RESUMO.
INFORMATIVO 559 DO STJ.
DIREITO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE E PROCESSUAL CIVIL. RELAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE AÇÃO
FUNDADA NA CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS E AÇÃO
DE GUARDA E DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. No caso em que criança tenha sido supostamente retida ilicitamente no
Brasil por sua genitora, não haverá conflito de competência entre (a) o
juízo federal no qual tramite ação tão somente de busca e apreensão da criança
ajuizada pelo genitor com fundamento na Convenção de Haia sobre os Aspectos
Civis do Sequestro Internacional de Crianças e (b) o juízo estadual de
vara de família que aprecie ação, ajuizada pela genitora, na qual se discuta o
fundo do direito de guarda e a regulamentação de visitas à criança; verificando-se
apenas prejudicialidade externa à ação ajuizada na Justiça Estadual, a
recomendar a suspensão deste processo até a solução final da demanda ajuizada
na Justiça Federal. Com efeito, o objetivo da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro
Internacional de Crianças é repor à criança seu status quo,
preservando o foro do país de sua residência habitual como o competente para
julgar pedido de guarda, por configurar o juízo natural onde se pressupõe sejam
melhor discutidas as questões a ela referentes e mais fácil a colheita de
provas (art. 1°). Essa presunção, aliás, reforça a ideia de que a decisão sobre
a guarda e regulamentação do direito de visitas não é objeto da ação de busca e
apreensão de criança retida ilicitamente no território nacional. Aliás, os
arts. 16, 17 e 19 da referida convenção corroboram esse entendimento e
evidenciam que a competência para a decisão sobre a guarda da criança não é do
juízo que vai decidir a medida de busca e apreensão da criança. Nesse passo, se
for determinada a restituição da criança ao país de origem, lá é que se
decidirá a respeito do fundo do direito de guarda e regulamentação de visitas.
Por sua vez, caso seja indeferido o pleito de restituição, a decisão sobre
essas questões caberá ao Juízo de Família competente. Desse modo, na ação de
busca e apreensão que tramita na Justiça Federal não será definido o fundo de
direito de guarda e regulamentação de visitas, por se tratar de questão para a
qual existe foro próprio e adequado, seja no país de origem da criança, seja no
Brasil. Portanto, a aludida ação de busca e apreensão de criança apresenta-se
como uma prejudicialidade externa à ação de guarda e regulamentação de visitas
proposta na Justiça Estadual, a recomendar sua suspensão desta, nos termos do
art. 265, IV, “a”, do CPC, e não a modificação da competência. Por fim, convém
esclarecer que há três recentes precedentes do STJ que analisaram hipóteses
semelhantes à que aqui se discute. Neles, reconheceu-se haver conflito e
concluiu pela competência da Justiça Federal para o julgamento das causas que
tramitavam na Justiça Estadual (CC 100.345-RJ, Segunda Seção, DJe 18/3/2009; CC
118.351-PR, Segunda Seção, DJe 5/10/2011; e CC 123.094-MG, Segunda Seção, DJe
14/2/2014). Entretanto, ante a inexistência de conexão entre a ação de busca e
apreensão e a ação de guarda e regulamentação de visitas, não há se falar em
conflito de competência entre as demandas em análise. CC 132.100-BA, Rel. Min. João
Otávio de Noronha, julgado em 25/2/2015, DJe 14/4/2015.
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR.
