sábado, 31 de outubro de 2009
LANÇAMENTO. VOLUME 4. 2a. Edição.
Prezados Amigos e Amigas,
Acaba de ser lançada, pela Editora GEN/Método, a 2a. Edição do Volume 4 da coleção de Direito Civil (2010).
A obra é escrita em co-autoria com José Fernando Simão, professor da Universidade de São Paulo (USP).
O trabalho foi revisto e ampliado, com inclusão de recentes julgados - inclusive deste ano de 2009 -, de novas visões doutrinárias e questões de provas.
Relembro que este é o volume que traz comentários sobre o julgado da favela Pullman, do TJSP e do STJ.
Bons estudos!!!
Abraços,
Professor Flávio Tartuce
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
NOVAS SÚMULAS DO STJ. DIREITO PRIVADO.
Súmula 402: "O contrato de seguro por danos pessoais compreende Danos Morais, salvo cláusula expressa de exclusão".
Súmula 404: "É dispensável o Aviso de Recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros".
Súmula 405: "uma ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) prescreve em três anos".
Súmula 404: "É dispensável o Aviso de Recebimento (AR) na carta de comunicação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos de dados e cadastros".
Súmula 405: "uma ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) prescreve em três anos".
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
RESUMO INFORMATIVO 412 DO STJ.
SÚM. N. 84-STJ. POSSE INDIRETA.
Os recorrentes celebraram compromisso de compra e venda de imóvel que ainda estava financiado e hipotecado. Pagaram, então, o ágio e se comprometeram a continuar a quitar as prestações restantes. Contudo, havia cláusula, no pacto, que permitia aos promitentes vendedores continuar residindo no imóvel por mais dois anos. Sucede que, após a celebração do compromisso e antes que fosse levado ao registro, a recorrida obteve a constrição do imóvel mediante penhora em processo de execução referente à locação afiançada pelos promitentes vendedores. Nesse contexto, é necessário definir se os promitentes compradores podem manejar embargos de terceiro, nos termos da Súm. n. 84-STJ. Anote-se que o Tribunal a quo reconheceu haver posse indireta dos recorrentes, o que faz pressupor uma transmissão ficta da posse mediante uma espécie de constituto possessório, o que não pode ser afastado sem reexame de prova ou cláusulas contratuais (Súmulas ns. 5 e 7 do STJ). Todavia, há inúmeros julgados deste Superior Tribunal que concluem ser possível o oferecimento de embargos de terceiro com base em posse indireta, tal como alguns precedentes que lastreiam a própria Súm. n. 84-STJ. Por sua vez, o art. 1.046 do CPC não exclui a possibilidade de ajuizamento dos embargos de terceiro na hipótese. Assim, conclui-se admissível a oposição dos embargos de terceiros sob alegação de posse indireta referente a compromisso de compra e venda sem registro. Mostra-se inadequado acolher uma interpretação mais restritiva do texto da citada súmula com o fim de resguardar-se de eventual má-fé, visto que ela pode ser adequadamente combatida pelo Poder Judiciário. Precedentes citados: REsp 573-SP, DJ 6/8/1990; REsp 421.996-SP, DJ 24/2/2003; REsp 68.097-SP, DJ 11/9/2000, e REsp 64.746-RJ, DJ 27/11/1995. REsp 908.137-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2009.
PURGAÇÃO. MORA. DIREITO MATERIAL.
O devedor requereu a purgação da mora ainda sob a égide da redação original do art. 3º do DL n. 911/1969, que previa o depósito das parcelas vencidas, conforme cálculo judicial, como requisito para a purgação. Porém, o juízo só apreciou esse pedido quando já alterado, substancialmente, o referido DL pela Lei n. 10.931/2004, que determina o depósito do total da dívida (parcelas vencidas e vincendas) para aquele mesmo efeito. Contudo, não se pode aplicar a nova lei ao caso, pois a purgação da mora tem conteúdo de direito material, e não processual, o que atrai a aplicação do princípio da irretroatividade (art. 6º e parágrafos da LICC e art. 5º, XXXVI, da CF/1988). Exercido o direito à purgação, a vigência do contrato é restabelecida e o credor perde a faculdade de promover sua rescisão pelo inadimplemento. Dessarte, a questionada norma incide no plano de eficácia do contrato, pois a prévia existência de ação de busca e apreensão apenas compõe o suporte fático para a incidência da norma, não lhe alterando a natureza de direito material. Anote-se caber ao juiz apenas reconhecer o direito potestativo exercido, pois não está em suas mãos nem nas do credor impedir a purgação formulada nos termos da lei. Daí a conclusão de que todas as condições para a materialização desse direito verificam-se no momento em que formulado o pedido pelo devedor. REsp 904.752-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2009.
FUNDHAB. LEGALIDADE.
A Turma proveu o recurso da CEF, entendendo que é de responsabilidade do vendedor do imóvel o pagamento do valor referente ao Fundo de Assistência Habitacional (FUNDHAB), conforme pactuado. Precedentes citados: REsp 82.532-SP, DJ 13/5/1996; REsp 854.654-SP, DJ 22/10/2007, e REsp 183.428-SP, DJ 1º/4/2002. REsp 617.830-AM, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/10/2009.
FRAUDE. CREDORES. PENHORA. VENDA. IMÓVEL.
A Turma proveu em parte o recurso, entendendo serem procedentes os embargos de terceiro para determinar o cancelamento da penhora incidente sobre imóvel, por inexistir prova de qualquer constrição judicial (ação de alimentos) à época de sua venda, em cartório de registro imobiliário, com a consequente averbação da decisão, o que tornaria ineficaz a alienação. No caso, conquanto pendente a execução de alimentos (CPC, art. 792), ainda assim era insuficiente para reduzir o recorrido à insolvência, não se podendo concluir que os adquirentes tivessem ciência inequívoca de sua existência, a ponto de configurar a fraude contra credores, tal como pretendido, mormente pelo fato de que os imóveis não haviam sido penhorados quando da alienação. Precedentes citados: REsp 442.583-MS, DJ 16/2/2004; AgRg no AgRg no Ag 1.094.919-SP, DJe 17/2/2009; REsp 625.235-RN, DJ 25/10/2004, e REsp 1.015.459-SP, DJe 29/5/2009. REsp 1.112.143-RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 20/10/2009
PROVA. ÔNUS. INVERSÃO. PÍLULAS DE FARINHA.
A Turma proveu em parte o recurso, entendendo que, no mérito, quanto às exceções à regra geral acerca da inversão do ônus da prova (art. 333 do CPC), em se tratando de relações consumeristas, o art. 6º, VIII, do CDC não tem aplicação ope legis, mas ope iudicis, a saber, cabe ao juiz redistribuir a carga probatória conforme o caso concreto, pois não basta que a relação seja regida pelo CDC, é indispensável a verossimilhança das alegações do consumidor ou sua hipossuficiência. Doutrinariamente, é cabível tal inversão do ônus da prova para facilitar sua produção por quem detém melhores condições, diante da possibilidade de o réu produzir menos penosamente eventual prova desconstitutiva do direito do autor. Questionou-se se essa inversão realizada pelo Tribunal a quo, efetivamente, facilitou a elucidação dos fatos narrados pela consumidora, ou se, pela impossibilidade de sua comprovação, somente cabível por presunção, como no caso, significou a automática procedência do pedido. Entretanto, dada a controvertida gravidez da autora por ineficiência do uso das chamadas “pílulas de farinha” como anticoncepcional sem o princípio ativo, não é possível a pretendida inversão do ônus da prova, mormente em apelação, já que abrange somente os fatos narrados na inicial, sem o nexo de causalidade entre os fatos e o dano sofrido. Daí descabe atribuir à recorrente, por presunção e sem a devida comprovação, a responsabilidade por toda gravidez das usuárias de seus medicamentos, ainda que eficazes, sendo inafastável a improcedência do pedido. Precedentes citados: REsp 716.386-SP, DJe 15/9/2008; REsp 707.451-SP, DJ 11/12/2006; REsp 883.612-ES, DJe 21/9/2009; AgRg no REsp 1.095.663-RJ, DJe 17/8/2009, e REsp 881.651-BA, DJ 21/5/2007. REsp 720.930-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/10/2009.
ACP. LOCAÇÃO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ILEGITIMIDADE. MP.
Trata-se de REsp em que o recorrente, MP estadual, pretende a nulidade de cláusulas abusivas constantes de contratos de locação realizados com uma única administradora do ramo imobiliário. Sustenta que o art. 82, I, do CDC, os arts. 1º, II e IV, e 5° da Lei n. 7.347/1985 o legitimam a promover a ação civil pública (ACP), tal como feito na hipótese em questão. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, reafirmou o entendimento de não ser possível o ajuizamento de ACP para postular direito individual que, apesar de indisponível, seja destituído do requisito da homogeneidade, indicativo da dimensão coletiva que deve caracterizar os interesses tutelados por meio de tais ações. Outrossim, segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, o CDC não é aplicável aos contratos locatícios, os quais são regulados por legislação própria. Assim, resta claro que o MP estadual não tem legitimidade para propor ACP nesse caso. Para os votos vencidos, contudo, não há inconveniência na propositura da ACP pelo MP estadual nessa hipótese, visto que se trata de uma ação visando alcançar ao mesmo tempo a pluralidade de locatários potencialmente vítimas de exploração. Ressaltou-se que as grandes administradoras têm uma carteira enorme de clientes, o contrato, em geral, é padronizado, basicamente, um contrato de adesão. Portanto, a ACP teria a utilidade de possibilitar o exame em uma única ação para dar lisura ou não às cláusulas postas no contrato. Precedentes citados: REsp 984.430-RS, DJ 22/11/2007; REsp 294.759-RJ, DJe 9/12/2008; AgRg no Ag 590.802-RS, DJ 14/8/2006; REsp 442.822-RS, DJ 13/10/2003; REsp 893.218-RS, DJe 9/12/2008, e AgRg no Ag 660.449-MG, DJ 25/2/2008. REsp 605.295-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/10/2009
Os recorrentes celebraram compromisso de compra e venda de imóvel que ainda estava financiado e hipotecado. Pagaram, então, o ágio e se comprometeram a continuar a quitar as prestações restantes. Contudo, havia cláusula, no pacto, que permitia aos promitentes vendedores continuar residindo no imóvel por mais dois anos. Sucede que, após a celebração do compromisso e antes que fosse levado ao registro, a recorrida obteve a constrição do imóvel mediante penhora em processo de execução referente à locação afiançada pelos promitentes vendedores. Nesse contexto, é necessário definir se os promitentes compradores podem manejar embargos de terceiro, nos termos da Súm. n. 84-STJ. Anote-se que o Tribunal a quo reconheceu haver posse indireta dos recorrentes, o que faz pressupor uma transmissão ficta da posse mediante uma espécie de constituto possessório, o que não pode ser afastado sem reexame de prova ou cláusulas contratuais (Súmulas ns. 5 e 7 do STJ). Todavia, há inúmeros julgados deste Superior Tribunal que concluem ser possível o oferecimento de embargos de terceiro com base em posse indireta, tal como alguns precedentes que lastreiam a própria Súm. n. 84-STJ. Por sua vez, o art. 1.046 do CPC não exclui a possibilidade de ajuizamento dos embargos de terceiro na hipótese. Assim, conclui-se admissível a oposição dos embargos de terceiros sob alegação de posse indireta referente a compromisso de compra e venda sem registro. Mostra-se inadequado acolher uma interpretação mais restritiva do texto da citada súmula com o fim de resguardar-se de eventual má-fé, visto que ela pode ser adequadamente combatida pelo Poder Judiciário. Precedentes citados: REsp 573-SP, DJ 6/8/1990; REsp 421.996-SP, DJ 24/2/2003; REsp 68.097-SP, DJ 11/9/2000, e REsp 64.746-RJ, DJ 27/11/1995. REsp 908.137-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2009.
PURGAÇÃO. MORA. DIREITO MATERIAL.
O devedor requereu a purgação da mora ainda sob a égide da redação original do art. 3º do DL n. 911/1969, que previa o depósito das parcelas vencidas, conforme cálculo judicial, como requisito para a purgação. Porém, o juízo só apreciou esse pedido quando já alterado, substancialmente, o referido DL pela Lei n. 10.931/2004, que determina o depósito do total da dívida (parcelas vencidas e vincendas) para aquele mesmo efeito. Contudo, não se pode aplicar a nova lei ao caso, pois a purgação da mora tem conteúdo de direito material, e não processual, o que atrai a aplicação do princípio da irretroatividade (art. 6º e parágrafos da LICC e art. 5º, XXXVI, da CF/1988). Exercido o direito à purgação, a vigência do contrato é restabelecida e o credor perde a faculdade de promover sua rescisão pelo inadimplemento. Dessarte, a questionada norma incide no plano de eficácia do contrato, pois a prévia existência de ação de busca e apreensão apenas compõe o suporte fático para a incidência da norma, não lhe alterando a natureza de direito material. Anote-se caber ao juiz apenas reconhecer o direito potestativo exercido, pois não está em suas mãos nem nas do credor impedir a purgação formulada nos termos da lei. Daí a conclusão de que todas as condições para a materialização desse direito verificam-se no momento em que formulado o pedido pelo devedor. REsp 904.752-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/10/2009.
FUNDHAB. LEGALIDADE.
A Turma proveu o recurso da CEF, entendendo que é de responsabilidade do vendedor do imóvel o pagamento do valor referente ao Fundo de Assistência Habitacional (FUNDHAB), conforme pactuado. Precedentes citados: REsp 82.532-SP, DJ 13/5/1996; REsp 854.654-SP, DJ 22/10/2007, e REsp 183.428-SP, DJ 1º/4/2002. REsp 617.830-AM, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/10/2009.
FRAUDE. CREDORES. PENHORA. VENDA. IMÓVEL.
A Turma proveu em parte o recurso, entendendo serem procedentes os embargos de terceiro para determinar o cancelamento da penhora incidente sobre imóvel, por inexistir prova de qualquer constrição judicial (ação de alimentos) à época de sua venda, em cartório de registro imobiliário, com a consequente averbação da decisão, o que tornaria ineficaz a alienação. No caso, conquanto pendente a execução de alimentos (CPC, art. 792), ainda assim era insuficiente para reduzir o recorrido à insolvência, não se podendo concluir que os adquirentes tivessem ciência inequívoca de sua existência, a ponto de configurar a fraude contra credores, tal como pretendido, mormente pelo fato de que os imóveis não haviam sido penhorados quando da alienação. Precedentes citados: REsp 442.583-MS, DJ 16/2/2004; AgRg no AgRg no Ag 1.094.919-SP, DJe 17/2/2009; REsp 625.235-RN, DJ 25/10/2004, e REsp 1.015.459-SP, DJe 29/5/2009. REsp 1.112.143-RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 20/10/2009
PROVA. ÔNUS. INVERSÃO. PÍLULAS DE FARINHA.
A Turma proveu em parte o recurso, entendendo que, no mérito, quanto às exceções à regra geral acerca da inversão do ônus da prova (art. 333 do CPC), em se tratando de relações consumeristas, o art. 6º, VIII, do CDC não tem aplicação ope legis, mas ope iudicis, a saber, cabe ao juiz redistribuir a carga probatória conforme o caso concreto, pois não basta que a relação seja regida pelo CDC, é indispensável a verossimilhança das alegações do consumidor ou sua hipossuficiência. Doutrinariamente, é cabível tal inversão do ônus da prova para facilitar sua produção por quem detém melhores condições, diante da possibilidade de o réu produzir menos penosamente eventual prova desconstitutiva do direito do autor. Questionou-se se essa inversão realizada pelo Tribunal a quo, efetivamente, facilitou a elucidação dos fatos narrados pela consumidora, ou se, pela impossibilidade de sua comprovação, somente cabível por presunção, como no caso, significou a automática procedência do pedido. Entretanto, dada a controvertida gravidez da autora por ineficiência do uso das chamadas “pílulas de farinha” como anticoncepcional sem o princípio ativo, não é possível a pretendida inversão do ônus da prova, mormente em apelação, já que abrange somente os fatos narrados na inicial, sem o nexo de causalidade entre os fatos e o dano sofrido. Daí descabe atribuir à recorrente, por presunção e sem a devida comprovação, a responsabilidade por toda gravidez das usuárias de seus medicamentos, ainda que eficazes, sendo inafastável a improcedência do pedido. Precedentes citados: REsp 716.386-SP, DJe 15/9/2008; REsp 707.451-SP, DJ 11/12/2006; REsp 883.612-ES, DJe 21/9/2009; AgRg no REsp 1.095.663-RJ, DJe 17/8/2009, e REsp 881.651-BA, DJ 21/5/2007. REsp 720.930-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/10/2009.
ACP. LOCAÇÃO. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ILEGITIMIDADE. MP.
Trata-se de REsp em que o recorrente, MP estadual, pretende a nulidade de cláusulas abusivas constantes de contratos de locação realizados com uma única administradora do ramo imobiliário. Sustenta que o art. 82, I, do CDC, os arts. 1º, II e IV, e 5° da Lei n. 7.347/1985 o legitimam a promover a ação civil pública (ACP), tal como feito na hipótese em questão. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, reafirmou o entendimento de não ser possível o ajuizamento de ACP para postular direito individual que, apesar de indisponível, seja destituído do requisito da homogeneidade, indicativo da dimensão coletiva que deve caracterizar os interesses tutelados por meio de tais ações. Outrossim, segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, o CDC não é aplicável aos contratos locatícios, os quais são regulados por legislação própria. Assim, resta claro que o MP estadual não tem legitimidade para propor ACP nesse caso. Para os votos vencidos, contudo, não há inconveniência na propositura da ACP pelo MP estadual nessa hipótese, visto que se trata de uma ação visando alcançar ao mesmo tempo a pluralidade de locatários potencialmente vítimas de exploração. Ressaltou-se que as grandes administradoras têm uma carteira enorme de clientes, o contrato, em geral, é padronizado, basicamente, um contrato de adesão. Portanto, a ACP teria a utilidade de possibilitar o exame em uma única ação para dar lisura ou não às cláusulas postas no contrato. Precedentes citados: REsp 984.430-RS, DJ 22/11/2007; REsp 294.759-RJ, DJe 9/12/2008; AgRg no Ag 590.802-RS, DJ 14/8/2006; REsp 442.822-RS, DJ 13/10/2003; REsp 893.218-RS, DJe 9/12/2008, e AgRg no Ag 660.449-MG, DJ 25/2/2008. REsp 605.295-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/10/2009
terça-feira, 27 de outubro de 2009
VII CONGRESSO BRASILEIRO DO IBDFAM. BELO HORIZONTE. DIA 28 A 31 DE OUTUBRO DE 2009.
Prezados Amigos e Amigas,
Começa amanhã o VII Congresso Brasileiro de Direito de Família do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), o maior evento de Direito Privado do País. O tema central do grandioso evento é Família e Responsabilidade.
Participarei de painel no dia 30 de outubro, tratando sobre "A responsabilidade civil por bullyng", às 11.25h (Sala 2 dos Espaços Paralelos).
Fiquei muito feliz também pela participação da irmã Fernanda Tartuce, no minicurso sobre mediação, no dia 31 de outubro, junto com as Professoras Aguida Arruda Barbosa e Giselle Câmara Groeninga.
A programação completa está no site http://www.ibdfam.org.br/congresso/index.asp?p=programacao.
Até lá.
Abraços a todos,
Professor Flávio Tartuce
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
RESUMO. INFORMATIVO 411 DO STJ.
LOCAÇÃO. RESTITUIÇÃO. IMÓVEL.
A embargante sustenta a existência de obscuridades em relação às premissas fáticas adotadas no acórdão embargado, na medida em que seriam incontroversos os seguintes fatos: existência de notificação escrita denunciando o contrato de locação com antecedência de trinta dias; existência de bens móveis no interior do imóvel locado; recusa do locador de receber as chaves; depósito das chaves em juízo e ciência inequívoca, pelo locador, do depósito das chaves. Destacou o Min. Relator que, na hipótese, ficou decidido, nas instâncias de origem, que, em nenhum momento, foi caracterizada a efetiva desocupação do imóvel pela autora, diante da ausência do restabelecimento do poder de uso e gozo do bem por suas proprietárias, em face da existência de vários móveis da locatária no interior do imóvel. O Tribunal de origem entendeu que o imóvel locado não foi efetivamente restituído às rés. Para que se adotasse neste Superior Tribunal a tese defendida pela autora de que o imóvel foi efetivamente desocupado e que a recusa das rés de receber as chaves seria injusta, seria necessário o reexame da situação fática definida nas instâncias originárias, o que é inviável em sede de recurso especial (Súm. n. 7-STJ). Assim, não resta configurada a hipótese do art. 485, V, do CPC, na medida em que o acórdão rescindendo, diante das particularidades do caso concreto, deu à controvérsia solução condizente com a regra do art. 6º da Lei n. 8.245/1991 (Lei do Inquilinato). No que tange às questões relativas à tese de abandono dos bens no interior do imóvel locado e à eficácia da denúncia da locação, o acórdão embargado limitou-se a afirmar que não seriam elas conhecidas em sede de rescisória, uma vez que não foram conhecidas no recurso especial cujo acórdão pretende-se rescindir. Resumindo-se a irresignação da embargante em mero inconformismo com o resultado do julgado desfavorável à sua pretensão, não há nenhum fundamento que justifique a interposição de embargos de declaração. Diante disso, a Seção, por maioria rejeitou-os. EDcl na AR 3.720-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgados em 14/10/2009.
