domingo, 28 de dezembro de 2008

FELIZ 2009 A TODOS!!!

Prezados Amigos e Amigas,
Em complemento à postagem anterior, gostaria de desejar a todos uma ótima virada de ano.
E que 2009 seja um excelente ano para todos nós, com muito amor, saúde, paz, felicidade, solidariedade, amizade, sucesso e.... Direito Civil.
Abraços a todos,
Flávio Tartuce

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

MENSAGEM DE NATAL.

"O que é um justo? É alguém que põe sua força a serviço do direito, e dos direitos, e que, decretando nele a igualdade de todo o homem com todo outro, apesar das desigualdades de fato ou de talentos, que são inúmeras, instaura uma ordem que não existe, mas sem a qual nenhuma ordem jamais poderia nos satisfazer. O mundo resiste, e o homem. Portanto, é preciso resistir a eles - e resistir antes de tudo à injustiça que cada um traz em si mesmo, que é si mesmo. É por isso que o combate pela justiça não terá fim. Esse Reino. pelo menos, nos é proibido, ou antes já estamos nele só quando nos esforçarmos por alcançá-lo. Felizes os famintos de justiça, que nunca serão saciados" (COMTE-SPONVILLE, André. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins-Fontes, 2007, p. 95).
Prezado Amigos e Amigas,
Não nos esqueçamos, neste Natal, daqueles que não têm JUSTIÇA, daqueles que sentem a dor amarga do sofrimento e do abandono.
Não nos esqueçamos da nossa meta principal, da razão da nossa presença neste mundo.
Não nos afastemos do nosso caminho e da nossa missão, iludidos pelas luzes que um dia se apagam.
Que 2009 seja mais um ano de busca pela JUSTIÇA, pelo AMOR, pela IGUALDADE.
É o que desejo, com todas as minhas forças, do fundo do meu espírito, do meu coração.
Flávio Tartuce

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

INFORMATIVO 532 DO STF. EXAME DE DNA x DIREITO DE LOCOMOÇÃO

Exame de DNA e Direito de Locomoção
A Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus para que a recorrente não seja obrigada a se deslocar a outra unidade da federação, às suas próprias expensas, com o propósito de realizar exame de DNA. Na espécie, nos autos de ação de investigação de paternidade promovida em face da recorrente e de seus irmãos, fora expedida ordem judicial a fim de determinar que a recorrente se submetesse à coleta de material para o citado exame na comarca em que domiciliado o autor daquela ação. Inicialmente, aduziu-se que a ora recorrente não se opusera à realização do exame de DNA, mas se insurgira quanto ao fato de ter que viajar para outro Estado-membro a fim de efetivar providência que poderia ser feita na comarca onde mora. Ressaltando tratar-se de situação fronteiriça, considerou-se que o caso seria de impetração de habeas corpus, porquanto se objetivava garantir a liberdade de ir, vir e ficar (não se locomover).

INFORMATIVO 532 DO STF. JULGAMENTO DA RESERVA RAPOSA SERRA DO SOL. FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE.

Demarcação de Terras Indígenas: Raposa/Serra do Sol - 10
O Tribunal retomou julgamento de ação popular ajuizada por Senador da República contra a União, em que impugna o modelo contínuo de demarcação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, situada no Estado de Roraima, e pleiteia a declaração de nulidade da Portaria 534/2005, do Ministro de Estado da Justiça, e do Decreto homologatório de 15.4.2005, do Presidente da República. Sustenta o autor, em síntese, que a Portaria em questão possuiria os mesmos vícios da Portaria 820/98, que a antecedeu, em razão da não observância das normas dos Decretos 22/91 e 1.775/96, haja vista que não teriam sido ouvidas todas as pessoas e entidades afetadas pela controvérsia, e o laudo antropológico sobre a área em discussão teria sido assinado por apenas um profissional, o que seria prova de presumida parcialidade. Alega, também, que a reserva em área contínua traria conseqüências desastrosas tanto para o Estado de Roraima, sob os aspectos comercial, econômico e social, quanto para os interesses do País, por comprometer a segurança e a soberania nacionais. Argumenta, por fim, que haveria desequilíbrio da Federação, já que a área demarcada, ao passar para o domínio da União, suprimiria parte significativa do território roraimense, ofendendo, ademais, o princípio da razoabilidade, ao privilegiar a tutela do índio em detrimento, por exemplo, da iniciativa privada — v. Informativo 517.Pet 3388/RR, rel. Min. Carlos Britto, 10.12.2008. (PET-3388)
Demarcação de Terras Indígenas: Raposa/Serra do Sol - 11
O Min. Menezes Direito, em voto-vista, julgou parcialmente procedente o pedido formulado para que sejam observadas as seguintes condições impostas pela disciplina constitucional ao usufruto dos índios sobre suas terras: 1) o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas pode ser suplantado de maneira genérica sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da CF, o interesse público da União, na forma de lei complementar; 2) o usufruto dos índios não abrange a exploração de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre da autorização do Congresso Nacional; 3) o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e a lavra de recursos naturais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional; 4) o usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, dependendo, se o caso, ser obtida a permissão da lavra garimpeira; 5) o usufruto dos índios fica condicionado ao interesse da Política de Defesa Nacional. A instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes — o Ministério da Defesa e o Conselho de Defesa Nacional —, serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; 6) a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica garantida e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI; 7) o usufruto dos índios não impede a instalação pela União Federal de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e de educação; 8) o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica restrito ao ingresso, trânsito e permanência, bem como a caça, a pesca e o extrativismo vegetal, tudo nos períodos, temporadas e condições estipulados pela administração da unidade de conservação, que ficará sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade; 9) o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área de unidade de conservação, também afetada pela terra indígena, com a participação das comunidades indígenas da área, em caráter apenas opinativo, levando em conta as tradições e os costumes dos indígenas, podendo, para tanto, contar com a consultoria da FUNAI; 10) o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pela administração; 11) deve ser admitido o ingresso, o trânsito, a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI; 12) o ingresso, trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas; 13) a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização de estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação ou não; 14) as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico, que restrinja o pleno exercício da posse direta pela comunidade jurídica ou pelos silvícolas; 15) é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas a prática da caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária extrativa; 16) os bens do patrimônio indígena, isto é, as terras pertencentes ao domínio dos grupos e comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos artigos 49, XVI, e 231, § 3º, da Constituição da República, bem como a renda indígena, gozam de plena isenção tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns e outros; 17) é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada; 18) os direitos dos índios relacionados as suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis.Pet 3388/RR, rel. Min. Carlos Britto, 10.12.2008. (PET-3388)
Demarcação de Terras Indígenas: Raposa/Serra do Sol - 12
Em seguida, o Tribunal, contra o voto do Min. Celso de Mello, tendo em conta o pedido de vista formulado pelo Min. Marco Aurélio, deliberou prosseguir no julgamento do processo. Prosseguindo, os Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Cezar Peluso e Ellen Gracie também julgaram parcialmente procedente a ação popular para que sejam observadas as condições constantes do voto-vista do Min. Menezes Direito, tendo a Min. Cármen Lúcia feito ressalva quanto às condições 10, 17 e 18. O Min. Cezar Peluso, quanto aos itens 8 e 9, acompanhou o Min. Menezes Direito por diversos fundamentos jurídicos. Por sua vez, o Min. Joaquim Barbosa, julgou o pleito improcedente. O Min. Carlos Britto, relator, reajustou o seu voto para também adotar as observações contidas no voto do Min. Menezes Direito, com ressalva em relação à condição 9, para dela excluir a expressão “em caráter apenas opinativo” e inserir as palavras “os usos” antes da expressão “tradições e costumes dos indígenas”. O relator propôs, ainda, a cassação da medida cautelar concedida na ação cautelar 2009/RR, no que foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Ricardo Lewandowski. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.Pet 3388/RR, rel. Min. Carlos Britto, 10.12.2008. (PET-3388)

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

LANÇAMENTO DE OBRA COLETIVA. OS VINTE ANOS DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL


Prezados Amigos e Amigas,



Informamos o lançamento de obra coletiva, pela Editora Atlas, em comemoração aos vinte anos da Constituição Federal

A obra foi coordenada pelo Professor Alexandre de Moraes (USP), contando com a participação, entre outros, de Antonio Junqueira de Azevedo (USP), Alvaro Villaça Azevedo (USP), Ada Pellegrini Grinover (USP), Carlos Ayres Brito (STF), Elival da Silva Ramos (USP), Fernanda Dias Menezes (USP), Flávio Yarshell (USP), Ives Gandra da Silva Martins (CEU), José Celso de Mello Filho (STF), José Luiz Gavião de Almeida (USP), José Renato Nalini (TJSP), Marco Aurélio Mello (STF), Maria Sylvia Zanella Di Pietro (USP), Maria Thereza Rocha de Assis Moura (STJ), Rachel Sztajn (USP) e Sérgio Pinto Martins (USP).

Participamos com o artigo O CÓDIGO CIVIL DE 2002 E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL: 5 ANOS E 20 ANOS, entre as páginas 463 e 520.
O trablho foi escrito em co-autoria com o Giselda Hironaka e José Fernando Simão, ambos também da USP.

Foi uma grande honra poder ter participado dessa obra, com todos esses notáveis juristas.


Abraços,

Flávio Tartuce

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

STF. ENCERRADA A QUESTÃO DA PRISÃO CIVIL CONTRATUAL OU NEGOCIAL.

Prisões civis por dívidas ficam restritas aos casos de inadimplência de pensão alimentícia
DO ESPAÇO VITAL

Por maioria, o Plenário do STF fulminou, ontem (03) dois recursos extraordinários que discutiam a prisão civil de alienante fiduciário infiel. O Plenário estendeu a proibição de prisão civil por dívida, prevista no artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal (CF), à hipótese de infidelidade no depósito de bens e, por analogia, também à alienação fiduciária, tratada nos dois recursos. (REs nºs 349703 e 466343).

Assim, a jurisprudência da corte evoluiu no sentido de que a prisão civil por dívida é aplicável apenas ao responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia. O Supremo entendeu que a segunda parte do dispositivo constitucional que versa sobre o assunto é de aplicação facultativa quanto ao devedor – excetuado o inadimplente com alimentos – e, também, ainda carente de lei que defina rito processual e prazos.

Também o STF decidiu, no mesmo sentido, um terceiro processo versando sobre o mesmo assunto, revogou a Súmula nº 619, da própria corte. Passa a não ter validade o verbete que estabelecia que “a prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constituiu o encargo, independentemente da propositura de ação de depósito”. (HC nº 87585).

As ações julgadas

Nos dois primeiros recursos extraordinários, em processos contra clientes, os bancos Itaú e Bradesco questionavam decisões que entenderam que o contrato de alienação fiduciária em garantia é insuscetível de ser equiparado ao contrato de depósito de bem alheio (depositário infiel) para efeito de prisão civil.

O primeiro caso é oriundo do RS, numa demanda do Banco Itaú contra o financiado Armando Luiz Segabinazzi, que foi defendido pelo advogado Alonso Machado Lopes.

O segundo caso é originário de São Paulo, onde o Bradesco litigou contra o consumidor Luciano Cardoso Santos, defendido pela advogada Vera Lúcia de Albuquerque.

O mesmo tema estava em discussão no hábeas, em que o cidadão Alberto de Ribamar Costa - residente no Estado de Tocantins - questiona acórdão do STJ.

O advogado de defesa Júlio Solimar Rosa Cavalcanti sustentou que, se for mantida a decisão que decretou a prisão de seu cliente, “ele estará respondendo pela dívida através de sua liberdade, o que não pode ser aceito no moderno Estado Democrático de Direito, não havendo razoabilidade e utilidade da pena de prisão para os fins do processo”.

Ele fundamentou seu pleito na impossibilidade de decretação da prisão de depositário infiel, à luz da redação trazida pela Emenda Constitucional nº 45, de 31 de dezembro de 2004, que tornou os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos equivalentes à norma constitucional, a qual tem aplicação imediata, referindo-se ao pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário.

