segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

RESUMO. INFORMATIVO 574 DO STJ. PRIMEIRO DE 2016

RESUMO. INFORMATIVO 574 DO STJ.
DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E PROCESSUAL CIVIL. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ECLESIÁSTICA DE ANULAÇÃO DE MATRIMÔNIO. É possível a homologação pelo STJ de sentença eclesiástica de anulação de matrimônio, confirmada pelo órgão de controle superior da Santa Sé.De início, o § 1º do art. 216-A do RISTJ prevê a possibilidade de serem homologados "os provimentos não judiciais que, pela lei brasileira, tiverem natureza de sentença". Nesse contexto, as decisões eclesiásticas confirmadas pelo órgão superior de controle da Santa Sé são consideradas sentenças estrangeiras para efeitos de homologação. Isso porque o § 1º do art. 12 do Decreto federal n. 7.107/2010 (que homologou o acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé, relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, aprovado pelo Decreto Legislativo n. 698/2009) determina que a "homologação das sentenças eclesiásticas em matéria matrimonial, confirmadas pelo órgão de controle superior da Santa Sé, será efetuada nos termos da legislação brasileira sobre homologação de sentenças estrangeiras". Aliás, não há como sustentar a inconstitucionalidade deste dispositivo legal, tendo em vista que ele apenas institui, em matéria matrimonial, que a homologação de sentenças eclesiásticas, confirmadas pelo órgão de controle superior da Santa Sé - que detém personalidade jurídica de direito internacional público -, será realizada de acordo com a legislação brasileira. Além disso, o caráter laico do Estado brasileiro não impede a homologação de sentenças eclesiásticas, tanto que o Brasil, nos termos do art. 3º de referido Decreto federal n. 7.107/2010, reconhece a personalidade jurídica das instituições eclesiásticas. Além do mais, vale salientar, quanto ao procedimento, que o Código de Direito Canônico assegura plenamente o direito de defesa e os princípios da igualdade e do contraditório, sendo que, nas causas que tratem da nulidade ou dissolução do casamento, sempre atuará o defensor do vínculo, que, por ofício está obrigado a apresentar e expor tudo o que razoavelmente se puder aduzir contra a nulidade ou dissolução (Cân. 1432) e, mais, a sentença favorável à nulidade do matrimônio será submetida a reexame necessário pelo tribunal de segundo grau (Cân. 1682). SEC 11.962-EX, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 4/11/2015, DJe 25/11/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA EM SEDE RECURSAL. É possível a formulação de pedido de assistência judiciária gratuita na própria petição recursal, dispensando-se a exigência de petição avulsa, quando não houver prejuízo ao trâmite normal do processo. De fato, a redação do art. 6º da Lei n. 1.060/1950 exige que, se a ação estiver em curso, o benefício deverá ser deduzido em petição avulsa. Contudo, não parece ser razoável a interpretação meramente gramatical da norma em apreço, devendo ser levado em consideração o sistema em que ela está atualmente inserida, no qual a própria a CF, no seu art. 5º, LXXIV, traz, como direito fundamental do cidadão, a prestação de assistência judiciária gratuita aos que não tiverem condições de custear as despesas do processo sem sacrifício de seu sustento e de sua família. Há, também, na esfera processual, os princípios da instrumentalidade das formas, do aproveitamento dos atos processuais, do pas de nullité sans grief, da economia processual, da prestação jurisdicional célere e justa, entre outros tantos. Desse arcabouço normativo e principiológico é viável extrair interpretação no sentido de ser possível o recebimento e a apreciação do pedido de assistência judiciária gratuita formulado na própria petição recursal. Nessa linha intelectiva, ao Relator ou ao Presidente do Tribunal bastará: (a) indeferi-lo se entender que há elementos nos autos que afastem a alegada hipossuficiência do requerente; (b) deferi-lo de plano, já que, nos termos da jurisprudência do STJ e do STF, o benefício da assistência judiciária gratuita pode ser pleiteado a qualquer tempo, sendo suficiente para sua obtenção que a parte afirme não ter condição de arcar com as despesas do processo. Observe-se que o ato processual, em regra, não encontrará dificuldade, nem atrasará o curso da demanda principal, sendo, portanto, possível dispensar o excesso de formalismo para receber o requerimento de assistência judiciária gratuita formulado na petição recursal, sempre que possível. Em verdade, é possível que a parte contrária impugne o pleito. Aí sim, nesta situação, por demandar maiores digressões, é razoável que a impugnação seja processada em apenso, sem suspensão do curso do processo principal. Se esta não for a hipótese, é recomendável dispensar-se o excesso de formalismo, dando maior efetividade às normas e princípios constitucionais e processuais citados, recebendo-se, pois, o pedido de assistência judiciária gratuita formulado na própria petição recursal. Por fim, o CPC/2015, certamente por levar em consideração os princípios constitucionais e processuais supracitados, autoriza, em seu art. 99, § 1º, que o pedido de assistência judiciária gratuita seja formulado a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, na própria petição recursal, dispensado, com isso, a retrógrada exigência de petição avulsa, sem inclusive fazer distinção entre os pleitos formulados por pessoa física ou jurídica.AgRg nos EREsp 1.222.355-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 4/11/2015, DJe 25/11/2015.
DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL DA TAXA DE OCUPAÇÃO DE IMÓVEL ALIENADO FIDUCIARIAMENTE NO ÂMBITO DO SFH. Na hipótese em que frustrados os públicos leilões promovidos pelo fiduciário para a alienação do imóvel objeto de alienação fiduciária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), a taxa de ocupação será exigível do fiduciante em mora a partir da data na qual se considera extinta a dívida (art. 27, § 5º, da Lei n. 9.514/1997), e não desde a data da consolidação da propriedade em nome do fiduciário (art. 27, caput, da Lei n. 9.514/1997). Nos termos da literalidade do art. 37-A da Lei n. 9.514/1997, "o "fiduciante pagará ao fiduciário, ou a quem vier a sucedê-lo, a título de taxa de ocupação do imóvel, por mês ou fração, valor correspondente a um por cento do valor a que se refere o inciso VI do art. 24, computado e exigível desde a data da alienação em leilão até a data em que o fiduciário, ou seus sucessores, vier a ser imitido na posse do imóvel". O fundamento para que essa taxa não incida no período anterior à alienação é que a propriedade fiduciária não se equipara à propriedade plena, por estar vinculada ao propósito de garantia da dívida, conforme expressamente dispõe o art. 1.367 do CC: "A propriedade fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis sujeita-se às disposições do Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial deste Código e, no que for específico, à legislação especial pertinente, não se equiparando, para quaisquer efeitos, à propriedade plena de que trata o art. 1.231". Efetivamente, não se reconhece ao proprietário fiduciário os direitos de usar (jus utendi) e de fruir (jus fruendi) da coisa, restando-lhe apenas os direitos de dispor da coisa (jus abutendi) e de reavê-la de quem injustamente a possua (rei vindicatio). Essa limitação de poderes se mantém após a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário, pois essa consolidação se dá exclusivamente com o propósito de satisfazer a dívida. É o que dispõe o art. 1.364 do CC, litteris: "Vencida a dívida, e não paga, fica o credor obrigado a vender, judicial ou extrajudicialmente, a coisa a terceiros, a aplicar o preço no pagamento de seu crédito e das despesas de cobrança, e a entregar o saldo, se houver, ao devedor". No mesmo sentido, o art. 27, caput, da Lei n. 9.514/1997, litteris: "Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel". Com efeito, o direito do credor se limita ao crédito, sendo a garantia (ainda que por meio de alienação fiduciária) um mero acessório, não podendo o credor se apropriar, simultaneamente, do crédito e da coisa dada em garantia, sob pena de bis in idem e enriquecimento sem causa. A taxa de ocupação do imóvel, pela sua própria definição, tem natureza de fruto do imóvel objeto da alienação fiduciária. Ora, se o credor fiduciário não dispõe do jus fruendi, não pode exigir do devedor o pagamento de taxa de ocupação. Efetivamente, os únicos frutos que podem ser exigidos pelo credor são os juros, frutos do capital mutuado. Entendimento diverso geraria bis in idem e enriquecimento sem causa do banco credor, pois, em razão do mútuo de certa quantia em dinheiro, o banco receberia dois frutos, os juros e a taxa de ocupação. Nessa esteira, observa-se que a redação do art. 37-A da Lei n. 9.514/1997 foi precisa ao dispor que a taxa de ocupação somente é devida após a "data da alienação em leilão", pois, antes da alienação, a propriedade não é plena, mas afetada à satisfação da dívida, não produzindo frutos em favor do credor fiduciário. Do mesmo modo, a redação do art. 38 da Lei n. 10.150/2000 também foi precisa ao instituir o arrendamento especial com opção de compra apenas para os imóveis que a instituição financeira tenha "arrematado, adjudicado ou recebido em dação em pagamento", não para os imóveis adquiridos por consolidação da propriedade fiduciária. Sob outro ângulo, cabe destacar que a Lei impõe um rito célere à alienação extrajudicial, de modo que o primeiro leilão deva ser realizado no prazo de trinta dias após o registro da consolidação da propriedade, conforme previsto no art. 27 da Lei n. 9.514/1997, independentemente da desocupação do imóvel. A fixação desse prazo exíguo tem o objetivo de evitar que a instituição financeira permaneça inerte após a consolidação da propriedade, deixando que a dívida se eleve aceleradamente, por força dos encargos da mora. Há, portanto, no referido art. 27, um fundamento de boa-fé objetiva, especificamente concretizada no preceito duty to mitigate the loss, explicado em precedente da Terceira Turma (REsp 758.518-PR, DJe 28/6/2010). Durante esse curto período de 30 dias, as perdas experimentadas pela instituição financeira já