REINTEGRAÇÃO. POSSE. TERRAS PÚBLICAS. Noticiam os autos que foram adquiridas terras públicas por instrumento de mandato outorgado por particular (mera detenção de posse); porém, durante o inventário decorrente da morte do adquirente, o imóvel sofreu apossamento, esbulho e grilagem por parte de terceiro. Então, houve o ajuizamento de cautelar de sequestro julgada procedente e, nos autos da cautelar, o autor (o espólio) pretendeu a expedição de mandado de desocupação, o qual foi indeferido ao argumento de que deveria ser ajuizado processo apropriado para tanto. Daí a ação de reintegração de posse interposta pelo espólio, em que a sentença extinguiu o processo sem resolução de mérito, sob o fundamento de que não cabe ao Judiciário decidir lide entre particulares que envolvam questões possessórias de ocupação de imóvel público, entretanto o Tribunal a quo deu provimento à apelação do recorrido (espólio), afirmando ser possível o ajuizamento da ação possessória. Isso posto, o REsp do MPDF tem por objetivo saber se é possível ao particular que ocupa terra pública utilizar-se de ação de reintegração de posse para reaver a coisa esbulhada por outro particular. Ressaltou a Min. Relatora que o tema ainda não foi apreciado neste Superior Tribunal, que só enfrentou discussões relativas à proteção possessória de particular perante o Poder Público – casos em que adotou o entendimento de que, em tais situações, a ocupação de bem público não passa de mera detenção, sendo, por isso, incabível invocar proteção possessória contra o órgão público. Observou que o espólio recorrido não demonstrou, na inicial, nenhum dos fundamentos que autorizam o pedido de proteção possessória e, sendo público o imóvel, nada mais é que mero detentor. Nesse contexto, concluiu haver impossibilidade de caracterização da posse por se tratar de imóvel público, pois não há título que legitime o direito do particular sobre esse imóvel. Assim, a utilização do bem público pelo particular só se considera legítima mediante ato ou contrato administrativo constituído a partir de rigorosa observância dos mandamentos legais para essa finalidade. Ademais, explica que o rito das possessórias previsto nos arts. 926 e seguintes do CPC exige que a posse seja provada de plano para que a ação tenha seguimento. Por essa razão, a Turma extinguiu o processo sem resolução de mérito, pela inadequação da ação proposta com fundamento no art. 267, IV, do CPC. Destacou-se, ainda, que o Judiciário poderá apreciar esse conflito por meio de outro rito que não o especial e nobre das possessórias. REsp 998.409-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/10/2009.
NEGATÓRIA. PATERNIDADE. VÍNCULO SOCIO-AFETIVO.
A ausência de vínculo biológico (afastado por exame de DNA) não teve o condão de desconstituir a filiação, pois foi reconhecido juridicamente que se estabeleceu o vínculo socio-afetivo entre pai e filho, porquanto, só após 22 anos do nascimento do filho, o pai propôs ação negatória de paternidade combinada com retificação de registro civil. Com esse entendimento, a Turma negou provimento ao REsp do pai. Apontou o Min. Relator que, nas instâncias ordinárias, ao contrário do sustentado no REsp, ficou inconteste não haver adoção à moda brasileira, pois o recorrente, ao proceder ao registro da paternidade, não tinha conhecimento da inexistência de vínculo biológico e, apesar da alegação de dúvidas, portou-se como pai, estabelecendo vínculo de afetividade. Explicou que a paternidade fundada no vínculo socio-afetivo não é construção doutrinária nem jurisprudencial, mas encontra proteção no § 6º do art. 227 da CF/1988, que veda diferenciação entre filhos havidos ou não de relação de casamento, e no art. 1.595 do CC/2002, que reconhece o parentesco civil resultante de origem não consanguínea. Observou que o reconhecimento espontâneo da paternidade somente pode ser desfeito se demonstrado o vício de consentimento ou falsidade do registrado, conforme disposto no art. 1.604 do CC/2002. Esclareceu que, por erro de conhecimento, deve-se compreender a falsa representação da realidade ou idéia falsa da realidade, tal como apregoado na doutrina. Ademais, no contexto dos autos, não se denota emprego de diligência apta a configurar o alegado erro substancial escusável. Anotou ainda que o erro essencial apto a anular a filiação assentada no registro civil deve estar evidenciado nos autos de forma clara e robusta, o que não se verificou no caso. Precedentes citados: REsp 932.692-DF, DJe 12/2/2009, e REsp 1.022.793-RS, DJe 3/2/2009. REsp 1.078.285-MS, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 13/10/2009.
ACIDENTE AÉREO. DANOS MORAIS. HONORÁRIOS.
Discute-se, no recurso especial interposto pelos pais e irmão de vítima de acidente aéreo (jovem de 21 anos), o valor do dano moral e pensão mensal, bem como, no recurso especial da companhia aérea, a exatidão das verbas honorárias. Segundo ressaltou a Min. Relatora, a jurisprudência consolidou-se no sentido de que o responsável pela morte de filho trabalhador deve aos familiares da vítima pensão alimentícia mensal fixada em 2/3 da sua remuneração até a idade de 25 anos, depois reduzida à metade, pois se presume que o filho constituiria família, o que diminuiria sua contribuição aos pais. Quanto ao pedido da inclusão de valores referentes ao FGTS e às férias na base de cálculo da pensão alimentícia, o dissídio só foi demonstrado quanto às férias, assim, só foi conhecida e concedida a inclusão das férias, com base na jurisprudência assentada pelas Turmas da Segunda Seção deste Superior Tribunal. Por último, quanto à fixação dos danos morais, observou ser ela uma das mais complexas tarefas a cargo do Judiciário pela falta de critérios e pelas peculiaridades de cada caso. Dessarte, fixou-os em R$ 190 mil para cada um dos três autores. Apontou que a sucumbência recíproca foi afastada devido ao fato de os autores decaírem em parte mínima, só em relação à indenização de tratamento psicológico e aos danos relativos ao sepultamento da vítima, que são ínfimos se comparados à pretensão julgada procedente, como a pensão e os danos morais. Outrossim, para o cálculo dos honorários advocatícios, quando há a necessidade de pensionamento, devem ser limitados, sendo fixados, no caso, em 10% sobre o somatório dos valores das prestações vencidas mais um ano das vincendas, afastada a multa do art. 538 do CPC. Com esse entendimento, a Turma deu parcial provimento ao recurso dos autores e ao da companhia aérea. Precedentes citados: REsp 713.764-RS, DJe 10/3/2008; REsp 361.814-MG, DJ 24/6/2002 ; REsp 193.296-RJ, DJ 10/4/2000; AgRg no Ag 429.155-RJ, DJ 24/10/2005; AgRg no REsp 1.109.961-MS, DJe 10/9/2009, e AgRg no Ag 727.915-SP, DJ 26/6/2006. REsp 1.137.708-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/10/2009.
PLANO. SAÚDE. COBERTURA. GASTROPLASTIA REDUTORA.
A recorrente autora, na inicial, afirma que, em 1992, aderiu a plano de saúde, mantendo as mensalidades em dia. Em 2005, já portadora de obesidade mórbida, que colocaria em risco sua vida, recebeu indicação médica para se submeter a uma gastroplastia redutora, conhecida popularmente como cirurgia para redução de estômago. As instâncias ordinárias reconheceram, ao menos implicitamente, que o contrato previa a cobertura para a moléstia. O tratamento a ser aplicado, nessas condições, deve ser sempre o mais recomendado, nisso residindo o fundamento para que a cláusula contratual em questão, conquanto genérica, englobe a específica modalidade de tratamento referida acima. Quanto ao dano moral, esse é devido, pois evidente o sofrimento daquele que vê negada a cobertura médica em momento delicado de necessidade. Assim, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, conheceu do recurso e deu provimento a ele, por entender que o plano de saúde deve proporcionar ao consumidor o tratamento mais moderno e adequado em substituição ao procedimento obsoleto previsto especificamente no contrato. Precedentes citados: REsp 311.509-SP, DJ 25/6/2001; REsp 668.216-SP, DJ 2/4/2007 e, REsp 519.940-SP, DJ 1º/9/2003. REsp 1.106.789-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2009.
ALTERAÇÃO. PRENOME. DESIGNATIVO. SEXO.
O recorrente autor, na inicial, pretende alterar o assento do seu registro de nascimento civil, para mudar seu prenome, bem como modificar o designativo de seu sexo, atualmente constante como masculino, para feminino, aduzindo como causa de pedir o fato de ser transexual, tendo realizado cirurgia de transgenitalização. Acrescenta que a aparência de mulher, por contrastar com o nome e o registro de homem, causa-lhe diversos transtornos e dissabores sociais, além de abalos emocionais e existenciais. Assim, a Turma entendeu que, tendo o recorrente se submetido à cirurgia de redesignação sexual nos termos do acórdão recorrido, existindo, portanto, motivo apto a ensejar a alteração do sexo indicado no registro civil, a fim de que os assentos sejam capazes de cumprir sua verdadeira função, qual seja, a de dar publicidade aos fatos relevantes da vida social do indivíduo, deve ser alterado seu assento de nascimento para que nele conste o sexo feminino, pelo qual é socialmente reconhecido. Determinou, ainda, que das certidões do registro público competente não conste que a referida alteração é oriunda de decisão judicial, tampouco que ocorreu por motivo de redesignação sexual de transexual. REsp 1.008.398-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2009
RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA. IMÓVEL.
Trata-se, originariamente, de ação de rescisão contratual de promessa de compra e venda de imóvel em desfavor da ora recorrente, objetivando, além da desconstituição do negócio, a devolução de todas as parcelas pagas acrescidas de juros e multa, atualizadas monetariamente, bem como as perdas e danos. Sustenta a recorrente ofensa ao art. 1.092 do CC/1916, porquanto, havendo os compradores suspendido o pagamento das parcelas do preço antes do ajuizamento da ação, não poderiam exigir da construtora o adimplemento obrigacional, visto que também descumpriram o contrato. Para o Min. Relator, conforme o acórdão recorrido, ficou patenteado, no exame realizado pelas instâncias ordinárias, que efetivamente o atraso que já se configurava era claro em revelar a inadimplência da construtora, de sorte que o agir dos autores, ora recorridos, na cessação do pagamento era medida defensiva, para evitar prejuízo maior, até porque a suspensão deu-se não antes da paralisação das obras, mas sim quando do retardado reinício dessas, cinco meses além do fim do prazo que a própria construtora previra para o prosseguimento. Correto, pois, o referido acórdão quando concluiu que, então, os autores achavam-se ao abrigo da exceção de contrato não cumprido. Diante disso, a Turma não conheceu do recurso. REsp 593.471-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 13/10/2009.
UNIÃO ESTÁVEL. BEM IMÓVEL. PARTILHA.
In casu, cinge-se a questão em saber se o imóvel adquirido primeiro pelo varão na constância da união estável e depois, ainda dentro do mesmo período de vida em comum, alienado por ele à autora (sua convivente) é bem sujeito à partilha. A Turma entendeu que, no caso, o imóvel objeto do contrato de compra e venda entre os companheiros está excluído da partilha. Ao concluir o negócio jurídico anterior à dissolução da união estável, o qual impunha obrigações sinalagmáticas para ambas as partes, o companheiro obteve vantagem econômica, o preço total do imóvel, não sendo razoável que agora, por meio de partilha, receba 50% do valor deste, que, no exercício de sua autonomia privada, já vendera à companheira. A alienação, por si só, é ato contrário, incompatível com a postulação de partilha. O contrato de compra e venda, em verdade, resulta em reserva do bem em favor da companheira, tornando-o incomunicável, portanto não sujeito à partilha. REsp 738.464-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/10/2009.
INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO INDEVIDA. CHARGE.
Trata-se de saber se são aplicáveis no caso discutido os parâmetros de fixação de indenização por violação dos direitos patrimoniais do autor previstos no art. 122, parágrafo único, da Lei n. 5.988/1973, cuja redação foi mantida pelo art. 103, parágrafo único, da Lei n. 9.610/1998, alterando-se somente o número de exemplares a serem indenizados. Na hipótese, as obras publicadas indevidamente são charges que integram apenas uma pequena parte do periódico, jornal composto por matérias de imprensa, artigos, fotografias e demais obras de autoria de inúmeras pessoas. Diante disso, a Turma entendeu não ser razoável, tampouco proporcional admitir-se que, na espécie, a indenização de parte seja feita pelo valor do todo, pois isso implicaria enriquecimento ilícito do autor da obra de arte. A indenização por danos materiais provocados pela violação dos direitos autorais tem por objetivo ressarcir o autor na medida exata do valor patrimonial que seria auferido, caso as obras fossem publicadas em conformidade com a lei e com os interesses do autor. Logo, a recomposição patrimonial do artista não pode ser utilizada como meio de abuso, como enriquecimento ilícito da parte. Assim, resta afastada a aplicação do art. 122, parágrafo único, da Lei n. 5.988/1973 a esse caso. Por outro lado, são razoáveis os critérios adotados pelo Tribunal de origem consistentes no pagamento do valor correspondente à metade do salário que o autor recebia da empresa pela qual era contratado referente aos meses em que publicadas, indevidamente, as obras, somado ao 13° salário proporcional, pois refletem os valores reais que teriam sido percebidos pelo autor caso tivesse contratado a publicação com o recorrido, recompondo, devidamente, as perdas havidas. Quanto à alegada violação do art. 126 da Lei n. 5.988/1973, entendeu-se ter razão o recorrente. A jurisprudência deste Superior Tribunal é firme no sentido de que o valor definido pela Corte de origem somente pode ser alterado em sede de recurso especial quando absurdamente excessivo ou irrisório, o que se verificou nos autos. Assim, diante da jurisprudência acima citada e tendo em vista as circunstâncias do caso, no qual o direito do autor foi violado durante um longo período de tempo, por meio da publicação de inúmeras charges sem a indicação da autoria, determinou-se a majoração do quantum indenizatório para R$ 10 mil, acrescidos de correção monetária a partir da data do julgamento (Súmula n. 362-STJ) e juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula n. 54-STJ). Destarte, tendo em vista que o ato ilícito deu-se no lapso temporal de janeiro de 1993 a maio de 1996, os juros moratórios devem ser calculados a partir de setembro de 1994, data intermediária entre a primeira e a última lesão, desconsiderado o período atingido pela prescrição. REsp 735.019-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/10/2009.
AÇÃO POPULAR. ANULAÇÃO. TESTAMENTO.
O recorrente afirma que o testamento é fruto de fraude perpetrada pelos réus e, diante da inexistência de herdeiros legítimos, a valiosa herança (cerca de sessenta imóveis) ter-se-ia por jacente, devolvendo-se o acervo hereditário à respectiva municipalidade. A questão refere-se ao cabimento de ação popular no caso em que se pretende anular testamento por suposto vício de consentimento. No caso, não obstante tratar-se de ação popular, o fato é que a relação em litígio é eminentemente de ordem privada, pois se litiga sobre a nulidade de um testamento. O interesse da Administração Pública é reflexo, devido à possível conversão da herança em vacante. Para que o ato seja sindicável mediante ação popular, ele deve ser, a um só tempo, nulo ou anulável e lesivo ao patrimônio público, no qual se incluem os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Com efeito, mostra-se inviável deduzir em ação popular pretensão com finalidade de mera desconstituição de ato por nulidade ou anulabilidade, sendo indispensável a asserção de lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público. No caso, como já dito, pretende-se a anulação de testamento por suposta fraude, sendo que, alegadamente, a herança tornar-se-ia jacente. Daí não decorre, todavia, nem mesmo em tese, uma lesão aos interesses diretos da Administração. Isso porque, ainda que prosperasse a alegação de fraude na lavratura do testamento, não haveria, por si só, uma lesão ao patrimônio público, porquanto tal provimento apenas teria o condão de propiciar a arrecadação dos bens do falecido, com subsequente procedimento de publicações de editais. A jacência, ao reverso do que pretende demonstrar o recorrente, pressupõe a incerteza de herdeiros, não percorrendo, necessariamente, o caminho rumo à vacância, tendo em vista que, após publicados os editais de convocação, podem eventuais herdeiros apresentar-se dando-se início ao inventário nos termos dos arts. 1.819 a 1.823 do CC/2002. Ademais, nem mesmo a declaração de vacância é em si bastante para transferir a propriedade dos bens ao Estado, uma vez que permanece resguardado o interesse dos herdeiros que se habilitarem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 1.822 do CC/2002. Diante disso, a Turma conheceu parcialmente do recurso especial e lhe deu provimento, apenas para afastar a multa aplicada na origem. REsp 445.653-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2009.
ACIDENTE. VEÍCULO. ANIMAL. PISTA.
O recorrente ingressou com ação de indenização contra a concessionária de rodovias por danos materiais causados a seu veículo devido a ter colidido com animais na pista. Note-se que o trecho da rodovia no qual houve o acidente encontra-se em zona rural, com campos de pecuária em grande parte de sua extensão, em que os animais circulam livremente pela pista, não havendo sinalização nenhuma nesse sentido. Isso posto, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, por entender que as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumerista. Portanto, respondem objetivamente por qualquer defeito na prestação do serviço, pela manutenção da rodovia em todos os aspectos, respondendo, inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista. Para o Min. Relator, a toda evidência, a questão da obrigação contratual de implantar sinalização em data posterior ao acidente não traz alteração, pois a segurança é inerente ao serviço de exploração da rodovia, haja ou não placas de advertência. Precedentes citados: REsp 647.710-RJ, DJ 30/6/2006; AgRg no Ag 522.022-RJ, DJ 5/4/2004, e REsp 467.883-RJ, DJ 1º/9/2003. REsp 687.799-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 15/10/2009.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. GARANTE.
O autor sustenta que o acórdão, ao endossar a decisão do juiz, conferiu interpretação equivocada ao dispositivo legal contido no art. 66 de Lei n. 4.728/1965, porquanto nele não consta nenhuma proibição de que terceiro interveniente dê, em alienação fiduciária, bem de sua propriedade. Para o Min. Relator, pela análise do referido artigo, que disciplina o mercado de capitais e estabelece medidas para seu desenvolvimento, seja de sua redação originária seja também da atual, conferida pelas alterações introduzidas pela Lei n. 10.931/2004, de fato, não consta nenhuma proibição de que o terceiro interveniente (garantidor) dê em alienação fiduciária, bem de sua propriedade. Na espécie, a instituição financeira aceitou a alienação fiduciária em garantia conferida por terceiro, sem qualquer contra prestação. O Tribunal de origem entendeu que não poderia haver alienação fiduciária de bem do garante, considerando haver, na realidade, uma garantia pela obrigação pecuniária contraída e não paga pelo devedor, não tendo o garantidor anuído com as modificações contratuais. Com efeito, uma das principais características da alienação fiduciária é a onerosidade, uma vez que beneficia ambos os contratantes, proporcionando instrumento creditício ao alienante e assecuratório ao adquirente. Nesse sentido, inexistindo a indispensável onerosidade no negócio jurídico entabulado entre as partes (banco e garante), outro não poderia ser o entendimento que não o do desvirtuamento da alienação fiduciária. Assim, o acórdão, ao não admitir a alienação fiduciária em garantia, entendeu corretamente, porquanto terceiros podem ser garantes, mas não alienantes fiduciários. Essa posição somente pode ser exercida pelo devedor. Entendeu o Tribunal a quo que, no caso, constitui uma “alienação fiduciária desnaturada de sua função social”, motivo pelo qual não poderia o Judiciário chancelar o procedimento praticado pela instituição financeira ou compactuar com ele. Para o Min. Relator, a conclusão a que chegou o Tribunal a quo decorreu da convicção formada em face dos elementos existentes nos autos, da interpretação dos contratos, das diversas renegociações e da análise das demais provas existentes. Rever a decisão recorrida importaria no vedado reexame de provas e na interpretação contratual (Súmulas. ns. 5 e 7 do STJ). REsp 866.300-BA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2009.
A embargante sustenta a existência de obscuridades em relação às premissas fáticas adotadas no acórdão embargado, na medida em que seriam incontroversos os seguintes fatos: existência de notificação escrita denunciando o contrato de locação com antecedência de trinta dias; existência de bens móveis no interior do imóvel locado; recusa do locador de receber as chaves; depósito das chaves em juízo e ciência inequívoca, pelo locador, do depósito das chaves. Destacou o Min. Relator que, na hipótese, ficou decidido, nas instâncias de origem, que, em nenhum momento, foi caracterizada a efetiva desocupação do imóvel pela autora, diante da ausência do restabelecimento do poder de uso e gozo do bem por suas proprietárias, em face da existência de vários móveis da locatária no interior do imóvel. O Tribunal de origem entendeu que o imóvel locado não foi efetivamente restituído às rés. Para que se adotasse neste Superior Tribunal a tese defendida pela autora de que o imóvel foi efetivamente desocupado e que a recusa das rés de receber as chaves seria injusta, seria necessário o reexame da situação fática definida nas instâncias originárias, o que é inviável em sede de recurso especial (Súm. n. 7-STJ). Assim, não resta configurada a hipótese do art. 485, V, do CPC, na medida em que o acórdão rescindendo, diante das particularidades do caso concreto, deu à controvérsia solução condizente com a regra do art. 6º da Lei n. 8.245/1991 (Lei do Inquilinato). No que tange às questões relativas à tese de abandono dos bens no interior do imóvel locado e à eficácia da denúncia da locação, o acórdão embargado limitou-se a afirmar que não seriam elas conhecidas em sede de rescisória, uma vez que não foram conhecidas no recurso especial cujo acórdão pretende-se rescindir. Resumindo-se a irresignação da embargante em mero inconformismo com o resultado do julgado desfavorável à sua pretensão, não há nenhum fundamento que justifique a interposição de embargos de declaração. Diante disso, a Seção, por maioria rejeitou-os. EDcl na AR 3.720-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgados em 14/10/2009.