Direitos humanos e gradação dos tratados internacionais

Em toda a discussão sobre o assunto prevaleceu o entendimento de que "o direito à liberdade é um dos direitos humanos fundamentais priorizados pela Constituição Federal" e que "a privação da liberdade somente pode ocorrer em casos excepcionalíssimos".

“A Constituição Federal não deve ter receio quanto aos direitos fundamentais”, disse o ministro Cezar Peluso, ao lembrar que os direitos humanos são direitos fundamentais com primazia na Constituição. Ele complementou afirmando que “o corpo humano, em qualquer hipótese de dívida é o mesmo; o valor e a tutela jurídica que ele merece são os mesmos".

Candente, Peluso sustentou que "a estratégia jurídica para cobrar dívida sobre o corpo humano é um retrocesso ao tempo em que o corpo humano era o ´corpus vilis´ (corpo vil), sujeito a qualquer coisa”.

Ao proferir seu voto, a ministra Ellen Gracie afirmou que “o respeito aos direitos humanos é virtuoso, no mundo globalizado e nós só temos a lucrar com sua difusão e seu respeito por todas as nações”.

No mesmo sentido, o ministro Menezes Direito afirmou que "há uma força teórica para legitimar-se como fonte protetora dos direitos humanos, inspirada na ética, de convivência entre os Estados com respeito aos direitos humanos".

Tratados e convenções proíbem a prisão por dívida

Menezes Direito filiou-se à tese hoje majoritária, no Plenário, que dá status supralegal (acima da legislação ordinária) a esses tratados, situando-os, no entanto, em nível abaixo da Constituição. Essa corrente, no entanto, admite dar a eles status de constitucionalidade, se votados pela mesma sistemática das emendas constitucionais pelo Congresso Nacional. Ou seja: maioria de dois terços, em dois turnos de votação, conforme previsto no parágrafo 3º, acrescido pela Emenda Constitucional nº 45/2004 ao artigo 5º da Constituição Federal.

No voto que proferiu em 12 de março, quando o julgamento foi interrompido por pedido de vista de Menezes Direito, o ministro Celso de Mello lembrou que o Pacto de São José da Costa Rica sobre Direitos Humanos, ratificado pelo Brasil em 1992, proíbe, em seu artigo 7º, parágrafo 7º, a prisão civil por dívida, excetuado o devedor voluntário de pensão alimentícia.

O mesmo - segundo Celso de Mello - ocorre com o artigo 11 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, patrocinado em 1966 pela Organização das Nações Unidas, ao qual o Brasil aderiu em 1990. Até a Declaração Americana dos Direitos da Pessoa Humana, firmada em 1948, em Bogotá (Colômbia), com a participação do Brasil, já previa esta proibição, enquanto a Constituição brasileira de 1988 ainda recepcionou legislação antiga sobre o assunto.

Também a Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, realizada em Viena (Áustria), em 1993, com participação ativa da delegação brasileira, então chefiada pelo ex-ministro da Justiça e ministro aposentado do STF Maurício Corrêa, preconizou o fim da prisão civil por dívida. Naquele evento ficou bem marcada a interdependência entre democracia e o respeito dos direitos da pessoa humana, tendência que se vem consolidando em todo o mundo.

Duas teses

O ministro Menezes Direito filiou-se à tese defendida pelo presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, que concede aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos - a que o Brasil aderiu - um status supralegal, porém admitindo a hipótese do nível constitucional delas, quando ratificados pelo Congresso de acordo com a EC nº 45 (parágrafo 3º do artigo 5º da CF).

Neste contexto, Mendes advertiu para o que considerou um "risco para a segurança jurídica" a equiparação dos textos dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos de que o Brasil é signatário ao texto constitucional. Segundo ele, o constituinte agiu com maturidade ao acrescentar o parágrafo 3º ao artigo 5º da CF.

No mesmo sentido se manifestaram os ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, além de Menezes Direito. Foram votos vencidos parcialmente - defendendo o status constitucional dos tratados sobre direitos humanos os ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Eros Grau e Ellen Gracie.

(Processos relacionados: HC nº 87585, RE nº 349703 e RE nº 466343 - com informações do STF e da redação do Espaço Vital ).

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

AASP. CAMPANHA DA SOLIDARIEDADE PARA SANTA CATARINA.

AASP - Campanha de Solidariedade à população de Santa Catarina
Com o objetivo de integrar-se à corrente de solidariedade formada para levar ajuda à população desabrigada do Estado de Santa Catarina, a Associação dos Advogados de São Paulo organizou-se de modo que os associados interessados possam participar, encaminhando suas doações para postos de recolhimento.
Locais de doações:
AASP - São Paulo Centro: Rua Álvares Penteado, 151
AASP - São Paulo Vila Mariana: Rua Francisco Cruz, 163
AASP - Campinas: Rua General Osório, 971 – 7º andar – conj. 74
AASP – Santos: Rua Dom Pedro II, nº 85 - conj. 21 - Centro
As doações arrecadadas serão destinadas à Coordenadoria Municipal de Defesa Civil, que conta com estrutura adequada para fazer essa valiosa ajuda chegar às vítimas da tragédia que assolou a vida dos catarinenses.
Depósitos Bancários na conta-corrente do Fundo Estadual de Defesa Civil (CNPJ 04.426.883/0001-57)
Banco do Brasil, agência 3582-3, conta-corrente 80.000-7
Banco Bradesco, agência 0348-4, conta-corrente 160.000-1
Horário de recebimento das doações: das 8h às 18h
Telefone para mais informações: (11) 3291 9200
Lista de prioridades para doações:
Água potável
Colchões
Material de higiene
Cestas básicas (com alimentos não perecíveis) .

Associação dos Advogados de São Paulo

PUBLICAÇÃO DE ARTIGO. O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA NO DIREITO DE FAMÍLIA.

Prezados Amigos e Amigas,

Informo a publicação na INTERNET do nosso artigo O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA NO DIREITO DE FAMÍLIA, que foi escolhido para ser apresentado como trabalho científico no V Congresso Brasileiro de Direito de Família do IBDFAM, no ano de 2005.
O trabalho pode ser acessado e lido no endereço: http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigos/Tartuce_bfofamilia.doc.

Abraços a todos,

Professor Flávio Tartuce

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

RESUMO. INFORMATIVO 377 DO STJ.

