quarta-feira, 29 de novembro de 2017

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUAS APLICAÇÕES AO DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. SEGUNDA PARTE. MINHA COLUNA DO MIGALHAS DO MÊS DE NOVEMBRO DE 2017.

A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUAS APLICAÇÕES AO DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. SEGUNDA PARTE[1]
Flávio Tartuce[2]
Como destacado em texto anterior publicado neste canal, quando do XI Congresso Brasileiro de Direito de Família e das Sucessões, promovido pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) entre os dias 25 e 27 de outubro deste ano de 2017, na cidade de Belo Horizonte, tive a honra de tratar do tema da desconsideração da personalidade jurídica aplicada ao Direito de Família e das Sucessões, respondendo à seguinte indagação formulada pela comissão científica do evento: “O CPC/2015 consolidou, ajudou e fez avanços na teoria e prática da desconsideração da personalidade jurídica?”.
No artigo anterior, demonstrei a origem da ideia, as suas modalidades – com destaque para a desconsideração inversa –, as suas teorias, a amplitude de sua aplicação, bem como diferencei o instituto em relação à despersonalização ou despersonificação.
Neste segundo texto, procurarei analisar de forma breve o tratamento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, corretamente incluído no Novo Código de Processo Civil, entre os seus arts. 133 a 137. Diz-se corretamente, pois tal regulamentação acabou por consolidar o clamor doutrinário anterior a respeito da instituição do contraditório prévio para o deferimento da desconsideração da personalidade jurídica, substituindo-se o corriqueiramente injusto contraditório diferido, existente na realidade anterior, em especial nas ações de execução. Como bem pontua André Pagani de Souza, a instauração do incidente permite que o juiz “realize a sua cognição e profira a sua decisão no curso de um processo pendente, sem prejudicar o direito de defesa do integrante da pessoa jurídica” (Código de Processo Civil anotado. Coordenadores: José Rogério Cruz e Tucci e outros. Rio de Janeiro: GZ, 2016. p. 196).
Como é notório, o incidente recebeu um título próprio no Capítulo IV do Título III, que trata da intervenção de terceiros no processo, sem prejuízo de outros dispositivos. De início, estabelece o art. 133, caput, do Novo Código de Processo Civil que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo. Fica afastada, portanto, e pelo menos a priori, a possibilidade de conhecimento de ofício, pelo juiz, da desconsideração da personalidade jurídica. Lembre-se de que a menção ao pedido pela parte ou pelo Ministério Público consta do art. 50 do Código Civil, no que diz respeito à incidência da categoria ao Direito de Família e das Sucessões.
Apesar disso, o presente autor entende que, em alguns casos, de ordem pública, a desconsideração da personalidade jurídica ex officio é possível. Citem-se, de início, as hipóteses envolvendo os consumidores, eis que, nos termos do art. 1º da Lei 8.078/1990, o Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública e interesse social, envolvendo direitos fundamentais protegidos pelo art. 5º da Constituição Federal de 1988. A esse propósito, por todos os doutrinadores consumeristas, como pondera Claudia Lima Marques, “no Brasil, pois, a proteção do consumidor é um valor constitucionalmente fundamental (Wertsystem) e é um direito subjetivo fundamental (art. 5º, XXXII), guiando – e impondo – a aplicação ex officio da norma protetiva dos consumidores, a qual realize o direito humano (efeito útil e pro homine do status constitucional); esteja esta norma no CDC ou em fonte outra (art. 7º do CDC)” (MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT, 2010. p. 70).
Existem arestos estaduais recentes que adotam tal ideia, caso do Tribunal de Justiça do Distrito Federal para as relações de consumo. A título de exemplo de vários arestos que assim concluem, com mesma relatoria e no âmbito do Juizado Especial Cível:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INCIDÊNCIA DA TEORIA MENOR, QUE POSSIBILITA A DECRETAÇÃO, DE OFÍCIO, APENAS EM RAZÃO DA INSOLVÊNCIA. ARTIGO 28, § 5º, DO CDC. AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Trata-se de relação de consumo, visto que o agravante é o consumidor, e o recorrido fornecedor de serviços, conforme previsto nos artigos 2º e 3º da Lei n. 8.079, de 11 de setembro de 1990, Código de Defesa do Consumidor. 2. Tratando-se de vínculo proveniente de relação de consumo aplica-se a teoria menor da desconsideração da personalidade (§ 5º do art. 28 do CDC), para qual é suficiente a prova de insolvência da pessoa jurídica, sem necessidade da demonstração do desvio de finalidade ou da confusão patrimonial. 3. Verificada a índole consumerista da relação e o esgotamento, sem sucesso, das diligências cabíveis e razoáveis à busca de bens suficientes para satisfação do crédito do consumidor, é cabível a desconsideração da personalidade jurídica do agravado. 4. Agravo de instrumento conhecido e provido. 5. Sem custas e sem honorários, ante a ausência de recorrente vencido” (TJDF, Processo n. 0700.64.9.252017-8079000, Acórdão n. 104.6000, Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Rel. Juiz Arnaldo Corrêa Silva, julgado em 13.09.2017, DJDFTE 20.09.2017).
Ressalve-se, contudo, que, nos termos do que consta do próprio CPC/2015, especialmente do seu art. 10, que trata da vedação das decisões-surpresa, antes do conhecimento de ofício da desconsideração da personalidade jurídica, o juiz deve ouvir as partes da demanda. Conforme essa norma, “o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.
Penso que também é viável a desconsideração da personalidade jurídica de ofício pelo juiz nos casos de danos ambientais, diante da proteção constitucional do Bem Ambiental, como bem difuso, retirada do art. 225 do Texto Maior. A conclusão deve ser a mesma nas hipóteses envolvendo corrupção, por força da recente Lei n. 12.846/2013, que trata da desconsideração administrativa das empresas envolvidas com tais atos, tendo a norma interesse coletivo inquestionável. Em suma, a decretação ex officio é viável nos casos de incidência da teoria menor.
Quanto às relações familiares e sucessórias, a desconsideração da personalidade jurídica de ofício parece estar descartada. Primeiro, porque nenhuma das normas citadas incide em tais relações. Segundo, pelo fato de que as relações jurídicas submetidas ao Direito de Família e das Sucessões chamam a aplicação da teoria maior, em que não é possível a desconsideração de ofício.
Seguindo no estudo das regras processuais, o § 1º do art. 133 do Novo CPC estabelece que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei. Desse modo, devem ser respeitadas pelas partes e pelos julgadores as regras materiais comentadas no artigo anterior desta série, bem como as interpretações doutrinárias e jurisprudenciais outrora deduzidas, especialmente quanto às teorias maior e menor.
Igualmente, como antes exposto, com clara origem na evolução doutrinária e jurisprudencial a respeito do tema, enuncia o § 2º do art. 133 do Novo CPC que o incidente de desconsideração é aplicável às hipóteses de desconsideração inversa da personalidade jurídica. Curiosamente, o fundamento legal para a desconsideração invertida ou indireta passou a ser a norma da lei processual, e não a codificação material.
Nos termos da cabeça do art. 134 da Norma Processual Civil emergente, o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial. No âmbito do Direito de Família, é cabível, por exemplo, em sede de cumprimento de sentença que reconheceu a partilha de bens do casal ou o pagamento de verbas alimentares. Não vemos problema em admitir a desconsideração, ainda, no âmbito de ação de divórcio ou de demanda que pretende a dissolução de união estável, de forma litigiosa.