REINTEGRAÇÃO. POSSE. TERRAS PÚBLICAS. Noticiam os autos que foram adquiridas terras públicas por instrumento de mandato outorgado por particular (mera detenção de posse); porém, durante o inventário decorrente da morte do adquirente, o imóvel sofreu apossamento, esbulho e grilagem por parte de terceiro. Então, houve o ajuizamento de cautelar de sequestro julgada procedente e, nos autos da cautelar, o autor (o espólio) pretendeu a expedição de mandado de desocupação, o qual foi indeferido ao argumento de que deveria ser ajuizado processo apropriado para tanto. Daí a ação de reintegração de posse interposta pelo espólio, em que a sentença extinguiu o processo sem resolução de mérito, sob o fundamento de que não cabe ao Judiciário decidir lide entre particulares que envolvam questões possessórias de ocupação de imóvel público, entretanto o Tribunal a quo deu provimento à apelação do recorrido (espólio), afirmando ser possível o ajuizamento da ação possessória. Isso posto, o REsp do MPDF tem por objetivo saber se é possível ao particular que ocupa terra pública utilizar-se de ação de reintegração de posse para reaver a coisa esbulhada por outro particular. Ressaltou a Min. Relatora que o tema ainda não foi apreciado neste Superior Tribunal, que só enfrentou discussões relativas à proteção possessória de particular perante o Poder Público – casos em que adotou o entendimento de que, em tais situações, a ocupação de bem público não passa de mera detenção, sendo, por isso, incabível invocar proteção possessória contra o órgão público. Observou que o espólio recorrido não demonstrou, na inicial, nenhum dos fundamentos que autorizam o pedido de proteção possessória e, sendo público o imóvel, nada mais é que mero detentor. Nesse contexto, concluiu haver impossibilidade de caracterização da posse por se tratar de imóvel público, pois não há título que legitime o direito do particular sobre esse imóvel. Assim, a utilização do bem público pelo particular só se considera legítima mediante ato ou contrato administrativo constituído a partir de rigorosa observância dos mandamentos legais para essa finalidade. Ademais, explica que o rito das possessórias previsto nos arts. 926 e seguintes do CPC exige que a posse seja provada de plano para que a ação tenha seguimento. Por essa razão, a Turma extinguiu o processo sem resolução de mérito, pela inadequação da ação proposta com fundamento no art. 267, IV, do CPC. Destacou-se, ainda, que o Judiciário poderá apreciar esse conflito por meio de outro rito que não o especial e nobre das possessórias. REsp 998.409-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/10/2009.
NEGATÓRIA. PATERNIDADE. VÍNCULO SOCIO-AFETIVO.
A ausência de vínculo biológico (afastado por exame de DNA) não teve o condão de desconstituir a filiação, pois foi reconhecido juridicamente que se estabeleceu o vínculo socio-afetivo entre pai e filho, porquanto, só após 22 anos do nascimento do filho, o pai propôs ação negatória de paternidade combinada com retificação de registro civil. Com esse entendimento, a Turma negou provimento ao REsp do pai. Apontou o Min. Relator que, nas instâncias ordinárias, ao contrário do sustentado no REsp, ficou inconteste não haver adoção à moda brasileira, pois o recorrente, ao proceder ao registro da paternidade, não tinha conhecimento da inexistência de vínculo biológico e, apesar da alegação de dúvidas, portou-se como pai, estabelecendo vínculo de afetividade. Explicou que a paternidade fundada no vínculo socio-afetivo não é construção doutrinária nem jurisprudencial, mas encontra proteção no § 6º do art. 227 da CF/1988, que veda diferenciação entre filhos havidos ou não de relação de casamento, e no art. 1.595 do CC/2002, que reconhece o parentesco civil resultante de origem não consanguínea. Observou que o reconhecimento espontâneo da paternidade somente pode ser desfeito se demonstrado o vício de consentimento ou falsidade do registrado, conforme disposto no art. 1.604 do CC/2002. Esclareceu que, por erro de conhecimento, deve-se compreender a falsa representação da realidade ou idéia falsa da realidade, tal como apregoado na doutrina. Ademais, no contexto dos autos, não se denota emprego de diligência apta a configurar o alegado erro substancial escusável. Anotou ainda que o erro essencial apto a anular a filiação assentada no registro civil deve estar evidenciado nos autos de forma clara e robusta, o que não se verificou no caso. Precedentes citados: REsp 932.692-DF, DJe 12/2/2009, e REsp 1.022.793-RS, DJe 3/2/2009. REsp 1.078.285-MS, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 13/10/2009.
ACIDENTE AÉREO. DANOS MORAIS. HONORÁRIOS.
Discute-se, no recurso especial interposto pelos pais e irmão de vítima de acidente aéreo (jovem de 21 anos), o valor do dano moral e pensão mensal, bem como, no recurso especial da companhia aérea, a exatidão das verbas honorárias. Segundo ressaltou a Min. Relatora, a jurisprudência consolidou-se no sentido de que o responsável pela morte de filho trabalhador deve aos familiares da vítima pensão alimentícia mensal fixada em 2/3 da sua remuneração até a idade de 25 anos, depois reduzida à metade, pois se presume que o filho constituiria família, o que diminuiria sua contribuição aos pais. Quanto ao pedido da inclusão de valores referentes ao FGTS e às férias na base de cálculo da pensão alimentícia, o dissídio só foi demonstrado quanto às férias, assim, só foi conhecida e concedida a inclusão das férias, com base na jurisprudência assentada pelas Turmas da Segunda Seção deste Superior Tribunal. Por último, quanto à fixação dos danos morais, observou ser ela uma das mais complexas tarefas a cargo do Judiciário pela falta de critérios e pelas peculiaridades de cada caso. Dessarte, fixou-os em R$ 190 mil para cada um dos três autores. Apontou que a sucumbência recíproca foi afastada devido ao fato de os autores decaírem em parte mínima, só em relação à indenização de tratamento psicológico e aos danos relativos ao sepultamento da vítima, que são ínfimos se comparados à pretensão julgada procedente, como a pensão e os danos morais. Outrossim, para o cálculo dos honorários advocatícios, quando há a necessidade de pensionamento, devem ser limitados, sendo fixados, no caso, em 10% sobre o somatório dos valores das prestações vencidas mais um ano das vincendas, afastada a multa do art. 538 do CPC. Com esse entendimento, a Turma deu parcial provimento ao recurso dos autores e ao da companhia aérea. Precedentes citados: REsp 713.764-RS, DJe 10/3/2008; REsp 361.814-MG, DJ 24/6/2002 ; REsp 193.296-RJ, DJ 10/4/2000; AgRg no Ag 429.155-RJ, DJ 24/10/2005; AgRg no REsp 1.109.961-MS, DJe 10/9/2009, e AgRg no Ag 727.915-SP, DJ 26/6/2006. REsp 1.137.708-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/10/2009.
PLANO. SAÚDE. COBERTURA. GASTROPLASTIA REDUTORA.
A recorrente autora, na inicial, afirma que, em 1992, aderiu a plano de saúde, mantendo as mensalidades em dia. Em 2005, já portadora de obesidade mórbida, que colocaria em risco sua vida, recebeu indicação médica para se submeter a uma gastroplastia redutora, conhecida popularmente como cirurgia para redução de estômago. As instâncias ordinárias reconheceram, ao menos implicitamente, que o contrato previa a cobertura para a moléstia. O tratamento a ser aplicado, nessas condições, deve ser sempre o mais recomendado, nisso residindo o fundamento para que a cláusula contratual em questão, conquanto genérica, englobe a específica modalidade de tratamento referida acima. Quanto ao dano moral, esse é devido, pois evidente o sofrimento daquele que vê negada a cobertura médica em momento delicado de necessidade. Assim, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, conheceu do recurso e deu provimento a ele, por entender que o plano de saúde deve proporcionar ao consumidor o tratamento mais moderno e adequado em substituição ao procedimento obsoleto previsto especificamente no contrato. Precedentes citados: REsp 311.509-SP, DJ 25/6/2001; REsp 668.216-SP, DJ 2/4/2007 e, REsp 519.940-SP, DJ 1º/9/2003. REsp 1.106.789-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2009.
ALTERAÇÃO. PRENOME. DESIGNATIVO. SEXO.
O recorrente autor, na inicial, pretende alterar o assento do seu registro de nascimento civil, para mudar seu prenome, bem como modificar o designativo de seu sexo, atualmente constante como masculino, para feminino, aduzindo como causa de pedir o fato de ser transexual, tendo realizado cirurgia de transgenitalização. Acrescenta que a aparência de mulher, por contrastar com o nome e o registro de homem, causa-lhe diversos transtornos e dissabores sociais, além de abalos emocionais e existenciais. Assim, a Turma entendeu que, tendo o recorrente se submetido à cirurgia de redesignação sexual nos termos do acórdão recorrido, existindo, portanto, motivo apto a ensejar a alteração do sexo indicado no registro civil, a fim de que os assentos sejam capazes de cumprir sua verdadeira função, qual seja, a de dar publicidade aos fatos relevantes da vida social do indivíduo, deve ser alterado seu assento de nascimento para que nele conste o sexo feminino, pelo qual é socialmente reconhecido. Determinou, ainda, que das certidões do registro público competente não conste que a referida alteração é oriunda de decisão judicial, tampouco que ocorreu por motivo de redesignação sexual de transexual. REsp 1.008.398-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/10/2009
RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA. IMÓVEL.
Trata-se, originariamente, de ação de rescisão contratual de promessa de compra e venda de imóvel em desfavor da ora recorrente, objetivando, além da desconstituição do negócio, a devolução de todas as parcelas pagas acrescidas de juros e multa, atualizadas monetariamente, bem como as perdas e danos. Sustenta a recorrente ofensa ao art. 1.092 do CC/1916, porquanto, havendo os compradores suspendido o pagamento das parcelas do preço antes do ajuizamento da ação, não poderiam exigir da construtora o adimplemento obrigacional, visto que também descumpriram o contrato. Para o Min. Relator, conforme o acórdão recorrido, ficou patenteado, no exame realizado pelas instâncias ordinárias, que efetivamente o atraso que já se configurava era claro em revelar a inadimplência da construtora, de sorte que o agir dos autores, ora recorridos, na cessação do pagamento era medida defensiva, para evitar prejuízo maior, até porque a suspensão deu-se não antes da paralisação das obras, mas sim quando do retardado reinício dessas, cinco meses além do fim do prazo que a própria construtora previra para o prosseguimento. Correto, pois, o referido acórdão quando concluiu que, então, os autores achavam-se ao abrigo da exceção de contrato não cumprido. Diante disso, a Turma não conheceu do recurso. REsp 593.471-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 13/10/2009.
UNIÃO ESTÁVEL. BEM IMÓVEL. PARTILHA.
In casu, cinge-se a questão em saber se o imóvel adquirido primeiro pelo varão na constância da união estável e depois, ainda dentro do mesmo período de vida em comum, alienado por ele à autora (sua convivente) é bem sujeito à partilha. A Turma entendeu que, no caso, o imóvel objeto do contrato de compra e venda entre os companheiros está excluído da partilha. Ao concluir o negócio jurídico anterior à dissolução da união estável, o qual impunha obrigações sinalagmáticas para ambas as partes, o companheiro obteve vantagem econômica, o preço total do imóvel, não sendo razoável que agora, por meio de partilha, receba 50% do valor deste, que, no exercício de sua autonomia privada, já vendera à companheira. A alienação, por si só, é ato contrário, incompatível com a postulação de partilha. O contrato de compra e venda, em verdade, resulta em reserva do bem em favor da companheira, tornando-o incomunicável, portanto não sujeito à partilha. REsp 738.464-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/10/2009.
INDENIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO INDEVIDA. CHARGE.
Trata-se de saber se são aplicáveis no caso discutido os parâmetros de fixação de indenização por violação dos direitos patrimoniais do autor previstos no art. 122, parágrafo único, da Lei n. 5.988/1973, cuja redação foi mantida pelo art. 103, parágrafo único, da Lei n. 9.610/1998, alterando-se somente o número de exemplares a serem indenizados. Na hipótese, as obras publicadas indevidamente são charges que integram apenas uma pequena parte do periódico, jornal composto por matérias de imprensa, artigos, fotografias e demais obras de autoria de inúmeras pessoas. Diante disso, a Turma entendeu não ser razoável, tampouco proporcional admitir-se que, na espécie, a indenização de parte seja feita pelo valor do todo, pois isso implicaria enriquecimento ilícito do autor da obra de arte. A indenização por danos materiais provocados pela violação dos direitos autorais tem por objetivo ressarcir o autor na medida exata do valor patrimonial que seria auferido, caso as obras fossem publicadas em conformidade com a lei e com os interesses do autor. Logo, a recomposição patrimonial do artista não pode ser utilizada como meio de abuso, como enriquecimento ilícito da parte. Assim, resta afastada a aplicação do art. 122, parágrafo único, da Lei n. 5.988/1973 a esse caso. Por outro lado, são razoáveis os critérios adotados pelo Tribunal de origem consistentes no pagamento do valor correspondente à metade do salário que o autor recebia da empresa pela qual era contratado referente aos meses em que publicadas, indevidamente, as obras, somado ao 13° salário proporcional, pois refletem os valores reais que teriam sido percebidos pelo autor caso tivesse contratado a publicação com o recorrido, recompondo, devidamente, as perdas havidas. Quanto à alegada violação do art. 126 da Lei n. 5.988/1973, entendeu-se ter razão o recorrente. A jurisprudência deste Superior Tribunal é firme no sentido de que o valor definido pela Corte de origem somente pode ser alterado em sede de recurso especial quando absurdamente excessivo ou irrisório, o que se verificou nos autos. Assim, diante da jurisprudência acima citada e tendo em vista as circunstâncias do caso, no qual o direito do autor foi violado durante um longo período de tempo, por meio da publicação de inúmeras charges sem a indicação da autoria, determinou-se a majoração do quantum indenizatório para R$ 10 mil, acrescidos de correção monetária a partir da data do julgamento (Súmula n. 362-STJ) e juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula n. 54-STJ). Destarte, tendo em vista que o ato ilícito deu-se no lapso temporal de janeiro de 1993 a maio de 1996, os juros moratórios devem ser calculados a partir de setembro de 1994, data intermediária entre a primeira e a última lesão, desconsiderado o período atingido pela prescrição. REsp 735.019-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/10/2009.
AÇÃO POPULAR. ANULAÇÃO. TESTAMENTO.
O recorrente afirma que o testamento é fruto de fraude perpetrada pelos réus e, diante da inexistência de herdeiros legítimos, a valiosa herança (cerca de sessenta imóveis) ter-se-ia por jacente, devolvendo-se o acervo hereditário à respectiva municipalidade. A questão refere-se ao cabimento de ação popular no caso em que se pretende anular testamento por suposto vício de consentimento. No caso, não obstante tratar-se de ação popular, o fato é que a relação em litígio é eminentemente de ordem privada, pois se litiga sobre a nulidade de um testamento. O interesse da Administração Pública é reflexo, devido à possível conversão da herança em vacante. Para que o ato seja sindicável mediante ação popular, ele deve ser, a um só tempo, nulo ou anulável e lesivo ao patrimônio público, no qual se incluem os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. Com efeito, mostra-se inviável deduzir em ação popular pretensão com finalidade de mera desconstituição de ato por nulidade ou anulabilidade, sendo indispensável a asserção de lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público. No caso, como já dito, pretende-se a anulação de testamento por suposta fraude, sendo que, alegadamente, a herança tornar-se-ia jacente. Daí não decorre, todavia, nem mesmo em tese, uma lesão aos interesses diretos da Administração. Isso porque, ainda que prosperasse a alegação de fraude na lavratura do testamento, não haveria, por si só, uma lesão ao patrimônio público, porquanto tal provimento apenas teria o condão de propiciar a arrecadação dos bens do falecido, com subsequente procedimento de publicações de editais. A jacência, ao reverso do que pretende demonstrar o recorrente, pressupõe a incerteza de herdeiros, não percorrendo, necessariamente, o caminho rumo à vacância, tendo em vista que, após publicados os editais de convocação, podem eventuais herdeiros apresentar-se dando-se início ao inventário nos termos dos arts. 1.819 a 1.823 do CC/2002. Ademais, nem mesmo a declaração de vacância é em si bastante para transferir a propriedade dos bens ao Estado, uma vez que permanece resguardado o interesse dos herdeiros que se habilitarem no prazo de cinco anos, nos termos do art. 1.822 do CC/2002. Diante disso, a Turma conheceu parcialmente do recurso especial e lhe deu provimento, apenas para afastar a multa aplicada na origem. REsp 445.653-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2009.
ACIDENTE. VEÍCULO. ANIMAL. PISTA.
O recorrente ingressou com ação de indenização contra a concessionária de rodovias por danos materiais causados a seu veículo devido a ter colidido com animais na pista. Note-se que o trecho da rodovia no qual houve o acidente encontra-se em zona rural, com campos de pecuária em grande parte de sua extensão, em que os animais circulam livremente pela pista, não havendo sinalização nenhuma nesse sentido. Isso posto, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento, por entender que as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumerista. Portanto, respondem objetivamente por qualquer defeito na prestação do serviço, pela manutenção da rodovia em todos os aspectos, respondendo, inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista. Para o Min. Relator, a toda evidência, a questão da obrigação contratual de implantar sinalização em data posterior ao acidente não traz alteração, pois a segurança é inerente ao serviço de exploração da rodovia, haja ou não placas de advertência. Precedentes citados: REsp 647.710-RJ, DJ 30/6/2006; AgRg no Ag 522.022-RJ, DJ 5/4/2004, e REsp 467.883-RJ, DJ 1º/9/2003. REsp 687.799-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 15/10/2009.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. GARANTE.
O autor sustenta que o acórdão, ao endossar a decisão do juiz, conferiu interpretação equivocada ao dispositivo legal contido no art. 66 de Lei n. 4.728/1965, porquanto nele não consta nenhuma proibição de que terceiro interveniente dê, em alienação fiduciária, bem de sua propriedade. Para o Min. Relator, pela análise do referido artigo, que disciplina o mercado de capitais e estabelece medidas para seu desenvolvimento, seja de sua redação originária seja também da atual, conferida pelas alterações introduzidas pela Lei n. 10.931/2004, de fato, não consta nenhuma proibição de que o terceiro interveniente (garantidor) dê em alienação fiduciária, bem de sua propriedade. Na espécie, a instituição financeira aceitou a alienação fiduciária em garantia conferida por terceiro, sem qualquer contra prestação. O Tribunal de origem entendeu que não poderia haver alienação fiduciária de bem do garante, considerando haver, na realidade, uma garantia pela obrigação pecuniária contraída e não paga pelo devedor, não tendo o garantidor anuído com as modificações contratuais. Com efeito, uma das principais características da alienação fiduciária é a onerosidade, uma vez que beneficia ambos os contratantes, proporcionando instrumento creditício ao alienante e assecuratório ao adquirente. Nesse sentido, inexistindo a indispensável onerosidade no negócio jurídico entabulado entre as partes (banco e garante), outro não poderia ser o entendimento que não o do desvirtuamento da alienação fiduciária. Assim, o acórdão, ao não admitir a alienação fiduciária em garantia, entendeu corretamente, porquanto terceiros podem ser garantes, mas não alienantes fiduciários. Essa posição somente pode ser exercida pelo devedor. Entendeu o Tribunal a quo que, no caso, constitui uma “alienação fiduciária desnaturada de sua função social”, motivo pelo qual não poderia o Judiciário chancelar o procedimento praticado pela instituição financeira ou compactuar com ele. Para o Min. Relator, a conclusão a que chegou o Tribunal a quo decorreu da convicção formada em face dos elementos existentes nos autos, da interpretação dos contratos, das diversas renegociações e da análise das demais provas existentes. Rever a decisão recorrida importaria no vedado reexame de provas e na interpretação contratual (Súmulas. ns. 5 e 7 do STJ). REsp 866.300-BA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/10/2009.
terça-feira, 20 de outubro de 2009
JULGADO DO TJ/MS APLICANDO O "DUTY TO MITIGATE THE LOSS" PARA REDUÇÃO DE JUROS.
Terceira Turma Cível
Apelação Cível - Ordinário - N. 2009.022658-4/0000-00 - Campo Grande.
Relator - Exmo. Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay.
Apelante - Banestado Administradora de Cartoes de Credito Ltda.
Advogada - Nilza Ramos.
Apelado - Antonio Gentil Rodrigues.
Def. Públ. - Salete de Fátima Nascimento.
E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO “DUTY TO MITIGATE THE LOSS” – CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – CONTRATO DE ADESÃO – APLICABILIDADE DO CDC – REVISÃO DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS – POSSIBILIDADE – JUROS REMUNERATÓRIOS – CÓPIA DO CONTRATO – AUSÊNCIA – APLICAÇÃO DO ART. 333 DO CPC – MANUTENÇÃO DA LIMITAÇÃO DOS JUROS EM 12% AO ANO – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE AVERIGUAÇÃO DA SUA COBRANÇA CUMULADA COM OUTROS ENCARGOS – INEXISTÊNCIA DE CÓPIA DO CONTRATO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE AFASTOU A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – PRÁTICA ILEGAL – ANATOCISMO – SÚMULA 121 DO STF – USURA – MULTA – 2% – FALTA DE INTERESSE RECURSAL – RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO.