SÚMULA N. 365-STJ.
A intervenção da União como sucessora da Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) desloca a competência para a Justiça Federal ainda que a sentença tenha sido proferida por Juízo estadual. Rel. Min. Fernando Gonçalves, em 19/11/2008.
SÚMULA N. 366-STJ.
Compete à Justiça estadual processar e julgar ação indenizatória proposta por viúva e filhos de empregado falecido em acidente de trabalho. Rel. Min. Fernando Gonçalves, em 19/11/2008.
SÚMULA N. 367-STJ.
A competência estabelecida pela EC n. 45/2004 não alcança os processos já sentenciados. Rel. Min. Eliana Calmon, em 19/11/2008.
DANO MORAL. DIPLOMA. ATRASO. UNIVERSIDADE.
A Turma, ao renovar o julgamento, por maioria, proveu em parte o recurso, considerando cabível a fixação de indenização dos danos morais devida às autoras pelo prejuízo sofrido com a demora na entrega de diploma por instituição de ensino superior, pois caracterizada a responsabilidade objetiva por desídia da universidade na regularização de sua situação junto ao MEC, o que, conseqüentemente, retardou o chancelamento do curso. REsp 631.204-RS, Rel. originário Min. Castro Filho, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/11/2008.
INJÚRIA. DANOS MORAIS. JUÍZ. IMUNIDADE. ADVOGADO. CLIENTE.
A Turma entendeu tipificado o crime de injúria, pois constatado que as expressões ofensivas utilizadas pelo causídico ultrapassaram os limites do tratamento admissível no meio forense, não se tratando apenas de mera deselegância e faltosa urbanidade para com o magistrado. Outrossim, cabíveis os danos morais com o aumento do quantum devido, mormente por ser incabível invocar a imunidade conferida no exercício da advocacia, já que o art. 7º, § 2º, do Estatuto da Advocacia, que dá concretude ao art. 133 da CF/1988, não é absoluto a ponto de isentar o advogado pelos excessos de linguagem, enquanto vocifera impropérios em afronta à honra de qualquer pessoa, desbordando da conduta por sua posição na condução do processo. Ademais, é de se afastar a responsabilidade solidária do cliente-contratante, que, somente em casos excepcionais, responderia pela conduta do advogado contratado, caso demonstrada sua culpa in eligendo. Precedentes citados: REsp 151.840-MG, DJ 23/8/1999; REsp 163.221-ES, DJ 8/5/2000; REsp 357.418-RJ, DJ 10/3/2003, e REsp 579.157-MT, DJ 11/2/2008. REsp 932.334-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/11/2008.
AÇÃO POSSESSÓRIA. PERDAS E DANOS. REINTEGRAÇÃO.
Nos autos de ação de manutenção de posse cumulada com perdas e danos ora em sede de recurso especial, os recorrentes indicam a contradição do acórdão recorrido, pois, enquanto, de um lado, reconheceu o caráter mandamental das ações possessórias (a permitir o cumprimento das respectivas sentenças a partir da expedição da ordem de ocupação, até de ofício), de outro, considerava nula a sentença que determinava a expedição de tal mandado por julgá-la extra petita. Porém, está consignado, nesse mesmo acórdão, que o cumprimento da sentença proferida na referida ação foi desmembrada em duas vertentes. Na primeira, incumbida da questão possessória propriamente dita, decidiu-se inviável a expedição do mandado de imissão na posse, pois a área a ser restituída ainda penderia de individualização, a ser feita em sede de liquidação. Já a outra, relativa às perdas e danos, requereu execução específica, por tratar-se de quantia líquida, cujos embargos são, agora, o objeto do recurso especial. Então, restringindo-se a execução ajuizada pelos recorrentes apenas à parte referente às perdas e danos, o juiz singular estava impedido de, na sentença de embargos, determinar a restituição da área (sob pena de multa diária), pois expedira ordem de cumprimento impossível, dada a necessidade de liquidação (transmudando a referida multa em pena compulsória), além de extrapolar os limites do título judicial executado. Dessarte, a declaração de nulidade da sentença por mácula ao art. 460 do CPC nada tem de incompatível ou contraditório com o reconhecimento da possibilidade de execução autônoma nas ações possessórias, caindo por terra a tese defendida pelos recorrentes. Anote-se, por último, que não se negou cumprimento à ordem reintegratória, visto que se decidiu somente que os embargos à execução da parte relativa às perdas e danos não seriam próprios para aquele fim. REsp 1.000.956-MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 18/11/2008.
FALÊNCIA. INDENIZAÇÃO. SÚM. N. 207-STJ.
O banco, lastreado em duas notas promissórias, declarava-se credor da importância de duzentos mil dólares e requereu a falência da companhia industrial tida por devedora. O juízo singular acabou por afastar a liquidez e certeza desse crédito e exarou sentença de improcedência do pleito falimentar, condenando o banco ao pagamento de indenização (atualmente em quatrocentos milhões de reais) a título de perdas e danos (art. 20 do DL n. 7.661/1945). Ambas as partes apelaram e o TJ, por maioria, reformou parcialmente a sentença para afastar a condenação imposta e majorar os honorários advocatícios. Opostos embargos de declaração por ambas as partes, os da companhia foram rejeitados por unanimidade, enquanto os do banco também o foram, mas por maioria. No acórdão, um dos desembargadores (voto divergente), modificava completamente seu entendimento (firmado quando da apelação), para ter como improcedente o pedido inicial. Novos aclaratórios foram ajuizados pelo banco. Esses também tiveram o mesmo destino, a negativa de provimento, mas com a aplicação da multa de 10% sobre o valor da causa, dado seu caráter protelatório. Daí o REsp do banco, que só subiu por força de provimento a agravo de instrumento. Diante disso, em preliminar, vê-se que o condicionamento da interposição de recurso ao pagamento de multa (art. 538, parágrafo único, do CPC) é admitido quando da oposição dos segundos declaratórios tidos por protelatórios, o que não é o caso dos autos, apesar de o banco ter depositado a referida quantia. Verifica-se, também, a preclusão da decisão do Ag que determinou a subida do REsp. Por outro lado, não se aplica ao caso a Súmula n. 207-STJ, visto que os aclaratórios em questão não receberam efeitos infringentes, pois foram improvidos, apesar da modificação do posicionamento de um dos desembargadores (sem efeito integrativo), como já dito, não existindo qualquer alteração no julgamento unânime proferido anteriormente; sequer se suprimiu omissão, obscuridade ou contradição. Dessarte, a fundamentação do acórdão embargado permaneceu hígida, daí não se mostrarem necessários ou mesmo cabíveis os infringentes. Entender viável a interposição de infringentes do julgamento não-unânime dos declaratórios pela simples existência de divergência é conferir interpretação extensiva à lei processual e criar óbice não previsto por ela à abertura da instância especial. Outrossim, não se deve exigir do banco a alegação de violação do art. 535 do CPC, pois o voto divergente foi-lhe favorável, a revelar sua falta de interesse. Quanto ao mérito, é consabido que o parágrafo único do art. 20 do DL n. 7.661/1945 exige a configuração de culpa ou abuso para a respectiva condenação e que o art. 159 do CC/1916 permitia entrever serem necessárias as demonstrações do elemento subjetivo e do nexo de causalidade, a afastar o simples ajuizamento de pedido de falência ou a mera improcedência do pleito como fundamentos à referida indenização. No caso, o desembargador relator do acórdão recorrido, sem estabelecer a devida pertinência lógica entre seus fundamentos e sua conclusão, acabou por reconhecer haver nexo de causalidade e culpa. Contudo, vê-se constar dos autos, nas premissas firmadas de forma coerente nas instâncias ordinárias, a inexistência de culpa, dolo ou nexo causal, o que impediria o acolhimento do pedido indenizatório. Com esse entendimento, a Turma, por maioria, ao prosseguir o julgamento após sua renovação, conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento, para julgar improcedente o pedido indenizatório e condenar a companhia ao pagamento de custas e honorários advocatícios (art. 20, § 4º, do CPC) no valor de cinco mil reais, corrigidos até o pagamento. Precedentes citados do STF: RE 64.706-RJ, DJ 29/10/1968; EDcl no AgRg no AI 653.882-SP, DJ 19/9/2008; do STJ: REsp 710.207-PR, DJ 20/6/2008; AgRg no Ag 76.653-DF, DJ 30/10/1995; EDcl no AgRg no Ag 837.439-SP, DJ 3/11/2008; EDcl no RMS 26.340-MS, DJ 20/10/2008; REsp 132.349-SP, DJ 3/11/1998; REsp 226.030-SP, DJ 16/11/1999, e EDcl no REsp 665.561-GO, DJ 26/9/2005. REsp 512.399-PE, Rel. originário Min. Cesar Asfor Rocha, Rel. para acórdão Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 18/11/2008.
SEGURO. ACIDENTE. TRATOR.
Trata-se de ação de cobrança de seguro DPVAT por acidente que vitimou o filho dos autores, pagamento que foi recusado pela ausência de elementos a respeito do veículo causador do sinistro, trator que operava em fazenda na atividade agrícola. A ora recorrente alega, entre outras coisas, não haver previsão de cobertura de seguro obrigatório em acidentes provocados por tratores, que são veículos de licenciamento facultativo; portanto, somente nessa hipótese, fariam jus os recorridos à indenização. Diante disso, a Turma entendeu que, relativamente ao descabimento da indenização, não prospera o inconformismo da recorrente, visto que, no caso, é desimportante se cuidar de trator de utilização em fazenda ou não ter havido o pagamento do prêmio do seguro, restando mantido o acórdão a quo que entendeu devida a cobertura. Precedente citado: REsp 11.889-PR, DJ 22/6/1992. REsp 665.282-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 20/11/2008.
DANOS MORAIS. ADVOGADO. IMUNIDADE.
Trata-se de ação ordinária de reparação por danos morais em que o autor (advogado) ora recorrente alega, entre outras coisas, ter o recorrido (também advogado) lhe imputado conduta definida como crime de constrangimento ilegal, além de outros fatos que lhe ofenderam a reputação. Em apelação, manteve-se a sentença desfavorável ao recorrente ao argumento de que o recorrido apenas levou ao conhecimento do julgador a versão apresentada pela cliente. No REsp, o recorrente sustenta que, embora a imunidade profissional assegure ao advogado liberdade no exercício da profissão, ela não é absoluta e não protege os excessos perpetrados pelo advogado em suas manifestações, especialmente quando ele ataca os demais partícipes da relação processual. Nesse contexto, a Turma conheceu do REsp e lhe deu provimento, reiterando o entendimento de que a inviolabilidade do advogado não é absoluta, estando adstrita aos limites da legalidade e da razoabilidade. Logo, excessos cometidos pelo profissional em face das demais pessoas envolvidas no processo não são cobertos pela imunidade profissional prevista no Estatuto da Ordem, podendo o advogado ser responsabilizado pelos danos que provocar no exercício de sua atividade. No caso, tampouco socorre o ora recorrido a alegação central da sentença e do acórdão de que houve reprodução, pelo advogado, de declaração pública da cliente. Deveras, se assim fosse, bastaria que se repetisse o que um incapaz pronunciasse, para se escoimar qualquer pecha de ofensa. A responsabilidade daquele que escreve um documento e o torna público em um processo, assacando contra a honra de outrem, é de quem o subscreve, pouco importando se reproduz, ou não, as ofensas prolatadas pela sua cliente (art. 32, caput, da Lei n. 8.906/1994). Assim, verificou-se abuso de direito cometido pelo recorrido na defesa de sua cliente que, a pretexto de demonstrar o direito da parte, excedeu-se em suas atribuições, imputando ao recorrente atos apontados como ilícitos, tecendo comentários ofensivos a sua pessoa. Passível, portanto, de reparação por danos morais, aos quais se deu o valor de R$ 10.000,00. Precedentes citados: REsp 163.221-ES, DJ 5/8/2002; REsp 1.022.103-RN, DJ 16/5/2008, e AgRg no Ag 657.289-BA, DJ 5/2/2007. REsp 988.380-MG, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 20/11/2008.
SEPARAÇÃO. CONVERSÃO. DIVÓRCIO. PARTILHA.
Trata-se de conversão de separação em divórcio, sendo incontroverso o decurso de tempo exigido pela lei. Alega a recorrente que o recorrido não adimpliu a obrigação firmada em acordo, qual seja, a transferência do imóvel do casal para a ex-esposa e seus filhos. Frente a isso, a Turma não conheceu do recurso por entender correto o acórdão a quo, no qual se assentou que as disposições do art. 36, II, da Lei n. 6.515/1977 continuam exigíveis em face da CF/1988, desde que as obrigações firmadas no acordo de separação não possam ser reclamadas por outros meios. Logo, como a autora, ora recorrente, poderia utilizar-se de ação própria para exigir aquela obrigação de fazer assumida pelo autor, ora recorrido, em ato de deliberação de partilha, incabível a invocação do referido dispositivo legal para impedir a decretação do divórcio. Ademais, no acordo de separação, homologado judicialmente, foi definida a partilha dos bens do casal. Contudo, a pendência referente à transferência do bem imóvel não configura causa impeditiva para a conversão, salvo demonstrado grave prejuízo. Precedentes citados: REsp 663.955-PE, DJ 23/5/2005, e REsp 236.225-DF, DJ 2/2/2004. REsp 207.682-SP, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 20/11/2008.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

DIREITOS AUTORAIS. INTERESSANTE ARTIGO DE RODRIGO MORAES (BA).