são adequadamente compensadas pela multa contratual. Aliás, a incidência de taxa de ocupação geraria o efeito deletério de estimular a inércia da instituição financeira, tendo em vista a incidência de mais um fator de incremento da dívida. Noutro norte, é certo que a boa-fé também impõe deveres ao mutuário, como o de desocupar o imóvel, caso não tenha purgado tempestivamente a mora. Porém, a violação desse dever impõe perdas potenciais ao próprio mutuário, não à instituição financeira, que já é remunerada pelos encargos contratuais, tendo em vista que o mutuário tem direito à restituição do saldo que restar das parcelas pagas após a quitação da dívida e dos encargos. Destaque-se, ainda, que a Lei n. 9.514/1997 confere ao mutuário o prazo de 60 dias para desocupar o imóvel (art. 30), mas prevê o prazo de apenas 30 dias para a realização do leilão, evidenciando que a lei deu mais relevância à liquidação da dívida do que à questão possessória. Mas, o que fazer na hipótese de leilão frustrado, em que não há alienação? Nessa hipótese, o art. 27 da Lei n. 9.514/1997 prevê a realização de um segundo leilão no prazo de 15 dias, após o qual a dívida será extinta compulsoriamente, exonerando-se ambas as partes de suas obrigações. Ora, havendo extinção da dívida, o imóvel deixa de estar afetado ao propósito de garantia, passando a integrar o patrimônio do credor de forma plena, o que se assemelha a uma adjudicação. A partir de então, o credor passa a titularizar todos os poderes inerentes ao domínio, fazendo jus aos frutos do imóvel, inclusive na forma da taxa de ocupação (REsp 1.328.656-GO, Quarta Turma, DJe 18/9/2012). Esclareça-se que, no âmbito da Terceira Turma do STJ, há um julgado em que se admitiu a cobrança de taxa de ocupação desde a consolidação da propriedade, antes, portanto, da data do leilão (REsp 1.155.716-DF, Terceira Turma, DJe 22/3/2012). Esse julgado, contudo, diz respeito a uma situação específica, em que o leilão foi adiado por muito tempo, em razão de decisões judiciais precárias obtidas pelo mutuário; a taxa de ocupação, portanto, foi deferida como forma de compensar as perdas e danos acrescidas em razão dessa demora não imputável ao credor fiduciário. REsp 1.401.233-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/11/2015, DJe 26/11/2015.
DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL EM GARANTIA DE QUALQUER OPERAÇÃO DE CRÉDITO. É possível a constituição de alienação fiduciária de bem imóvel para garantia de operação de crédito não vinculada ao Sistema Financeiro Imobiliário (SFI). O entendimento de que o instituto da alienação fiduciária de bens imóveis somente poderia ser utilizado em crédito destinado a aquisição, edificações ou reformas do imóvel oferecido em garantia - fundado no argumento de que a finalidade da Lei n. 9.514/1997 é proteger o sistema imobiliário e o de habitação como um todo, de modo que a constituição de garantia fiduciária sobre bem imóvel deve estar em sintonia com o objetivo da lei, consubstanciado no incentivo ao financiamento imobiliário - não se sustenta. Isso porque esse posicionamento não encontra respaldo nos arts. 22, § 1º, da Lei n. 9.514/1997 e 51 da Lei n. 10.931/2004 ("Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel. § 1º A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena: [...]"; e "Art. 51. Sem prejuízo das disposições do Código Civil, as obrigações em geral também poderão ser garantidas, inclusive por terceiros, por cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de contratos de alienação de imóveis, por caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis e por alienação fiduciária de coisa imóvel"). Assim, sem maior esforço hermenêutico, verifica-se que é possível afirmar que a lei não exige que o contrato de alienação fiduciária se vincule ao financiamento do próprio imóvel. Ao contrário, é legítima a sua formalização como garantia de toda e qualquer obrigação pecuniária, podendo inclusive ser prestada por terceiros. Dessa forma, muito embora a alienação fiduciária de imóveis tenha sido introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Lei n. 9.514/1997, que dispõe sobre o SFI, seu alcance ultrapassa os limites das transações relacionadas à aquisição de imóvel. Resta indubitável, portanto, que a finalidade do instituto é o de fomentar o sistema de garantias do direito brasileiro, dotando o ordenamento jurídico de instrumento que permite, nas situações de mora - tanto nos financiamentos imobiliários, como nas operações de créditos com garantia imobiliária - a recomposição em prazos compatíveis com as necessidades da economia moderna. REsp 1.542.275-MS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/11/2015, DJe 2/12/2015.