Se a instituição financeira permanece inerte por longo período, aguardando que a dívida atinja montantes astronômicos, impõe-se-lhe a aplicação do princípio denominado duty to mitigate the loss, que impõe, nestes casos, por penalidade, a redução do crédito do mutuário deveria, nos termos do princípio da boa-fé objetiva, evitar o agravamento do próprio prejuízo.
Nos termos da súmula 297 do STJ e precedentes do Supremo Tribunal Federal, O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
O contrato de cartão de crédito é considerado de adesão, eis que resulta da padronização e uniformização das cláusulas contratuais realizadas pela instituição financeira, as quais o consumidor é obrigado a aceitá-las em bloco, em seu prejuízo.
Na esteira do entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, levando-se em consideração a situação jurídica específica do contrato, é de se admitir a revisão das cláusulas consideradas abusivas pelo Código de Defesa do Consumidor.
Se os juros remuneratórios contratados excedem a taxa média de mercado, fixada pelo Banco Central do Brasil, fica autorizada a revisão contratual, eis que caracterizada a abusividade, devendo os juros serem reduzidos ao valor da taxa média de mercado.
Outrossim, quando a instituição financeira não comprova os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor, demonstrando que a taxa de juros por ele cobrada não é extorsiva, mantém-se a fixação dos juros em 12%, nos termos da sentença.
Mantém-se a sentença recorrida que afastou a possibilidade de cobrança da comissão de permanência se não houver nos autos cópia do contrato, permitindo aferir se a sua cobrança foi cumulada com outros encargos.
A capitalização mensal de juros, denominada anatocismo, é prática vedada pelo nosso ordenamento jurídico, a exemplo do que ocorre com o art. 13 do Decreto nº 22.626/33, tanto que o STF editou a súmula 121, que estabelece ser vedada a capitalização de juros.
Se a sentença apenas afasta a possibilidade de cobrança da multa em percentual superior a 2%, nos termos contratado, carece o autor de interesse recursal.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Terceira Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento.
Campo Grande, 21 de setembro de 2009.
Des. Rubens Bergonzi Bossay – Relator
RELATÓRIO
O Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay
Trata-se de apelação cível interposta por Banestado Administradora de Cartões de Crédito Ltda., inconformado com a sentença prolatada pelo Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande, nos autos da Ação de Cobrança que move em face de Antonio Gentil Rodrigues, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Diante do exposto e por tudo mais que dos autos constam, julgo parcialmente procedente o pedido inicial formulado por Banestado Adminstradora de Cartões de Crédito em desfavor de Antônio Gentil Rodrigues, razão pela qual condeno o réu no pagamento dos valores a serem apurados em liquidação de sentença, excluíndo-se do quantum debeatur os percentuais alusivos às cláusulas escorchantes existentes no contrato de cartão de crédito celebrado entre as partes, assim consideradas as que fixam juros superiores a 12% ao ano, que permitem sua capitalização mensal, estabelecem a cobrança de comissão de permanência, de multa moratória superior a 2% e correção monetária por qualquer outro índice que não seja o do IGPM/FGV.
Em razão disso, no período que compreende 20/01/1997 a 20/08/1999, há de incidir juros de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de mora de 2% (dois pontos percentuais). Ante a inércia da instituição financeira e em face a aplicação do princípio duty the mitigate the loss, no interregno temporal de 21/08/1999 a 11/11/2004 o quantum debeatur não deverá sofrer qualquer correção (seja no tocante a juros, correção monetária e/ou multa moratória). A partir da propositura da demanda, outrossim, ou seja, a partir de 12 de novembro de 2004 até a data do efetivo pagamento, deverão incidir, novamente, juros no percentual de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de 2% dois pontos percentuais.
Declaro, demais disso, com esteio nos artigos 47 e 51, inciso IV, da Lei 8.078/90, e, bem assim, por força do artigo 422 do Código Civil, a nulidade das cláusulas contratuais que estabeleceram a cobrança de encargos contratuais que diferem dos parâmetros fixados por esta sentença e por ela expressamente mencionados.
Via de conseqüência o feito tem seu mérito resolvido a par do que determina o art. 269, I do Código de Processo Civil.”
Sustenta o apelante que o fato do banco ter permanecido inerte no período de 21/08/1999 a 11/11/2004, não autoriza o afastamento da correção monetária e os encargos da mora, mesmo porque não permaneceu inerte, mas tentava receber amigavelmente o seu crédito.
Argumenta que deixar de aplicar correção monetária, juros moratórios e multas no período mencionado favorece o enriquecimento ilícito do apelado às custas do apelante, norma esta contida no art. 884 do Código Civil.
Afirma que o contrato de cartão de crédito é simples contrato-tipo, que possibilita a padronização de procedimentos da autora, essencial na atual fase de desenvolvimento e complexidade da economia.
Com relação aos juros remuneratórios, afirma que a lei 4.595/64, em vigor, revogou o Decreto-Lei 22.626/33 no tocante à limitação dos juros, tendo sido delegado ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para regular as taxas de juros aplicadas pelas instituições financeiras.
Em relação à capitalização de juros, sustenta o apelante que negou a sua prática, razão pela qual não merece discussão a este respeito.
No que tange à comissão de permanência, assevera que não realizou a sua cobrança, sendo que não constam das faturas e mesmo que houvesse cobrado, não haveria nenhuma ilegalidade, eis que nos termos da Resolução nº 1.129 e 1.572 do Conselho Monetário Nacional, editadas com o amparo da lei n. 4.595/64, a cobrança da comissão é facultada no âmbito do mercado financeiro.
Já em relação à multa contratual, aduz que foi convencionada em 2% (cláusula 5.9) e não cobrada.
Requer o provimento do recurso para reformar a sentença nos pontos abordados, impondo-se o ônus da sucumbência ao réu.
Em contrarrazões, o apelado manifesta-se pelo improvimento do recurso.
VOTO
O Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay (Relator)
Trata-se de apelação cível interposta por Banestado Administradora de Cartões de Crédito Ltda., inconformado com a sentença prolatada pelo Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande, nos autos da Ação de Cobrança que move em face de Antonio Gentil Rodrigues, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Diante do exposto e por tudo mais que dos autos constam, julgo parcialmente procedente o pedido inicial formulado por Banestado Adminstradora de Cartões de Crédito em desfavor de Antônio Gentil Rodrigues, razão pela qual condeno o réu no pagamento dos valores a serem apurados em liquidação de sentença, excluíndo-se do quantum debeatur os percentuais alusivos às cláusulas escorchantes existentes no contrato de cartão de crédito celebrado entre as partes, assim consideradas as que fixam juros superiores a 12% ao ano, que permitem sua capitalização mensal, estabelecem a cobrança de comissão de permanência, de multa moratória superior a 2% e correção monetária por qualquer outro índice que não seja o do IGPM/FGV.
Em razão disso, no período que compreende 20/01/1997 a 20/08/1999, há de incidir juros de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de mora de 2% (dois pontos percentuais). Ante a inércia da instituição financeira e em face a aplicação do princípio duty the mitigate the loss, no interregno temporal de 21/08/1999 a 11/11/2004 o quantum debeatur não deverá sofrer qualquer correção (seja no tocante a juros, correção monetária e/ou multa moratória). A partir da propositura da demanda, outrossim, ou seja, a partir de 12 de novembro de 2004 até a data do efetivo pagamento, deverão incidir, novamente, juros no percentual de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de 2% dois pontos percentuais.
Declaro, demais disso, com esteio nos artigos 47 e 51, inciso IV, da Lei 8.078/90, e, bem assim, por força do artigo 422 do Código Civil, a nulidade das cláusulas contratuais que estabeleceram a cobrança de encargos contratuais que diferem dos parâmetros fixados por esta sentença e por ela expressamente mencionados.
Via de conseqüência o feito tem seu mérito resolvido a par do que determina o art. 269, I do Código de Processo Civil.”
Aplicação do princípio “duty to mitigate the loss”:
Inicialmente, irresigna-se o apelante contra a aplicação do princípio denominado “duty to mitigate the loss” (mitigação do prejuízo pelo próprio credor), que culminou no afastamento da cobrança de qualquer encargo, tais como juros, correção nonetária ou multa moratória, no período de 21/08/1999 a 11/11/2004, período em que o apelado incidiu em mora e a interposição da presente ação.
Antes de adentrar na análise propriamente dessa matéria, passo a tecer alguns comentários a respeito do princípio denominado “duty to mitigate the loss” (mitigação do prejuízo pelo próprio credor).
Segundo os ensinamentos do mestre Flávio Tartuce, citando Vera Maria Jacob Fradera, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, esta é uma das construções inovadoras do Novo Código Civil e esta diretamente relacionada com o princípio da boa-fé objetiva, “uma vez que a mitigação do próprio prejuízo constituiria um dever de natureza acessória, um dever anexo, derivado da boa conduta que deve existir entre os negociantes.” (Direito Civil, Ed. Método, pág. 111)
Aliás, a respeito da tese em questão já foi aprovado o Enunciado 169 na III Jornada de Direito Civil, verbis:
“o princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo.”
Como esclareceu com muita propriedade o mestre Flávio Tartuce, “(...) não pode a instituição financeira permanecer inerte, aguardando que, diante da alta taxa de juros prevista no instrumento contratual, a dívida atinja montantes astronômicos.” (Direito Civil, Ed. Método, pág. 112)
Exatamente esta a situação dos autos, eis que o Contrato de Emissão e Utilização dos Cartões de Crédito Banestado Visa, n. 491415208964600, firmado em 17.12.1996, segundo alegações do próprio apelante, não teve as suas fatura pagas desde o dia 20/8/1999 (f. 11).
Contudo, o apelante aguardou até 12/11/2004 para tomar alguma atitude quanto ao recebimento do seu crédito, o que ocorreu com a interposição desta ação, o que implicou na evolução do saldo devedor de R$ 19.196,26 para R$ 50.151,76 (cálculo efetuado em 07/10/2004).
Como dito acima, em nome do princípio da boa-fé objetiva, que deve prevalecer entre as partes contratantes, deveria o apelante ter efetuado a cobrança do encargo tão logo o apelado deixou de efetuar os pagamentos, evitando com isso a elevação da dívida a montantes astronômicos, como é o caso dos autos.
Nesses casos, menciona o mestre Flávio Tartuce, em citação à professora Vera Jacob Fradera, que em casos tais envolvendo o duty to mitigate the loss, a professora propõe que o “não atendimento a tal dever traria como consequência sanções ao credor, principalmente a imputação de culpa próxima à culpa delitual, com o pagamento de eventuais perdas e danos, ou a redução do seu próprio crédito.” ((Direito Civil, Ed. Método, pág. 113)
Assim considerando, mostra-se razoável a redução do crédito do apelante no período compreendido de 20/01/1997 a 20/08/1999, não havendo se falar em enriquecimento ilícito neste caso, porquanto a penalidade decorre da própria inércia do apelante, que não obedeceu ao princípio da boa-fé que deve prevalecer nas relações contratuais, tendo se valido das vantagens decorrentes da demora na interposição da presente ação.
Cartão de Crédito – Contrato de adesão/aplicação do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras/Revisão Contratual:
Em sequência, discute que o contrato de cartão de crédito não é de adesão, mas simples contrato-tipo, que possibilita a padronização de procedimentos da autora, essencial na atual fase de desenvolvimento e complexidade da economia.
De igual modo, não assiste razão ao apelante.
Cumpre esclarecer, a priori, que é perfeitamente admissível a aplicação do CDC às relações bancárias, como é o caso dos autos, onde o contrato entabulado entre as partes é denominado contrato de adesão, onde, segundo o mestre Rizzatto Nunes, “as suas cláusulas são estipuladas unilateralmente (no caso, pelo fornecedor), cabendo à outra parte (aqui o consumidor) aquiescer a seus termos, aderindo a ele.” (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 3ª edição, Ed. Saraiva, pág. 552)
Essa antiga discussão já resultou na súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:
“Súmula 297 - Ó Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”
Diverso não é o entendimento da Corte Suprema:
“EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL. Esta Corte, no julgamento da ADI 2.591, considerou aplicáveis às instituições financeiras as normas constantes do Código de Defesa do Consumidor. Entretanto, a análise da onerosidade excessiva da taxa fixada no contrato é vedada pelo contido na Súmula 279 desta Corte. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI-AgR 608884/RS, rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Julgamento: 09/12/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma) (destacado)
Ao contrário do que sustenta o apelante, o contrato de cartão de crédito se apresenta como de adesão. Isto porque a atividade bancária, em decorrência da multiplicidade de clientes e por razões de ordem econômica, impõe a necessidade de padronização e uniformização das cláusulas contratuais e, nestes casos, o consumidor se vê obrigado a aceitá-las em bloco, o que na maioria das vezes lhe resulta prejuízos, porque se tratam de cláusulas abusivas, que restringem os seus direitos.
Tanto é verdade que dos autos só consta o contrato padrão de utilização dos cartões de crédito Banestado (f. 06-10), onde não se vê a participação do apelado, tratando-se de cláusulas previamente estabelecidas pela instituição financeira.
Portanto, em se tratando de contrato de adesão, passível a sua revisão à luz do Código de Defesa do Consumidor, até porque, a parte apelada, em sede de contestação, requereu expressamente a sua revisão (f. 112/113).
O inc. V do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor estabelece expressamente que são direitos básicos do consumidor “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.”
Assim sendo, havendo desequilíbrio entre as partes contratantes, impõe-se a revisão do contrato pela parte hipossuficiente, excluindo-se as cláusulas desfavoráveis, restabelecendo o equilíbrio contratual, conforme cada situação específica, como vêm sinalizando o Superior Tribunal de Justiça em diversos julgados:
“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INCIDÊNCIA DO CDC. REVISÃO DE CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INACUMULABILIDADE COM QUAISQUER OUTROS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS OU MORATÓRIOS. MANUTENÇÃO DO BEM NA POSSE DO DEVEDOR. DEPÓSITO PARCIAL. VALORES INCONTROVERSOS. CABIMENTO. COMPENSAÇÃO/RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO. POSSIBILIDADE. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. MULTA, ART. 557, § 2º, DO CPC. I. Aplicam-se às instituições financeiras as disposições do Código de Defesa do Consumidor, no que pertine à possibilidade de revisão dos contratos, conforme cada situação específica. (...) VII. Agravo improvido.” (AgRg no REsp 1025842/RS, Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, 4ª Turma, Data do Julgamento 15/05/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 23/06/2008)
“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. MEDIDA PROVISÓRIA. N. 2.170-36. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E 356-STF. INCIDÊNCIA DO CDC. REVISÃO DE CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INACUMULABILIDADE COM QUAISQUER OUTROS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS OU MORATÓRIOS. TEMAS PACIFICADOS. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. MULTA, ART. 557, § 2º, DO CPC. I. Inviável o inconformismo atinente à questão da capitalização mensal dos juros com fundamento na Medida Provisória n. 2.170-36, matéria que não foi tratada pelo Tribunal de origem, razão pela qual incidem, no particular, as Súmulas n. 282 e 356-STF. II. Aplicam-se às instituições financeiras as disposições do Código de Defesa do Consumidor, no que pertine à possibilidade de revisão dos contratos, conforme cada situação específica. (...) V. Agravo improvido.” (AgRg no REsp 1021161/RS, Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Data do Julgamento 17/04/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 05/05/2008) (destacado)
Esse entendimento termina por demonstrar que princípios como o pacta sunt servanda”, o da autonomia da vontade, da intangibilidade e da força obrigatória dos contratos, embora revestidos de grande importância, não se encontram revestidos do caráter absoluto que possuíam anteriormente, sendo este o resultado da nova visão açambarcada pelo Código de Defesa do Consumidor, que passou a priorizar o interesse público e o bem comum.
Diverso não é o entendimento desta Corte:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA REVISIONAL DE DÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS – CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – APLICABILIDADE DO CDC NOS CONTRATOS BANCÁRIOS – REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS – NÃO-OCORRÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DO PACTA SUNT SERVANDA E DA AUTONOMIA DA VONTADE – LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO – APLICABILIDADE DA LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33) – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS E COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – VEDAÇÃO – MULTA CONTRATUAL – LIMITAÇÃO EM 2%, NOS TERMOS DO ARTIGO 52, § 1º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RESTITUIÇÃO OU COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE DE FORMA SIMPLES – CONSIGNAÇÃO DOS VALORES – PROCEDENTE ATÉ OS VALORES CONSIGNADOS EM JUÍZO – PREQUESTIONAMENTO – DESNECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DO ACÓRDÃO SOBRE OS DISPOSITIVOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS DEBATIDOS – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos casos que envolvem relação de consumo, tais como empréstimos bancários. Dessa forma, é permitida a revisão das cláusulas contratuais pactuadas, mormente em face do fato de que o princípio do pacta sunt servanda, há muito vêm sofrendo mitigações, mormente quanto aos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual.
(...)” (TJMS. Apelação Cível nº 2007.031457-7. Rel. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo. Terceira Turma Cível. J: 19.11.2007). (destacado)
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA E REVISIONAL DE DÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA – POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – TAXA DE JUROS LIMITADA EM 12% AO ANO – INCIDÊNCIA DO ARTIGO 1º DO DECRETO N° 22.626/33 – CAPITALIZAÇÃO ANUAL – COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – VEDADA – SUBSTITUIÇÃO PELO IGPM-FGV – COMPENSAÇÃO DOS VALORES EVENTUALMENTE PAGOS A MAIOR – RECURSO PROVIDO.
Ante a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários, tornou-se possível a revisão das cláusulas contratuais desconformes com o ordenamento jurídico, ficando, portanto, mitigado o princípio do pacta sunt servanda.
(...)” (TJMS. Apelação Cível nº 2007.022988-3. Des. Paulo Alfeu Puccinelli. Terceira Turma Cível. J: 15.10.2007). (destacado)
Desta feita, levando-se em consideração a situação específica do contrato, é de se admitir a revisão das cláusulas consideradas abusivas pelo Código de Defesa do Consumidor, com o fito de restabelecer o equilíbrio contratual.
Dos juros remuneratórios:
Com relação aos juros remuneratórios, tenho que a sentença deve ser mantida, mas por fundamentos diversos.
A respeito dos juros remuneratórios havia firmado entendimento no sentido de que a lei n. 4.595/64, que regula o Sistema Monetário Nacional, não havia sido totalmente recepcionada pela Constituição Federal, já que esta dispôs em seu art. 25, do ADCT que, “Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional.”
Com a entrada em vigor do mencionado preceito legal, houve a revogação de todos os dispositivos que atribuíam ao Conselho Monetário Nacional competência para regulamentar a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras, passando tal estipulação a ser exercida pelo Congresso Nacional, segundo entendimento exarado no inc. XIII do art. 48, que estabelece que “Cabe ao Congresso Nacional (...) dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:
Inc. XIII – Matéria Financeira, Cambial e Monetária, Instituições Financeiras e suas operações.”
Assim sendo, mesmo que se considere que o prazo previsto no art. 25 do ADCT tenha sido prorrogado pelo disposto no art. 1º da lei 8.392/91, o inc. XIII do art. 48 é expresso em delegar ao Congresso Nacional a competência para dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre matéria financeira, cambial e monetária, e, portanto, sobre disciplina dos juros sobre operações financeiras.
Desta feita, em não tendo havido a recepção do art. 4º, inc. IX, da lei 4.595/64 pela Constituição Federal, que atribuía competência ao Conselho Monetário Nacional para fixar a taxa de juros e, em não tendo havido regulamentação pelo Congresso Nacional, a limitação das taxas de juros deveria obedecer ao disposto no art. 1º do Decreto n. 22.626/33, que dispõe que “é vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal.”
De tal sorte, os juros remuneratórios deveriam ser fixados no patamar de 12% ao ano, já que o art. 1º do Decreto n. 22.626/33 se referia expressamente ao art. 1.062 do Código Civil de 1.916, que estabelecia que “A taxa dos juros moratórios, quando não convencionada (art. 1.262, será de 6% (seis por cento) ao ano”. Assim sendo, o limite máximo dos juros remuneratórios deveria ser de 12% ao ano, sob pena da prática de crime de usura, previsto no Decreto n. 22.626/33.
Mesmo com o advento da EC n. 40 e da súmula vinculante n. 07 do STF, continuei convicto de que os juros remuneratórios deveriam continuar limitados a 12% ao ano, por entender que embora o § 3º do art. 192 da CF tivesse sido revogado, prevaleciam em vigor as regras do Decreto n. 22.626/33, o que deveria ocorrer até que houvesse edição de norma, a ser expedida pelo Congresso Nacional, regulamentando a matéria.
Não obstante, em que pese o entendimento adotado por este relator, é forçoso reconhecer que a jurisprudência já vinha, há algum tempo, caminhando em sentido contrário, firmando convicção no sentido de que as taxas de juros admitidas são aquelas livremente pactuada, desde que não ultrapassem a taxa média de mercado.
Esse entendimento restou pacificado com a entrada em vigor da lei n. 11.672/08, que regulamentou o procedimento dos recursos repetitivos e, culminou no julgamento do Resp. 1.061.530-RS, da relatoria do Ministro Ari Pargendler (2ª seção do STJ), que tratou da questão referente aos juros remuneratórios da seguinte forma:
“a) As instituições financeira não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na lei de usura (Decreto 22.626/33), súmula 596 do STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.”