Ó PAÍ, Compositores!
Publicada em 25/11/2008
Autor: Rodrigo Moraes, advogado, compositor e Presidente da Comissão de Educação, Cultura, Esporte e Lazer da OAB-BA. E-mail: rodrigo@rodrigomoraes.adv.br.
No dia 31 de outubro de 2008, estreou, na TV Globo, o primeiro episódio do seriado Ó PAÍ, Ó, uma continuação do filme homônimo de Monique Gardenberg, que traz no elenco o excelente Bando de Teatro Olodum. Gostaria, aqui, de registrar minha percepção sobre como o tema Direito Autoral foi abordado.
Eis uma breve sinopse do episódio, dirigido por Mauro Lima. Neusão (Tânia Toko), a “gata-macho” proprietária do bar mais badalado do Pelourinho, briga com Queixão (Matheus Nachtergaele), porque este monta uma “isoposada” na porta de seu estabelecimento, para a venda de cerveja por um preço 50% menor, afugentando, assim, sua clientela.
A concorrência desleal é criticada por Neusão. Afinal de contas, Queixão não paga impostos, empregados etc. O mercado informal é condenado por ela com veemência, que o denomina de “mercado negro”. Ao ouvir tal expressão, hoje politicamente incorreta, o cantor e compositor Roque (Lázaro Ramos) diz que “o mercado não é negro; ele é branco”.
Afirma: “isso aí [o vocábulo “negro”] é simbólico”. Na visão do personagem, portanto, a expressão contém, simbolicamente, preconceito racial, assim como outras (“lista negra”, “caixa preta”, etc.). Segundo Roque, o mercado é branco. O compositor, então, inspira-se e cria a canção de protesto Mercado Branco, que aborda essa séria temática do preconceito.Descontente com a concorrência desleal de Queixão, a dona do bar promove um show com a participação de Roque.
O intuito do show foi exatamente esse: angariar clientela, ajudar a pagar as dívidas do estabelecimento. Pois bem. Após o término da apresentação, surge uma personagem que se apresenta de maneira arrogante e caricaturada: “Boa noite. Fiscal de arrecadação de direitos”. Neusão, inconformada, responde: “Ó paí, rapaz, cada dia aparece um malandro com uma sigla nova, querendo morder um troco de quem está duro...”. A fiscal afirma: “Sabia que pra senhora executar música aqui precisa pagar direitos autorais?” Neusão rebate: “Isso aqui é uma comemoração em família”. A fiscal contesta: “Família? A senhora quer dizer que esse povo todo aqui é irmão, é genro, é cunhado da senhora?”. Roque, cantor e compositor, indignado, diz que a fiscal de arrecadação é uma “burocrata”.
O taxista Reginaldo (Érico Brás), então, malandramente, tenta “conquistar” (leia-se subornar) a fiscal, oferecendo-lhe cerveja e acarajé. Ela confessa explicitamente que é corrupta, nos seguintes termos: “Meu camarada, eu só aceito em espécie”. Então, Reginaldo põe na mão da fiscal desonesta uma cédula de R$ 50,00. Mais uma vez, funciona o velho “cala-boca”, o famoso “jeitinho brasileiro”.
Obviamente, a TV Globo fez uma crítica ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), órgão criado com a Lei 5.988/73. O nome ECAD não foi dito expressamente, mas todos captaram a mensagem que a TV Globo tentou incutir na mente de milhares e milhares de brasileiros. Não poderia ser outro órgão, porque somente ele tem legitimidade para efetuar a cobrança de direitos autorais decorrentes de execução pública. A mensagem subliminar merece uma análise. A fiscal não poderia ter sido chamada de “burocrata”, porque o ECAD é um órgão privado, uma associação civil. Burocrata só pode ser quem trabalha na Administração Pública. E o ECAD é um órgão privado, que faz a cobrança através de depósito bancário, como determina o art. 99, §3º da Lei Autoral.
Mas por que será que a Globo quis fazer chacota com tema tão sério? A resposta é óbvia: ela é uma grande usuária de música e, ordinariamente, é refratária no pagamento. Costuma não querer pagar. Costuma resistir ao máximo. Atualmente, inclusive, encontra-se sub judice, num processo que se encontra no Supremo Tribunal Federal (STF). A Globo recusa-se a pagar 2,5% de seu faturamento a título de direitos autorais. Então, utiliza o seu poder de conquistar a massa, jogando a sociedade contra a parte ex adversa. A opinião pública, em sua grande maioria, captou de maneira inconsciente a mensagem, que tentou denegrir o ECAD. Aliás, retifico: a mensagem tentou ferir a imagem do ECAD, porque “denegrir” é vocábulo considerado politicamente incorreto, ao menos aqui na Cidade do Salvador, pois associa (“simbolicamente”) o negro a algo negativo.
Ficou subentendido o seguinte: a TV Globo quis desmoralizar o ECAD. O significado da mensagem surgiu de forma implícita, sutil, lúdica, cômica, criativa. Mensagem subliminar é algo que precisa ser analisado com muito cuidado. Lembrei-me daquela canção de Lulu Santos e Nelson Motta: “Eu gosto tanto de você, que até prefiro esconder. Deixo assim ficar subentendido...” A TV Globo deixou algo subentendido. Não o seu amor pelo Escritório Central. Deixou subentendido, sim, uma inverdade: que o ECAD é um órgão nocivo, que atrapalha a cultura e prejudica os autores.
Curioso é que, ao conseguir obter o dízimo de Dona Joana, o pastor dirige-se ao bar de Neusão e aluga um microfone para o show de uma cantora gospel. Indaga-se: por que Neusão não emprestou o microfone gratuitamente? Por que cobrar pelo empréstimo? Não seria tal conduta um empecilho à cultura, à difusão da música? Ora, então por que os autores têm de “emprestar” (autorizar) gratuitamente suas canções?
Ademais, a TV Globo esqueceu de dizer, nos créditos, que a música Mercado Branco, interpretada por Roque (Lázaro Ramos) e que deu título ao primeiro episódio, é de autoria do compositor de reggae baiano Edson Gomes. O crédito não foi dado, o que consiste em violação explícita ao direito moral do autor de ter o seu nome designado na utilização de sua obra (Lei nº 9.610/98, art. 24, II e art. 108). O autor Edson Gomes faz jus a uma ação indenizatória contra a Globo, conforme lhe autoriza a Lei. O nome de Edson Gomes sequer consta nos créditos do site oficial da Rede Globo (www.opaio.globo.com). Por que será? Será que o compositor nacional é, de fato, devidamente valorizado por essa importante emissora? Os compositores precisam ter consciência de que há diversos projetos de lei, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, tentando desobrigar o pagamento de direitos autorais ao ECAD. Ei-los: PL 3548/2008, PL 1550/2007, PL 860/2007, PL 818/2007, PL 793/2007, PL 752/2007, PLS 627/2007, PL 6226/05, PL 5943/05, PL 5831/05, PL 5105/05, PL 4811/05, PLS 221/04, PL 2290/03, PL 1004/03, PLS 532/2003, PL 6.980/02, PL 6.136/02, PL 5.298/01, PL 4.499/01, PL 4.429/01, PL 1940/99, PL 1.557/99.
Indaga-se: qual o verdadeiro interesse desses parlamentares? Proteger os autores? Fomentar a cultura? Será? O personagem Queixão me faz afirmar que queixão é quem quer usar música sem nada pagar. Queixão é quem omite os nomes dos compositores na programação e, ainda, utiliza o slogan “Cidadania, a gente vê por aqui”. Queixão é chamar um órgão de corrupto, para tentar legitimar a inadimplência. Por fim, lembrei-me, também, de que Ó PAÍ, Ó é fruto do talento criativo do dramaturgo e diretor teatral Marcio Meirelles, atual Secretário de Cultura do Estado da Bahia. Uma das principais metas da SECULT, segundo o ilustre Secretário, é “interiorizar” a cultura. Diversos municípios do interior baiano são inadimplentes em relação ao ECAD. Amargosa é campeã na inadimplência! Faz festas caríssimas de São João e não paga direitos autorais. O Estado cruza os braços e finge que não vê. A União, idem.
Ora, cabe à SECULT e, sobretudo, ao Ministério da Cultura, contribuir no fomento do respeito ao Direito Autoral. Por que não produzir, ao menos, um folder institucional dizendo que os Municípios devem, sim, respeitar a Lei 9.610/98, vigente Lei de Direito Autoral?
Compositores, cuidado na hora de afirmar que os técnicos do ECAD querem “morder um troco de quem está duro”. Os mordedores são outros. E quem está dura, na verdade, não é a TV Globo. Dura, sim, é a situação de muitos compositores, prejudicados cotidianamente por diversos Queixões e Neusões empresários, prefeitos, donos de emissoras de rádio e televisão, hotéis, motéis, casas de show, restaurantes, bares...

domingo, 23 de novembro de 2008

BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR. PROPOSTA LEGISLATIVA INTERESSANTE!!

Projeto amplia proteção contra penhora de bem de família
O Projeto de Lei 2455/07, do deputado Fernando de Fabinho (DEM-BA), elimina a possibilidade de penhora da residência de devedor em três casos:
- para cobrança de impostos predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;
- para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
- por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Essas três exceções, que são revogadas pelo projeto, estão previstas na Lei 8.009/90. Conforme a lei, o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar é impenhorável e não responderá por nenhum tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas na lei.
O projeto mantém as demais exceções previstas na lei, como o penhor para pagamento de pensão alimentícia.
O deputado argumenta que o objetivo da lei é proteger o imóvel usado como residência familiar. "Sendo assim, não se justifica que a mesma lei permita a penhora nesses três casos.
Não adianta o legislador oferecer a proteção com umamão e retirá-la com a outra", disse.
Segundo Fernando de Fabinho, é especialmente grave a hipótese do bem de família ser penhorado em virtude de fiança concedida em contrato de locação. "Pune-se quem praticou um ato de solidariedade e boa-fé, em detrimento do afiançado mau pagador", lamenta o parlamentar.
Tramitação
O projeto, que tramita em caráter conclusivo na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Ele foi apensado ao PL 4728/98, do ex-deputado José Machado, que proíbe o oferecimento do único imóvel, que serve de abrigo à família do fiador, como garantia de locação.
Íntegra da proposta:- PL-2455/2007
Reportagem - Luiz Claudio Pinheiro
Edição - Natalia Doederlein
(Reprodução autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara')
Agência Câmara
Tel. (61) 3216.1851/3216.1852Fax. (61) 3216.1856

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

RESUMO. INFORMATIVO N. 376 DO STJ. VÁRIOS TEMAS: RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO, PERDA DA CHANCE, EFICÁCIA EXTERNA DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