DIREITO CIVIL. PRAZO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO DE COBRANÇA DE SERVIÇO DE CONSERTO DE VEÍCULO POR MECÂNICO. Prescreve em 10 anos (art. 205 do CC) a pretensão de cobrar dívida decorrente de conserto de automóvel por mecânico que não tenha conhecimento técnico e formação intelectual suficiente para ser qualificado como profissional liberal. Isso porque não há como se enquadrar o referido mecânico na categoria de profissional liberal, cuja pretensão de cobrança de serviço é regida pelo prazo prescricional de 5 anos (art. 206, § 5º, II, do CC). Com efeito, tratando-se de regra especial, sua interpretação é restritiva, devendo-se apenas estabelecer a sua exata abrangência, partindo-se da identificação de quem se inclui no conceito de profissional liberal. Considera-se profissional liberal aquela pessoa que exerce atividade especializada de prestação de serviços de natureza predominantemente intelectual e técnica, normalmente com formação universitária, em caráter permanente e autônomo, sem qualquer vínculo de subordinação. Nesse contexto, essa espécie de profissional celebra, normalmente, com seu cliente um contrato de prestação de serviços em que prepondera o elemento confiança (intuitu personae). Na categoria dos profissionais liberais, incluem-se médicos, dentistas, advogados, engenheiros, arquitetos, psicólogos, veterinários, agrônomo, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, economistas, contabilistas, administradores, enfermeiros, professores, etc. Dessa forma, guardadas as peculiaridades de cada atividade, podem-se apontar as características comuns das profissões liberais: (i) prestação de serviço técnico ou científico especializados; (ii) formação técnica especializada, normalmente, em nível universitário; (iii) vínculo de confiança com o cliente (intuitu personae); (iv) ausência de vínculo de subordinação com o cliente ou com terceiro; e (v) exercício permanente da profissão. Na hipótese, o mecânico não apresenta a necessária formação técnica especializada para que incida o prazo prescricional quinquenal; desse modo, aplica-se a regra geral da prescrição decenal. REsp 1.546.114-ES, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 17/11/2015, DJe 23/11/2015.
DIREITO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. ALCANCE DE ALTERAÇÃO DO INDEXADOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR PREVISTO NO PLANO DE BENEFÍCIOS. A alteração no regulamento referente ao plano de benefícios de previdência privada que substituir o indexador IGP-DI pelo INPC para fins de correção monetária da aposentadoria complementar alcança o assistido - "o participante ou seu beneficiário em gozo de benefício de prestação continuada" (art. 8º, II, da LC n. 109/2001) -, devendo o novo índice incidir integralmente a partir de sua vigência, e não apenas nos períodos em que o indexador for mais vantajoso ao assistido. Realmente, conforme dispositivos da LC n. 109/2001, "Ao participante que tenha cumprido os requisitos para obtenção dos benefícios previstos no plano é assegurada a aplicação das disposições regulamentares vigentes na data em que se tornou elegível a um benefício de aposentadoria" (art. 17, parágrafo único) e "Os benefícios serão considerados direito adquirido do participante quando implementadas todas as condições estabelecidas para elegibilidade consignadas no regulamento do respectivo plano" (art. 68, § 1º). Logo, o assistido é possuidor de certos direitos que não podem ser alterados por dispositivos de regulamento superveniente, ainda que aprovados pelo conselho deliberativo da entidade e pelo órgão regulador e fiscalizador. Nesse contexto, o STJ já decidiu, para fins de cálculo da renda mensal inicial de benefício previdenciário complementar, que se aplica o regulamento vigente à época em que preenchidos os requisitos para a sua obtenção (AgRg no AREsp 403.963-CE, Terceira Turma, DJe 13/6/2014; AgRg no AREsp 297.647-SC, Terceira Turma, DJe 31/3/2014; e AgRg no AREsp 10.503-DF, Quarta Turma, DJe 14/12/2012). Todavia, quando se tratar de normas alteradoras da sistemática de correção monetária, não poderão ser invocados os institutos protetores do direito adquirido e do ato jurídico perfeito. Isso porque não há direito adquirido a determinado índice de correção monetária, mas sim ao benefício previdenciário complementar em si mesmo e à efetiva atualização monetária de seu valor. Diante disso, revela-se possível a substituição de um indexador por outro, desde que idôneo para medir a inflação, recompondo a obrigação contratada. Caso seja adotado um índice inadequado para atualizar as verbas previdenciárias suplementares, com o passar do tempo, substanciais prejuízos ocorrerão ao assistido, que perderá gradualmente o seu poder aquisitivo com a corrosão da moeda, dando azo ao desequilíbrio contratual. Além disso, restará frustrado o objetivo principal da Previdência Complementar, que é propiciar ao inativo padrão de vida semelhante ao que desfrutava em atividade. Especificamente quanto à legalidade da substituição do IGP-DI para o INPC para fins de correção monetária da aposentadoria complementar, sabe-se que o INPC é indexador tão eficaz para medir a desvalorização da moeda quanto o IGP-DI. Ambos são índices gerais de preços de ampla publicidade, sendo aptos a mensurar a inflação no mercado de consumo e