DEVER DE UTILIZAÇÃO DO SISTEMA BRAILLE POR INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. As instituições financeiras
devem utilizar o sistema braille na confecção dos contratos bancários de adesão
e todos os demais documentos fundamentais para a relação de consumo
estabelecida com indivíduo portador de deficiência visual. Pela ordem
cronológica, destaca-se, de início, o art. 1º da Lei 4.169/1962, que
oficializou as Convenções Braille para uso na escrita e leitura dos cegos e o
Código de Contrações e Abreviaturas Braille. Posteriormente, a Lei 10.048/2000,
ao conferir prioridade de atendimento às pessoas portadoras de deficiência, textualmente
impôs às instituições financeiras a obrigação de conferir tratamento
prioritário, e, por conseguinte, diferenciado, aos indivíduos que ostentem as
aludidas restrições. A referida Lei, ao estabelecer normas gerais e critérios
básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadores de deficiência
ou com mobilidade reduzida, bem explicitou a necessidade de supressão de todas
as barreiras e de obstáculos, em especial, nos meios de comunicação. E, por
fim, em relação ao micro-sistema protetivo das pessoas portadoras de
deficiência, cita-se à colação o Decreto 6.949/2009, que promulgou a
Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu
Protocolo Facultativo, cujo texto possui valor equivalente ao de uma emenda
constitucional, e, por veicular direitos e garantias fundamentais do indivíduo,
tem aplicação concreta e imediata (art. 5º, §§ 1º e 3º, da CF). Nesse ínterim,
assinala-se que a convenção sob comento impôs aos Estados signatários a
obrigação de assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos
humanos e liberdades fundamentais pelas pessoas portadoras de deficiência,
conferindo-lhes tratamento materialmente igualitário (diferenciado na proporção
de sua desigualdade) e, portanto, não discriminatório, acessibilidade física e
de comunicação e informação, inclusão social, autonomia e independência (na
medida do possível, naturalmente), e liberdade para fazer suas próprias
escolhas, tudo a viabilizar a consecução do princípio maior da dignidade da
pessoa humana. Especificamente sobre a barreira da comunicação, a
Convenção, é certo, referiu-se expressamente ao método braille, sem prejuízos
de outras formas e sempre com atenção à denominada “adaptação razoável”, como
forma de propiciar aos deficientes visuais o efetivo acesso às informações.
Nesses termos, valendo-se das definições trazidas pelo Tratado, pode-se
afirmar, com segurança, que a não utilização do método braille durante todo o
ajuste bancário levado a efeito com pessoa portadora de deficiência visual
(providência, é certo, que não importa em gravame desproporcional à instituição
financeira), impedindo-a de exercer, em igualdade de condições com as demais
pessoas, seus direitos básicos de consumidor, a acirrar a inerente dificuldade
de acesso às correlatas informações, consubstancia, a um só tempo, intolerável
discriminação por deficiência e inobservância da almejada “adaptação razoável”.
A utilização do método braille nos ajustes bancários com pessoas portadoras de
deficiência visual encontra lastro, ainda, indiscutivelmente, na legislação
consumerista, que preconiza ser direito básico do consumidor o fornecimento de
informação suficientemente adequada e clara do produto ou serviço oferecido,
encargo, é certo, a ser observado não apenas por ocasião da celebração do
ajuste, mas também durante toda a contratação. No caso do consumidor deficiente
visual, a consecução deste direito, no bojo de um contrato bancário de adesão,
somente é alcançada (de modo pleno, ressalta-se), por meio da utilização do
método braille, a facilitar, e mesmo a viabilizar, a integral compreensão e
reflexão acerca das cláusulas contratuais submetidas a sua apreciação,
especialmente aquelas que impliquem limitações de direito, assim como dos
extratos mensais, dando conta dos serviços prestados, taxas cobradas etc.