A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas (§ 1º). Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, situação em que será citado diretamente o sócio ou a pessoa jurídica (§ 2º). A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese de pedido na exordial, com citação do sócio (§ 3º). Parece ter pecado o CPC/2015 por mencionar apenas os sócios e não os administradores da empresa, sendo viável fazer uma interpretação extensiva para também incluí-los. A menção a qualquer fase do processo é louvável, afastando o debate anterior de desconsideração em processo executivo, mormente por um suposto atentado ao contraditório e à ampla defesa. Com a instauração do incidente, essa discussão fica afastada.
Também são afastadas inquietações anteriores com a previsão de que  de que os sócios – e administradores – passam a compor o polo passivo da demanda. Dessa forma, devem ser tratados como partes e não como terceiros, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica. Tanto isso é verdade que o novo art. 790, inciso VII, do Código de Processo Civil passou a enunciar que, nas situações de desconsideração da personalidade jurídica, ficam sujeitos à execução os bens do responsável.
Suplementarmente, o art. 674 do Novo Código de Processo Civil define como legitimado para opor embargos de terceiros aquele que, não sendo parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo. Ademais, conforme o § 2º, inciso III, do mesmo artigo, considera-se terceiro, para ajuizamento dos embargos de terceiro, quem sofrer constrição judicial de seus bens por força de desconsideração da personalidade jurídica, de cujo incidente não fez parte. Somente nessas hipóteses fáticas os embargos de terceiro são cabíveis.
O § 4º do art. 134 do CPC/2015 preconiza que o requerimento de desconsideração da personalidade deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para a sua incidência. Em suma, o pedido deve ser bem fundamentado, com a exposição da incidência das teorias maior ou menor, na linha de todas as lições que foram antes desenvolvidas no primeiro artigo desta série.
Instaurado o incidente, o sócio (ou a pessoa jurídica) será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 dias (art. 135 do Novo Processo Civil), o que evidencia a instauração do louvável contraditório, sempre defendido pela doutrina. Nos termos do novo art. 136 do CPC/2015, concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória, e não por sentença. Se a decisão for proferida pelo relator, caberá agravo interno, com tratamento específico no próprio Estatuto Processual emergente.
Como última regra geral a respeito do incidente de desconsideração, nos termos do art. 137 do Novo CPC, acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente. Em suma, a opção legislativa é resolver a questão no plano da eficácia, e não da validade, como consta da parte final do art. 50 do Código Civil, com a notória ampliação de responsabilidades decorrentes do instituto.
Outro dispositivo que merece ser citado e anotado é o art. 795 do Código de Processo Civil em vigor, segundo o qual os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão nos casos previstos em lei. Nos termos do seu § 1º, o sócio-réu, quando responsável pelo pagamento da dívida da sociedade, tem o direito de exigir que primeiro sejam excutidos os bens da sociedade, o que confirma a sua responsabilidade subsidiária e não solidária, presente o benefício de ordem ou de excussão.
Ao sócio que alegar esse benefício, cabe a nomeação de bens da sociedade, situados na mesma comarca, livres e desembargados, que bastem para pagar o débito (art. 795, § 2º). O sócio que pagar a dívida poderá executar a sociedade nos autos do mesmo processo (art. 795, § 3º, do Novo CPC). Por fim, para a desconsideração da personalidade jurídica é obrigatória a observância do incidente previsto no próprio CPC/2015, o que indica que a responsabilidade do sócio ou administrador passa a ser integral e solidária (art. 795, § 4º), na linha do que vinha entendendo a melhor jurisprudência nacional. Por todos os julgados superiores, merece destaque o seguinte: “tese expendida no recurso especial, consistente na limitação da responsabilidade dos sócios à correspondente participação societária ou ao exercício dos poderes de administração, a despeito da desconsideração da personalidade jurídica, em princípio, não se mostra plausível. Efetivamente, o artigo 50 do Código Civil não tece qualquer restrição nesse sentido, sendo certo que tal exegese poderia tornar inócuo tal instituto, destinado a permitir a satisfação pontual do credor, lesado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial” (STJ, Ag. Rg. na MC 20.472/DF, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 03.09.2013, DJe 20.09.2013).
Também em boa hora o novo art. 1.062 do CPC/2015 passa a prever que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais. Como o incidente não traz grandes complexidades, não haveria qualquer óbice para a sua incidência nesses processos, constituindo-se em um importante mecanismo que afasta a má-fé e pune os maus sócios e administradores das pessoas jurídicas. Sobre o Direito de Família, existem projetos legislativos que pretendem trazer para o âmbito do Juizado Especial as suas demandas, o que não conta com o nosso apoio, diante das peculiaridades e complexidades pontuais dessas ações.
Na jurisprudência nacional já podem ser encontrados vários arestos aplicando o novel incidente e com debates interessantes, notadamente para o Direito de Família e das Sucessões. Tais arestos, todos muito recentes, serão analisados no terceiro e último artigo desta série.
De todo modo, para encerrar este estudo, merecem ser comentados brevemente dois enunciados doutrinários aprovados na I Jornada de Direito Processual Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em agosto de 2017.
O primeiro deles, de número 11, estabelece a necessidade de aplicação do incidente previsto entre os arts. 133 e 137 do Novo CPC não só para a desconsideração direta, como também para a inversa ou indireta, o que, como se verá, é reconhecido por muitos acórdãos recentes. O enunciado cita ainda a desconsideração expansiva, também denominada sucessão de empresas ou desconsideração econômica, em que há a ampliação de responsabilidades de uma pessoa jurídica para outra, evidenciado o conluio fraudulento praticado pelos sócios ou administradores de ambas.
O segundo enunciado doutrinário, aprovado no mesmo evento, preceitua que é cabível a concessão de tutela provisória de urgência em incidente de desconsideração da personalidade jurídica (Enunciado n. 42). Como se sabe, a tutela provisória de urgência está tratada pelo art. 300 do CPC/2015, sendo concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Duas são as suas modalidades: a) a tutela de urgência de natureza antecipada, preenchidos tais requisitos; e b) a tutela de urgência de natureza cautelar, efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito (art. 301 do CPC/2015).
Vários acórdãos deferem a tutela provisória de urgência para bloqueio ou arresto de bens do fraudador, seja ele pessoa natural ou jurídica, na desconsideração da personalidade jurídica. A ilustrar, do Tribunal Paulista, entendeu-se pela viabilidade da desconsideração inversa da personalidade jurídica, instaurando-se o incidente para tal fim. Reformou-se decisão de primeiro grau, para manter o deferimento de tutela de urgência, que autorizava arresto de bens (TJSP, Agravo de Instrumento n. 2153635-11.2016.8.26.0000, Acórdão 10484765, Santo André, Rel. Des. Roberto Mac Cracken, 22ª Câmara de Direito Privado, julgado em 25.05.2017, DJESP07.06.2017, p. 1765).
Outros julgados de aplicação do incidente, notadamente no âmbito do Direito de Família e das Sucessões, serão expostos no terceiro e último texto desta série de artigos.