corrigir os benefícios da previdência privada. Além disso, os dois indexadores, além de oficiais, possuem metodologias confiáveis, quer dizer, o IGP-DI utiliza o índice de preços no atacado e nos mercados do consumidor e da construção civil, enquanto que o INPC observa as variações sentidas nos preços de diversos produtos e serviços consumidos pelas famílias de baixa renda, como alimentação, bebidas, transporte, habitação, artigos de residência, vestuário, saúde, cuidados pessoais e educação. Ademais, como esses índices são variáveis, em determinado período, um se mostra mais elevado que o outro e vice-versa. Por isso, uma alteração no regulamento referente ao plano de benefícios de previdência privada para substituir o indexador de correção monetária da aposentadoria complementar (o IGP-DI pelo INPC) pode, em um período, causar prejuízo ao assistido e, em outro período, gerar ganho para ele. Nessa conjuntura, quanto à aplicação parcial das novas regras do regulamento, ou seja, da restrição da incidência do novo indexador a apenas determinados períodos em que for mais vantajoso ao assistido, cumpre ressaltar ser inadmissível a conjugação de estatutos, de modo a instituir um regime híbrido que mescle os índices vantajosos para o assistido. Pela teoria do conglobamento, deve-se buscar o estatuto jurídico mais benéfico enfocando globalmente o conjunto normativo de cada sistema, sendo vedada, portanto, a mescla de dispositivos diversos, a criar um terceiro regulamento. Logo, a definição do estatuto mais favorável deve se dar em face da totalidade de suas disposições, e não da aplicação cumulativa de critérios mais vantajosos previstos em diferentes regulamentos. Sobre o tema, tanto a jurisprudência do STF (AgR no RE 660.033-DF, Primeira Turma, DJe 29/10/2015) quanto a do STJ (AgRg no AREsp 641.099-RS, Segunda Turma, DJe 9/3/2015) são uníssonas em afastar, em hipóteses variadas, o regime híbrido de normas. Além do mais, não pode ficar ao alvedrio do assistido promover a troca periódica de índices de correção monetária, flutuantes por natureza, já que refletem a dinâmica dos fatos econômicos, almejando a incidência de um ou de outro, quando for mais elevado, conjugando fórmulas de cálculo particulares, a gerar um regime híbrido. Isso, em vez de provocar a simples atualização monetária do benefício previdenciário suplementar, causaria distorções no sistema, como a produção indevida de ganhos reais em detrimento do fundo mútuo, ferindo, assim, o equilíbrio econômico-atuarial. REsp 1.463.803-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 24/11/2015, DJe 2/12/2015.
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E CONSTITUCIONAL. INADEQUAÇÃO DO HABEAS CORPUS PARA IMPUGNAR DECISÃO QUE DETERMINA A BUSCA E APREENSÃO E O ACOLHIMENTO DE CRIANÇA. Não cabe habeas corpus para impugnar decisão judicial liminar que determinou a busca e apreensão de criança para acolhimento em família devidamente cadastrada junto a programa municipal de adoção. Em que pese existirem precedentes da Terceira Turma do STJ admitindo o uso do habeas corpus para a análise de questões semelhantes, a jurisprudência sedimentada do STJ se orienta no sentido de que o habeas corpus não é instrumento processual adequado para a concessão desse tipo de provimento jurisdicional (AgRg no HC 203.485-PR, Terceira Turma, DJe 18/5/2011; RHC 24.086-SC, Quarta Turma, DJe 2/3/2009; RHC 18.597-RJ, Quarta Turma, DJ 5/6/2006; e RHC 1.970-RS, Quinta Turma, DJ 1º/6/1992). Ademais, o caso não se enquadra na hipótese de ameaça de violência ou coação em liberdade de locomoção prevista no art. 5º, LXVIII, da CF. HC 329.147-SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 20/10/2015, DJe 11/12/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPENHORABILIDADE DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. A pequena propriedade rural, trabalhada pela família, é impenhorável, ainda que dada pelos proprietários em garantia hipotecária para financiamento da atividade produtiva. Conforme exposto no REsp 262.641-RS (Quarta Turma, DJ 15/4/2002), o art. 5º, XXVI, da CF "revogou as determinações contidas na legislação ordinária, proibindo a penhora desse bem por sobradas razões, a fim de garantir condições mínimas de sobrevivência e capacidade de produção ao pequeno agricultor. Se não for assim, evidentemente o dispositivo constitucional não está sendo aplicado; e ele existe exatamente para essa finalidade". Ademais, convém esclarecer não ser relevante a alteração legislativa promovida pela Lei n. 11.382/2006, que substituiu a impenhorabilidade do imóvel rural de até um módulo (art. 649, X, do CPC, incluído pela Lei n. 7.513/1987) pela impenhorabilidade da "pequena propriedade rural, assim definida em lei" (art. 649, VIII, do CPC, com redação dada pela Lei n. 11.382/2006), haja vista que, em uma interpretação teleológica, fica clara a intenção do legislador de proteger a atividade agropecuária de subsistência do trabalhador rural e de sua família, a par do enquadramento do imóvel como pequena propriedade rural. Precedentes citados dos STJ: AgRg no REsp 261.350-RS, Terceira Turma, DJ 6/5/2002; e REsp 684.648-RS, Quarta Turma, DJe 21/10/2013. Precedente citado do STF: AI 184.198 AgR, Segunda Turma, DJ 4/4/1997. REsp 1.368.404-SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 13/10/2015, DJe 23/11/2015.