CONSÓRCIO. MÓVEIS. TAXA. ADMINISTRAÇÃO.
Quanto ao consórcio de bens móveis, o TJ entendia nula de pleno direito a cobrança de taxa de administração no valor de 19%, porque isso afrontava, não só o art. 51, IV, do CDC, como também o art. 42 do Dec. n. 70.951/1972 (regulamentou a Lei n. 5.768/1971), que a limitava a 10% no caso (bem mais valioso do que cinqüenta salários mínimos que não é de fabrico ou comércio da associação). Já a Seção adotou o entendimento da Quarta Turma de que essas administradoras de consórcio possuem total liberdade para fixar a respectiva taxa de administração (art. 33 da Lei n. 8.177/1991, que atribuiu ao Bacen competência para limitá-las, e Circular n. 2.766/1997 do Bacen, que determinou a fixação da taxa pela administradora no contrato de adesão do associado), não se tendo por ilegal ou abusiva a taxa fixada em percentual superior a 10%, tal como ocorre no presente caso. O Min. Aldir Passarinho Junior, reportando-se a seu voto vista em precedente, reiterou que, para a constatação da abusividade repudiada pelo CDC, há que se demonstrar, de modo cabal, que a taxa cobrada situa-se em patamar bastante acima do que usualmente cobrado pelas demais administradoras de consórcio, exigência semelhante à que se faz na apuração da abusividade das taxas de juros bancárias. Precedente citado: REsp 918.627-RS, DJ 11/2/2008. EREsp 927.379-RS, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgados em 12/11/2008.
INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. DETENTO.
Detento cumprindo mandado de prisão ajuizou ação de indenização contra Estado-membro por sua manutenção em unidade prisional sem condições mínimas. As instâncias ordinárias reconheceram a culpa objetiva do ora recorrente (Estado-membro), que, no REsp, aponta divergência jurisprudencial neste STJ, a impossibilidade de indenização em razão de limitação de recursos orçamentários e ainda sustenta a falta de demonstração de culpa administrativa, por tratar-se de responsabilidade subjetiva. Para o Min. Teori Albino Zavascki (tese vencedora), duas premissas são importantes no julgamento deste recurso. A primeira: não está em questão o exame das condições do sistema carcerário brasileiro, mas apenas um específico estabelecimento prisional, em “estado caótico”, tal como reconhecido no acórdão recorrido; a segunda: não se negou a ocorrência do dano moral, mas apenas a responsabilidade civil do Estado pela respectiva indenização. Observa que, estabelecidas essas premissas, não há como deixar de dar provimento ao recurso, e o princípio da reserva do possível, que, nos votos vencidos, teria o significado da insuficiência de recursos financeiros, não pode ser invocado, numa dimensão reducionista, nas situações como as do caso concreto. Ressalta que o dever de ressarcir danos, inclusive morais, efetivamente causados por ato dos agentes estatais ou pela sua inadequada prestação de serviços públicos decorre do art. 37, § 6º, da CF/1988, dispositivo auto-aplicável. Assim, ocorrendo o dano e estabelecido o nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado e, nesses casos, o dever de ressarcir. Lembra que, recentemente, a Turma assentou o entendimento de que o dever de proteção do Estado em relação aos detentos abrange, inclusive, protegê-los contra si mesmos e impedir que causem danos uns aos outros. Para o Min. Relator (vencido), seria indevida a indenização na hipótese, uma vez que o problema carcerário não decorre da má administração da coisa pública, mas de várias conjunturas sociais, bem como da indisponibilidade orçamentária, aspectos que devem ser sopesados com os direitos envolvidos no caso. Pelo exposto, a Turma, por maioria, negou provimento ao recurso. Precedentes citados: AgRg no Ag 986.208-MT, DJ 12/5/2008; REsp 847.687-GO, DJ 25/6/2007; REsp 713.682-RJ, DJ 11/4/2005, e REsp 944.884-RS, DJ 17/4/2008. REsp 1.051.023-RJ, Rel. originário Min. Francisco Falcão, Rel. para acordão Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 11/11/2008.
INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. MORTE. DETENTO.
Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada pela mãe em razão da morte de seu filho, ocorrida dentro de uma cela de unidade prisional e provocada por outros detentos. O pedido foi julgado procedente nas instâncias ordinárias, condenando a Administração Pública estadual ao pagamento de indenização de dez mil reais e pensão na proporção de dois terços do salário mínimo até a idade presumida de 65 anos. Ressalta o Min. Relator que no caso, não se cuida de prova (Súm. n. 7-STJ), uma vez que não há discussão acerca das circunstâncias que levaram à morte o detento, sendo claro que foi ocasionada por outros presos dentro de uma cela. Manteve, assim, o posicionamento no sentido de que, na hipótese dos autos, não há qualquer envolvimento direto do agente do ente público a ensejar a respectiva indenização e de que não ficou demonstrada a culpa ou dolo da Administração, porque a morte do detento foi causada por outros presos. Para a tese vencedora, há culpa in vigilando da Administração (Estado-membro) que deve responder pelo evento danoso. Assim, a Turma, por maioria, negou provimento ao recurso do Estado-membro. REsp 936.342-ES, Rel. originário Min. Francisco Falcão, Rel. para acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 11/11/2008.
CONTRATO. SFH. EFICÁCIA. TERCEIROS.
Firmou-se contrato de mútuo habitacional (SFH) com o agente financeiro vinculado ao extinto BNH. Sucede que houve a cessão da posição contratual (devedor) por força de escritura de compra e venda na qual se ressalvava a existência de caução hipotecária dada ao BNH pelo agente financeiro, mediante endosso em cédula hipotecária. Então, os cessionários quitaram antecipadamente o saldo devedor, quitação essa passada pelo agente financeiro, autorizando-os a levantar o gravame hipotecário. Remanesceu, contudo, o direito real de caução sobre o crédito hipotecário. Porém, a CEF firmou contrato de novação com o agente financeiro (em liquidação extrajudicial) e adquiriu, entre outros, os direitos sobre a caução hipotecária constituída sobre o imóvel dos cessionários. Foi o inadimplemento do agente financeiro que gerou a pretensão de a CEF opor-se ao levantamento do gravame da caução, o que levou os cessionários a ingressar com ação ordinária contra a CEF, com o fito de liberá-los desse ônus real. Quanto a isso, veja-se que o princípio da relatividade dos efeitos dos contratos (res inter alios acta) tem sofrido mitigações mediante a admissão de que os negócios entre as partes, eventualmente, podem interferir (positiva ou negativamente) na esfera jurídica de terceiros. Essas mitigações dão-se pela doutrina do terceiro cúmplice, a proteção do terceiro diante dos contratos que lhe são prejudiciais ou mesmo pela tutela externa do crédito. Porém, em todos os casos, sobressaem a boa-fé objetiva e a função social do contrato. No caso, a cessão dos direitos de crédito à CEF deu-se após o adimplemento da obrigação pelos cessionários, negócio que se operou inter partes (devedor e credor). Assim, o posterior negócio entre a CEF e o agente financeiro não tem força para dilatar sua eficácia e atingir os devedores adimplentes. Aflora da interpretação dos arts. 792 e 794 do CC/1916 a necessidade de que os cessionários sejam notificados da cessão do título caucionado, com o desiderato de não pagarem em duplicidade, assertiva compartilhada pelas instâncias ordinárias. No entanto, não há, nos autos, prova de que a CEF tenha promovido a notificação. Por último, vê-se que a Súm. n. 308-STJ tem aplicação analógica ao caso e que os princípios da boa-fé objetiva, função social e os relativos à proteção das relações jurídicas também impedem a responsabilização dos cessionários. Com esse entendimento, a Turma, conheceu em parte do recurso da CEF e, nessa parte, negou-lhe provimento. REsp 468.062-CE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 11/11/2008.
AÇÃO. INDENIZAÇÃO. CONSTRUTORA.
A autora argumenta que seu irmão faleceu no desmoronamento da laje do edifício em construção no qual trabalhava. Alega que dependia economicamente da vítima, sendo sua dependente perante o INSS e pleiteia o pagamento de pensão mensal, constituição de capital que garanta o referido pagamento e indenização por dano moral, que arbitra em 300 salários mínimos. O Tribunal a quo reconheceu a legitimidade ativa da autora, bem como a negligência da construtora como causa do acidente. Assim, condena a proprietária da obra a indenizar diretamente a autora, dando a ela, proprietária, o direito de requerer, em regresso, o ressarcimento devido pela construtora ou pela seguradora contratada, nos limites da apólice. A recorrente, em seu recurso, alega violação do art. 1.058 do CC/1916 porque o evento teria decorrido de caso fortuito ou força maior, consoante conclusão do laudo pericial. O Min. Relator conhecia e dava provimento ao recurso para restabelecer a sentença, respaldando a pretensão da recorrente, ao observar que a livre apreciação da prova pelo juiz não implica arbítrio. Ele está livre para afastar um elemento de prova ao decidir, mas desde que o substitua por outro elemento capaz de sustentar a versão que estabelecerá para os fatos sub judice. A Min. Nancy Andrighi, em seu voto-vista, concordou com o Min. Relator quando afirma que substituir um elemento de prova por mera suposição implicaria arbítrio. Entretanto, ponderou que o Tribunal de origem não pôs de lado o laudo pericial sem motivos, como pretendeu fazer crer o recorrente, mas declarou, de maneira expressa, por que o fazia: a) entendeu que o laudo seria contraditório em seus próprios termos, já que a proximidade entre o edifício que desmoronou e a praia indicaria uma fragilidade maior do solo, demandando cuidado adicional; b) considerou relevante a declaração de um operário de que o desmoronamento da estrutura anunciava-se já uma semana antes de ocorrer. O Instituto de Criminalística concluiu que o projeto do edifício era adequado. A causa do acidente, portanto, terá sido o inesperado adensamento do solo no ponto em que se localizava a viga que ruiu. Tal adensamento não foi instantâneo, foi progressivo, conforme se constata do laudo. Ainda que o cálculo da obra tenha sido inicialmente correto, nada impede que tal perda progressiva de resistência seja passível de observação pelos que ali trabalhavam e pelos engenheiros responsáveis. A declaração do operário ao jornal indica que ele havia notado que a escora se deteriorara, qualquer que fosse o motivo. Competiria ao engenheiro responsável, diante de qualquer anormalidade, paralisar a obra e verificar o fato. Para a Min. Nancy Andrighi, pode-se até argumentar que a versão adotada pelo acórdão recorrido não seja a mais adequada. Mas não é possível dizer que ela decorre de arbítrio no julgamento. Tudo o que o Tribunal fez foi apreciar, segundo seu livre convencimento, as provas dos autos. Por isso, é impossível a revisão da matéria nesta sede, por força do óbice da Súm. n. 7-STJ. Esclareceu, ainda, que a jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal é que o dono da obra responde, solidariamente com o empreiteiro, pelos danos decorrentes de sua construção ou de reforma. Também quanto à dependência econômica em relação à vítima, não cabe rever a matéria nesta instância especial por vedação da Súm. n. 7-STJ. REsp 267.229-RJ, Rel. originário Min. Ari Pargendler, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/11/2008.
SUCESSÃO EMPRESARIAL. RESPONSABILIDADE. DÍVIDA.
A recorrente, concessionária de transporte ferroviário, sustentou que não possui qualquer relação com a empresa que à época dos fatos explorava a rede ferroviária e que, em razão do acidente que vitimou o filho do recorrido, foi condenada a indenizá-lo. A recorrente não seria sucessora daquela, não absorveu parte de seu patrimônio e não tem qualquer ligação com aquela companhia. A questão analisa a responsabilidade da recorrente e a existência de sucessão empresarial, bem como examina a legalidade da decisão que determinou a penhora de cinco por cento de sua renda líquida. A Min. Relatora destacou que, em situação análoga à dos autos, a empresa que recebe o patrimônio da anterior concessionária e continua na exploração da mesma atividade responde pela dívida judicial já constituída antes da alienação. A particularidade da hipótese indica que, a par da sucessão reconhecida pelo acórdão recorrido, a companhia sucedida manteve sua personalidade jurídica ainda diante do processo de liquidação e que, nessa condição, foi citada para a execução. A sucessão, por si só, não faz com que aquele ato citatório estenda seus efeitos à recorrente. Não se dispensa a regular citação apenas porque a companhia sucedida já fora citada. Assim, deve-se reconhecer que o acórdão recorrido, ao determinar a penhora sem antes franquear à recorrente a oportunidade de pagar e nomear bens à penhora, violou o devido processo legal e, em especial, o art. 652 do CPC, devendo, portanto, ser reformado nesse ponto. A Min. Relatora ressaltou ainda que a penhora sobre o faturamento ou renda, vem sendo admitida por este Superior Tribunal. Entretanto, para aceitar tal modalidade de constrição, requer-se que: a) o devedor não possua bens ou, se os tiver, sejam eles de difícil execução ou insuficientes a saldar o crédito demandado; b) impõem-se a nomeação de administrador e a apresentação de plano de pagamento; c) o percentual fixado sobre o faturamento não torne inviável o exercício da atividade empresarial. Sem a prévia citação da recorrida, não se cumpriu, à evidência, o primeiro requisito mencionado acima, que exige a excepcionalidade da penhora sobre o faturamento. Diante disso, a Turma conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento para reformar o acórdão recorrido, cassando a decisão que determinou a penhora da renda da recorrente e determinando que o feito prossiga em primeiro grau de jurisdição, na esteira do devido processo legal. Precedentes citados: REsp 399.569-RJ, DJ 10/2/2003; EREsp 311.394-PR, DJ 9/10/2006, e AgRg no Ag 777.351-SP, DJ 27/11/2006. REsp 866.382-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/11/2008.
SENTENÇA PENAL. EXTINÇÃO. PUNIBILIDADE. INDENIZAÇÃO.
O recorrente exerceu a função de diretor administrativo da fundação recorrida e emitiu 109 cheques sacados pela pessoa jurídica em favor de seus filhos, os demais recorrentes. Dessa forma, ter-se-ia consubstanciado o crime de apropriação indébita. O extinto Tribunal de Alçada estadual condenou os recorrentes pela prática das últimas 53 condutas. Esse acórdão criminal é a peça que embasa o pedido de liquidação de sentença que, após a homologação dos cálculos em primeiro e segundo grau de jurisdição, é atacada por meio do recurso especial. Os recorrentes sustentavam que a condenação penal reconheceu a prescrição retroativa da pretensão punitiva para todas as práticas delitivas. Embora o acórdão recorrido passe ao longo da prescrição quanto às últimas 53 condutas, há uma segunda decisão criminal relevante, cuja punibilidade, em razão de o recorrente ter completado setenta anos, foi decretada extinta, ocorrente a prescrição retroativa da pretensão punitiva. O cerne da questão diz respeito à eficácia da sentença penal que extingue a punibilidade. Para a Min. Relatora, a hipótese dos autos é excepcional, pois o recorrente foi efetivamente condenado. A decisão condenatória traz conseqüências claras tanto na esfera penal quanto na esfera civil, impondo-se ao réu a pena pecuniária, restritiva de direitos ou da liberdade, ao mesmo tempo em que sujeita o condenado ao dever de reparar, após a liquidação na esfera cível, os danos que causou. Foi isento da pena. A extinção da punibilidade ocorreu após a existência da sentença penal condenatória, com base na pena in concreto, levando-se, ainda, em consideração, sua especial condição de septuagenário. A prescrição retroativa posteriormente reconhecida só atinge os efeitos penais da condenação, não seus efeitos civis. Afinal, não se pode ignorar que o Poder Judiciário reconheceu a existência de fato típico, antijurídico e culpável, e isso é quanto basta para que, na esfera cível, imponha-se o dever de indenizar. A sujeição do condenado à pena é fato irrelevante para fins de direito privado. Ao art. 67, II, CPP, deve-se dar interpretação que prestigie o princípio constitucional da razoável duração do processo. Havendo certeza sobre o ilícito, a decisão que julgar extinta a punibilidade não impedirá, em sentido amplo, a propositura de "ação civil", ou seja, ação de conhecimento, execução ou cautelar. Entendimento diverso imporia ao jurisdicionado o ônus de suportar a duração de dois processos de conhecimento, um na esfera cível e outro na criminal, para que se julguem rigorosamente os mesmos fatos. REsp 789.251-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/11/2008.
RESPONSABILIDADE. ADVOGADO. TEORIA. PERDA. CHANCE.
A recorrente afirma que o advogado foi negligente na condução de sua causa, vindo ela a perder seu imóvel, por não defender adequadamente seu direito de retenção por benfeitorias e também ter deixado transcorrer in albis o prazo para a interposição de recurso de apelação. Para a Min. Relatora, não há omissão ou contradição no acórdão impugnado. O Tribunal a quo pronunciou-se de maneira a discutir todos os aspectos fundamentais do julgado, dentro dos limites que lhe são impostos por lei, alcançando solução que foi tida como mais justa e apropriada para a hipótese. A questão insere-se no contexto da responsabilidade profissional do advogado. O vínculo entre advogado e cliente tem nítida natureza contratual. Em razão do vínculo obrigacional, a responsabilidade do advogado é contratual. Todavia sua obrigação não é de resultado, mas de meio. O advogado obriga-se a conduzir a causa com toda diligência, não se lhe impondo o dever de entregar um resultado certo. Ainda que o advogado atue diligentemente, o sucesso no processo judicial depende de outros fatores não sujeitos a seu controle. Daí a dificuldade de estabelecer, para a hipótese, um nexo causal entre a negligência e o dano. Para a solução do impasse, a jurisprudência, sobretudo do direito comparado, e a doutrina passaram a cogitar da teoria da perda da chance. Essa teoria procura dar vazão ao intrincado problema das probabilidades com as quais se depara no dia-a-dia, trazendo para o campo do ilícito aquelas condutas que minam, de forma dolosa ou culposa, as chances, sérias e reais, de sucesso às quais a vítima fazia jus. Há possibilidades e probabilidades diversas e tal fato exige que a teoria seja vista com o devido cuidado. A adoção da teoria da perda da chance exige que o Poder Judiciário bem saiba diferenciar o “improvável” do “quase certo”, a “probabilidade de perda” da “chance do lucro”, para atribuir a tais fatos as conseqüências adequadas. Assim, o Tribunal de origem concluiu pela ausência de culpa do advogado e, nesse ponto, não há como extrair daí a responsabilidade nos termos tradicionais e, tampouco, nos termos da teoria da perda da chance. Anotou-se que, em determinados casos, a perda da chance, além de determinar o dano material, poderá ser considerada um agregador do dano moral, o que não se pode admitir é considerar o dano da perda de chance como sendo um dano exclusivamente moral. Diante do exposto, a Turma não conheceu do recurso. Precedentes citados: REsp 965.758-RS, DJ 3/9/2008, e REsp 788.459-BA, DJ 13/3/2006. REsp 1.079.185-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/11/2008.
JUROS MORATÓRIOS. INCIDÊNCIA. EVENTOS DANOSOS.
Renovando o julgamento, a Turma, no caso sub judice, proveu em parte o pedido do autor, determinando, nos termos do voto do Relator originário, a incidência dos juros moratórios a contar da data do evento danoso. Afora esse ponto principal de divergência, a Min. Nancy Andrighi proveu parcialmente o recurso, apenas para que a indenização a ser paga ao autor inclua, também, as ações preferenciais, além de autorizar a revisão dos honorários advocatícios (CPC, art. 20, § 3º), no percentual dos 10% sobre o valor da condenação inicial do autor, relativos aos honorários pagos à instituição bancária. REsp 901.260-PR, Rel. originário Min. Carlos Alberto Menezes Direito, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2008.
MORA. DESCARACTERIZAÇÃO. COMPENSAÇÃO.
Renovando-se o julgamento, a Turma, por maioria, entendeu que, no caso sub judice, nos termos do art. 963 do CC/1916, inexiste mora, porquanto o fiador não foi sequer notificado, cabendo afastar-se a execução por ter sido excessiva. Além disso, é impossível a compensação na medida em que se descaracterizou a existência de mora, a qual somente se poderia determinar com a apuração de sua exata liquidez no juízo de 1º grau. Precedente citado: REsp 713.329-RS, DJ 7/12/2006. REsp 337.572-SP, Rel. originário Min. Ari Pargendler, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/11/2008.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