Ressalte-se que, considerada a magnitude dos direitos sob exame, de assento
constitucional e legal, afigura-se de menor, ou sem qualquer relevância, o fato
de a Resolução 2.878/2001 do BACEN, em seu art. 12, exigir, sem prejuízo de
outras providências a critério das instituições financeiras, que as
contratações feitas com deficientes visuais sejam precedidas de leitura, em voz
alta, por terceiro, das cláusulas contratuais, na presença de testemunhas. Este
singelo procedimento, a toda evidência, afigura-se insuficiente, senão inócuo,
ao fim que se destina. De fato, esse proceder não confere ao consumidor
deficiente visual, como seria de rigor, pleno acesso às informações, para
melhor nortear as suas escolhas, bem como para permitir seja aferido, durante
toda a contratação, a correlação e mesmo a correção entre os serviços
efetivamente prestados com o que restou pactuado (taxas cobradas, condições,
consectários de eventual inadimplemento etc.). Nesse contexto, é
manifesta, ainda, a afronta ao direito à intimidade do consumidor deficiente
visual que, para simples conferência acerca da correção dos serviços prestados,
ou mesmo para mera obtenção de prestação de contas, deve se dirigir a agência
bancária e, forçosamente, franquear a terceiros, o conteúdo de sua movimentação
financeira. O simples envio mensal dos extratos em braille afigurar-se-ia
providência suficiente e razoável para conferir ao cliente, nessas condições,
tratamento digno e isonômico. Deve-se, pois, propiciar ao consumidor nessas
condições, não um tratamento privilegiado, mas sim diferenciado, na medida de
sua desigualdade, a propiciar-lhes igualdade material de tratamento. É de se
concluir, assim, que a obrigatoriedade de confeccionar em braille os contratos
bancários de adesão e todos os demais documentos fundamentais para a
relação de consumo estabelecida com indivíduo portador de deficiência visual,
além de encontrar esteio no ordenamento jurídico nacional, afigura-se
absolutamente razoável, impondo à instituição financeira encargo próprio de sua
atividade, adequado e proporcional à finalidade perseguida, consistente em
atender ao direito de informação do consumidor, indispensável à validade da
contratação, e, em maior extensão, ao princípio da dignidade da pessoa humana.
REsp 1.315.822-RJ, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 24/3/2015, DJe 16/4/2015.
DIREITO CIVIL. DEVER DE RETRANSMISSÃO
POR TELEVISÃO A CABO DA PROGRAMAÇÃO E SINAL GERADOS POR EMISSORA LOCAL. A empresa de TV a cabo, ao
distribuir os canais básicos de utilização gratuita, deve veicular os sinais de
radiodifusão e imagens gerados pelas emissoras locais afiliadas regionais de
emissora nacional que tenham programação própria. Isso porque o art. 23, I,
“a”, da Lei 8.977/1995 dispõe que a operadora de TV a cabo, na sua área de
prestação do serviço, deverá tornar disponíveis canais destinados à
distribuição obrigatória, integral e simultânea, sem inserção de qualquer
informação, da programação das emissoras locais de radiodifusão de sons e
imagens, em VHF ou UHF, abertos e não codificados, cujo sinal alcance a área do
serviço de TV a Cabo e apresente nível técnico adequado, conforme padrões
estabelecidos pelo Poder Executivo. De acordo com a doutrina, a “Lei do Cabo é
a única que obriga as operadoras locais a oferecerem aos seus assinantes canais
abertos de emissora Geradora local, com programação que tiver condições
técnicas de ser veiculada na localidade onde é oferecido o cabo.” Ressalta
ainda que “somente são oferecidos os canais abertos de emissora Geradora local
que são captados na comunidade onde é oferecida a assinatura do cabo. Assim, se
na localidade não houver Geradoras tal obrigação não existe. Tal obrigação é
específica da operação de cabo e não pode ser estendida as demais”. É certo que
existem estações meramente retransmissoras, mas muitas TVs locais atuam também
como geradoras de programas, já que as emissoras nacionais abrem espaço na
grade de programação para produção local de telejornais, programas regionais e
publicidade nos intervalos comerciais. Mesmo que esses espaços sejam diminutos,
ainda assim, se existentes, está caracterizada a geração de sinais. Assim, a
operadora de TV a cabo deve disponibilizar para seus assinantes o sinal gerado
pela emissora local, com a inserção de programas e publicidades locais, visto
que a finalidade da lei é preservar a cultura e interesses locais. REsp 1.234.153-SC, Rel. Min.