[1] Coluna do Migalhas do mês de novembro de 2017.
[2] Doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC-SP. Professor titular permanente do programa de mestrado e doutorado da FADISP. Professor e coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensuda EPD. Diretor do IBDFAM – Nacional e vice-presidente do IBDFAM/SP. Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

RESUMO. INFORMATIVO 614 DO STJ

RESUMO. INFORMATIVO 614 DO STJ.
SÚMULA N. 593
O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente. Terceira Seção, aprovada em 25/10/2017, DJe 6/11/2017.

SÚMULA N. 594
O Ministério Público tem legitimidade ativa para ajuizar ação de alimentos em proveito de criança ou adolescente independentemente do exercício do poder familiar dos pais, ou do fato de o menor se encontrar nas situações de risco descritas no art. 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente, ou de quaisquer outros questionamentos acerca da existência ou eficiência da Defensoria Pública na comarca. Segunda Seção, aprovada em 25/10/2017, DJe 6/11/2017.

SÚMULA N. 595
As instituições de ensino superior respondem objetivamente pelos danos suportados pelo aluno/consumidor pela realização de curso não reconhecido pelo Ministério da Educação, sobre o qual não lhe tenha sido dada prévia e adequada informação. Segunda Seção, aprovada em 25/10/2017, DJe 6/11/2017.

SÚMULA N. 596
A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso de impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais. Segunda Seção, aprovada em 8/11/2017, DJe 20/11/2017.