Vê-se, portanto, dentro do cenário jurídico atual que o julgado que tratar de matéria repetitiva, como é o caso dos juros remuneratórios, deverá forçosamente ser observado pelos Tribunais e Juízes singulares, com força de súmula vinculante.
Diante desta realidade, contrariar o entendimento das Cortes Superiores significa andar na contra-mão da direção, porquanto como bem salientou o Des. Dorival Renato Pavan, por ocasião do julgamento da Apelação cível n. 2009.003487-1: “(...) não adianta se irresignar contra a decisão superior, porque bastará, no recurso especial que vier a ser interposto pela parte, mero pedido de aplicação do paradigma, que será feito por despacho do Presidente do Superior tribunal de Justiça, restabelecendo a orientação e a diretriz imprimida por aquele tribunal em relação à matéria decidida. (...)” (Ac. n. 2009.003487-1, 4ª Turma Cível, julgado em 03/03/2009)
Assim, com reserva do meu entendimento pessoal, passo a analisar a questão referente aos juros remuneratórios, segundo o entendimento prevalecente no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal.
Consoante se extrai do Resp. 1061530/RS que examinou a matéria em questão, a revisão da taxa de juros deve ser admitida em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridade do julgamento em concreto.
A situação fática exposta nos autos caracteriza-se como relação de consumo e, portanto, está sujeita às regras do Código de Defesa do Consumidor, cabendo assim, a análise da abusividade da taxa contratada, a autorizar a revisão do contrato, a teor do que prevê expressamente o referido codex.
Segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça, consideram-se abusivas as taxas contratadas que excedam à taxa média de mercado.
Confira a respeito alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça:
“RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. DISPOSIÇÕES ANALISADAS DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LICITUDE DA COBRANÇA. CUMULAÇÃO VEDADA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. NECESSIDADE. 1. Não cabe ao Tribunal de origem revisar de ofício cláusulas contratuais tidas por abusivas em face do Código de Defesa do Consumidor. 2. A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado. (...) (AgRg no REsp 995990/RS, Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 02/02/2009) (destacado)
AGRAVO REGIMENTAL. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. EVENTUAL VÍCIO EXISTENTE NA CORRETA DEMONSTRAÇÃO DA CAPACIDADE POSTULATÓRIA DEVE SER ARTICULADO E PROVADO NO DEVIDO TEMPO, ISTO É, NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, OU NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE QUE A PARTE TEVE ACESSO AOS AUTOS. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA. ALEGAÇÃO DE DESERÇÃO. PREPARO DO RECURSO ESPECIAL REGULAR. AFASTAMENTO DA LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO. INAPLICABILIDADE, NO CASO, DA LEI DE USURA. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 4.595/64 E DA SÚMULA 596/STF. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE DO PERCENTUAL AVENÇADO ENTRE AS PARTES EM RELAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE E REVISÃO, PELO PODER JUDICIÁRIO, EM CADA CASO, DE EVENTUAL ABUSIVIDADE, ONEROSIDADE EXCESSIVA OU OUTRAS DISTORÇÕES NA COMPOSIÇÃO CONTRATUAL DA TAXA DE JUROS, NOS TERMOS DO CÓDIGO CIVIL. APURAÇÃO QUE DEVE SER FEITA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, À VISTA DAS PROVAS PRODUZIDAS. APLICAÇÃO DA TAXA PREVISTA NO CONTRATO. RECURSO IMPROVIDO.(AgRg no REsp 1046651/MS, Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 26/02/2009) (destacado)
Logo, se a taxa de juros prevista no contrato estiver acima da taxa média de mercado resta caracteriza a abusividade, sendo, portanto, possível a revisão do contrato e a consequente redução da taxa dos juros ao limite imposto pela taxa média de mercado.
Neste sentido a determinação do Superior Tribunal de Justiça:
“CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. PACTUAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. INCIDÊNCIA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. PRECEDENTES. 1. Ante a ausência de demonstração do percentual de juros remuneratórios contratado, prevalece a taxa média de mercado estipulada pelo Bacen nas operações da espécie. 2. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no REsp 1003938/RS, Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 02/12/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 18/12/2008)
Por consequência lógica, se a taxa prevista no contrato estiver abaixo da taxa média de mercado, assim considerada aquela prevista na data da celebração do contrato, não deve ser admitida a revisão contratual, por não restar caracterizada nenhuma abusividade, devendo, então, prevalecer a taxa estipulada no contrato, sob pena de lesão aos direitos do consumidor.
No caso vertente, não existindo meios de se apurar o valor da taxa contratada, ante a ausência de contrato nos autos, que deveria ter sido juntado pelo apelante, levando-se em conta a hipossuficiência do apelado, tenho que deve prevalecer os termos da sentença recorrida, ou seja, os juros remuneratórios devem permanecer limitados em 12% ao ano, pelas razões que passo a explicar.
A priori, cumpre esclarecer que esta posição não afronta o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, sufragado no recurso representativo da controvérsia n. 1.061.530/RS, tratando-se, na verdade, de caso atípico, que deve ser analisado sob a ética processual civil.
Nos termos do art. 333 do Código de Processo Civil:
“ Art. 333 - O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”
No caso presente, a alegação do apelado, na contestação e nas contrarrazões recursais é no sentido de que o apelante efetuou a cobrança de juros extorsivos, dos quais não há comprovação nos autos, em razão da ausência do contrato firmado entre as partes.
Considerando o disposto no inc. II do art. 333 do CPC, competia ao apelante comprovar os fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito do apeado, ou seja, deveria ter demonstrado, através da juntada do contrato entabulado entre as partes, que não procedeu nele a cobrança de juros extorsivos.
Cumpre esclarecer que os extratos de f. 12/47 não se prestam a esse fim, eis que se trata de documento produzido unilateralmente, sem qualquer participação do apelado.
Assim não procedendo, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pelo apeldo, ou seja, que houve a cobrança de juros extorsivos, razão pela qual deve ser mantido o percentual de juros fixados na sentença recorrida, qual seja, de 12% ao ano.
Da comissão de permanência:
A respeito do tema havia firmado entendimento no sentido de é indevida a cobrança comissão de permanência, quer seja cumulada ou não com outros encargos, por entender que esta possui a mesma natureza jurídica da correção monetária, sendo o resultado da taxa de capitação de recursos, pelos bancos, mais o spread e as taxas dos serviços bancários. Por ser ilegal a sua cobrança, determinava-se a sua substituição por outro índice de correção monetária para fins de atualização do saldo devedor.
Contudo, é firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que é admitida a incidência da comissão de permanência, desde que não cumulada com correção monetária, juros remuneratórios, moratórios e multa contratual.
Neste sentido as súmulas editadas pela Corte Superior:
“Súmula 296 – Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.”
“Súmula 294 – Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.”
“Súmula 30 – A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.”
A respeito, confiram-se os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO BANCÁRIO - JUROS REMUNERATÓRIOS – LIMITAÇÃO - INADMISSIBILIDADE, NA ESPÉCIE - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS - CONTRATOS FIRMADOS APÓS A EDIÇÃO DA MP Nº 1.963-17/2000 (atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001) - COBRANÇA – POSSIBILIDADE - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - LICITUDE NA COBRANÇA, DESDE QUE NÃO CUMULADA COM ENCARGOS DA MORA, JUROS REMUNERATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA – MORA DEBENDI - DESCARACTERIZAÇÃO PELA ILICITUDE DOS ENCARGOS COBRADOS NO PERÍODO DA NORMALIDADE - CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL - A ANTECIPAÇÃO DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO NÃO DESCARACTERIZA O CONTRATO - INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 293/STJ - RECURSO IMPROVIDO.” (AgRg nos EDcl no REsp 1054486/RS, Ministro MASSAMI UYEDA, 3ª Turma, Data do Julgamento, 10/02/2009 Data da Publicação/Fonte DJe 27/02/2009) (destacado)
“RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. DISPOSIÇÕES ANALISADAS DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LICITUDE DA COBRANÇA. CUMULAÇÃO VEDADA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. NECESSIDADE.
1. (...)
4. É admitida a cobrança da comissão de permanência durante o período de inadimplemento contratual, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo BACEN, limitada à taxa do contrato, não podendo ser cumulada com a correção monetária, com os juros remuneratórios e moratórios, nem com a multa contratual.
5. Agravo regimental desprovido.”(AgRg no REsp 995990/RS, Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 02/02/2009) (destacado)
Como se observa, é admissível a cobrança da comissão de permanência, desde que calculada pela taxa média do mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada, porém, à taxa contratada e, ainda, desde que cobrada isoladamente, não podendo ser cumulada com a correção monetária, juros remuneratórios, juros moratórios ou multa contratual.
Por consequência lógica, se houver cumulação da comissão de permanência com outros encargos, não deve ser admitida a sua cobrança, sob pena de incorrer em bis in idem, gerando enriquecimento sem causa ao credor.
No caso vertente, como não foi juntado aos autos a cópia do contrato, ônus este que competia ao apelante, deve ser mantida a sentença, que afastou a possibilidade de cobrança da comissão de permanência, substituindo-a pelo IGPM/FGV como índice de correção monetária.
Contudo, cumpre esclarecer que adoto o entendimento para que seja aplicado o INPC como índice de correção monetária, por se tratar de índice oficial.
O artigo 395 do Código Civil de 2002 estabelece que:
“Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”
Nesse sentido, confira-se o julgado abaixo:
E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – APLICABILIDADE DO CDC NOS CONTRATOS BANCÁRIOS – REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS – NÃO-OCORRÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DO PACTA SUNT SERVANDA E DA AUTONOMIA DA VONTADE – LIMITAÇÃO DOS JUROS EM 12% AO ANO – APLICABILIDADE DA LEI DE USURA (DECRETO Nº 22.626/33) – INADMISSIBILIDADE DA COBRANÇA DE COMISSÃO CUMULADA – APLICAÇÃO DO INPC COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIOR DE FORMA SIMPLES – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NOS TERMOS DO ART. 20, § 4.º, DO CPC – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(...).
5. Deve ser afastada a cláusula contratual que prevê a incidência da comissão de permanência, cumulado ou não com outros encargos, ante a manifesta ilegalidade. O índice adotado para correção monetária é o INPC (índice oficial).
6. É justo que ocorra a repetição do que eventualmente tenha sido pago indevidamente pelo apelante, contudo, tal devolução deve ocorrer de forma simples, e não em dobro.
7. O § 4º do art. 20 do CPC expressa que os honorários advocatícios devem ser fixados por eqüidade e na consideração aos fatos referidos no § 3º do mesmo dispositivo, tratando-se, portanto, de eqüidade jurídica.” (Apelação Cível nº 2007.031098-8. Rel. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo. Terceira Turma cível. J: 12.11.2007).
Contudo, como o apelado não se insurgiu contra a fixação do IGPM/FGV como índice de correção monetária, não há falar em reforma da sentença.
Ressalte-se que os documentos colacionados aos autos são insuficientes para se aferir, com certeza, que não houve a cobrança da comissão de permanência, o que deve ser apurado, portanto, em liquidação de sentença.
Da capitalização de juros:
A regra do artigo 4º do Decreto 22.626/33, plenamente em vigor, estabelece que:
“Art. 4º: É proibido contar juros dos juros. Esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.”
Tal prática, denominada anatocismo, é expressamente vedada pelo nosso ordenamento jurídico, tanto que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 121, determinando que “é vedado a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada.”
Prevalece entendimento dominante de que a capitalização de juros só é admissível quando legislação especial a autorizar, como é o caso do Decreto-Lei nº 167/67 (artigo 5º), que dispõe sobre títulos de crédito rural, do Decreto-Lei nº 413/69 (artigo 5º c/c 14, VI), que dispõe sobre títulos de crédito industrial e da Lei nº 6.840/80 (artigo 5º), que dispõe sobre títulos de crédito comercial, sendo que todas prevêem a capitalização semestral. Fora dessas hipóteses vigora a regra da capitalização anual (Decreto nº 22.626/33).
Neste sentido o entendimento atual desta Corte:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO E ANULAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS C/C CONSTITUTIVA DE DIREITOS, COMPENSAÇÃO DE PAGAMENTOS INDEVIDOS – SENTENÇA QUE AFASTOU A CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS DEVENDO SER ANUAL E DETERMINOU A SUBSTITUIÇÃO DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA PELO IGPM/FGV, COM A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIS – MANTIDA – IMPOSSIBILIDADE DA INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR DA AÇÃO REVISIONAL NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – RECURSO IMPROVIDO.
1 - A capitalização diária, mensal e semestral de juros somente é permitida nos casos de crédito rural, comercial e industrial e quando houver previsão contratual, devendo ser afastada sua incidência nos demais contratos bancários, sendo devida, no caso dos autos, somente a capitalização anual.(...) (Apelação Cível N. 2009.003861-1/0000-00, Rel. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, 12.3.2009, Quinta Turma Cível) (destacado)
“E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO, C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – JUROS REMUNERATÓRIOS LIMITADOS EM 12% AO ANO – CAPITALIZAÇÃO ANUAL – SUBSTITUIÇÃO DA COMISSÃO PERMANÊNCIA PELO IGPM – NÃO CONHECIDO O RECURSO QUANTO À MULTA CONTRATUAL – RECURSO IMPROVIDO.
(...)
Ainda que se diga que a Medida Provisória nº 1.963-17/2000 tenha permitido, a partir de sua publicação, a aplicação dos juros em período inferior a um ano, por certo que, com a entrada em vigor do Código Civil/2002, ou seja, janeiro/2003, houve a revogação tácita do artigo 5º. da referida MP, atingindo as faturas de cartão de crédito desde então, em razão do teor do artigo 591 da nova legislação. Por isso, a capitalização seja dos juros não poderá ser inferior a um ano.(...) (AC N. 2006.000355-4/0000-00, Rel. Des. Sideni Soncini Pimentel, 12.3.2009, Quinta Turma Cível) (destacado)
“E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – CONTRATO DE FINANCIAMENTO – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – CLÁUSULAS ABUSIVAS – POSSIBILIDADE DE REVISÃO – JUROS REMUNERATÓRIOS – CONTRATO QUE FIXA OS JUROS EM 2,07% AO MÊS – INFERIORIDADE À TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL – INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE – MANUTENÇÃO DOS JUROS PREVISTOS NO CONTRATO – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS REMUNERATÓRIOS – VEDADA – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – COBRANÇA INDEVIDA – IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OUTROS ENCARGOS – CORREÇÃO PELO IGPM-FGV – PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO – IMPROCEDENTE – CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – INSUFICÊNCIA DOS VALORES DEPOSITADOS – PROCEDÊNCIA PARCIAL – RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ).
O princípio pacta sunt servanda não é absoluto, devendo ser interpretado de forma relativa, em virtude do caráter público das normas violadas no contrato, possibilitando, portanto, a revisão das cláusulas havidas por abusivas e ofensivas à legislação nacional, em especial o Código de Defesa do Consumidor, Código Civil e o Decreto 22.626/33.
Seguindo a linha perfilhada pelo colegiado Superior, que tem na Constituição Federal a fonte primária de sua competência e, agora, legalmente autorizado pelo artigo 543-C do CPC a decidir sobre os recursos especiais repetitivos, não mais se deve aplicar o entendimento de que os juros remuneratórios estão delimitados em 12% ao ano, mas sim devem ser havidos como os da taxa média de mercado.
A capitalização dos juros, mesmo que convencionada, não pode ser mensal, até porque os juros estão sendo mantidos à taxa estipulada no contrato, fato que proporciona ampla compensação financeira ao credor. Capitalização determinada como sendo tão somente anual, haja ou não pacto expresso em sentido contrário, até mesmo pelo fato de que a cláusula respectiva não foi redigida com destaque para alertar o devedor quanto a sua instituição, sendo assim de nenhuma valia. (...)” (AC N. 2009.003487-1/0000-00, Rel. Des. Dorival Renato Pavan, 3.3.2009, Quarta Turma Cível)
"E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E COMPENSAÇÃO DE VALORES – APLICAÇÃO DO CDC – ATO JURÍDICO PERFEITO – PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA – RELATIVIDADE – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – LIMITAÇÃO – IMPERIOSIDADE – LEI DE USURA – APLICABILIDADE DO DECRETO-LEI Nº 22.626/33 ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS – PATAMAR DE 12% AO ANO – CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA, MENSAL E SEMESTRAL DE JUROS – VEDADA – COMPENSAÇÃO DE VALORES – POSSIBILIDADE – SENTENÇA CONFIRMADA – RECURSO IMPROVIDO.
O princípio pacta sunt servanda não é absoluto, podendo ser relativizado em virtude do caráter público das normas violadas no contrato.
Reputam-se abusivas as cláusulas contratuais que colocam o consumidor em posição de desvantagem em relação ao fornecedor e a que deixa ao alvedrio do fornecedor a fixação da taxa de juros sem o conhecimento prévio e adequado do consumidor.
As normas contidas no Decreto Nº 22.626/33 revelam-se aplicáveis aos litígios que envolvem entidades bancárias, realidade fática que torna necessária a limitação da taxa de juros ao percentual de 12% (doze por cento) ao ano.
É vedada a capitalização mensal ou diária de juros, ainda que expressamente convencionada. (...)” (AC N. 2009.001468-0/0000-00, Rel.Des. Rêmolo Letteriello, 10.2.2009, Quarta Turma Cível) (destacado)
No tocante à Medida Provisória nº 2.170-36/2001, comungo do entendimento de que referida medida constitui verdadeira afronta ao Código de Defesa do Consumidor, ao estabelecer a cobrança de juros sobre juros, em seu artigo 5°.
Em recente julgado de n° 2007.002435-5, em que atuei como revisor, acompanhando o entendimento do relator Des. Paulo Alfeu Puccinelli, restou consignado a respeito do tema:
“(...) que a Medida Provisória n. 1963-17/2000 e Medida Provisória n. -36/2001, que teriam autorizado a capitalização mensal de juros e, portanto, seria fundamento de muitas instituições financeiras para a prática do anatocismo, ao meu ver, encontra verdadeira afronta ao Código de Defesa do Consumidor – Lei n. 8.078/90, uma vez que o anatocismo estabelece a cobrança de juros sobre juros, o que coloca o consumidor em evidente prejuízo, contrariando as normas consumeiristas.
Além do mais, apenas para argumentar, tenho que tal medida provisória não tem nenhuma validade por lhe faltar um de seus requisitos, qual seja, a urgência de sua matéria, já que, ao meu ver, a legalização de uma conduta que beneficia tão somente as instituições financeiras não se apresenta como urgente para a sociedade. Vale dizer, o teor da medida provisória que liberou a prática do anatocismo não é urgente para os interesses da sociedade; urgente ele é, porém, para os bancos, com inúmeras ações, contestando a ilegalidade do anatocismo, sendo julgadas procedentes, a mudança da legislação! (Bruno Matos e Silva, in Anatocismo Legalizado: Medida Provisória beneficia as já poderosas instituições financeiras, artigo publicado em http://www.brunosilva.adv.br/anat-leg.htm).
Assim, tenho que é ilegal e imoral a capitalização mensal de juros, de forma que a sentença monocrática deve ser reformada.”
Assim, não merece reforma a sentença recorrida, eis que afastou a incidência da capitalização mensal, admitindo apenas a anual.
Da multa contratual:
No que se refere â multa contratual, vê-se que o contrato fixou-a, na cláusula 5.9, em 2%, nos termos do que dispõe o Código de Defesa do Consumidor.
Como a sentença apenas afastou a possibilidade de cobrança da multa contratual em percentual superior a 2%, falece ao apelante interesse recursal, eis que a multa será mantida nos termos contratado.
Assim sendo, não conheço do recurso nesta parte.
Pelo exposto, conheço em parte do recurso interposto e no mérito nego-lhe provimento, mantendo incólume a sentença recorrida.
DECISÃO
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, CONHECERAM EM PARTE DO RECURSO E, NESTA EXTENSÃO, NEGARAM-LHE PROVIMENTO.
Presidência do Exmo. Sr. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo.
Relator, o Exmo. Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Rubens Bergonzi Bossay, Oswaldo Rodrigues de Melo e Ildeu de Souza Campos.
Campo Grande, 21 de setembro de 2009.
Apelação Cível - Ordinário - N. 2009.022658-4/0000-00 - Campo Grande.
Relator - Exmo. Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay.
Apelante - Banestado Administradora de Cartoes de Credito Ltda.
Advogada - Nilza Ramos.
Apelado - Antonio Gentil Rodrigues.
Def. Públ. - Salete de Fátima Nascimento.
E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO “DUTY TO MITIGATE THE LOSS” – CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO – CONTRATO DE ADESÃO – APLICABILIDADE DO CDC – REVISÃO DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS – POSSIBILIDADE – JUROS REMUNERATÓRIOS – CÓPIA DO CONTRATO – AUSÊNCIA – APLICAÇÃO DO ART. 333 DO CPC – MANUTENÇÃO DA LIMITAÇÃO DOS JUROS EM 12% AO ANO – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE AVERIGUAÇÃO DA SUA COBRANÇA CUMULADA COM OUTROS ENCARGOS – INEXISTÊNCIA DE CÓPIA DO CONTRATO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE AFASTOU A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – PRÁTICA ILEGAL – ANATOCISMO – SÚMULA 121 DO STF – USURA – MULTA – 2% – FALTA DE INTERESSE RECURSAL – RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO.
Se a instituição financeira permanece inerte por longo período, aguardando que a dívida atinja montantes astronômicos, impõe-se-lhe a aplicação do princípio denominado duty to mitigate the loss, que impõe, nestes casos, por penalidade, a redução do crédito do mutuário deveria, nos termos do princípio da boa-fé objetiva, evitar o agravamento do próprio prejuízo.