RESUMO. INFORMATIVO N. 375 DO STJ.

FORNECIMENTO. ÁGUA. REDE. ESGOSTO. RESTITUIÇÃO. DOBRO.
O acórdão do TJ determinou a restituição de valores referentes a tratamento de esgoto que era cobrado na mesma razão do volume de água fornecido pela sociedade empresarial concessionária de água, cujo conteúdo, em torno de 20% do volume utilizado, perder-se-ia pelo uso, não podendo ser tarifado. O recorrente sustenta que pagou tarifa em excesso em razão de cobrança indevida, incidindo, portanto, o art. 42 do CDC, que determina a restituição em dobro dos valores devidos. Sustenta, também, que os honorários devem ser calculados com base no valor da condenação (art. 20, § 3º, do CPC), e não pela equidade, nos termos do § 4º do mencionado dispositivo. Assim, a controvérsia cinge-se à configuração do engano justificável, a incidir, ou não, a restituição em dobro. O Tribunal a quo afastou a incidência do mencionado art. 42 pela ausência de má-fé da recorrida. Entretanto, tal entendimento não deve prevalecer, isso porque não é só pela má-fé que se configura hipótese de restituição em dobro. Para a incidência do artigo, basta a culpa. No acórdão recorrido, não foi demonstrado o engano justificável. Para o Min. Relator, é de rigor a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. Quanto aos honorários, devem ser calculados nos termos do art. 20, § 3º, do CPC, incidindo sobre o valor da condenação, não sobre o valor da causa. Precedentes citados: REsp 1.025.472-SP, DJ 30/4/2008, e REsp 263.229-SP, DJ 9/4/2001. REsp 1.085.947-SP, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 4/11/2008.
MS. LIMINAR. TRATAMENTO MÉDICO. EXTERIOR.
Na espécie, a recorrida sofria de retinose pigmentar (patologia oftalmológica) e, como vários outros, buscou o Judiciário, obtendo liminar contra a União para que o SUS custeasse o tratamento em Cuba. Para tanto, recebeu R$ 25.443,43. Nessa época, a posição jurisprudencial concedia o custeio de tais tratamentos, mas alterou-se diante do parecer técnico do Conselho de Oftalmologia Brasileiro, que levou o Ministério da Saúde a baixar a Portaria n. 763, proibindo o custeio do tratamento dessa doença no exterior pelo SUS. Então, a recusa do Poder Judiciário em confirmar a decisão liminar ensejou a União a mover ação de cobrança, que foi repudiada, nas instâncias ordinárias, ao argumento do fato consumado e irreversibilidade do provimento. Isso posto, para o Min. Relator, o ponto central do aresto recorrido é o art. 7º da Lei n. 1.533/1951, que trata especialmente da liminar em mandado de segurança (MS). Ressalta que existe a Súm. n. 405-STF, que dá eficácia retroativa à revogação superveniente de liminar em MS. Entretanto, podem admitir-se, excepcionalmente, como no caso, os conceitos do fato consumado e da boa-fé objetiva no recebimento de valores pagos em caráter alimentar e essa postura tem sido adotada em julgados do próprio STF (como quando analisa devolução pecuniária recebida de boa-fé por servidores públicos e posteriormente declarada inconstitucional), também há decisões deste Superior Tribunal. Ademais, aplica-se ao caso o princípio da confiança assente no Código Civil alemão e constante do ordenamento jurídico brasileiro como cláusula geral, que ultrapassa os limites do CC/2002 (arts. 113, 187 e 422), o que influencia a interpretação do Direito Público e a ele chegando como subprincípio derivado da moralidade administrativa, o qual serve de fundamento à mantença do acórdão recorrido. Precedentes citados: REsp 353.147-DF, DJ 18/8/2003; MS 8.895-DF, DJ 7/6/2004; REsp 697.768-RS, DJ 21/3/2005; REsp 627.808-RS, DJ 14/11/2005; REsp 955.969-DF, DJ 3/9/2008, e REsp 1.031.356-DF, DJ 10/4/2008. REsp 944.325-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 4/11/2008.
SÚM. N. 84-STJ. EMBARGOS DE TERCEIRO. ADQUIRENTE. BOA-FÉ.
É cediço que a jurisprudência deste Superior Tribunal tem protegido a promessa da compra e venda, ainda que não registrada em cartório (art. 530, I, do CC/ 1916), preservando-se o direito dos terceiros adquirentes de boa-fé (Súm. n. 84-STJ). Ressalta a Min. Relatora que, em se tratando de execução fiscal com penhora sobre imóvel, o marco a ser considerado é o registro da constrição no cartório competente (art. 659, § 4º, do CPC), uma vez que não se pode impor ao terceiro adquirente a obrigação quanto à ciência da execução tão-somente pela existência da citação do devedor. Assim, ausente o registro da penhora efetuada sobre o imóvel, não se pode concluir que houve fraude. Ademais, na hipótese dos autos, ficou comprovado que a venda do imóvel, ainda que sem registro, foi realizada antes do ajuizamento da execução fiscal, motivo pelo qual deve ser preservado o direito do terceiro de boa-fé. Com essas considerações, a Turma negou provimento ao recurso da Fazenda. Precedentes citados: REsp 739.388-MG, DJ 10/4/2006, e REsp 120.756-MG, DJ 15/12/1997. REsp 892.117-RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 4/11/2008.
TRANSFERÊNCIA. VAGA. GARAGEM. VALIDADE.
Cinge-se a questão em determinar a validade da transferência de vaga de garagem vinculada a apartamento para outra unidade do mesmo prédio. A Turma, por maioria, após renovar o julgamento, entendeu que a vaga de garagem adere à unidade, sendo, contudo, desta destacável para efeito de sua cessão a outro condômino. Assim, não obstante a vaga de garagem ser, de regra, bem acessório vinculado à unidade habitacional, ao contrário do que sustentaram as instâncias ordinárias, ela admite, independentemente de ser-lhe atribuída fração ideal específica do terreno, separação para transferência a outro apartamento do mesmo edifício. Quanto ao registro de transferência da vaga de garagem de que trata esse caso específico, verifica-se, dos autos, que, apesar de a escritura de venda e compra dessa unidade originalmente não prever a garagem, o documento foi oportunamente retificado e registrado, tudo antes da alienação da outra unidade, o que garante aos proprietários daquele imóvel, ora recorrentes, o direito à vaga. REsp 954.861-RJ, Rel. originário Min. Humberto Gomes de Barros, Rel. para o acórdão Min. Nancy Andrighi (art. 52, IV, b, do RISTJ), julgado em 6/11/2008.
ACIDENTE. TRÂNSITO. CULPA. MOTORISTA.
Trata-se de indenização pelos danos materiais e morais por morte em acidente de trânsito da esposa do promovente, que colidiu seu veículo na traseira do caminhão que trafegava a sua frente. Destaca o Min. Relator que, nas instâncias ordinárias, ficou comprovada a responsabilidade do preposto da ré (motorista) pelo acidente, por ele ter agido com negligência e imperícia, ao dirigir o caminhão com luzes apagadas em horário noturno, apesar de a presunção de culpa ser de quem colide na traseira de veículo. Ressalta que não houve cerceamento de defesa, porquanto a testemunha (o motorista) tem interesse na lide, constituindo a hipótese do art. 405, § 3º, IV, do CPC e, nesses casos, a ausência de contradita não impede que o depoimento da testemunha seja valorado como informante, mormente diante do princípio do livre convencimento motivado do juiz. Por outro lado, quanto ao pedido de abatimento na indenização do seguro obrigatório (DPVAT), explica que não pode ser acolhido, já que o Tribunal a quo o indeferiu por falta de comprovação do recebimento do prêmio pelo marido, além da inexistência de discussão do tema na primeira instância. Por essas razões, entre outras, a Turma não conheceu do recurso. Precedentes citados: EDcl nos EREsp 168.207-SP, DJ 26/10/2006; REsp 190.456-SP, DJ 28/8/2000; REsp 172.335-SP, DJ 18/10/1999, e REsp 466.751-AC, DJ 23/6/2003. REsp 824.473-PR, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 6/11/2008.
DOAÇÃO. PARTILHA. DOLO. ANULAÇÃO.
Noticiam os autos que mãe e irmãos convenceram a irmã (autora, ora recorrida) a abrir mão dos bens havidos na partilha da sucessão do pai, sob pretexto de resguardo do patrimônio familiar, que estaria em risco por seu casamento e ela (a autora) foi induzida em erro ao crer que, participando dos negócios, receberia de volta os bens havidos na partilha. Depois, a mãe fez distribuir, com reserva de usufruto, alguns bens aos outros dois filhos e ao tio da autora. Daí a ação de anulação de ato jurídico cumulada com perdas e danos contra a mãe e os irmãos, na qual afirma ter sido ludibriada e dolosamente induzida a abrir mão do seu quinhão. Observa o Min. Relator que a lide foi decidida nas instâncias ordinárias com explícita fundamentação nas provas produzidas (Súm. n 7-STJ), concluindo-se pela ocorrência do dolo (vício de consentimento) apto a desencadear a anulação dos atos jurídicos realizados, ou seja, a doação da autora em benefício da mãe. Outrossim, o Tribunal a quo consignou, em contraposição à sentença, não ser adequada a anulação das doações feitas pela filha à mãe sem anular também todo o negócio subjacente da doação. Assim, não prospera a alegação de que a autora busca anular doação feita ao tio que deveria ocupar o pólo passivo da demanda como litisconsórcio necessário. Houve a preclusão consumativa quanto essa questão porque não requerida em declaratórios opostos ao acórdão da apelação. Por fim, quanto à ausência de solidariedade, porque não teria havido dolo dos irmãos, mas somente da mãe, este mesmo acórdão foi depois confirmado em embargos infringentes, que imputaram, não só à genitora, mas também aos outros dois irmãos o ardil, são todos responsáveis, sendo assim, não há a pretendida violação do art. 896 do CC/1916 (os atos jurídicos são anuláveis por dolo, quando esse for causa). Diante do exposto, a Turma não conheceu o recurso. REsp 186.604-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 6/11/2008.
SEGURO HABITACIONAL. VÍCIOS. CONSTRUÇÃO.
Em ação de indenização por danos de vício de construção ocasionados em imóveis adquiridos de COHAB, com recursos do Sistema Financeiro da Habitação, os quais contam com cobertura securitária específica para riscos de danos físicos, os autores, ora recorridos, postulam o recebimento do valor desse seguro habitacional contratado. Ressalta o Min. Relator que a responsabilização dos mutuários pelos danos ou vícios intrínsecos ocorridos nos imóveis foram afastados pelas instâncias ordinárias. Sendo assim, conforme jurisprudência deste Superior Tribunal, a seguradora é a responsável quando presentes vícios decorrentes da construção. Quanto à multa decendial pactuada no seguro para o atraso do pagamento da indenização, reconheceu em parte os recursos das seguradoras, pois a multa decendial é limitada ao montante da obrigação principal, ficando esse reconhecido como o montante a que foi condenada a seguradora a título de indenização pelos reparos em cada um dos imóveis. Precedentes citados: REsp 813.898-SP, DJ 28/5/2007, e REsp 651.227-SP, DJ 11/10/2004. REsp 186.571-SC, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, julgado em 6/11/2008.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