SÚMULA N. 597
A cláusula contratual de plano de saúde que prevê carência para utilização dos serviços de assistência médica nas situações de emergência ou de urgência é considerada abusiva se ultrapassado o prazo máximo de 24 horas contado da data da contratação. Segunda Seção, aprovada em 8/11/2017, DJe 20/11/2017.
TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.631.329-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 24/10/2017, DJe 31/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Ação de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Reportagem jornalística. Divulgação de imagem sem autorização. Fatos históricos de repercussão social. Direito à memória. Prévia autorização. Desnecessidade.
DESTAQUE
A Súmula 403/STJ é inaplicável às hipóteses de divulgação de imagem vinculada a fato histórico de repercussão social.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se a veiculação não autorizada da imagem da filha da autora em programa televisivo configura dano material e moral indenizável. Para tanto, cabe considerar o alcance do entendimento consolidado pela Segunda Seção do STJ, por meio do enunciado de Súmula n. 403, segundo o qual "independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais", diante de fatos históricos de repercussão social. Em relação a esses, ressalta-se que o direito à memória intensificado pela mídia, assume o papel de guardião da memória social, porquanto permite que a vida se desenvolva na continuidade de uma memória comum, cujos dados são permanentemente acessíveis a todos. Nesse sentido, ao resgatar um fato histórico de repercussão social, a atividade jornalística reforça a promessa em sociedade de que não queremos outros episódios de dor e sofrimento, de que precisamos superar, em todos os tempos, a injustiça e a intolerância. Registre-se que eventual abuso na transmissão do fato, cometido, entre outras formas, por meio de um desvirtuado destaque da intimidade da vítima ou do agressor, deve ser objeto de controle sancionador. A razão jurídica que atribui ao portador da informação uma sanção, entretanto, está vinculada ao abuso do direito e não à reinstituição do fato histórico, afinal, o exercício regular do direito, não pode se subverter, ele mesmo, em uma transgressão à lei, na modalidade abuso do direito, desvirtuando um interesse aparentemente legítimo, pelo excesso. Ademais, importante ressaltar que o Plenário do STF (ADI 4.815), à unanimidade, estabeleceu interpretação conforme a Constituição ao art. 20 do CC/02, para declarar inexigível autorização de pessoa biografada relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais e pessoas retratadas como coadjuvantes - o que legitima, ainda mais, a análise por esta Corte sobre a necessidade de autorização prévia para divulgação de imagem vinculada a fato histórico de repercussão social. No caso, por meio da conjuntura fática cristalizada pelo acórdão recorrido, pode-se concluir que: i) a matéria jornalística possui cunho informativo, sem denotação vexatória ou que denigra a imagem da autora ou de sua filha; ii) não há destaque para a intimidade da vítima ou de sua mãe; iii) as imagens divulgadas na reportagem se limitam a noticiar o fato histórico de repercussão social; iv) o fato já foi ampla e notoriamente divulgado desde a sua ocorrência; v) não há exploração comercial na exibição do conteúdo informativo. Desse modo, não é possível extrair a consequência jurídica pretendida.
PROCESSO
REsp 1.584.970-MT, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Seguro de automóvel. Garantia de responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Terceiro prejudicado. Ação de reparação de danos. Inclusão única da seguradora. Possibilidade.
DESTAQUE
A vítima de acidente de trânsito pode ajuizar demanda direta e exclusivamente contra a seguradora do causador do dano quando reconhecida, na esfera administrativa, a responsabilidade deste pela ocorrência do sinistro e quando parte da indenização securitária já tiver sido paga.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
De início, cumpre salientar que são pressupostos para o pagamento da cobertura securitária a verificação prévia da responsabilidade civil do segurado no sinistro, pois assim certamente haverá dano a ser indenizado por ele a terceiro, bem como a sua vontade de utilizar a garantia securitária, já que é de natureza facultativa. Quanto ao tema da legitimidade passiva do ente segurador em ações que buscam indenização securitária advinda do seguro de responsabilidade civil facultativo, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça consagrou o entendimento de que descabe ação do terceiro prejudicado ajuizada direta e exclusivamente contra a seguradora do apontado causador do dano (Súmula 529/STJ). Não obstante esse entendimento, há hipóteses em que a obrigação civil de indenizar do segurado se revela incontroversa, como quando reconhece a culpa pelo acidente de trânsito ao acionar o seguro de automóvel contratado, ou quando firma acordo extrajudicial com a vítima obtendo a anuência da seguradora, ou, ainda, quando esta celebra acordo diretamente com a vítima. Nesses casos, mesmo não havendo liame contratual entre a seguradora e o terceiro prejudicado, forma-se, pelos fatos sucedidos, uma relação jurídica de direito material envolvendo ambos, sobretudo se paga a indenização securitária. Logo, na pretensão de complementação de indenização securitária decorrente de seguro de responsabilidade civil facultativo, a seguradora pode ser demandada direta e exclusivamente pelo terceiro prejudicado no sinistro, pois, com o pagamento tido como parcial na esfera administrativa, originou-se uma nova relação jurídica substancial entre as partes. Ademais, mesmo com a ausência do segurado no polo passivo da lide, não haverá, nesses casos, restrição ao direito de defesa da seguradora, porquanto somente será feita a quantificação da indenização, já que o próprio segurado admitiu ser o causador do dano.
PROCESSO
REsp 1.442.597-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA
Ação redibitória. Reclamação que obsta a decadência. Forma documental ou verbal. Admissão. Comprovação pelo consumidor.
DESTAQUE
A reclamação obstativa da decadência, prevista no art. 26, § 2º, I, do CDC pode ser feita documentalmente ou verbalmente.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Na origem, trata-se de ação redibitória – extinta com resolução do mérito, ante o reconhecimento da decadência – por meio da qual se buscava a rescisão do contrato de compra e venda de veículo defeituoso. Nesse contexto, discute-se a forma pela qual o consumidor deve externar a reclamação prevista no art. 26, § 2º, I, do Código de Defesa do Consumidor. Nos termos do dispositivo supracitado, é causa obstativa da decadência, a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca. Infere-se do preceito legal que a lei não preestabelece uma forma para a realização da reclamação, exigindo apenas comprovação de que o fornecedor tomou ciência inequívoca quanto ao propósito do consumidor de reclamar pelos vícios do produto ou serviço. Com efeito, a reclamação obstativa da decadência pode ser feita documentalmente – por meio físico ou eletrônico – ou mesmo verbalmente – pessoalmente ou por telefone – e, consequentemente, a sua comprovação pode dar-se por todos os meios admitidos em direito. Afinal, supor que o consumidor, ao invés de servir-se do atendimento atualmente oferecido pelo mercado, vá burocratizar a relação, elaborando documento escrito e remetendo-o ao Cartório, é ir contra o andamento natural das relações de consumo.