Nos termos da súmula 297 do STJ e precedentes do Supremo Tribunal Federal, O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
O contrato de cartão de crédito é considerado de adesão, eis que resulta da padronização e uniformização das cláusulas contratuais realizadas pela instituição financeira, as quais o consumidor é obrigado a aceitá-las em bloco, em seu prejuízo.
Na esteira do entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, levando-se em consideração a situação jurídica específica do contrato, é de se admitir a revisão das cláusulas consideradas abusivas pelo Código de Defesa do Consumidor.
Se os juros remuneratórios contratados excedem a taxa média de mercado, fixada pelo Banco Central do Brasil, fica autorizada a revisão contratual, eis que caracterizada a abusividade, devendo os juros serem reduzidos ao valor da taxa média de mercado.
Outrossim, quando a instituição financeira não comprova os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor, demonstrando que a taxa de juros por ele cobrada não é extorsiva, mantém-se a fixação dos juros em 12%, nos termos da sentença.
Mantém-se a sentença recorrida que afastou a possibilidade de cobrança da comissão de permanência se não houver nos autos cópia do contrato, permitindo aferir se a sua cobrança foi cumulada com outros encargos.
A capitalização mensal de juros, denominada anatocismo, é prática vedada pelo nosso ordenamento jurídico, a exemplo do que ocorre com o art. 13 do Decreto nº 22.626/33, tanto que o STF editou a súmula 121, que estabelece ser vedada a capitalização de juros.
Se a sentença apenas afasta a possibilidade de cobrança da multa em percentual superior a 2%, nos termos contratado, carece o autor de interesse recursal.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Terceira Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento.
Campo Grande, 21 de setembro de 2009.
Des. Rubens Bergonzi Bossay – Relator
RELATÓRIO
O Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay
Trata-se de apelação cível interposta por Banestado Administradora de Cartões de Crédito Ltda., inconformado com a sentença prolatada pelo Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande, nos autos da Ação de Cobrança que move em face de Antonio Gentil Rodrigues, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Diante do exposto e por tudo mais que dos autos constam, julgo parcialmente procedente o pedido inicial formulado por Banestado Adminstradora de Cartões de Crédito em desfavor de Antônio Gentil Rodrigues, razão pela qual condeno o réu no pagamento dos valores a serem apurados em liquidação de sentença, excluíndo-se do quantum debeatur os percentuais alusivos às cláusulas escorchantes existentes no contrato de cartão de crédito celebrado entre as partes, assim consideradas as que fixam juros superiores a 12% ao ano, que permitem sua capitalização mensal, estabelecem a cobrança de comissão de permanência, de multa moratória superior a 2% e correção monetária por qualquer outro índice que não seja o do IGPM/FGV.
Em razão disso, no período que compreende 20/01/1997 a 20/08/1999, há de incidir juros de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de mora de 2% (dois pontos percentuais). Ante a inércia da instituição financeira e em face a aplicação do princípio duty the mitigate the loss, no interregno temporal de 21/08/1999 a 11/11/2004 o quantum debeatur não deverá sofrer qualquer correção (seja no tocante a juros, correção monetária e/ou multa moratória). A partir da propositura da demanda, outrossim, ou seja, a partir de 12 de novembro de 2004 até a data do efetivo pagamento, deverão incidir, novamente, juros no percentual de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de 2% dois pontos percentuais.
Declaro, demais disso, com esteio nos artigos 47 e 51, inciso IV, da Lei 8.078/90, e, bem assim, por força do artigo 422 do Código Civil, a nulidade das cláusulas contratuais que estabeleceram a cobrança de encargos contratuais que diferem dos parâmetros fixados por esta sentença e por ela expressamente mencionados.
Via de conseqüência o feito tem seu mérito resolvido a par do que determina o art. 269, I do Código de Processo Civil.”
Sustenta o apelante que o fato do banco ter permanecido inerte no período de 21/08/1999 a 11/11/2004, não autoriza o afastamento da correção monetária e os encargos da mora, mesmo porque não permaneceu inerte, mas tentava receber amigavelmente o seu crédito.
Argumenta que deixar de aplicar correção monetária, juros moratórios e multas no período mencionado favorece o enriquecimento ilícito do apelado às custas do apelante, norma esta contida no art. 884 do Código Civil.
Afirma que o contrato de cartão de crédito é simples contrato-tipo, que possibilita a padronização de procedimentos da autora, essencial na atual fase de desenvolvimento e complexidade da economia.
Com relação aos juros remuneratórios, afirma que a lei 4.595/64, em vigor, revogou o Decreto-Lei 22.626/33 no tocante à limitação dos juros, tendo sido delegado ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para regular as taxas de juros aplicadas pelas instituições financeiras.
Em relação à capitalização de juros, sustenta o apelante que negou a sua prática, razão pela qual não merece discussão a este respeito.
No que tange à comissão de permanência, assevera que não realizou a sua cobrança, sendo que não constam das faturas e mesmo que houvesse cobrado, não haveria nenhuma ilegalidade, eis que nos termos da Resolução nº 1.129 e 1.572 do Conselho Monetário Nacional, editadas com o amparo da lei n. 4.595/64, a cobrança da comissão é facultada no âmbito do mercado financeiro.
Já em relação à multa contratual, aduz que foi convencionada em 2% (cláusula 5.9) e não cobrada.
Requer o provimento do recurso para reformar a sentença nos pontos abordados, impondo-se o ônus da sucumbência ao réu.
Em contrarrazões, o apelado manifesta-se pelo improvimento do recurso.
VOTO
O Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay (Relator)
Trata-se de apelação cível interposta por Banestado Administradora de Cartões de Crédito Ltda., inconformado com a sentença prolatada pelo Juiz da 5ª Vara Cível da Comarca de Campo Grande, nos autos da Ação de Cobrança que move em face de Antonio Gentil Rodrigues, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, nos seguintes termos: “Diante do exposto e por tudo mais que dos autos constam, julgo parcialmente procedente o pedido inicial formulado por Banestado Adminstradora de Cartões de Crédito em desfavor de Antônio Gentil Rodrigues, razão pela qual condeno o réu no pagamento dos valores a serem apurados em liquidação de sentença, excluíndo-se do quantum debeatur os percentuais alusivos às cláusulas escorchantes existentes no contrato de cartão de crédito celebrado entre as partes, assim consideradas as que fixam juros superiores a 12% ao ano, que permitem sua capitalização mensal, estabelecem a cobrança de comissão de permanência, de multa moratória superior a 2% e correção monetária por qualquer outro índice que não seja o do IGPM/FGV.
Em razão disso, no período que compreende 20/01/1997 a 20/08/1999, há de incidir juros de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de mora de 2% (dois pontos percentuais). Ante a inércia da instituição financeira e em face a aplicação do princípio duty the mitigate the loss, no interregno temporal de 21/08/1999 a 11/11/2004 o quantum debeatur não deverá sofrer qualquer correção (seja no tocante a juros, correção monetária e/ou multa moratória). A partir da propositura da demanda, outrossim, ou seja, a partir de 12 de novembro de 2004 até a data do efetivo pagamento, deverão incidir, novamente, juros no percentual de 1% ao mês, correção monetária pelo IGPM/FGV e multa de 2% dois pontos percentuais.
Declaro, demais disso, com esteio nos artigos 47 e 51, inciso IV, da Lei 8.078/90, e, bem assim, por força do artigo 422 do Código Civil, a nulidade das cláusulas contratuais que estabeleceram a cobrança de encargos contratuais que diferem dos parâmetros fixados por esta sentença e por ela expressamente mencionados.
Via de conseqüência o feito tem seu mérito resolvido a par do que determina o art. 269, I do Código de Processo Civil.”
Aplicação do princípio “duty to mitigate the loss”:
Inicialmente, irresigna-se o apelante contra a aplicação do princípio denominado “duty to mitigate the loss” (mitigação do prejuízo pelo próprio credor), que culminou no afastamento da cobrança de qualquer encargo, tais como juros, correção nonetária ou multa moratória, no período de 21/08/1999 a 11/11/2004, período em que o apelado incidiu em mora e a interposição da presente ação.
Antes de adentrar na análise propriamente dessa matéria, passo a tecer alguns comentários a respeito do princípio denominado “duty to mitigate the loss” (mitigação do prejuízo pelo próprio credor).
Segundo os ensinamentos do mestre Flávio Tartuce, citando Vera Maria Jacob Fradera, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, esta é uma das construções inovadoras do Novo Código Civil e esta diretamente relacionada com o princípio da boa-fé objetiva, “uma vez que a mitigação do próprio prejuízo constituiria um dever de natureza acessória, um dever anexo, derivado da boa conduta que deve existir entre os negociantes.” (Direito Civil, Ed. Método, pág. 111)
Aliás, a respeito da tese em questão já foi aprovado o Enunciado 169 na III Jornada de Direito Civil, verbis:
“o princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo.”
Como esclareceu com muita propriedade o mestre Flávio Tartuce, “(...) não pode a instituição financeira permanecer inerte, aguardando que, diante da alta taxa de juros prevista no instrumento contratual, a dívida atinja montantes astronômicos.” (Direito Civil, Ed. Método, pág. 112)
Exatamente esta a situação dos autos, eis que o Contrato de Emissão e Utilização dos Cartões de Crédito Banestado Visa, n. 491415208964600, firmado em 17.12.1996, segundo alegações do próprio apelante, não teve as suas fatura pagas desde o dia 20/8/1999 (f. 11).
Contudo, o apelante aguardou até 12/11/2004 para tomar alguma atitude quanto ao recebimento do seu crédito, o que ocorreu com a interposição desta ação, o que implicou na evolução do saldo devedor de R$ 19.196,26 para R$ 50.151,76 (cálculo efetuado em 07/10/2004).
Como dito acima, em nome do princípio da boa-fé objetiva, que deve prevalecer entre as partes contratantes, deveria o apelante ter efetuado a cobrança do encargo tão logo o apelado deixou de efetuar os pagamentos, evitando com isso a elevação da dívida a montantes astronômicos, como é o caso dos autos.
Nesses casos, menciona o mestre Flávio Tartuce, em citação à professora Vera Jacob Fradera, que em casos tais envolvendo o duty to mitigate the loss, a professora propõe que o “não atendimento a tal dever traria como consequência sanções ao credor, principalmente a imputação de culpa próxima à culpa delitual, com o pagamento de eventuais perdas e danos, ou a redução do seu próprio crédito.” ((Direito Civil, Ed. Método, pág. 113)
Assim considerando, mostra-se razoável a redução do crédito do apelante no período compreendido de 20/01/1997 a 20/08/1999, não havendo se falar em enriquecimento ilícito neste caso, porquanto a penalidade decorre da própria inércia do apelante, que não obedeceu ao princípio da boa-fé que deve prevalecer nas relações contratuais, tendo se valido das vantagens decorrentes da demora na interposição da presente ação.
Cartão de Crédito – Contrato de adesão/aplicação do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras/Revisão Contratual:
Em sequência, discute que o contrato de cartão de crédito não é de adesão, mas simples contrato-tipo, que possibilita a padronização de procedimentos da autora, essencial na atual fase de desenvolvimento e complexidade da economia.
De igual modo, não assiste razão ao apelante.
Cumpre esclarecer, a priori, que é perfeitamente admissível a aplicação do CDC às relações bancárias, como é o caso dos autos, onde o contrato entabulado entre as partes é denominado contrato de adesão, onde, segundo o mestre Rizzatto Nunes, “as suas cláusulas são estipuladas unilateralmente (no caso, pelo fornecedor), cabendo à outra parte (aqui o consumidor) aquiescer a seus termos, aderindo a ele.” (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 3ª edição, Ed. Saraiva, pág. 552)
Essa antiga discussão já resultou na súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:
“Súmula 297 - Ó Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”
Diverso não é o entendimento da Corte Suprema:
“EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL. Esta Corte, no julgamento da ADI 2.591, considerou aplicáveis às instituições financeiras as normas constantes do Código de Defesa do Consumidor. Entretanto, a análise da onerosidade excessiva da taxa fixada no contrato é vedada pelo contido na Súmula 279 desta Corte. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AI-AgR 608884/RS, rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Julgamento: 09/12/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma) (destacado)
Ao contrário do que sustenta o apelante, o contrato de cartão de crédito se apresenta como de adesão. Isto porque a atividade bancária, em decorrência da multiplicidade de clientes e por razões de ordem econômica, impõe a necessidade de padronização e uniformização das cláusulas contratuais e, nestes casos, o consumidor se vê obrigado a aceitá-las em bloco, o que na maioria das vezes lhe resulta prejuízos, porque se tratam de cláusulas abusivas, que restringem os seus direitos.
Tanto é verdade que dos autos só consta o contrato padrão de utilização dos cartões de crédito Banestado (f. 06-10), onde não se vê a participação do apelado, tratando-se de cláusulas previamente estabelecidas pela instituição financeira.
Portanto, em se tratando de contrato de adesão, passível a sua revisão à luz do Código de Defesa do Consumidor, até porque, a parte apelada, em sede de contestação, requereu expressamente a sua revisão (f. 112/113).
O inc. V do art. 6º do Código de Defesa do Consumidor estabelece expressamente que são direitos básicos do consumidor “a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou a sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.”
Assim sendo, havendo desequilíbrio entre as partes contratantes, impõe-se a revisão do contrato pela parte hipossuficiente, excluindo-se as cláusulas desfavoráveis, restabelecendo o equilíbrio contratual, conforme cada situação específica, como vêm sinalizando o Superior Tribunal de Justiça em diversos julgados:
“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INCIDÊNCIA DO CDC. REVISÃO DE CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INACUMULABILIDADE COM QUAISQUER OUTROS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS OU MORATÓRIOS. MANUTENÇÃO DO BEM NA POSSE DO DEVEDOR. DEPÓSITO PARCIAL. VALORES INCONTROVERSOS. CABIMENTO. COMPENSAÇÃO/RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO. POSSIBILIDADE. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. MULTA, ART. 557, § 2º, DO CPC. I. Aplicam-se às instituições financeiras as disposições do Código de Defesa do Consumidor, no que pertine à possibilidade de revisão dos contratos, conforme cada situação específica. (...) VII. Agravo improvido.” (AgRg no REsp 1025842/RS, Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, 4ª Turma, Data do Julgamento 15/05/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 23/06/2008)
“CIVIL E PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. MEDIDA PROVISÓRIA. N. 2.170-36. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS N. 282 E 356-STF. INCIDÊNCIA DO CDC. REVISÃO DE CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. INACUMULABILIDADE COM QUAISQUER OUTROS ENCARGOS REMUNERATÓRIOS OU MORATÓRIOS. TEMAS PACIFICADOS. RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. MULTA, ART. 557, § 2º, DO CPC. I. Inviável o inconformismo atinente à questão da capitalização mensal dos juros com fundamento na Medida Provisória n. 2.170-36, matéria que não foi tratada pelo Tribunal de origem, razão pela qual incidem, no particular, as Súmulas n. 282 e 356-STF. II. Aplicam-se às instituições financeiras as disposições do Código de Defesa do Consumidor, no que pertine à possibilidade de revisão dos contratos, conforme cada situação específica. (...) V. Agravo improvido.” (AgRg no REsp 1021161/RS, Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, Data do Julgamento 17/04/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 05/05/2008) (destacado)
Esse entendimento termina por demonstrar que princípios como o pacta sunt servanda”, o da autonomia da vontade, da intangibilidade e da força obrigatória dos contratos, embora revestidos de grande importância, não se encontram revestidos do caráter absoluto que possuíam anteriormente, sendo este o resultado da nova visão açambarcada pelo Código de Defesa do Consumidor, que passou a priorizar o interesse público e o bem comum.
Diverso não é o entendimento desta Corte:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA REVISIONAL DE DÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E COMPENSAÇÃO DE VALORES PAGOS – CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – APLICABILIDADE DO CDC NOS CONTRATOS BANCÁRIOS – REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS – NÃO-OCORRÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DO PACTA SUNT SERVANDA E DA AUTONOMIA DA VONTADE – LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO – APLICABILIDADE DA LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33) – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS E COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – VEDAÇÃO – MULTA CONTRATUAL – LIMITAÇÃO EM 2%, NOS TERMOS DO ARTIGO 52, § 1º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RESTITUIÇÃO OU COMPENSAÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE DE FORMA SIMPLES – CONSIGNAÇÃO DOS VALORES – PROCEDENTE ATÉ OS VALORES CONSIGNADOS EM JUÍZO – PREQUESTIONAMENTO – DESNECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO EXPRESSA DO ACÓRDÃO SOBRE OS DISPOSITIVOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS DEBATIDOS – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos casos que envolvem relação de consumo, tais como empréstimos bancários. Dessa forma, é permitida a revisão das cláusulas contratuais pactuadas, mormente em face do fato de que o princípio do pacta sunt servanda, há muito vêm sofrendo mitigações, mormente quanto aos princípios da boa-fé objetiva, da função social dos contratos e do dirigismo contratual.
(...)” (TJMS. Apelação Cível nº 2007.031457-7. Rel. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo. Terceira Turma Cível. J: 19.11.2007). (destacado)
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA E REVISIONAL DE DÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA – POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – TAXA DE JUROS LIMITADA EM 12% AO ANO – INCIDÊNCIA DO ARTIGO 1º DO DECRETO N° 22.626/33 – CAPITALIZAÇÃO ANUAL – COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – VEDADA – SUBSTITUIÇÃO PELO IGPM-FGV – COMPENSAÇÃO DOS VALORES EVENTUALMENTE PAGOS A MAIOR – RECURSO PROVIDO.
Ante a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários, tornou-se possível a revisão das cláusulas contratuais desconformes com o ordenamento jurídico, ficando, portanto, mitigado o princípio do pacta sunt servanda.
(...)” (TJMS. Apelação Cível nº 2007.022988-3. Des. Paulo Alfeu Puccinelli. Terceira Turma Cível. J: 15.10.2007). (destacado)
Desta feita, levando-se em consideração a situação específica do contrato, é de se admitir a revisão das cláusulas consideradas abusivas pelo Código de Defesa do Consumidor, com o fito de restabelecer o equilíbrio contratual.
Dos juros remuneratórios:
Com relação aos juros remuneratórios, tenho que a sentença deve ser mantida, mas por fundamentos diversos.
A respeito dos juros remuneratórios havia firmado entendimento no sentido de que a lei n. 4.595/64, que regula o Sistema Monetário Nacional, não havia sido totalmente recepcionada pela Constituição Federal, já que esta dispôs em seu art. 25, do ADCT que, “Ficam revogados, a partir de cento e oitenta dias da promulgação da Constituição, sujeito este prazo a prorrogação por lei, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional.”
Com a entrada em vigor do mencionado preceito legal, houve a revogação de todos os dispositivos que atribuíam ao Conselho Monetário Nacional competência para regulamentar a taxa de juros cobrada pelas instituições financeiras, passando tal estipulação a ser exercida pelo Congresso Nacional, segundo entendimento exarado no inc. XIII do art. 48, que estabelece que “Cabe ao Congresso Nacional (...) dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:
Inc. XIII – Matéria Financeira, Cambial e Monetária, Instituições Financeiras e suas operações.”
Assim sendo, mesmo que se considere que o prazo previsto no art. 25 do ADCT tenha sido prorrogado pelo disposto no art. 1º da lei 8.392/91, o inc. XIII do art. 48 é expresso em delegar ao Congresso Nacional a competência para dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre matéria financeira, cambial e monetária, e, portanto, sobre disciplina dos juros sobre operações financeiras.
Desta feita, em não tendo havido a recepção do art. 4º, inc. IX, da lei 4.595/64 pela Constituição Federal, que atribuía competência ao Conselho Monetário Nacional para fixar a taxa de juros e, em não tendo havido regulamentação pelo Congresso Nacional, a limitação das taxas de juros deveria obedecer ao disposto no art. 1º do Decreto n. 22.626/33, que dispõe que “é vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal.”
De tal sorte, os juros remuneratórios deveriam ser fixados no patamar de 12% ao ano, já que o art. 1º do Decreto n. 22.626/33 se referia expressamente ao art. 1.062 do Código Civil de 1.916, que estabelecia que “A taxa dos juros moratórios, quando não convencionada (art. 1.262, será de 6% (seis por cento) ao ano”. Assim sendo, o limite máximo dos juros remuneratórios deveria ser de 12% ao ano, sob pena da prática de crime de usura, previsto no Decreto n. 22.626/33.
Mesmo com o advento da EC n. 40 e da súmula vinculante n. 07 do STF, continuei convicto de que os juros remuneratórios deveriam continuar limitados a 12% ao ano, por entender que embora o § 3º do art. 192 da CF tivesse sido revogado, prevaleciam em vigor as regras do Decreto n. 22.626/33, o que deveria ocorrer até que houvesse edição de norma, a ser expedida pelo Congresso Nacional, regulamentando a matéria.
Não obstante, em que pese o entendimento adotado por este relator, é forçoso reconhecer que a jurisprudência já vinha, há algum tempo, caminhando em sentido contrário, firmando convicção no sentido de que as taxas de juros admitidas são aquelas livremente pactuada, desde que não ultrapassem a taxa média de mercado.
Esse entendimento restou pacificado com a entrada em vigor da lei n. 11.672/08, que regulamentou o procedimento dos recursos repetitivos e, culminou no julgamento do Resp. 1.061.530-RS, da relatoria do Ministro Ari Pargendler (2ª seção do STJ), que tratou da questão referente aos juros remuneratórios da seguinte forma:
“a) As instituições financeira não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na lei de usura (Decreto 22.626/33), súmula 596 do STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.”