João Otávio de Noronha, julgado em 7/4/2015, DJe 13/4/2015.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
PENHORA DE QUOTAS SOCIAIS NA PARTE RELATIVA À MEAÇÃO. A existência de dívida
alimentar não autoriza a penhora imediata de cotas sociais pertencentes à atual
companheira do devedor na parte relativa à meação, sem que antes tenha sido
verificada a viabilidade de constrição do lucro relativo às referidas cotas e
das demais hipóteses que devam anteceder a penhora (art. 1.026, c/c art.
1.053, ambos do CC). Com efeito, como se aplica à união estável o regime da
comunhão parcial de bens, a jurisprudência do STJ admite a penhora da meação do
devedor para satisfação de débito exequendo (REsp 708.143-MA, Quarta Turma, DJ
26/2/2007). Igualmente, não se pode olvidar que a jurisprudência STJ, nos
moldes do disposto no art. 655, VI, do CPC, também admite a penhora de quotas
sociais do executado para satisfação de crédito exequendo, ainda que exista
vedação no contrato social da sociedade empresária à livre alienação das cotas,
sem que isso, todavia, implique a admissão como sócio daquele que arrematar ou
adjudicar (REsp 327.687-SP, Quarta Turma, DJ 15/4/2002). Contudo, não se pode
ignorar que o advento do art. 1.026 do CC, ao dispor que “O credor particular
de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a
execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe
tocar em liquidação”, relativizou a penhorabilidade das quotas sociais, que só
deve ser efetuada acaso superadas as demais possibilidades conferidas pelo
dispositivo mencionado, consagrando o princípio da conservação da empresa ao
restringir a adoção de solução que possa provocar a dissolução da sociedade
empresária e maior onerosidade da execução, visto que a liquidação parcial da
sociedade empresária, por débito estranho à sociedade, implica a sua
descapitalização, afetando os interesses dos demais sócios, empregados,
fornecedores e credores da empresa. Nesse mesmo diapasão, propugna a doutrina
que não cabe ao credor particular do sócio “escolher se vai receber os lucros
ou se vai liquidar parte da sociedade como forma de pagamento do que lhe é
devido, seria condenar as sociedades a um futuro incerto e possivelmente
desastroso, caso a diminuição de capital afete sua capacidade produtiva. Nessa
última situação acabaria, ainda, punindo a sociedade por obrigação que lhe é
estranha, da qual não tomou parte, mas que poderia ser adimplida de outro
modo”, devendo sempre que possível ser feita a opção pela retenção dos lucros,
correspondentes à quota social do devedor. Convém consignar que o Enunciado 387
da IV Jornada de Direito Civil propõe que a opção entre fazer a execução recair
sobre o que ao sócio couber no lucro da sociedade ou na parte em que lhe tocar
em dissolução orienta-se pelos princípios da menor onerosidade e da função
social da empresa. Assim, tendo em vista o disposto no art. 1.026, c/c o
art. 1.053, ambos do CC, e os princípios da conservação da empresa e da menor
onerosidade da execução, cabe ao exequente requerer a penhora dos lucros
relativos às quotas sociais correspondentes à meação do devedor – o que também
é a inteligência do art. 1.027 do CC –, não podendo ser deferida, de modo
imediato, a penhora de quotas sociais de sociedade empresária em plena
atividade, em prejuízo de terceiros, por dívida estranha à referida pessoa
jurídica. REsp 1.284.988-RS, Rel Min. Luis
Felipe Salomão, julgado em 19/3/2015, DJe 9/4/2015.