DIREITO CIVIL. DEVOLUÇÃO DE CHEQUE SEM PROVISÃO DE FUNDOS E RESPONSABILIDADE CIVIL DE INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. O banco sacado não é parte legítima para figurar no polo passivo de ação ajuizada com o objetivo de reparar os prejuízos decorrentes da devolução de cheque sem provisão de fundos emitido por correntista. De fato, os arts. 2º, 7º e 10 da Res. BACEN n. 2.025/1993 estabelecem regras para a elaboração da ficha-proposta a ser preenchida pelo cliente e procedimento para entrega de talonário de cheques. Mas, em nenhum momento, essas regras impõem o ônus da fiscalização constante do saldo em conta, nem transformam as instituições financeiras em garantes da solvibilidade de seus clientes. Assim, não se tratando de cheque administrativo ou cheque visado, a partir do momento em que o cheque é colocado à disposição do correntista não é possível fazer um controle do valor de emissão do título. Com efeito, na forma do disposto no art. 4º da Lei n. 7.357/1985, "a existência de fundos disponíveis é verificada no momento da apresentação do cheque para pagamento". Dessa forma, ao receber um cheque para saque, é dever do banco conferir se está presente algum dos motivos para devolução do cheque, como no caso de o valor do título ser superior ao saldo ou ao eventual limite de crédito rotativo, conforme previsto no art. 6º da Res. BACEN n. 1.682/1990. A prestação de serviços referente ao portador do título de crédito limita-se a esse procedimento. Não havendo nenhuma mácula nessa conferência, não há defeito na prestação do serviço, e, portanto, não cabe imputar ao banco conduta ilícita ou risco social inerente à atividade econômica que implique responsabilização por fato do serviço. Por isso, não há a responsabilidade da instituição financeira pelas atividades de seus correntistas na utilização de cheques com má gestão de seus recursos financeiros. A responsabilidade por verificar a capacidade de pagamento do cliente em relação a determinado valor é de quem contrata, o qual deve se cercar dos meios necessários para saber se, em caso de falta de provisão de fundos, terá como cobrar a quantia por outras formas. Ademais, o credor pode se negar a receber cheques, caso não queira correr o risco da devolução por falta de fundos, ou, até mesmo, pode transferir o risco da falta de pagamento a outra pessoa, com custo por esse serviço, como nas taxas pela utilização do cartão de crédito, em que a ausência de pagamento não é sentida pelo credor, ou no deságil dos contratos de factoring, nos quais a ausência de fundos é suportada pelo faturizador. O título de crédito é apenas uma forma de facilitar as relações comerciais postas à disposição daqueles que contratam e não representa a criação de responsabilidade solidária com o sacado, até porque a solidariedade no direito brasileiro não se presume, já que depende de lei. Assim, a pretendida solidariedade contraria a norma de regência do título de crédito em questão (REsp 1.324.125-DF, Terceira Turma, DJe 12/6/2015). Pelo exposto, não há defeito na prestação do serviço bancário quando ocorre devolução de cheque desprovido de fundos, sendo o emitente do cheque desprovido de fundos o único responsável pelo pagamento da dívida, não havendo nexo de causalidade direto e imediato com o fornecimento de talonário pela instituição financeira ao seu cliente. REsp 1.509.178-SC, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 20/10/2015, DJe 30/11/2015.
DIREITO AMBIENTAL E CIVIL. DANOS MATERIAIS OCASIONADOS POR CONSTRUÇÃO DE HIDRELÉTRICA.O pescador profissional artesanal que exerça a sua atividade em rio que sofreu alteração da fauna aquática após a regular instalação de hidrelétrica (ato lícito) tem direito de ser indenizado, pela concessionária de serviço público responsável, em razão dos prejuízos materiais decorrentes da diminuição ou desaparecimento de peixes de espécies comercialmente lucrativas paralelamente ao surgimento de outros de espécies de menor valor de mercado, circunstância a impor a captura de maior volume de pescado para a manutenção de sua renda próxima à auferida antes da modificação da ictiofauna. Não há dúvida de que mesmo atos lícitos podem dar causa à obrigação de indenizar. Segundo a doutrina, "Tratando-se de um benefício à coletividade, desde que o ato administrativo lícito atende ao interesse geral, o pagamento da indenização redistribui o encargo, que, de outro modo, seria apenas suportado pelo titular do direito. [...] Não é, porém, absoluto, nem geral. A compensação é limitada ao dano especial e anormalgerado pela atividade administrativa. Generalizar a noção a todo e qualquer prejuízo, decorrente do funcionamento do serviço, seria a própria denegação da supremacia do interesse público e da destinação social da propriedade. A atividade discricionária da administração condiciona, legitimamente, o exercício de direitos individuais, podendo atingi-los em seu valor econômico, sem obrigação de indenizar". Nesse contexto, convém distinguir os conceitos de direito subjetivo e interesse legítimo, contrapondo-os ao de mero interesse econômico. Segundo a doutrina, "[...] a tutela jurídica, concretizada na possibilidade da coação, [é] o critério de distinção e caracterização do direito subjetivo: onde este exista, não pode faltar a garantia do direito objetivo e a garantia dada pela ação, mercê da qual o particular faz valer em juízo