PROCESSO
REsp 1.507.339-MT, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Execução para entrega de coisa incerta. Conversão para procedimento executivo por quantia certa. Coisa perseguida entregue com atraso. Possibilidade.
DESTAQUE
É possível a conversão do procedimento de execução para entrega de coisa incerta para execução por quantia certa na hipótese em que o produto perseguido for entregue com atraso, gerando danos ao credor da obrigação.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Na origem, trata-se de execução movida por cooperativa agroindustrial com base em cédula de produto rural, em que os executados se comprometeram à entrega de coisa incerta. Ante o atraso no cumprimento da obrigação, discute-se a possibilidade de se converter o procedimento para execução por quantia certa. Com efeito, o art. 627 do CPC/73 já autorizava a referida conversão para as hipóteses de frustração do meio executório, ou seja, nas situações específicas em que: (a) não encontrada a coisa perseguida; (b) não entregue; (c) deteriorada a coisa; e (d) não reclamada de terceiro adquirente. Na hipótese em que se busca obrigação subsidiária consistente nos frutos e ressarcimento dos prejuízos decorrentes da mora, deve-se fazer uma análise da compatibilidade do título (CPR) com o rito (execução para entrega de coisa e de quantia certa). Nesse sentido, extrai-se da leitura da segunda parte do art. 624 do CPC/73 – agora com nova redação ampliada do art. 807 do CPC/15 – combinado com o art. 389 do CC/02, que, mesmo satisfeita a obrigação de entregar a coisa, se "prosseguirá a execução" para o pagamento de frutos e/ou ressarcimento de prejuízos. Dessa forma, embora não contido no título, decorre da lei a certeza do direito perseguido, sem a necessidade de um novo processo cognitivo para se declarar a obrigação que o ordenamento jurídico já estabeleceu. Ressalta-se, por fim, que o citado ressarcimento dos prejuízos depende de liquidação incidental no próprio feito executivo convertido, sendo a prévia apuração do quantum realizada por estimativa do credor ou por arbitramento.

PROCESSO
REsp 1.588.226-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 17/10/2017, DJe 20/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Créditos vinculados aos FIES. Recurso público recebido por instituição privada para aplicação compulsória em educação. Art. 649, IX, do CPC/73. Impenhorabilidade.
DESTAQUE
São absolutamente impenhoráveis os créditos vinculados ao programa Fundo de Financiamento Estudantil - FIES constituídos em favor de instituição privada de ensino.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A Lei n. 11.382/2006 inseriu, no art. 649, IX, do CPC/73, a previsão de impenhorabilidade absoluta dos "recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde, ou assistência social". Essa restrição à responsabilidade patrimonial do devedor justifica-se em razão da prevalência do interesse coletivo em relação ao interesse particular. No sistema anterior, embora a impenhorabilidade dos recursos públicos, enquanto pertencentes ao patrimônio de algum ente público, já estivesse garantida pelo disposto no art. 649, I, do CPC/73, quando eram repassados às entidades privadas, esses recursos passavam a integrar o patrimônio privado, o qual, em regra, está sujeito à penhora. Nesse contexto, a inserção do inciso IX no art. 649 do CPC/73, pela Lei 11.382/2006, visa a garantir a efetiva aplicação dos recursos públicos recebidos pelas entidades privadas às áreas da educação, saúde e assistência social, afastando a possibilidade de sua destinação para a satisfação de execuções individuais promovidas por particulares. Por seu turno, consigna-se que o programa Fundo de Financiamento Estudantil-FIES destina-se à concessão de financiamento a estudantes de cursos superiores não gratuitos, considerando sua renda familiar mensal bruta per capita, a qual, atualmente, está limitada a 03 (três) salários mínimos. Trata-se, pois, de programa que concretiza política pública voltada a promover educação – ensino superior – para a população de menor renda. Muito mais que constituir simples remuneração por serviços prestados, os créditos recebidos do FIES retribuem a oportunidade dada aos estudantes de menor renda de obter a formação de nível superior, de aumentar suas chances de inserção no mercado de trabalho formal e, por conseguinte, de melhorar a qualidade de vida da família. Como se vê, são recursos vinculados a um fim social, e, portanto, impenhoráveis. Noutro ângulo, permitir a penhora desses recursos públicos transferidos às instituições particulares de ensino poderia frustrar a adesão ao programa e, em consequência, o atingimento dos objetivos por ele traçados.