DIREITO CIVIL. POSSIBILIDADE DE
ABSOLUTAMENTE INCAPAZ SOFRER DANO MORAL. O absolutamente incapaz, ainda quando
impassível de detrimento anímico, pode sofrer dano moral. O dano moral
caracteriza-se por uma ofensa, e não por uma dor ou um padecimento. Eventuais
mudanças no estado de alma do lesado decorrentes do dano moral, portanto, não
constituem o próprio dano, mas eventuais efeitos ou resultados do dano. Já os
bens jurídicos cuja afronta caracteriza o dano moral são os denominados pela
doutrina como direitos da personalidade, que são aqueles reconhecidos à pessoa
humana tomada em si mesma e em suas projeções na sociedade. A CF deu ao homem
lugar de destaque, realçou seus direitos e fez deles o fio condutor de todos os
ramos jurídicos. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito
constitucional subjetivo – essência de todos os direitos personalíssimos –, e é
o ataque a esse direito o que se convencionou chamar dano moral. REsp 1.245.550-MG, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 17/3/2015, DJe 16/4/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS (ECT) POR
ASSALTO OCORRIDO NO INTERIOR DE BANCO POSTAL. A ECT é responsável pelos danos sofridos por
consumidor que foi assaltado no interior de agência dos Correios na qual é
fornecido o serviço de banco postal. De início, cumpre esclarecer que a
questão discutida no caso em análise não é a mesma da enfrentada no julgamento
do REsp 1.224.236-RS (DJe 2/4/2014), ocasião na qual a Quarta Turma afastou a
incidência do art. 1º, § 1º, da Lei 7.102/1983 no que toca às lotéricas, quando
atuando na função de correspondente, ao fundamento de que, apesar de prestarem
determinados serviços bancários, não possuem natureza de instituição
financeira. Naquele caso, analisava-se contenda entre casa lotérica e a Caixa
Econômica Federal, na qual se discutia a relação contratual (seguro) entre elas
e a específica relação de permissão de serviço público, para fins de definir
quem seria o responsável pela segurança do estabelecimento comercial (agência
permissionária). Aqui, ao revés, discute-se a responsabilidade na relação
usuário/fornecedor pelo defeito nos serviços prestados na atividade de banco
postal, portanto durante a relação de consumo entre as partes, não havendo
falar em permissão de serviço público. Posto isso, esclareça-se, por oportuno,
que banco postal (serviço financeiro postal especial), segundo o Banco Central,
é a marca utilizada pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT para
a atuação, por meio de sua rede de atendimento, como correspondente contratado
de uma instituição financeira. O objetivo dessa atividade é levar os serviços e
produtos bancários mais elementares à população de localidades desprovidas de
referidos benefícios, proporcionando a inclusão social e acesso ao sistema
financeiro, conferindo maior capilaridade ao atendimento bancário, nada mais
sendo do que uma longa manus das instituições financeiras que não
conseguem atender toda a sua demanda. Efetivamente, é inviável reconhecer a
incidência das especializadas regras de segurança previstas na Lei 7.102/1983
com relação à atuação dos Correios, notadamente a exigência de requisitos de
segurança para funcionamento de estabelecimento que seja sede de instituição
financeira, tais como: equipamentos de filmagem, vigilância ostensiva,
artefatos que retardem a ação de criminosos, cabina blindada dentre outros.