coativamente a faculdade que tem desde que alguém a desconheça ou a conteste. E, vice-versa, onde falta a garantia poderá haver um simples interesse mas não um direito subjetivo. Isto não significa no entanto que o direito objetivo não reconheça todo o interesse que não seja garantido por ação, mas apenas que entre os vários interesses que têm os caracteres supra-referidos há alguns que são elevados à categoria de direitos subjetivos, visto estarem protegidos por uma ação, ao passo que outros não são por ela tutelados. Entre os vários e infinitos interesses, há alguns que se distinguem de todos os outros porque são protegidos, mas não da mesma forma e com a mesma intensidade com a qual se tutelam os direitos subjetivos. Devem assim distinguir-se os interesses puros ou simples, privados de tutela, e os interesses legítimos que tem proteção, não na ação judiciária, mas no recurso aos órgãos da justiça administrativa". Certamente, no caso em análise, o pescador artesanal não tem direito subjetivo a exigir de alguém que lhe assegure a pesca nas mesmas condições anteriores à construção da barragem. Contudo, deve-se verificar se ele está amparado por "situação juridicamente protegida", suscetível de configurar um "interesse legítimo", protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro, em face do fato qualificado como danoso. Nesse sentido, importa destacar que a profissão de pescador é regulamentada pela Lei n. 11.959/2009, a qual dispõe sobre a "Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca". De fato, o caput do art. 3º dessa Lei estabelece que "Compete ao Poder Público a regulamentação da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Atividade Pesqueira, conciliando o equilíbrio entre o princípio da sustentabilidade dos recursos pesqueiros e a obtenção de melhores resultados econômicos e sociais", para o que, entre outras providências, cabe-lhe estabelecer os "períodos de defeso". No § 1º desse mesmo artigo, está previsto que o "ordenamento pesqueiro deve considerar as peculiaridades e as necessidades dos pescadores artesanais, de subsistência e da aquicultura familiar, visando a garantir sua permanência e sua continuidade". Por sua vez, a Lei n. 10.779/2003, com a redação dada pela MP n. 665/2014, dispõe sobre a concessão do benefício de seguro desemprego, durante o período de defeso, ao pescador profissional que exerce a atividade pesqueira de forma artesanal. Ciente disso, observa-se que, embora não haja direito subjetivo à pesca de determinada quantidade ou qualidade de peixes, o ordenamento jurídico confere especial proteção aos pescadores artesanais, garantindo-lhes as condições mínimas de subsistência na época defeso, bem como uma Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável que leve em conta suas peculiaridades e necessidades. Desse modo, tratando-se de pescadores artesanais, há interesse legítimo, situação juridicamente protegida, a ensejar compensação pecuniária em caso de comprovado prejuízo patrimonial, em que houve redução de renda em decorrência do ato lícito de construção da barragem. Com efeito, se a restrição de pesca na época do defeso enseja o benefício previsto na Lei n. 10.779/2003, não há dúvida de que a diminuição do valor comercial do pescado causada pelo ato lícito da concessionária enseja dano a legítimo interesse, passível de indenização. Diversamente, em relação à pesca industrial e à pesca amadora, atividades privadas lícitas e regulamentadas em lei, em princípio, não há senão interesse simples de natureza puramente econômica, desprovido de especial proteção que assegure a seus praticantes renda mínima na atividade pesqueira, a qual fora alterada em decorrência de atividade também lícita da administração ao dar adequada destinação a bem público em prol da coletividade. REsp 1.371.834-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/11/2015, DJe 14/12/2015.
DIREITO AMBIENTAL E CIVIL. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS EM CASO DE CONSTRUÇÃO DE HIDRELÉTRICA. O pescador profissional artesanal que exerça a sua atividade em rio que sofreu alteração da fauna aquática após a regular instalação de hidrelétrica (ato lícito) - adotadas todas as providências mitigatórias de impacto ambiental para a realização da obra, bem como realizado EIA/RIMA - não tem direito a ser compensado por alegados danos morais decorrentes da diminuição ou desaparecimento de peixes de espécies comercialmente lucrativas paralelamente ao surgimento de outros de espécies de menor valor de mercado, circunstância que, embora não tenha ocasionado a suspensão da pesca, imporia a captura de maior volume de pescado para manutenção de sua renda próxima à auferida antes da modificação da ictiofauna. Tratando-se de ato lícito, a indenização em análise não teria por base o princípio da responsabilidade. Sua justificativa seria compensar o sacrifício do direito ou legítimo interesse individual em prol da vantagem conferida à coletividade, não tendo como escopo desestimular o comportamento do agente causador do fato danoso. Além disso, é óbvio que a atividade administrativa presume-se pautada pelo interesse público, preponderante sobre o particular, e, portanto, não deve ser desencorajada. Diversamente, em se tratando de ato ilícito, como é o caso de acidente ambiental causador de poluição, a condenação do poluidor não apenas ao pagamento de indenização plena pelos