PROCESSO
REsp 1.619.868-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 24/10/2017, DJe 30/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Execução. Honorários sucumbenciais. Penhora. CPC/73. Saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. FGTS. Impossibilidade.
DESTAQUE
Não é possível a penhora do saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS para o pagamento de honorários de sucumbência.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, cumpre salientar que embora os honorários advocatícios tenham natureza alimentar, não se confundem com a prestação de alimentos, sendo esta última obrigação periódica, de caráter ético-social, lastreada no princípio da solidariedade entre os membros do mesmo grupo familiar. Apesar da distinção havida entre as verbas, esta Corte Superior, em linhas gerais, tem dado interpretação extensiva à expressão "prestação alimentícia" constante do § 2º do art. 649 do CPC/73, para englobar não somente as prestações alimentícias stricto senso, como também os honorários advocatícios. Ocorre que no caso dos autos, a hipótese não é propriamente de penhora de salários e vencimentos, mas, sim, de saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, que tem regramento próprio. De acordo com o art. 7º, III, da Constituição Federal, o FGTS é um direito de natureza trabalhista e social. Trata-se de uma poupança forçada do trabalhador, que tem suas hipóteses de levantamento elencadas na Lei n. 8.036/1990. O rol não é taxativo, tendo sido contemplados casos diretamente relacionados com a melhora da condição social do trabalhador e de seus dependentes, mais especificamente em casos de comprometimento de direito fundamental do titular do fundo. Nessa linha de entendimento, tem-se admitido a penhora de saldo do FGTS para pagamento de prestação alimentícia stricto senso, considerando que a dignidade do trabalhador está em risco, diante da possibilidade de sua prisão, assim como de seus dependentes. Destaca-se, porém, que a penhora de verbas do FGTS é medida extrema, que só se justifica para evitar a prisão do devedor de alimentos e atender as necessidades imediatas de sua prole. Dessa forma, não se justifica a liberação de valores do fundo de garantia fora das hipóteses legais para o pagamento de dívidas do trabalhador, ainda que tenham natureza alimentar em sentido amplo, como as decorrentes de honorários sucumbenciais e quaisquer outros honorários devidos a profissionais liberais.
QUARTA TURMA
PROCESSO
REsp 1.309.158-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 26/09/2017, DJe 20/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO CIVIL
TEMA
Ação indenizatória. Locação de área para estação de telefonia celular. Compartilhamento de infraestrutura. Sublocação não caracterizada. Direito de uso. Servidão administrativa instituída pela lei em benefício das prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo. Inviabilidade de indenização.
DESTAQUE
O compartilhamento de infraestrutura de estação rádio base de telefonia celular por prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo caracteriza servidão administrativa, não ensejando direito à indenização ao locador da área utilizada para instalação dos equipamentos.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A discussão reside em saber se o compartilhamento de equipamentos de telecomunicações e de uma torre visando à fixação de antenas de telefonia celular por empresas prestadoras de serviços de telecomunicações caracteriza sublocação, ensejando direito à indenização ao locador do espaço. Inicialmente cumpre salientar que o caput do art. 73 da Lei n. 9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações), dispõe que "as prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo terão direito à utilização de postes, dutos, condutos e servidões pertencentes ou controlados por prestadora de serviços de telecomunicações ou de outros serviços de interesse público, de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis". Registre-se ainda que o art. 10 da Lei n. 11.934/2009 estabelece ser obrigatório o compartilhamento de torres pelas prestadoras de serviços de telecomunicações que utilizam estações transmissoras de radiocomunicação nas situações em que o afastamento entre elas for menor do que 500 (quinhentos) metros, exceto quando houver justificado motivo técnico. Além disso, tanto a Resolução n. 274/2001 da Anatel como a Resolução Conjunta n. 1 da Anatel, Aneel e ANP, de 24/11/1999, também preveem o direito ao compartilhamento da infraestrutura entre prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo. Esta utilização compartilhada tem nítida relevância de interesse público, pois propicia que haja: a) barateamento dos custos do serviço público; b) minimização dos impactos urbanísticos, paisagísticos e ambientais; c) otimização da manutenção contínua da rede; d) condições a ensejar a cobrança de tarifas mais baixas dos consumidores; e) fomento à concorrência, expansão e melhoria da cobertura da rede. Como visto, o compartilhamento de infraestrutura é compulsório, sendo inviável atribuir a natureza jurídica de sublocação à operação. Nesse passo, tendo em vista a ideia de submissão dos direitos subjetivos ao interesse público, o direito de uso, previsto no art. 73 da Lei n. 9.472/1997, cristaliza servidão administrativa instituída pela lei em benefício das prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo, constituindo-se direito real, de natureza pública, a ser exercido sobre bem de propriedade alheia, para fins de utilidade pública, instituído com base em lei específica. Deste modo, considerando a característica de servidão administrativa do compartilhamento de infraestrutura, só haveria de cogitar-se em indenização se houvesse redução do potencial de exploração econômica do bem imóvel.

PROCESSO
REsp 1.274.639-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por maioria, julgado em 12/09/2017, DJe 23/10/2017
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Ação de prestação de contas. Bens e direitos em estado de mancomunhão (entre a separação de fato e a efetiva partilha). Patrimônio comum administrado exclusivamente por ex-cônjuge.
DESTAQUE
Após a separação de fato ou de corpos, o cônjuge que estiver na posse ou na administração do patrimônio partilhável - seja na condição de administrador provisório, seja na de inventariante - terá o dever de prestar contas ao ex-consorte.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O propósito recursal consiste em definir se há dever de prestação de contas entre ex-cônjuges em relação aos bens e direitos em estado de mancomunhão (entre a separação de fato e a efetiva partilha). É consabido que a administração do patrimônio comum do casal compete a ambos os cônjuges (artigos 1.663 e 1.720 do Código Civil). Nada obstante, a partir da separação de fato ou de corpos (marco final do regime de bens), os bens e direitos dos ex-consortes ficam em estado de mancomunhão - conforme salienta doutrina especializada -formando uma massa juridicamente indivisível, indistintamente pertencente a ambos. No tocante especificamente à relação decorrente do fim da convivência matrimonial, infere-se que, após a separação de fato ou de corpos, o cônjuge que estiver na posse ou na administração do patrimônio partilhável - seja na condição de administrador provisório, seja na de inventariante - terá o dever de prestar contas ao ex-consorte. Isso porque, uma vez cessada a afeição e a confiança entre os cônjuges, aquele titular de bens ou negócios administrados pelo outro tem o legítimo interesse ao pleno conhecimento da forma como são conduzidos, não se revelando necessária a demonstração de qualquer irregularidade, prejuízo ou crédito em detrimento do gestor. Por fim, registre-se que a Terceira Turma do STJ já se manifestou nesse sentido, conforme se depreende dos seguintes julgados: REsp 1.300.250-SP, DJe 19/4/12; REsp 1.287.579-RN, DJe 2/8/13 e REsp 1.470.906-SP, DJe 15/10/15.