Vê-se, portanto, dentro do cenário jurídico atual que o julgado que tratar de matéria repetitiva, como é o caso dos juros remuneratórios, deverá forçosamente ser observado pelos Tribunais e Juízes singulares, com força de súmula vinculante.
Diante desta realidade, contrariar o entendimento das Cortes Superiores significa andar na contra-mão da direção, porquanto como bem salientou o Des. Dorival Renato Pavan, por ocasião do julgamento da Apelação cível n. 2009.003487-1: “(...) não adianta se irresignar contra a decisão superior, porque bastará, no recurso especial que vier a ser interposto pela parte, mero pedido de aplicação do paradigma, que será feito por despacho do Presidente do Superior tribunal de Justiça, restabelecendo a orientação e a diretriz imprimida por aquele tribunal em relação à matéria decidida. (...)” (Ac. n. 2009.003487-1, 4ª Turma Cível, julgado em 03/03/2009)
Assim, com reserva do meu entendimento pessoal, passo a analisar a questão referente aos juros remuneratórios, segundo o entendimento prevalecente no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal.
Consoante se extrai do Resp. 1061530/RS que examinou a matéria em questão, a revisão da taxa de juros deve ser admitida em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridade do julgamento em concreto.
A situação fática exposta nos autos caracteriza-se como relação de consumo e, portanto, está sujeita às regras do Código de Defesa do Consumidor, cabendo assim, a análise da abusividade da taxa contratada, a autorizar a revisão do contrato, a teor do que prevê expressamente o referido codex.
Segundo precedentes do Superior Tribunal de Justiça, consideram-se abusivas as taxas contratadas que excedam à taxa média de mercado.
Confira a respeito alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça:
“RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. DISPOSIÇÕES ANALISADAS DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LICITUDE DA COBRANÇA. CUMULAÇÃO VEDADA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. NECESSIDADE. 1. Não cabe ao Tribunal de origem revisar de ofício cláusulas contratuais tidas por abusivas em face do Código de Defesa do Consumidor. 2. A alteração da taxa de juros remuneratórios pactuada em mútuo bancário depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado. (...) (AgRg no REsp 995990/RS, Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 02/02/2009) (destacado)
AGRAVO REGIMENTAL. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. EVENTUAL VÍCIO EXISTENTE NA CORRETA DEMONSTRAÇÃO DA CAPACIDADE POSTULATÓRIA DEVE SER ARTICULADO E PROVADO NO DEVIDO TEMPO, ISTO É, NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, OU NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE QUE A PARTE TEVE ACESSO AOS AUTOS. PRECLUSÃO. INEXISTÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA. ALEGAÇÃO DE DESERÇÃO. PREPARO DO RECURSO ESPECIAL REGULAR. AFASTAMENTO DA LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO. INAPLICABILIDADE, NO CASO, DA LEI DE USURA. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 4.595/64 E DA SÚMULA 596/STF. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE DO PERCENTUAL AVENÇADO ENTRE AS PARTES EM RELAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE DE CONTROLE E REVISÃO, PELO PODER JUDICIÁRIO, EM CADA CASO, DE EVENTUAL ABUSIVIDADE, ONEROSIDADE EXCESSIVA OU OUTRAS DISTORÇÕES NA COMPOSIÇÃO CONTRATUAL DA TAXA DE JUROS, NOS TERMOS DO CÓDIGO CIVIL. APURAÇÃO QUE DEVE SER FEITA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS, À VISTA DAS PROVAS PRODUZIDAS. APLICAÇÃO DA TAXA PREVISTA NO CONTRATO. RECURSO IMPROVIDO.(AgRg no REsp 1046651/MS, Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008 Data da Publicação/Fonte DJe 26/02/2009) (destacado)
Logo, se a taxa de juros prevista no contrato estiver acima da taxa média de mercado resta caracteriza a abusividade, sendo, portanto, possível a revisão do contrato e a consequente redução da taxa dos juros ao limite imposto pela taxa média de mercado.
Neste sentido a determinação do Superior Tribunal de Justiça:
“CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. PACTUAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. INCIDÊNCIA DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. PRECEDENTES. 1. Ante a ausência de demonstração do percentual de juros remuneratórios contratado, prevalece a taxa média de mercado estipulada pelo Bacen nas operações da espécie. 2. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no REsp 1003938/RS, Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 02/12/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 18/12/2008)
Por consequência lógica, se a taxa prevista no contrato estiver abaixo da taxa média de mercado, assim considerada aquela prevista na data da celebração do contrato, não deve ser admitida a revisão contratual, por não restar caracterizada nenhuma abusividade, devendo, então, prevalecer a taxa estipulada no contrato, sob pena de lesão aos direitos do consumidor.
No caso vertente, não existindo meios de se apurar o valor da taxa contratada, ante a ausência de contrato nos autos, que deveria ter sido juntado pelo apelante, levando-se em conta a hipossuficiência do apelado, tenho que deve prevalecer os termos da sentença recorrida, ou seja, os juros remuneratórios devem permanecer limitados em 12% ao ano, pelas razões que passo a explicar.
A priori, cumpre esclarecer que esta posição não afronta o entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça, sufragado no recurso representativo da controvérsia n. 1.061.530/RS, tratando-se, na verdade, de caso atípico, que deve ser analisado sob a ética processual civil.
Nos termos do art. 333 do Código de Processo Civil:
“ Art. 333 - O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.”
No caso presente, a alegação do apelado, na contestação e nas contrarrazões recursais é no sentido de que o apelante efetuou a cobrança de juros extorsivos, dos quais não há comprovação nos autos, em razão da ausência do contrato firmado entre as partes.
Considerando o disposto no inc. II do art. 333 do CPC, competia ao apelante comprovar os fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito do apeado, ou seja, deveria ter demonstrado, através da juntada do contrato entabulado entre as partes, que não procedeu nele a cobrança de juros extorsivos.
Cumpre esclarecer que os extratos de f. 12/47 não se prestam a esse fim, eis que se trata de documento produzido unilateralmente, sem qualquer participação do apelado.
Assim não procedendo, presumem-se verdadeiros os fatos alegados pelo apeldo, ou seja, que houve a cobrança de juros extorsivos, razão pela qual deve ser mantido o percentual de juros fixados na sentença recorrida, qual seja, de 12% ao ano.
Da comissão de permanência:
A respeito do tema havia firmado entendimento no sentido de é indevida a cobrança comissão de permanência, quer seja cumulada ou não com outros encargos, por entender que esta possui a mesma natureza jurídica da correção monetária, sendo o resultado da taxa de capitação de recursos, pelos bancos, mais o spread e as taxas dos serviços bancários. Por ser ilegal a sua cobrança, determinava-se a sua substituição por outro índice de correção monetária para fins de atualização do saldo devedor.
Contudo, é firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que é admitida a incidência da comissão de permanência, desde que não cumulada com correção monetária, juros remuneratórios, moratórios e multa contratual.
Neste sentido as súmulas editadas pela Corte Superior:
“Súmula 296 – Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do Brasil, limitada ao percentual contratado.”
“Súmula 294 – Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do contrato.”
“Súmula 30 – A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.”
A respeito, confiram-se os precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO BANCÁRIO - JUROS REMUNERATÓRIOS – LIMITAÇÃO - INADMISSIBILIDADE, NA ESPÉCIE - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS - CONTRATOS FIRMADOS APÓS A EDIÇÃO DA MP Nº 1.963-17/2000 (atualmente reeditada sob o n. 2.170-36/2001) - COBRANÇA – POSSIBILIDADE - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA - LICITUDE NA COBRANÇA, DESDE QUE NÃO CUMULADA COM ENCARGOS DA MORA, JUROS REMUNERATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA – MORA DEBENDI - DESCARACTERIZAÇÃO PELA ILICITUDE DOS ENCARGOS COBRADOS NO PERÍODO DA NORMALIDADE - CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL - A ANTECIPAÇÃO DO VALOR RESIDUAL GARANTIDO NÃO DESCARACTERIZA O CONTRATO - INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 293/STJ - RECURSO IMPROVIDO.” (AgRg nos EDcl no REsp 1054486/RS, Ministro MASSAMI UYEDA, 3ª Turma, Data do Julgamento, 10/02/2009 Data da Publicação/Fonte DJe 27/02/2009) (destacado)
“RECURSO ESPECIAL. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. DISPOSIÇÕES ANALISADAS DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO AFASTADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LICITUDE DA COBRANÇA. CUMULAÇÃO VEDADA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. NECESSIDADE.
1. (...)
4. É admitida a cobrança da comissão de permanência durante o período de inadimplemento contratual, calculada pela taxa média de mercado apurada pelo BACEN, limitada à taxa do contrato, não podendo ser cumulada com a correção monetária, com os juros remuneratórios e moratórios, nem com a multa contratual.
5. Agravo regimental desprovido.”(AgRg no REsp 995990/RS, Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 4ª Turma, Data do Julgamento 18/12/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 02/02/2009) (destacado)
Como se observa, é admissível a cobrança da comissão de permanência, desde que calculada pela taxa média do mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada, porém, à taxa contratada e, ainda, desde que cobrada isoladamente, não podendo ser cumulada com a correção monetária, juros remuneratórios, juros moratórios ou multa contratual.
Por consequência lógica, se houver cumulação da comissão de permanência com outros encargos, não deve ser admitida a sua cobrança, sob pena de incorrer em bis in idem, gerando enriquecimento sem causa ao credor.
No caso vertente, como não foi juntado aos autos a cópia do contrato, ônus este que competia ao apelante, deve ser mantida a sentença, que afastou a possibilidade de cobrança da comissão de permanência, substituindo-a pelo IGPM/FGV como índice de correção monetária.
Contudo, cumpre esclarecer que adoto o entendimento para que seja aplicado o INPC como índice de correção monetária, por se tratar de índice oficial.
O artigo 395 do Código Civil de 2002 estabelece que:
“Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”
Nesse sentido, confira-se o julgado abaixo:
E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – APLICABILIDADE DO CDC NOS CONTRATOS BANCÁRIOS – REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS – NÃO-OCORRÊNCIA DE AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DO PACTA SUNT SERVANDA E DA AUTONOMIA DA VONTADE – LIMITAÇÃO DOS JUROS EM 12% AO ANO – APLICABILIDADE DA LEI DE USURA (DECRETO Nº 22.626/33) – INADMISSIBILIDADE DA COBRANÇA DE COMISSÃO CUMULADA – APLICAÇÃO DO INPC COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIOR DE FORMA SIMPLES – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NOS TERMOS DO ART. 20, § 4.º, DO CPC – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(...).
5. Deve ser afastada a cláusula contratual que prevê a incidência da comissão de permanência, cumulado ou não com outros encargos, ante a manifesta ilegalidade. O índice adotado para correção monetária é o INPC (índice oficial).
6. É justo que ocorra a repetição do que eventualmente tenha sido pago indevidamente pelo apelante, contudo, tal devolução deve ocorrer de forma simples, e não em dobro.
7. O § 4º do art. 20 do CPC expressa que os honorários advocatícios devem ser fixados por eqüidade e na consideração aos fatos referidos no § 3º do mesmo dispositivo, tratando-se, portanto, de eqüidade jurídica.” (Apelação Cível nº 2007.031098-8. Rel. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo. Terceira Turma cível. J: 12.11.2007).
Contudo, como o apelado não se insurgiu contra a fixação do IGPM/FGV como índice de correção monetária, não há falar em reforma da sentença.
Ressalte-se que os documentos colacionados aos autos são insuficientes para se aferir, com certeza, que não houve a cobrança da comissão de permanência, o que deve ser apurado, portanto, em liquidação de sentença.
Da capitalização de juros:
A regra do artigo 4º do Decreto 22.626/33, plenamente em vigor, estabelece que:
“Art. 4º: É proibido contar juros dos juros. Esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano.”
Tal prática, denominada anatocismo, é expressamente vedada pelo nosso ordenamento jurídico, tanto que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 121, determinando que “é vedado a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada.”
Prevalece entendimento dominante de que a capitalização de juros só é admissível quando legislação especial a autorizar, como é o caso do Decreto-Lei nº 167/67 (artigo 5º), que dispõe sobre títulos de crédito rural, do Decreto-Lei nº 413/69 (artigo 5º c/c 14, VI), que dispõe sobre títulos de crédito industrial e da Lei nº 6.840/80 (artigo 5º), que dispõe sobre títulos de crédito comercial, sendo que todas prevêem a capitalização semestral. Fora dessas hipóteses vigora a regra da capitalização anual (Decreto nº 22.626/33).
Neste sentido o entendimento atual desta Corte:
“APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO E ANULAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS C/C CONSTITUTIVA DE DIREITOS, COMPENSAÇÃO DE PAGAMENTOS INDEVIDOS – SENTENÇA QUE AFASTOU A CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS DEVENDO SER ANUAL E DETERMINOU A SUBSTITUIÇÃO DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA PELO IGPM/FGV, COM A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIS – MANTIDA – IMPOSSIBILIDADE DA INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR DA AÇÃO REVISIONAL NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO – RECURSO IMPROVIDO.
1 - A capitalização diária, mensal e semestral de juros somente é permitida nos casos de crédito rural, comercial e industrial e quando houver previsão contratual, devendo ser afastada sua incidência nos demais contratos bancários, sendo devida, no caso dos autos, somente a capitalização anual.(...) (Apelação Cível N. 2009.003861-1/0000-00, Rel. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva, 12.3.2009, Quinta Turma Cível) (destacado)
“E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO, C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – JUROS REMUNERATÓRIOS LIMITADOS EM 12% AO ANO – CAPITALIZAÇÃO ANUAL – SUBSTITUIÇÃO DA COMISSÃO PERMANÊNCIA PELO IGPM – NÃO CONHECIDO O RECURSO QUANTO À MULTA CONTRATUAL – RECURSO IMPROVIDO.
(...)
Ainda que se diga que a Medida Provisória nº 1.963-17/2000 tenha permitido, a partir de sua publicação, a aplicação dos juros em período inferior a um ano, por certo que, com a entrada em vigor do Código Civil/2002, ou seja, janeiro/2003, houve a revogação tácita do artigo 5º. da referida MP, atingindo as faturas de cartão de crédito desde então, em razão do teor do artigo 591 da nova legislação. Por isso, a capitalização seja dos juros não poderá ser inferior a um ano.(...) (AC N. 2006.000355-4/0000-00, Rel. Des. Sideni Soncini Pimentel, 12.3.2009, Quinta Turma Cível) (destacado)
“E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – CONTRATO DE FINANCIAMENTO – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – CLÁUSULAS ABUSIVAS – POSSIBILIDADE DE REVISÃO – JUROS REMUNERATÓRIOS – CONTRATO QUE FIXA OS JUROS EM 2,07% AO MÊS – INFERIORIDADE À TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL – INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE – MANUTENÇÃO DOS JUROS PREVISTOS NO CONTRATO – CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS REMUNERATÓRIOS – VEDADA – COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – COBRANÇA INDEVIDA – IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OUTROS ENCARGOS – CORREÇÃO PELO IGPM-FGV – PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO – IMPROCEDENTE – CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – INSUFICÊNCIA DOS VALORES DEPOSITADOS – PROCEDÊNCIA PARCIAL – RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDO – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ).
O princípio pacta sunt servanda não é absoluto, devendo ser interpretado de forma relativa, em virtude do caráter público das normas violadas no contrato, possibilitando, portanto, a revisão das cláusulas havidas por abusivas e ofensivas à legislação nacional, em especial o Código de Defesa do Consumidor, Código Civil e o Decreto 22.626/33.
Seguindo a linha perfilhada pelo colegiado Superior, que tem na Constituição Federal a fonte primária de sua competência e, agora, legalmente autorizado pelo artigo 543-C do CPC a decidir sobre os recursos especiais repetitivos, não mais se deve aplicar o entendimento de que os juros remuneratórios estão delimitados em 12% ao ano, mas sim devem ser havidos como os da taxa média de mercado.
A capitalização dos juros, mesmo que convencionada, não pode ser mensal, até porque os juros estão sendo mantidos à taxa estipulada no contrato, fato que proporciona ampla compensação financeira ao credor. Capitalização determinada como sendo tão somente anual, haja ou não pacto expresso em sentido contrário, até mesmo pelo fato de que a cláusula respectiva não foi redigida com destaque para alertar o devedor quanto a sua instituição, sendo assim de nenhuma valia. (...)” (AC N. 2009.003487-1/0000-00, Rel. Des. Dorival Renato Pavan, 3.3.2009, Quarta Turma Cível)
"E M E N T A – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E COMPENSAÇÃO DE VALORES – APLICAÇÃO DO CDC – ATO JURÍDICO PERFEITO – PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA – RELATIVIDADE – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – LIMITAÇÃO – IMPERIOSIDADE – LEI DE USURA – APLICABILIDADE DO DECRETO-LEI Nº 22.626/33 ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS – PATAMAR DE 12% AO ANO – CAPITALIZAÇÃO DIÁRIA, MENSAL E SEMESTRAL DE JUROS – VEDADA – COMPENSAÇÃO DE VALORES – POSSIBILIDADE – SENTENÇA CONFIRMADA – RECURSO IMPROVIDO.
O princípio pacta sunt servanda não é absoluto, podendo ser relativizado em virtude do caráter público das normas violadas no contrato.
Reputam-se abusivas as cláusulas contratuais que colocam o consumidor em posição de desvantagem em relação ao fornecedor e a que deixa ao alvedrio do fornecedor a fixação da taxa de juros sem o conhecimento prévio e adequado do consumidor.
As normas contidas no Decreto Nº 22.626/33 revelam-se aplicáveis aos litígios que envolvem entidades bancárias, realidade fática que torna necessária a limitação da taxa de juros ao percentual de 12% (doze por cento) ao ano.
É vedada a capitalização mensal ou diária de juros, ainda que expressamente convencionada. (...)” (AC N. 2009.001468-0/0000-00, Rel.Des. Rêmolo Letteriello, 10.2.2009, Quarta Turma Cível) (destacado)
No tocante à Medida Provisória nº 2.170-36/2001, comungo do entendimento de que referida medida constitui verdadeira afronta ao Código de Defesa do Consumidor, ao estabelecer a cobrança de juros sobre juros, em seu artigo 5°.
Em recente julgado de n° 2007.002435-5, em que atuei como revisor, acompanhando o entendimento do relator Des. Paulo Alfeu Puccinelli, restou consignado a respeito do tema:
“(...) que a Medida Provisória n. 1963-17/2000 e Medida Provisória n. -36/2001, que teriam autorizado a capitalização mensal de juros e, portanto, seria fundamento de muitas instituições financeiras para a prática do anatocismo, ao meu ver, encontra verdadeira afronta ao Código de Defesa do Consumidor – Lei n. 8.078/90, uma vez que o anatocismo estabelece a cobrança de juros sobre juros, o que coloca o consumidor em evidente prejuízo, contrariando as normas consumeiristas.
Além do mais, apenas para argumentar, tenho que tal medida provisória não tem nenhuma validade por lhe faltar um de seus requisitos, qual seja, a urgência de sua matéria, já que, ao meu ver, a legalização de uma conduta que beneficia tão somente as instituições financeiras não se apresenta como urgente para a sociedade. Vale dizer, o teor da medida provisória que liberou a prática do anatocismo não é urgente para os interesses da sociedade; urgente ele é, porém, para os bancos, com inúmeras ações, contestando a ilegalidade do anatocismo, sendo julgadas procedentes, a mudança da legislação! (Bruno Matos e Silva, in Anatocismo Legalizado: Medida Provisória beneficia as já poderosas instituições financeiras, artigo publicado em http://www.brunosilva.adv.br/anat-leg.htm).
Assim, tenho que é ilegal e imoral a capitalização mensal de juros, de forma que a sentença monocrática deve ser reformada.”
Assim, não merece reforma a sentença recorrida, eis que afastou a incidência da capitalização mensal, admitindo apenas a anual.
Da multa contratual:
No que se refere â multa contratual, vê-se que o contrato fixou-a, na cláusula 5.9, em 2%, nos termos do que dispõe o Código de Defesa do Consumidor.
Como a sentença apenas afastou a possibilidade de cobrança da multa contratual em percentual superior a 2%, falece ao apelante interesse recursal, eis que a multa será mantida nos termos contratado.
Assim sendo, não conheço do recurso nesta parte.
Pelo exposto, conheço em parte do recurso interposto e no mérito nego-lhe provimento, mantendo incólume a sentença recorrida.
DECISÃO
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, CONHECERAM EM PARTE DO RECURSO E, NESTA EXTENSÃO, NEGARAM-LHE PROVIMENTO.
Presidência do Exmo. Sr. Des. Oswaldo Rodrigues de Melo.
Relator, o Exmo. Sr. Des. Rubens Bergonzi Bossay.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Rubens Bergonzi Bossay, Oswaldo Rodrigues de Melo e Ildeu de Souza Campos.
Campo Grande, 21 de setembro de 2009.
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
PRIMEIRA DECISÃO DO STJ SOBRE TRANSEXUALISMO.
Fonte: Site do STJ.
Transexual consegue alteração de nome e gênero, sem registro da decisão judicial na certidão.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a alteração do pré-nome e da designação de sexo de um transexual de São Paulo que realizou cirurgia de mudança de sexo. Ele não havia conseguido a mudança no registro junto à Justiça paulista e recorreu ao Tribunal Superior.