IMPORTANTE JULGADO DO STJ. FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO E TUTELA EXTERNA DO CRÉDITO.

RECURSO ESPECIAL Nº 468.062 - CE (2002/0121761-0)
RELATOR
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
RECORRENTE
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto por CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", CF/1988, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5a. Região (fls. 138/143).
A decisão ficou assim ementada:
"ADMINISTRATIVO. CIVIL. PRELIMINARES. NULIDADE DA SENTENÇA. CONEXÃO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DOS AUTORES. INOCORRÊNCIA. (sic) CEF COMO SUCESSORA DO EX-BNH (DECRETO Nº 2.291/86). RESPONSABILIDADE DE FISCALIZAÇÃO DOS AGENTES FINANCEIROS. COMPROVAÇÃO DA EFETIVA QUITAÇÃO ANTECIPADA DA DÍVIDA COM GARANTIA DA LIBERAÇÃO DA CAUÇÃO HIPOTECÁRIA.
1. Nulidade da sentença, em virtude do juiz fundamentar sua decisão dentro dos limites da pretensão com base nos documentos trazidos aos autos.
2. Incabível a preliminar de conexão, por força do art. 95, CPC, 'nas ações fundadas em direito real sobre imóveis é competente o foro da situação da coisa'.
3. Assumindo a CEF enquanto sucessora do BNH a posição de Agente e Operadora do fundo, passando assim a deter as cauções hipotecárias, não há falar-se em denunciação à lide do Agente Financeiro.
4. A ilegitimidade ativa AD CAUSAM dos autores, não prospera em virtude do que dispõe o art. 859, do Código, 'presume-se pertencer o direito real à pessoa, em cujo nome se inscreveu, ou transcreveu'.
5. No mérito, ressalta a inteira responsabilidade da CEF, sucessora do ex-BNH, fiscalizar os repasses feitos pelos seus agentes financeiros.
6. Diante da efetiva liquidação do saldo devedor do imóvel em questão e conforme transcrição do mesmo no Cartório de Registro de Imóveis, é devida a liberação da caução hipotecária.
7. Preliminares rejeitadas.
8. Apelação improvida."
O recurso especial da CEF louva-se nos seguintes fundamentos: (fls.145/156)
a) violação do art. 70, inciso III, CPC; do art. 458, inciso II, e do art. 102, CPC;
b) ofensa aos arts. 3º, 6º e 267, VI, CPC;
c) desrespeito ao art.794, CCB/1916.
Contra-razões. (fls.161/167)
Recurso admitido. (fls.169)
Parecer do MPF em favor do conhecimento parcial e pelo não-provimento do recurso. (fls.178/187)
É, no essencial, o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 468.062 - CE (2002/0121761-0)
EMENTA
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - FCVS - CAUÇÃO DE TÍTULOS - QUITAÇÃO ANTECIPADA - EXONERAÇÃO DOS MUTUÁRIOS - COBRANÇA SUPERVENIENTE PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, SUCESSORA DO BNH - DOUTRINA DO TERCEIRO CÚMPLICE - EFICÁCIA DAS RELAÇÕES CONTRATUAIS EM RELAÇÃO A TERCEIROS - OPONIBILIDADE - TUTELA DA CONFIANÇA.
1. CAUSA E CONTROVÉRSIA. A causa (a lide deduzida em juízo) e a controvérsia (a questão jurídica a ser resolvida), para se usar de antiga linguagem, de bom e velho sabor medieval, ainda conservada no direito anglo-saxão (cause and controverse), dizem respeito à situação jurídica de mutuários em relação à cessão de títulos de crédito caucionados entre o agente financeiro primitivo e a Caixa Econômica Federal -CEF, sucessora do BNH, quando se dá quitação antecipada do débito. A CEF pretende exercer seus direitos de crédito contra os mutuários, ante a inadimplência do agente financeiro originário. Ausência de precedentes nos órgãos da Primeira Seção.
2. PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS DO CONTRATO “DOUTRINA DO TERCEIRO CÚMPLICE" TUTELA EXTERNA DO CRÉDITO. O tradicional princípio da relatividade dos efeitos do contrato (res inter alios acta), que figurou por séculos como um dos primados clássicos do Direito das Obrigações, merece hoje ser mitigado por meio da admissão de que os negócios entre as partes eventualmente podem interferir na esfera jurídica de terceiros “de modo positivo ou negativo", bem assim, tem aptidão para dilatar sua eficácia e atingir pessoas alheias à relação inter partes. As mitigações ocorrem por meio de figuras como a doutrina do terceiro cúmplice e a proteção do terceiro em face de contratos que lhes são prejudiciais, ou mediante a tutela externa do crédito. Em todos os casos, sobressaem a boa-fé objetiva e a função social do contrato.
3. SITUAÇÃO DOS RECORRIDOS EM FACE DA CESSÃO DE POSIÇÕES CONTRATUAIS. Os recorridos, tal como se observa do acórdão, quitaram suas obrigações com o agente financeiro credor - TERRA CCI. A cessão dos direitos de crédito do BNH “sucedido pela CEF" ocorreu após esse adimplemento, que se operou inter partes (devedor e credor). O negócio entre a CEF e a TERRA CCI não poderia dilatar sua eficácia para atingir os devedores adimplentes.
4. CESSÃO DE TÍTULOS CAUCIONADOS. A doutrina contemporânea ao Código Civil de 1916, em interpretação aos arts. 792 e 794, referenda a necessidade de que sejam os devedores intimados da cessão, a fim de que não se vejam compelidos a pagar em duplicidade. Nos autos, segundo as instâncias ordinárias, não há prova de que a CEF haja feito esse ato de participação.
5. DISSÍDIO PRETORIANO. Não se conhece da divergência, por não-observância dos requisitos legais e regimentais.
Recurso especial conhecido em parte e improvido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO HUMBERTO MARTINS (Relator):
PERMISSIVO "A"
A.1 - A CAUSA DOS AUTOS
O caso dos autos tem por subjacente um contrato de mútuo habitacional firmado entre José Américo Sobrinho e TERRA COMPANHIA DE CRÉDITO IMOBILIÁRIO - TERRA CCI, agente financeiro vinculado ao extinto Banco Nacional de Habitação - BNH, sucedido pela ora recorrente.
Houve, posteriormente, cessão de posição contratual de José Américo Sobrinho para os recorridos ANTONIO OSMAR TELES MONTEIRO e OUTRO, por força de escritura de compra e venda, lavrada aos 30.10.1989. Na escritura, ressalvou-se a existência de caução hipotecária dada ao BNH por TERRA CCI, por meio de endosso em cédula hipotecária.
Houve quitação antecipada do saldo devedor pelos cessionários ANTONIO OSMAR TELES MONTEIRO aos 27.3.1991, com quitação passada por TERRA CCI aos 24.6.1997. Na ocasião, foi autorizado o levantamento do gravame hipotecário.
Remanesceu, porém, o direito real de caução sobre crédito hipotecário, titularizado pela CEF contra a TERRA CCI, que gravava o imóvel adquirido pelos recorridos. Por essa razão, optaram os recorridos pelo ingresso de ação ordinária contra a CEF, a fim de liberá-los desse ônus real.
A CEF, em sua manifestação nos autos, deu ciência de que, aos 30.9.1998, firmou contrato de novação e outros pactos com TERRA CCI, que se encontrava em liquidação extrajudicial. Por esse negócio jurídico, a CEF adquiriu o direito real de garantia pelos créditos hipotecários de titularidade da TERRA CCI a serem exercidos contra os mutuários do SFH. Dentre esses direitos, encontrava-se a caução hipotecária constituída sobre o imóvel dos recorridos.
O inadimplemento das obrigações pela TERRA CCI ante à CEF gerou a esta a pretensão de se opor ao levantamento do gravame de caução.
Apreciada a lide, em primeiro grau, decidiu-se pela ineficácia do negócio jurídico celebrado entre a CEF e a TERRA CCI em relação a terceiros, dada a ausência de comunicação prévia. O fato de haver registro do título não implicava presunção de conhecimento.
O acórdão do TRF-5, que conservou a sentença, entendeu que os recorridos cumpriram suas obrigações perante o credor, não sendo lícito mantê-los vinculados por efeito de inadimplemento da TERRA CCI para com a CEF.
A questão, por conseguinte, está em saber se os recorridos podem-se liberar de gravame, após a quitação de suas obrigações, quando persistem vínculos de seu credor com a CEF.
B.2. A CONTROVÉRSIA JURÍDICA
A causa (a lide deduzida em juízo) e a controvérsia (a questão jurídica a ser resolvida), para se usar de antiga linguagem, de bom e velho sabor medieval, ainda conservada no direito anglo-saxão (cause and controverse) não possuem precedentes na Segunda Turma. Trata-se, em verdade, de um problema que envolve conceitos jurídicos recentemente estudados na doutrina brasileira, introduzidos no debate contemporâneo por ANTONIO JUNQUEIRA DE AZEVEDO (Os princípios do atual direito contratual e a desregulamentação do mercado. Direito de execlusividade nas relações contratuais de fornecimento. Função social do contrato e responsabilidade aquiliana do terceiro que contribuiu para inadimplemento contratual. In. Estudos e pareceres de Direito Privado. São Paulo: Saraiva, 2004. p.137-147), posteriormente desenvolvida em outros estudos dogmáticos: RODRIGUES JÚNIOR, Otavio Luiz. Título A doutrina do terceiro cúmplice : autonomia da vontade, o princípio res inter alios acta, função social do contrato e a interferência alheia na execução dos negócios jurídicos. In Revista dos Tribunais, v.93, n.821, p.80-98, mar., 2004; PENTEADO, Luciano Camargo. Efeitos contratuais perante terceiros. São Paulo: Quartier Latin, 2007.)
O tradicional princípio da relatividade dos efeitos do contrato (res inter alios acta), que figurou por séculos como um dos primados clássicos do Direito das Obrigações, merece hoje ser mitigado por meio da admissão de que os negócios entre as partes eventualmente podem interferir na esfera jurídica de terceiros – de modo positivo ou negativo –, bem assim, tem aptidão para dilatar sua eficácia e atingir pessoas alheias à relação inter partes.
Para tanto, faz-se indispensável citar três formas diferentes de apresentação dessa eficácia contratual extra partes, a saber:
1. Oponibilidade. Os contratos podem ser oponíveis a terceiros, o que implica duas situações clássicas:
a) a obrigação de conhecimento de um contrato alheio por alguém, o que opera efeitos (principalmente) no plano subjetivo da boa-fé. É o exemplo clássico da oponibilidade de um contrato particular registrado em cartório, o que lhe confere publicidade e, com isso, faz presumir seu conhecimento por terceiros, negando-se-lhes a alegação de boa-fé quando invocam sua insciência.
b) a obrigação de respeitar uma relação jurídica alheia, o que implica a produção de efeitos jurídicos na esfera de quase todos os demais indivíduos não-partícipes do negócio. Em geral, essa forma de oponibilidade é também eficaz quanto à boa-fé de terceiros. Mas, essencialmente, ela atrai a chamada eficácia 'erga omnes' (oponibilidade contra todos), presente nos Direitos Reais, e nascida do registro imobiliário.
O registro dá publicidade e torna o direito oponível a terceiros, os quais devem conhecê-lo e respeitá-lo. Se imobiliário, o registro dá publicidade e cria "imunidade ao conteúdo daqueles atos pelos demais atuantes no cenário jurídico, revestindo-se a situação jurídica registrada de um poder de exclusão das demais faculdades, pretensões e poderes jurídicos em geral." (PENTEADO, Luciano Camargo. Op. cit. p.167).
2. Doutrina do terceiro cúmplice. A doutrina do terceiro cúmplice tem por objeto a interferência ilícita do terceiro em negócios jurídicos alheios, por meio da indução ao inadimplemento (RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Op. cit. p.94-98).
3. Contrato em dano a terceiro. É o caso da dilatação eficacial (as chamadas externalidades negativas) de um contrato em relação a terceiros. Cuida-se de hipótese na qual os contraentes, ao celebrarem um negócio, geram efeitos danosos a alguém que é alheio ao contrato.
Além de situações já bem conhecidas da doutrina (contrato com pessoa a declarar e estipulação em favor de terceiro), essas três formas de ampliação da eficácia dos negócios têm por suporte a quebra da higidez do princípio da relatividade dos efeitos do contrato e, ainda, a proteção à boa-fé objetiva e à função social do contrato.
Essa restrição genérica a que a lesividade contratual inter partes se projeta extra partes é especialmente aplicada nas doutrina e jurisprudência francesas, quando se cuida de cessão de posições contratuais. É essa, em linhas gerais, a posição de MARIE-LAURE IZORCHE:
"O princípio é, desse modo, conservado: o cessionário do contrato, ainda que nos casos legalmente previstos, é tido como um terceiro qualquer para todo o período precedente à cessão, e ele apenas sofre a oponibilidade, até quando se torne parte do contrato após a cessão, e se vincule, nessa qualidade, pelos efeitos obrigatórios.
A única diferença com a cessão convencional está no fat ode que ele (o cessionário) não manifestou sua vontade de assumir a posição de parte do contrato que lhe foi transmitido, em concomitância à coisa adquirida: tudo se passa como se o contrato fosse um accessório da coisa, o qual se transmite automaticamente com ela mesma."(IZORCHE, Marie-Laure. Les effets des conventions à l'égard des tiers: l'expérience française. In. VACCA, Letizia (a cura di). Gli effeti del contratto nei confronti dei terzi nella prospettiva storico-comparatistica. Torino: Giappichelli, 2001. p.98.)
No original:
"Le principe est donc sauf: le cessionnaire du contrat, même dans les cas prévus par la loi, est consideré comme un tiers quelconque pour toute la période précédant la cession, et il n'est concerné que par l'opposabilité, alors qu'il devient partie au contrat après la cession, et est donc concerné, en tant que tel, par les effets obligatoires.
La seule différence avec la cession conventionelle réside dans le fait qu'il n'a pas manifesfé sa volonté de recueillir la position de partie au contrat qui lui est transmis, em même temps que la chose qu'il acquiert: tout se passe comme si le contrat était un acessoire de la chose, accessoire que se transmet automatiquement avec celle-ci".
Ora, os recorridos, tal como se observa do acórdão, quitaram suas obrigações com a credora TERRA CCI. A cessão dos direitos de crédito do BNH, sucedido pela CEF, ocorreu após esse adimplemento, que se operou inter partes (devedor e credor). O negócio entre a CEF e a TERRA CCI não poderia dilatar sua eficácia para atingir os devedores adimplentes.
Aqui, a oponibilidade da cessão de direitos (TERRA CCI e CEF) deixa de atingir a eficácia dos terceiros, por conta da proteção jurídica hoje concedida pelo ordenamento às pessoas que se põem à margem de negócios que lhes são prejudiciais, como ocorreu na espécie.
Logo, não houve violação do art. 458, II, CPC. O acórdão é bem fundamento e escolheu, dentre as molduras possíveis, a melhor interpretação para o caso e a controvérsia.
Outrossim, não houve malferimento dos arts.70 e 102, CPC. Nesse ponto, invoco, como razão de decidir, o parecer do Ministério Público Federal:
"A alegação de infringência ao art. 102 do CPC mostra-se manifestamente improcedente, vez que as demandas articuladas entre a CEF e a agente financeira TERRA CCI, com fundamento no descumprimento de contrato pactuado entre elas não tem qualquer conexão com o presente feito, a versar sobre direito real de garantia pendente sobre imóvel, que, a toda evidência, deve ser processado no foro em que situado o imóvel.
O mesmo se diga da tese que pugna pelo reconhecimento de atentado ao art. 70, III, do CPC, pois não há obrigatoriedade em se convocar a TERRA CCI à presente relação processual, na medida em que a legitimidade para liberação da caução fiduciária é exclusiva da CEF, que poderá, por outros meio judiciais, exigir da agente financeira o cumprimento das obrigações contratuais desrespeitadas."
A tese de ofensa aos arts. 3º, 6º, e 267, inciso VI, CPC, também não se sustenta. A posição jurídica dos recorridos é avaliável como digna de interesse processual, em razão da aludida dilatação de efeitos do contrato entre a TERRA e a CEF. A liberação de seu gravame está estritamente vinculada à solução da controvérsia. Daí não se cuidar desse suposto vilipêndio.
O único ponto digno de exame mais acurado é o relativo à suposta ofensa ao art. 794 do Código Civil revogado, que possui a redação seguinte:

"Art. 794. O devedor do título caucionado, tanto que receba a intimação do art. 792, II, ou se dê por ciente da caução, não poderá receber quitação do seu credor."
Cumpre examinar a estrutura jurídica dessa norma.
Entenderam os juízos ordinários que a existência de caução devidamente publicizada no registro imobiliário não tornaria oponível aos recorridos o negócio realizado entre a CEF e a TERRA CCI. Com isso, não se poderia atribuir-lhes responsabilidade pela inadimplência da TERRA CCI.
Se interpretado o art. 794 em concomitância com o revogado art. 792, observar-se-á que:
"Art. 792.  Ao credor por esta caução compete o direito de:
IÂ -Â conservar e recuperar a posse dos títulos caucionados, por todos os meios cíveis ou criminais, contra qualquer detentor, inclusive o próprio dono;
IIÂ - fazer intimar ao devedor dos títulos caucionados, que não pague ao seu credor, enquanto durar a caução (art. 794);
IIIÂ - usar das ações, recursos e exceções convenientes, para assegurar os seus direitos, bem como os do credor caucionante, como se deste fora procurador especial;
IVÂ - receber a importância dos títulos caucionados, e restituí-los ao devedor, quando este solver a obrigação por eles garantida."
Observando o que se deu no caso concreto:
a) a CEF não intimou (rectius, notificou) os recorridos para que não pagassem o débito à TERRA CCI durante a vigência da caução, como prescrevia a legislação vigente à época;
b) a CEF, como lembra o Ministério Público Federal, "imputou à agente financeira TERRA CCI a obrigação de fazer a cobrança dos créditos devidos pelos Recorridos. De acordo com o que se aferiu na instância a quo, com base no instrumento de novação e outros pactos ofertado pela própria CEF, esta teria, inclusive, assumido a responsabilidade pela fiscalização do repasse dos valores recebidos pela agente financeira TERRA CCI, no que, efetivamente, não logrou êxito".
A indispensabilidade da notificação, como atestado nas instâncias próprias, não foi objeto das mesuras necessárias pela CEF.
A doutrina contemporânea ao Código Civil de 1916, em interpretação aos arts. 792 e 794, mostra-se simétrica aos postulados aqui delineados. O clássico JOÃO MANUEL DE CARVALHO SANTOS (Código Civil brasileiro interpretado. 12 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1982. v.10. p. 205, ao comentar o art.792, inciso II, CCB/1916, anota que:
"3. Fazer intimar ao devedor dos títulos caucionados, que não pague ao seu credor, enquanto durar a caução. É o que se denomina denúncia da caução. A denúncia se justifica, porque a caução, em última análise envolve uma cessão limitada dos direitos creditórios, que, se não prevalecesse a tornaria sem efeito. Para que possa prevalecer, é imprescindível que o devedor dos títulos caucionados fique conhecendo a existência da caução, e pois, dessa cessão.
A denúncia deve ser feita por via de intimação judicial ao devedor dos títulos caucionados, para que não pague ao seu credor, enquanto durar a caução."
Adiante, JOÃO MANUEL DE CARVALHO SANTOS (Op. cit. p.208) explicita que, se o devedor receber a quitação do credor, a despeito da cessão do título, prevalece o direito exoneratório daquele: "Mas se a quitação for dada, não obstante a proibição legal, nem por isso o pagamento feito e a quitação respectiva ficam sem valor".
Por fim, considero que, independentemente do teor da lei, a aplicação dos princípios relativos à proteção das relações jurídicas em face de terceiros é fundamento suficiente, ao lado da função social e da boa-fé objetiva, para impedir a responsabilização dos recorridos.
Essa perspectiva foi a que presidiu, no STJ, a edição da Súmula 308, cujo teor é auto-explicativo: "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel".
Analogicamente, a Súmula tem aplicação ao caso. O promitente comprador não pode responder por dívidas da construtora, contraídas com agente financeiro, em razão de lhe ser conservada a esfera jurídica dos atos de terceiros lesivos a seu patrimônio. É idêntico o fundamento deste recurso.
Desse modo, é de ser negado provimento ao recurso especial.

PERMISSIVO "C"
O recurso desatende o teor do art. 541, parágrafo único, CPC, combinado com o art. 255, RISTJ.
Como se tem ressaltado na Segunda Turma, não se pode conhecer do especial quando se omite a parte na "demonstração da exata similitude fático-jurídica entre os acórdãos tidos por divergentes e, tampouco (há) o cotejo analítico entre eles, o que se afigura indispensável para a admissão do apelo especial, conforme os ditames estabelecidos pelo § 2º do art. 255 do RISTJ e art. 541, parágrafo único, do CPC." (REsp 681.500/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 12.8.2008, DJe 26.8.2008.)
Em suma, "não havendo a recorrente demonstrado, mediante a realização do devido cotejo analítico, a existência de similitude das circunstâncias fáticas e do direito aplicado nos acórdãos recorrido e paradigmas, resta desatendido o comando dos arts. 541 do CPC e 255 do RISTJ." (REsp 881.672/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 24.6.2008, DJe 13.8.2008).
Não conheço do recurso pelo permissivo "c".
CONCLUSÃO
Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial e nego-lhe provimento.
É como penso. É como voto.
MINISTRO HUMBERTO MARTINS
Relator