terça-feira, 21 de novembro de 2017

NOVIDADE EDITORIAL. A MINHA SALA DE AULA VIRTUAL. EDIÇÕES 2018 DOS LIVROS JÁ ESTÃO EM PRÉ-VENDA


O ano de 2018 representará uma nova era para a minha coleção de Direito Civil e para o Manual de Direito Civil. Volume Único. A partir de agora, todos esses livros terão um complemento digital, uma Sala de Aula Virtual, para pleno acesso de alunos, professores e demais profissionais da área jurídica, em uma total interação entre autor e leitores.
Na nossa Sala de Aula Virtual, o leitor terá contato com complementos de atualização dos livros – novas leis que surgirem, posições doutrinárias e decisões jurisprudenciais proferidas durante o ano –, questões de provas e concursos adicionais, análises de casos concretos e desafios preparados por mim e pela Equipe do Grupo GEN Editorial.
Poderá, também, ler artigos e pareceres elaborados durante o ano e assistir a aulas explicativas sobre os conteúdos dos livros, com temas escolhidos por este autor. As aulas têm duração de dez a quinze minutos, trazendo temas importantes e atuais do Direito Privado Contemporâneo.
Teremos ainda a postagem de artigos escritos por convidados, chats e transmissões ao vivo (lives e webinars) com certa frequência, para exposição de conteúdos pontuais e atualizações e com o objetivo de tirar dúvidas dos leitores em momentos próximos a provas, em todos os níveis do ensino jurídico.
Acredito que a Sala de Aula Virtual revolucionará o mercado editorial brasileiro, servindo de paradigma para um aperfeiçoamento do ensino do Direito no Brasil.
A Sala poderá ser acessada de qualquer computador, laptop, tablet ou smartphone. Aproveitem este espaço, que é nosso.
O acesso é feito por código encontrado em qualquer versão 2018 da minha coleção de Direito Civil ou do Manual de Direito Civil. Volume Único. 
Os livros já estão em pré-venda no site do Grupo GEN (www.grupogen.com.br).
Bons estudos e boas reflexões. É o que sempre desejo.
Professor Flávio Tartuce