A decisão da Terceira Turma do STJ é inédita porque garante que nova certidão civil seja feita sem que nela conste anotação sobre a decisão judicial. O registro de que a designação do sexo foi alterada judicialmente poderá figurar apenas nos livros cartorários.
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a observação sobre alteração na certidão significaria a continuidade da exposição da pessoa a situações constrangedoras e discriminatórias.
Anteriormente, em 2007, a Terceira Turma analisou caso semelhante e concordou com a mudança desde que o registro de alteração de sexo constasse da certidão civil.
A cirurgia de transgenitalização foi incluída recentemente na lista de procedimentos custeados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e o Conselho Federal de Medicina reconhece o transexualismo como um transtorno de identidade sexual e a cirurgia como uma solução terapêutica.
De acordo com a ministra relatora, se o Estado consente com a cirurgia, deve prover os meios necessários para que a pessoa tenha uma vida digna. Por isso, é preciso adequar o sexo jurídico ao aparente, isto é, à identidade, disse a ministra.
A ministra Nancy Andrighi destacou que, atualmente, a ciência não considera apenas o fator biológico como determinante do sexo. Existem outros elementos identificadores do sexo, como fatores psicológicos, culturais e familiares. Por isso, “a definição do gênero não pode ser limitada ao sexo aparente”, ponderou. Conforme a relatora, a tendência mundial é adequar juridicamente a realidade dessas pessoas. Ela citou casos dos tribunais alemães, portugueses e franceses, todos no sentido de permitir a alteração do registro.
A decisão foi unânime.
Entenda o caso
O transexual afirmou no STJ que cresceu e se desenvolveu como mulher, com hábitos, reações e aspectos físicos tipicamente femininos. Submeteu-se a tratamento multidisciplinar que diagnosticou o transexualismo. Passou pela cirurgia de mudança de sexo no Brasil.
Alega que seus documentos lhe provocam grandes transtornos, já que não condizem com sua atual aparência, que é completamente feminina.
A defesa do transexual identificou julgamentos no Tribunal de Justiça do Amapá, do Rio Grande do Sul e de Pernambuco, nos quais questões idênticas foram resolvidas de forma diferente do tratamento dado a ele pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Nesses estados, foi considerada possível a alteração e retificação do assento de nascimento do transexual submetido à cirurgia de mudança de sexo.
Em primeira instância, o transexual havia obtido autorização para a mudança de nome e designação de sexo, mas o Ministério Público estadual apelou ao TJSP, que reformou o entendimento, negando a alteração. O argumento foi de que “a afirmação dos sexos (masculino e feminino) não diz com a aparência, mas com a realidade espelhada no nascimento, que não pode ser alterada artificialmente”.
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
LANÇAMENTO DE OBRA COLETIVA. DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES TEMAS ATUAIS.
Prezados Amigos e Amigas,
Informo o lançamento, pela Editora GEN/Método, do livro DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. TEMAS ATUAIS, coordenado por mim e pelos Professores Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e José Fernando Simão.
A obra é composta por vinte e nove artigos, conforme sumário a seguir.
Segue a sinopse com os temas e co-autores.
Na sequência, informações gerais sobre o trabalho.
O livro será lançado no VII Congresso Brasileiro de Direito de Família, em Belo Horizonte, entre os dias 28 a 31 de outubro.
Informo o lançamento, pela Editora GEN/Método, do livro DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. TEMAS ATUAIS, coordenado por mim e pelos Professores Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka e José Fernando Simão.
A obra é composta por vinte e nove artigos, conforme sumário a seguir.
Segue a sinopse com os temas e co-autores.
Na sequência, informações gerais sobre o trabalho.
O livro será lançado no VII Congresso Brasileiro de Direito de Família, em Belo Horizonte, entre os dias 28 a 31 de outubro.
Abraços a todos,
Flávio Tartuce
DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. TEMAS ATUAIS.
SUMÁRIO.
1. A nova principiologia do direito de família e suas repercussões
Flávio Tartuce
DIREITO DE FAMÍLIA E DAS SUCESSÕES. TEMAS ATUAIS.
SUMÁRIO.
1. A nova principiologia do direito de família e suas repercussões
Paulo Lôbo
2. Conceito pós-moderno de família
Águida Arruda Barbosa
3. A invalidade do casamento. Casamento nulo e casamento anulável. Análise do Código Civil de 2002 e do PL 2285/07F
ernando Carlos de Andrade Sartori
4. Casamento e união estável - eficácia, direitos e deveres
Antônio Carlos Mathias Coltro
5. Aspectos controvertidos dos regimes de bens
José Fernando Simão
6. A mitigação da culpa na separação judicial e suas conseqüências
André Borges de Carvalho Barros
7. Reflexões quanto à guarda compartilhada
Cláudia Stein Vieira
8. Responsabilidade civil nas relações de conjugalidade
Flávio Tartuce
9. Responsabilidade civil na parentalidade
Romualdo Baptista dos Santos
10. União estável na jurisprudência do STJ e do STF
Euclides de Oliveira
11. Famílias Simultâneas e Redes Familiares
Anderson Schreiber
12. A parentalidade socioafetiva e suas repercussões processuais
Fernanda Tartuce
13. O processo civil e a tutela dos vulneráveis no Direito de Família
Rolf Madaleno
14. Direitos e deveres dos avós (alimentos e visitação)
Álvaro Villaça Azevedo
15. O instituto do parto anônimo no direito brasileiro: avanços ouretrocessos?
Fabíola Santos Albuquerque
16. Poder familiar e processo educacional: a polêmica gradualidade do seu exercício
Ana Carolina Brochado Teixeira
17. Procriação medicamente assistida e relação de paternidade
José de Oliveira Ascensão
18. Uniões homossexuais - o estado da arte na jurisprudência brasileira
Débora Vanessa Caús Brandão
19. Aspectos jurídicos das famílias homossexual, simultânea e recomposta
Ana Carla Harmatiuk Matos
20. O duplo tratamento legal do bem de família e suas repercussõespráticas
Maurício Bunazar
21. A proporcionalidade na fixação da verba alimentar: desconstruindo o trinômio
Marcos Catalan
22. Alimentos pós-divórcio
Patrícia Fontanella
23. Direito Sucessório e Constituição: controvérsias e tendências
Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka
24. A sucessão do cônjuge casado no regime da separação total convencional de bens
Ana Luiza Maia Nevares
25. Sucessão do Companheiro: concorrência com descendentes comuns e exclusivos do autor da herança
Gabriele Tusa
26. A concorrência entre cônjuge e companheiro na sucessão legítima
José Luiz Gavião de Almeida e José Pedro Makowski de Oliveira Gavião de Almeida
27. Sucessão legítima, desacertos do sistema e proposta de alteração legislativa
Gustavo Rene Nicolau
28. Testamento Público e Publicidade Registral - Desmistificandouma crença normatizada
Paulo Dóron Rehder de Araujo
29. O testamento vital ou biológico e sua possibilidade no Brasil
Roxana Cardoso Brasileiro Borges
INFORMAÇÕES GERAIS.
Ano: 2009.
Ano: 2009.
Edição: 1ª edição
Número de Páginas: 592
Peso: 0,900 kg
Altura: 23 cm
Largura: 16 cm
Profundidade: 3 cm
Acabamento: Brochura
I.S.B.N.: 978-85-309-2986-2
Código de Barras: 9788530929862
Valor: R$ 89,00
RESUMO. INFORMATIVO 410 DO STJ.
CDC. CRÉDITO RURAL.
In casu, trata-se de execução fiscal de crédito rural securitizado e cedido pelo Banco do Brasil à União. No REsp, a Fazenda Nacional, recorrente, alegou violação dos arts. 535 do CPC, 2º do CDC, 71 do DL n. 167/1967 e 14 da Lei n. 4.829/1965. Sustentou, entre outras questões, que o CDC não se aplica às operações de financiamento agrícola, pois o crédito rural tem normas próprias, destacando que, nessa forma de empréstimo, o mutuante não utiliza o dinheiro como destinatário final. Para a Min. Relatora, em relação à possibilidade de ser aplicado o CDC às operações de financiamento agrícola, bem como quanto à validade da comissão de permanência, a jurisprudência do STJ já consolidada na Segunda Seção é no sentido contrário à pretensão da recorrente, isto é, aplica-se o CDC aos contratos firmados entre instituição financeira e o agricultor, pessoa física, ainda que para viabilizar seu trabalho como produtor rural. É impossível, nos contratos bancários, a cobrança cumulada da comissão de permanência com os juros remuneratórios, correção monetária e/ou juros moratórios. Quanto à multa moratória, segundo ressaltou a Min. Relatora, o entendimento do STJ é que só se aplica tal multa no valor de 10% aos contratos firmados anteriormente à edição da Lei n. 9.298/1996. Quanto à tese de que o art. 14 da Lei n. 4.829/1965 não estabelece limite às taxas de juros, bem como à de que o Dec. n. 22.626/1933 não se aplica às taxas de juros e outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional (Súmula n. 596-STF), observou que o Tribunal a quo não emitiu juízo de valor sobre a aplicabilidade desse enunciado do STF ao caso concreto, nem do referido art. 14 da citada lei, fato que dá ensejo à aplicação da Súmula n. 211-STJ. Destacou que tais questões não foram objeto da apelação, motivo pelo qual não estava a Corte de origem obrigada a se pronunciar sobre elas no julgamento dos embargos declaratórios. Diante disso, a Turma conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento. Precedentes citados: AgRg no REsp 677.851-PR, DJe 11/5/2009; AgRg nos EDcl no REsp 866.389-DF, DJe 1°/7/2008; AgRg no REsp 794.526-MA, DJ 24/4/2006; REsp 435.249-MS, DJ 7/10/2002, e REsp 299.435-MT, DJ 13/12/2004. REsp 1.127.805-PR, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 6/10/2009.
In casu, trata-se de execução fiscal de crédito rural securitizado e cedido pelo Banco do Brasil à União. No REsp, a Fazenda Nacional, recorrente, alegou violação dos arts. 535 do CPC, 2º do CDC, 71 do DL n. 167/1967 e 14 da Lei n. 4.829/1965. Sustentou, entre outras questões, que o CDC não se aplica às operações de financiamento agrícola, pois o crédito rural tem normas próprias, destacando que, nessa forma de empréstimo, o mutuante não utiliza o dinheiro como destinatário final. Para a Min. Relatora, em relação à possibilidade de ser aplicado o CDC às operações de financiamento agrícola, bem como quanto à validade da comissão de permanência, a jurisprudência do STJ já consolidada na Segunda Seção é no sentido contrário à pretensão da recorrente, isto é, aplica-se o CDC aos contratos firmados entre instituição financeira e o agricultor, pessoa física, ainda que para viabilizar seu trabalho como produtor rural. É impossível, nos contratos bancários, a cobrança cumulada da comissão de permanência com os juros remuneratórios, correção monetária e/ou juros moratórios. Quanto à multa moratória, segundo ressaltou a Min. Relatora, o entendimento do STJ é que só se aplica tal multa no valor de 10% aos contratos firmados anteriormente à edição da Lei n. 9.298/1996. Quanto à tese de que o art. 14 da Lei n. 4.829/1965 não estabelece limite às taxas de juros, bem como à de que o Dec. n. 22.626/1933 não se aplica às taxas de juros e outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional (Súmula n. 596-STF), observou que o Tribunal a quo não emitiu juízo de valor sobre a aplicabilidade desse enunciado do STF ao caso concreto, nem do referido art. 14 da citada lei, fato que dá ensejo à aplicação da Súmula n. 211-STJ. Destacou que tais questões não foram objeto da apelação, motivo pelo qual não estava a Corte de origem obrigada a se pronunciar sobre elas no julgamento dos embargos declaratórios. Diante disso, a Turma conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento. Precedentes citados: AgRg no REsp 677.851-PR, DJe 11/5/2009; AgRg nos EDcl no REsp 866.389-DF, DJe 1°/7/2008; AgRg no REsp 794.526-MA, DJ 24/4/2006; REsp 435.249-MS, DJ 7/10/2002, e REsp 299.435-MT, DJ 13/12/2004. REsp 1.127.805-PR, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 6/10/2009.
UNIÃO ESTÁVEL. DISSOLUÇÃO. ALIMENTOS. MENOR. INVENTÁRIO. ADIANTAMENTO.
A Turma decidiu aque não se justifica o pedido de anulação da ação de alimentos, entendendo cabível a legitimidade ativa de filhos menores quando assistidos ou representados (conforme a idade), com pedido formulado em nome próprio pela genitora em favor dos filhos, uma vez demonstrado que o valor solicitado é para a manutenção da família. Ademais, tal legitimidade ativa não se altera quando atingida a maioridade do filho menor no curso do processo. É admissível também a partilha de bens decorrente da dissolução de união estável (vinte anos) promovida mediante processo futuro de inventário (art. 1.121, § 1º, do CPC), com a indicação prévia dos bens que integrarão a divisão, sem, contudo, haver o pretendido adiantamento da partilha, que só ocorreria se fosse desde já atribuída pelo Tribunal a cada companheiro uma parcela individualizada do patrimônio. No mais, pela incidência da Súmula n. 7-STJ, descabe examinar pedidos quanto à fixação do valor da pensão de alimentos com o do montante da participação da companheira na formação do patrimônio na constância da união. REsp 1.046.130-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 6/10/2009.
A Turma decidiu aque não se justifica o pedido de anulação da ação de alimentos, entendendo cabível a legitimidade ativa de filhos menores quando assistidos ou representados (conforme a idade), com pedido formulado em nome próprio pela genitora em favor dos filhos, uma vez demonstrado que o valor solicitado é para a manutenção da família. Ademais, tal legitimidade ativa não se altera quando atingida a maioridade do filho menor no curso do processo. É admissível também a partilha de bens decorrente da dissolução de união estável (vinte anos) promovida mediante processo futuro de inventário (art. 1.121, § 1º, do CPC), com a indicação prévia dos bens que integrarão a divisão, sem, contudo, haver o pretendido adiantamento da partilha, que só ocorreria se fosse desde já atribuída pelo Tribunal a cada companheiro uma parcela individualizada do patrimônio. No mais, pela incidência da Súmula n. 7-STJ, descabe examinar pedidos quanto à fixação do valor da pensão de alimentos com o do montante da participação da companheira na formação do patrimônio na constância da união. REsp 1.046.130-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 6/10/2009.
CONDOMÍNIO. ASSEMBLÉIA GERAL. QUORUM. SUPRIMENTO.
A Turma negou provimento ao recurso ao entendimento de que em assembléia geral de condomínio, o quorum qualificado para a aprovação de obras a serem realizadas em partes comuns do condomínio depende da aprovação de dois terços dos condôminos conforme o art. 1.342 do CC/2002, não se admitindo ratificação posterior de ata para suprir eventual falta de quorum por ocasião da assembléia que deliberou sobre as obras. Também inexiste vício na decisão do Tribunal a quo ao julgar antecipadamente a lide com a dispensa de dilação probatória, considerando a convenção condominial e a ata da assembléia elementos suficientes para a formação da convicção do julgador. Precedente citado: REsp 844.778-SP, DJ 26/3/2007. REsp 1.120.140-MG, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 6/10/2009.
BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL EM CONSTRUÇÃO.
O terreno não edificado não se caracteriza como bem de família (art. 5º da Lei n. 8.009/1990), pois não serve à moradia familiar. Contudo, na hipótese, antes do vencimento da nota promissória que lastreia a execução, já havia, no terreno, uma casa em construção que servia de única residência à família. Não há importância no fato de a construção só ter sido registrada posteriormente, pois há certidão nos autos atestando o início da edificação ainda pelo ex-proprietário. Desse modo, o imóvel está sob a proteção da Lei n. 8.009/1990. Precedentes citados: REsp 619.722-RS, DJ 31/5/2004, e REsp 507.048-MG, DJ 30/6/2003. REsp 1.087.727-GO, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 6/10/2009.
O terreno não edificado não se caracteriza como bem de família (art. 5º da Lei n. 8.009/1990), pois não serve à moradia familiar. Contudo, na hipótese, antes do vencimento da nota promissória que lastreia a execução, já havia, no terreno, uma casa em construção que servia de única residência à família. Não há importância no fato de a construção só ter sido registrada posteriormente, pois há certidão nos autos atestando o início da edificação ainda pelo ex-proprietário. Desse modo, o imóvel está sob a proteção da Lei n. 8.009/1990. Precedentes citados: REsp 619.722-RS, DJ 31/5/2004, e REsp 507.048-MG, DJ 30/6/2003. REsp 1.087.727-GO, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 6/10/2009.
SEGURO. BAIXA. VEÍCULO. MULTAS.
O veículo furtado do recorrido não foi recuperado pela polícia, então a seguradora recorrente efetuou o pagamento da indenização estipulada. Sucede que essa mesma seguradora não providenciou a baixa do veículo no cadastro do Detran, por isso diversas multas relativas a infrações de trânsito praticadas pelos criminosos ou terceiros foram emitidas em nome do recorrido e computadas em sua carteira de habilitação. Assim, além do dano moral, a ação busca compelir a seguradora a providenciar a transferência da propriedade do veículo, bem como a retirar todas as multas de trânsito aplicadas sob pena de fixação de astreintes. Anote-se que o veículo, como visto, não se encontra na posse do recorrido nem do recorrente, o que impede o cumprimento das exigências usualmente feitas pelo Detran para a transferência (CTB, art. 124, VII e XI), tal como a vistoria do automóvel. Esse panorama evidencia o dano moral causado ao recorrido, pois houve desídia da seguradora em prontamente atender a suas solicitações. Todavia, não tem cabimento impor multa diária, inclusive por tutela antecipada, para compeli-la a cumprir uma impossível transferência do veículo, daí ser necessária a exclusão das astreintes da condenação. De outro lado, é preciso que este Superior Tribunal, ao aplicar o direito à espécie (art. 257 do RISTJ), avance em busca de uma solução burocrática do problema que atormenta o autor. Isso posto, a Turma determinou a imediata expedição de ofício ao Detran para que se registre a seguradora como a proprietária do veículo desde a data do furto. Com isso, o recorrido fica livre das multas aplicadas, apesar de o STJ não poder cancelá-las, visto representarem valor devido à Fazenda Pública, que não é parte na lide. REsp 1.003.372-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 6/10/2009.
O veículo furtado do recorrido não foi recuperado pela polícia, então a seguradora recorrente efetuou o pagamento da indenização estipulada. Sucede que essa mesma seguradora não providenciou a baixa do veículo no cadastro do Detran, por isso diversas multas relativas a infrações de trânsito praticadas pelos criminosos ou terceiros foram emitidas em nome do recorrido e computadas em sua carteira de habilitação. Assim, além do dano moral, a ação busca compelir a seguradora a providenciar a transferência da propriedade do veículo, bem como a retirar todas as multas de trânsito aplicadas sob pena de fixação de astreintes. Anote-se que o veículo, como visto, não se encontra na posse do recorrido nem do recorrente, o que impede o cumprimento das exigências usualmente feitas pelo Detran para a transferência (CTB, art. 124, VII e XI), tal como a vistoria do automóvel. Esse panorama evidencia o dano moral causado ao recorrido, pois houve desídia da seguradora em prontamente atender a suas solicitações. Todavia, não tem cabimento impor multa diária, inclusive por tutela antecipada, para compeli-la a cumprir uma impossível transferência do veículo, daí ser necessária a exclusão das astreintes da condenação. De outro lado, é preciso que este Superior Tribunal, ao aplicar o direito à espécie (art. 257 do RISTJ), avance em busca de uma solução burocrática do problema que atormenta o autor. Isso posto, a Turma determinou a imediata expedição de ofício ao Detran para que se registre a seguradora como a proprietária do veículo desde a data do furto. Com isso, o recorrido fica livre das multas aplicadas, apesar de o STJ não poder cancelá-las, visto representarem valor devido à Fazenda Pública, que não é parte na lide. REsp 1.003.372-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 6/10/2009.
BANCO. DENUNCIAÇÃO. LIDE. SEGURADORA.
O consumidor e o banco firmaram contrato de abertura de crédito com alienação fiduciária a recair sobre o automóvel adquirido. Esse negócio condicionou-se à adesão do consumidor a contrato de seguro que quitaria o financiamento em caso de óbito, a ser firmado com seguradora, sociedade pertencente ao mesmo grupo econômico do qual faz parte o banco. Porém, o consumidor faleceu e a seguradora negou-se a honrar a apólice ao argumento de que havia doença preexistente. Então, o espólio propôs, apenas contra o banco, ação cominatória combinada com condenatória a fim de transferir o veículo sob pena de multa diária e receber a restituição de parcelas pagas indevidamente. Concedida a tutela antecipada, o banco busca, no REsp, o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva e a denunciação à lide da seguradora (art. 70, III, do CPC). Nesse contexto, logo se percebe que não há direito de o banco ressarcir-se da seguradora, pois não há vínculo contratual ou legal entre eles, o que torna incabível uma eventual pretensão regressiva. A seguradora não está obrigada, por lei ou contrato, a garantir o resultado da demanda, daí não haver razão para a denunciação à lide. Na verdade, busca o banco recorrente, com lastro no mencionado artigo do CPC, eximir-se de sua responsabilidade sobre o evento danoso, ao atribuí-la, com exclusividade, a terceiro, o que não é aceito pela jurisprudência e pela doutrina. Precedentes citados: REsp 191.118-PR, DJ 12/8/2002; REsp 648.253-DF, DJ 3/4/2006; REsp 97.675-SP, DJ 4/5/1998, e REsp 58.080-ES, DJ 29/4/1996. REsp 1.141.006-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/10/2009.
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