Todavia, não há como obstar a incidência das regras protetivas do CDC. Com
efeito, as contratações tanto dos serviços postais como dos serviços de
banco postal oferecidos pelos Correios revelam a existência de contrato de
consumo, desde que o usuário se qualifique como “destinatário final” do produto
ou serviço. Observe-se, a propósito, que o fato de uma empresa se inserir na
categoria de prestadora de serviço público ou de exploradora da atividade
econômica, por óbvio, não a afasta das regras próprias do CDC, bastando que
seja estabelecida relação de consumo com seus usuários (art. 3º). Nesse
contexto, tanto as empresas públicas prestadoras de serviços públicos, assim
como as exploradoras da atividade econômica, submetem-se ao regime de
responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 14 do CDC. Dessarte,
considerando a existência de relação de consumo na hipótese, bem como o fato do
serviço, resta saber se incide a excludente de responsabilização pelo
rompimento do nexo causal – fortuito externo. No caso do banco postal,
presta-se um serviço cuja natureza traz, em sua essência, risco à segurança,
justamente por tratar de atividade financeira com guarda de valores e
movimentação de numerário, além de diversas outras atividades tipicamente
bancárias, e que, apesar de o correspondente não ser juridicamente uma
instituição financeira para fins de incidência do art. 1°, § 1°, da Lei
7.102/1983, aos olhos do consumidor nada mais é do que um banco, como o próprio
nome revela: “banco postal”. Deveras, é assente na jurisprudência do STJ que,
nas discussões a respeito de assaltos dentro de agências bancárias, sendo o
risco inerente à atividade bancária, é a instituição financeira que deve
assumir o ônus desses infortúnios. É que os “roubos em agências bancárias são
eventos previsíveis, não caracterizando hipótese de força maior, capaz de
elidir o nexo de causalidade, requisito indispensável ao dever de indenizar”
(REsp 1.093.617-PE, Quarta Turma, DJe 23/3/2009). Na hipótese, o serviço
prestado pelos Correios foi inadequado e ineficiente, porque descumpriu o dever
de segurança legitimamente esperado pelo consumidor, não havendo falar em caso
fortuito para fins de exclusão da responsabilidade com rompimento da relação de
causalidade, mas sim fortuito interno, porquanto incide na proteção dos riscos
esperados da atividade empresarial desenvolvida. Ademais, como dito, aos olhos
do usuário, inclusive em razão do nome e da prática comercial, não se pode
concluir de outro modo. Com efeito, o consumidor efetivamente crê que o banco
postal (correspondente bancário) nada mais é do que um banco com funcionamento
dentro de agência dos Correios. De fato, dentro do seu poder de livremente
contratar e oferecer diversos tipos de serviços, ao agregar a atividade de
correspondente bancário ao seu empreendimento, acaba-se por criar risco
inerente à própria atividade das instituições financeiras, devendo por isso
responder pelos danos que essa nova atribuição tenha gerado aos seus
consumidores, uma vez que atraiu para si o ônus de fornecer a segurança
legitimamente esperada para esse tipo de negócio. REsp 1.183.121-SC, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 24/2/2015, DJe 7/4/2015.
DIREITO EMPRESARIAL. AVAL EM
CÉDULAS DE CRÉDITO RURAL. Admite-se aval em cédulas de crédito rural. Isso porque a
proibição contida no § 3º do art. 60 do Decreto-Lei 167/1967 não se refere ao caput
(cédulas de crédito), mas apenas ao § 2º (nota promissória e duplicata rurais).
Dispõe o art. 60 do DL 167/1967 que “Aplicam-se à cédula de crédito rural, à
nota promissória rural e à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas de
direito cambial, inclusive quanto a aval, dispensado porém o protesto para
assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas”. O § 2º do
referido artigo, por sua vez, impõe ser “nulo o aval dado em Nota Promissória
Rural ou Duplicata Rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes
da empresa emitente ou por outras pessoas jurídicas”. Já o § 3º preceitua que
“também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando
prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou
por outras pessoas jurídicas”. Observe-se que a afirmação de que “também são
nulas” outras garantias só pode complementar dispositivo no qual haja
referência a outra nulidade, e o único dispositivo do citado artigo a fazer tal
assertiva é o § 2º, no tocante à nulidade do aval. É dizer que a afirmação de
que “também são nulas” outras garantias não pode mesmo dizer respeito ao caput,