domingo, 19 de novembro de 2017

ENUNCIADOS SOBRE DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES APROVADOS PELOS JUÍZES DE SÃO PAULO

A Escola Paulista da Magistratura (EPM) realizou no último dia 10 de novembro de 2017 o 1º Encontro Estadual de Magistrados de Varas da Família e das Sucessões. O evento reuniu mais de 160 juízes que atuam nas varas especializadas do Estado e, na ocasião, foram aprovados 43 enunciados:
1. A transmissibilidade da obrigação alimentar (art. 1.700 CC) pressupõe seu prévio estabelecimento por acordo ou sentença judicial, antes da morte do devedor.
2. O prazo de prisão civil do devedor de alimentos variará de 1 a 3 meses (art. 528 CPC), revogado o prazo máximo de 60 dias do art. 19 da L. 5.478/69
3. Os alimentos devidos entre ex-cônjuges e ex-companheiros devem ter caráter excepcional, transitório e ser fixados por prazo determinado, exceto quando um deles não possua mais condições de reinserção no mercado do trabalho ou de readquirir autonomia financeira.
4. Com o nascimento com vida da criança, os alimentos gravídicos serão convertidos automaticamente em pensão alimentícia em favor do recém-nascido, com mudança, assim, da titularidade dos alimentos, sem que, para tanto, seja necessário pronunciamento judicial ou pedido expresso da parte, perdurando até eventual julgamento de ação revisional, exoneratória, investigatória ou negatória de paternidade.
5. É possível o aditamento da ação de alimentos gravídicos, após o nascimento da criança sem o reconhecimento espontâneo do suposto pai, para inclusão do pedido de investigação de paternidade.
6. Os alimentos pedidos pelo cônjuge ou companheiro como pagamento da parte da renda líquida dos bens comuns administrados pelo devedor, previstos no artigo 4º, parágrafo único, da Lei 5.478/68, tem natureza ressarcitória e não comportam a prisão civil do alimentante.
7. O magistrado não pode autorizar a assunção pelo alimentante da obrigação tributária incidente sobre a verba alimentar devida pelo alimentando.
8. Nas ações de alimentos e revisionais de alimentos é cabível, em princípio, o deferimento de provas para quebra do sigilo bancário de empresas em relação às quais figure como sócio o alimentante.
9. É cabível a incidência da pensão alimentícia sobre participação nos lucros e abonos auferidos pelo alimentante.
10. Os efeitos da sentença proferida em ação de revisão de alimentos – seja em caso de redução, majoração ou exoneração - retroagem à data da citação (Lei 5.478/68, art. 13, § 2º), ressalvada a irrepetibilidade dos valores quitados e a impossibilidade de compensação de eventual excesso pago com prestações futuras.
11. Sem prejuízo do protesto, no cumprimento que se processa sob pena de prisão, a execução de alimentos não comporta acréscimo da multa prevista no artigo 523 do CPC.
12. Nas execuções de alimentos que se processam pelo rito do artigo 528 do CPC, não cabe a fixação de honorários se no prazo de três dias o devedor proceder ao pagamento do débito alimentar..
13. A exigência de contas prevista no § 5º, art.1.583, do Código Civil, requer indícios de que a pensão alimentícia não está sendo utilizada, parcial ou totalmente, em benefício dos filhos.
14. No regime da comunhão parcial de bens constitui bem comum a indenização trabalhista correspondente a créditos formados na constância do casamento.
15. No regime da comunhão parcial de bens o saldo do FGTS formado na constância do casamento constitui bem comum.
16. No regime da comunhão parcial de bens o saldo de fundos de previdência privada formado na constância do casamento constitui bem comum.
17. No regime da comunhão parcial de bens não se comunicam indenizações por acidente de trabalho e por dano moral postuladas somente por um dos cônjuges ou companheiros, em razão da natureza personalíssima da reparação.
18. É possível a retificação de assento de nascimento para a averbação da alteração de sexo, com ou sem alteração do nome, independentemente da prévia realização de cirurgia de transgenitalização, desde que mediante determinação judicial em ação própria.
19. É possível a coexistência da indicação de filiações socioafetiva e biológica no registro civil de nascimento, sem identificação, no respectivo assento de nascimento, da origem ou causa da paternidade ou da maternidade.
20. A retificação do registro civil do nascimento para incluir paternidade ou maternidade biológica, quando já indicada a respectiva filiação (passando a existir dois pais e uma mãe, ou duas mães e um pai), depende de determinação judicial em ação contenciosa, sendo nessa hipótese inaplicável o Provimento nº 16, da Corregedoria Nacional de Justiça, que em seu art. 6º dispõe sobre o reconhecimento espontâneo de filho realizado pelo genitor mediante declaração, por escrito particular, feita diretamente ao Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais.
21. A coexistência de filiações socioafetiva e biológica no Registro Civil das Pessoas Naturais enseja a partilha da herança, em caso de falecimento do filho, entre todos os genitores, por cabeça.
22. Na inseminação artificial heteróloga consentida, não pode o doador do material genético pleitear a declaração da paternidade tendo como fundamento os laços biológicos. Na gestação por substituição também não se admite em favor da parturiente a declaração da maternidade em coexistência com a fornecedora do material genético.
23. Na união estável incide o regime da separação obrigatória de bens quando ao tempo de sua constituição incidir uma das hipóteses do art. 1.641 do Código Civil.
24. Na união estável os companheiros podem alterar o regime de bens a qualquer tempo e sem autorização judicial, ressalvados os efeitos que o regime anterior produziu em relação aos bens então adquiridos, e preservados os direitos de terceiros. A alteração do regime de bens para o da comunhão universal enseja a comunicação dos bens adquiridos anteriormente, ressalvadas as hipóteses de incomunicabilidade.
25. O direito real de habitação do cônjuge ou companheiro viúvo (art. 1.831 CC) se extingue em razão de novo casamento ou união estável.
26. O direito real de habitação do cônjuge ou companheiro viúvo (art. 1.831 CC) se aplica a todos os regimes de bens do casamento ou união estável.
27. O direito real de habitação do cônjuge ou companheiro viúvo (art. 1.831 CC) não se aplica quando o imóvel pertencia ao autor da herança em condomínio com terceiros.
28. A realização do inventário e da partilha por escritura pública não impede a posterior sobrepartilha em ação judicial, ou a formulação de pedido de alvará judicial de bens não partilhados, devendo na respectiva ação de sobrepartilha ou de alvará, porém, ser feita prova de todos os requisitos que forem exigíveis para o deferimento do pedido, inclusive no que tange à representação processual do viúvo, do ex-companheiro e dos herdeiros.
29. A separação e o divórcio por escritura pública não impede posterior partilha judicial de bens.
30. Na hipótese de regime de comunhão universal de bens, no casamento ou união estável, o cônjuge ou o companheiro sobreviventes concorrem com descendentes (art. 1.829, I, do Código Civil) se houver bens particulares nos casos do art. 1.668 do Código Civil, limitada a concorrência a esses bens.
31. Ante a decisão do STF no RE 878.694, declarando inconstitucional o art. 1.790 do Código Civil, assentando que, à luz da Constituição, não é cabível distinção nos regimes sucessórios derivados do casamento e da união estável, o companheiro figura em igualdade de condições com o cônjuge: 1) na ordem da vocação hereditária; 2) como herdeiro necessário; 3) como titular de direito real de habitação; 4) no direito à quarta parte da herança na concorrência com descendentes; 5) e na obrigação de trazer doações à colação (Código Civil, arts. 1.829, 1.845, 1.831, 1.832 e 2002/2003 respectivamente).
32. O direito sucessório do cônjuge sobrevivente, separado de fato até dois anos, previsto no art. 1.830 do Código Civil, cessa se, antes desse prazo de dois anos, o de cujus havia constituído união estável.
33. A partir da Emenda Constitucional 66/2010, que passou a admitir divórcio sem prazo mínimo de casamento e sem discussão de culpa, tornou-se inconstitucional a previsão do art. 1.830 do Código Civil, parte final, no sentido de que o direito sucessório do cônjuge sobrevivente poderia se estender além de dois anos da separação de fato se provado que a convivência se tornara impossível sem culpa dele. Em consequência, decorridos dois anos de separação de fato, extingue-se esse direito, sem possibilidade de prorrogação.
34. Concorrendo simultaneamente com descendentes comuns e exclusivos do de cujus, o cônjuge ou companheiro sobreviventes não têm o direito à quarta parte da herança, previsto no art. 1.832 do Código Civil. Só têm direito a essa quarta parte se todos os filhos concorrentes forem comuns, ou seja, filhos do de cujus com o cônjuge ou companheiro sobreviventes.
35. A exigência de justa causa para gravar a legítima por testamento, com inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade (Código Civil, art. 1.848) se aplica igualmente à imposição dessas cláusulas por doação, sobre o adiantamento da legítima, para manutenção da coerência do sistema e para evitar que, por doações, o autor da herança possa burlar a limitação legal.
36. A aparente antinomia entre o disposto no artigo 2.004 do Código Civil e o artigo 639, parágrafo único do CPC se resolve em favor do primeiro dispositivo, que delimita com maior precisão o patrimônio do falecido efetivamente transmitido, não se computando acessões ou benfeitorias depois introduzidas, nem valorizações ou desvalorizações subsequentes à liberalidade.
37. Ao contrário do artigo 1031, § 2º, do CPC de 1973, o artigo 659, § 2º, do CPC em vigor não mais estabelece a concordância da Fazenda quanto à suficiência dos tributos como condição à expedição de alvarás e formais de partilha nos arrolamentos. Transitada em julgado a sentença, o juízo se limita a dar ciência à Fazenda da existência do procedimento sucessório, expedindo em seguida os alvarás e formais de partilha.
38. Não é obrigatória a realização de avaliação biopsicossocial por equipe multidisciplinar nos pedidos de curatela, quando a perícia mostra-se suficiente para avaliar o grau de deficiência do curatelado.
39. No curso do processo de interdição não pode o juiz de oficio ou a requerimento do Ministério Público, converter o pedido em tomada de decisão apoiada, prevista no artigo 1.783-A do Código Civil.
40. Na fixação da guarda compartilhada deve ser estipulado o local do domicílio do menor ou incapaz e regime de convivência.
41. A guarda compartilhada não exime o pagamento de alimentos aos filhos.
42. A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso da impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais.
43. No casamento do menor com suprimento judicial é possível determinar o regime da comunhão parcial, se a imposição do regime da separação obrigatória lhe for prejudicial.
Fonte: Comunicação Social TJSP – MA (texto) / LS (arte)