que não contém previsão alguma acerca de nulidade de garantias. Frise-se,
ademais, que os arts. 11, 17 e 18 do Decreto-Lei 167/1967 fazem referência
textual a garantias prestadas por terceiros em cédulas de crédito rural. De
mais a mais, observa-se que as alterações promovidas pela Lei 6.754/1979 – que
acrescentou ao art. 60 os parágrafos 1º a 4º –, pretenderam retirar a
responsabilidade cambiária do produtor rural pelo endosso e aval nas notas
promissórias rurais ou duplicatas rurais descontadas em instituição bancária,
quando o principal devedor, a indústria agrícola, fraudulentamente ou não,
deixava de honrar a dívida garantida pelas cártulas. A disciplina das cédulas
de crédito rural, por sua vez, é absolutamente diferente. Mesmo porque se trata
de títulos de crédito referentes a financiamentos tomados pelos produtores
rurais com integrantes do sistema nacional de crédito rural ou cooperativas
(nesse sentido, são os arts. 1º, caput e parágrafo único, 14, IV, 20,
IV, 25, IV, e 77, parágrafo único, todos do Decreto-Lei 167/1967). Com efeito,
as alterações trazidas pela Lei 6.754/1979, a toda evidência, não tiveram como
destinatárias as Cédulas de Crédito, pois estas são títulos representativos de
financiamento rural tomado pelo produtor ou cooperado para o incremento de suas
próprias atividades. Ou seja, nelas o produtor figura mesmo como devedor, ao
contrário da nota promissória rural e da duplicata rural, nas quais o devedor é
o comprador do produto rural a prazo – no mais das vezes, a agroindústria de grande
porte. Nessa linha de raciocínio, o aval prestado por terceiros nas cédulas de
crédito rural constitui reforço de garantia do próprio produtor rural, sem o
qual figuraria sozinho como responsável pelo financiamento perante o credor. A
um só tempo, o crédito rural estaria sensivelmente dificultado – e certamente
mais caro – ao pequeno produtor rural, e, além disso, tal circunstância vai de
encontro ao próprio sistema do crédito rural, o qual tem como um dos principais
objetivos “possibilitar o fortalecimento econômico dos produtores rurais,
notadamente pequenos e médios” (Lei 4.829/1965, art. 3º, III). REsp 1.315.702-MS, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, julgado em 10/3/2015, DJe 13/4/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
RESPONSABILIDADE DO ADJUDICANTE POR DÍVIDAS CONDOMINIAIS PRETÉRITAS. O exequente que
adjudicou o imóvel penhorado após finda praça sem lançador deve arcar com as
despesas condominiais anteriores à praça, ainda que omitidas no edital da hasta
pública. De fato, a jurisprudência consolidada no STJ estabelece que,
diante da ausência de previsão no edital da hasta pública acerca de débitos
condominiais anteriores à praça, não haverá a responsabilização do arrematante
pelo pagamento da dívida, a qual deverá ser quitada com o valor obtido na
alienação judicial. Cumpre esclarecer, entretanto, que a adjudicação e a
arrematação, apesar de ambos os institutos visarem à satisfação do direito do
credor, ostentam características diversas e, portanto, merecem tratamento
distinto no que diz respeito à vinculação ao edital. Efetivamente, a
adjudicação consiste na aquisição espontânea pelo exequente do bem penhorado
por preço não inferior ao da avaliação, não havendo sua subordinação ao edital
de praça, haja vista que essa forma de aquisição da propriedade não se insere
no conceito de hasta pública. A propósito, cabe ressaltar que a Lei 11.382/2006
– que revogou o art. 714 do CPC – alterou a sistemática tradicional da
alienação forçada na tutela executiva prevista no CPC, evidenciando ainda mais
a independência do ato de adjudicar em relação ao edital, ao colocar a
adjudicação como a primeira técnica expropriativa, seguida pela alienação por
iniciativa particular e, apenas subsidiariamente, a arrematação ou alienação em
hasta pública. É o que se infere do caput do art. 686, que prevê que
somente será expedido o edital da arrematação se não requerida a adjudicação e
não realizada a alienação particular do bem penhorado. Assim, é certa a
responsabilização do adjudicante pelo pagamento das contribuições condominiais
inadimplidas no período anterior à adjudicação, aplicando-se o art. 1.345 do CC
em sua íntegra: “O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante,
em relação ao condomínio, inclusive multa e juros moratórios”. REsp 1.186.373-MS, Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, julgado em 24/3/2015, DJe 14/4/2015.
Nenhum comentário:
Postar um comentário