danos materiais, incluídos os lucros cessantes, mas também de indenização por dano moral, atende à finalidade preventiva de incentivar no futuro comportamento mais cuidadoso do agente. Segundo a doutrina, "no caso da compensação de danos morais decorrentes de dano ambiental, a função preventiva essencial da responsabilidade civil é a eliminação de fatores capazes de produzir riscos intoleráveis". Na hipótese em foco, não há possibilidade de eliminação dos fatores que invariavelmente levam à alteração do estoque pesqueiro do reservatório formado em decorrência da barragem. Isso porque a alteração da fauna aquática é inerente à construção de usinas hidrelétricas. Necessariamente, com o represamento do rio, as condições ambientais passam a ser propícias a espécies de peixes sedentárias ou de pouca movimentação, de médio e pequeno porte, e desfavoráveis às espécies tipicamente migradoras, de maior porte. Ademais, na hipótese em análise, a regularidade e o interesse público da atuação da concessionária não é alvo de questionamento, tendo em vista que a concessionária providenciou o EIA/RIMA e cumpriu satisfatoriamente todas as condicionantes, inclusive propiciando a recomposição do meio ambiente com a introdução de espécies de peixes mais adaptadas à vida no lago da hidrelétrica. Além disso, não houve suspensão, em momento algum, da atividade pesqueira, ao contrário do que ocorre em situações de poluição causada por desastre ambiental, durante o período necessário à recuperação do meio ambiente. A simples necessidade de adaptação às novas condições da atividade pesqueira - composto o dano patrimonial - não gera dano moral autônomo indenizável. Convém assinalar que a alteração do meio ambiente não se enquadra, por si só, como poluição (Lei n. 6.938/1981, art. 3º, III). Tratar como poluição qualquer alteração ambiental que afete a biota implicaria, na prática, por exemplo, o impedimento à atividade produtiva agropecuária e inviabilizaria a construção de hidrelétricas, por maiores e mais eficazes que fossem as condicionantes ambientais e os benefícios ao interesse público. Desse modo, nestas circunstâncias, estabelecer a condenação por dano moral, a qual, em última análise, onerará o contrato de concessão, com reflexos nos custos do empreendimento, a ser arcado indiretamente por toda a sociedade, representaria negar a supremacia do interesse público e da destinação social da propriedade.REsp 1.371.834-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/11/2015, DJe 14/12/2015.
DIREITO CIVIL. DESNECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR ACERCA DO LEILÃO PREVISTO NO ART. 63, § 1º, DA LEI DE INCORPORAÇÕES. Nas execuções disciplinadas pela lei que regula as incorporações imobiliárias (Lei n. 4.591/1964), não há necessidade de notificação da parte inadimplente da data e hora do leilão extrajudicial (art. 63, § 1º), quando existir autorização contratual para sua utilização e prévia interpelação do devedor com intuito de possibilitar a purgação da mora. A revogação parcial da Lei n. 4.591/1964 (Lei de Incorporações) pelo Código Civil de 2002 não atingiu a previsão constante do art. 63 daquela, consistente na execução extrajudicial do contratante faltoso em sua obrigação de pagamento das prestações do preço da construção. Dessarte, a Lei n. 4.591/1964, diante da inexecução culposa do adquirente, além da rescisão do contrato, permite ao incorporador fazer com que os direitos à respectiva fração ideal do terreno e à parte construída adicionada respondam pelo débito, sempre conforme contratualmente previsto e mediante prévia notificação do inadimplente, para que em 10 dias purgue a mora. Assim, o compromissário comprador, já no momento de assinatura do contrato com o incorporador, toma ciência da possibilidade de ocorrência do leilão extrajudicial. Portanto, passado o prazo sem a purgação da mora, os editais para publicidade do leilão serão providenciados, e, assim como quaisquer outros terceiros, o devedor poderá tomar ciência da data e hora de sua ocorrência. Dessa forma, diante da necessidade de previsão contratual da medida expropriatória extrajudicial somada à prévia interpelação do devedor para que seja constituído em mora, parte respeitável da doutrina e da jurisprudência consideram que essa espécie de execução possui elementos de contraditório satisfatórios, uma vez que a interpelação será absolutamente capaz de informar o devedor da inauguração do procedimento, possibilitando, concomitantemente, sua reação. A jurisprudência do STF (AI 678.256 AGR, Segunda Turma, DJe 25/3/2010; AI 663.578 AGR, Segunda Turma, DJe 27/8/2009; AI 709.499 AGR, Primeira Turma, DJe 20/8/2009; RE 223.075, Primeira Turma, DJ 6/11/1998; e RE 408.224 AGR, Primeira Turma, DJe 30/8/2007) se posiciona, hoje, pela constitucionalidade das execuções extrajudiciais, comum aos procedimentos especiais previstos na Lei n. 4.591/1964, no DL n. 70/1966 e na Lei n. 9.514/1997, e, na linha desse entendimento, outrora o STF se manifestou especificamente acerca do art. 63 da Lei de Incorporações, decidindo por sua regularidade (RE 83.382, Segunda Turma, DJ 6/10/1976). Muito além do respeito aos princípios constitucionais, o STF reconhece o valor social dessa forma especial, célere e efetiva de expropriação, e entende que as execuções extrajudiciais imobiliárias têm por fundamento a pronta recuperação dos créditos com garantia imobiliária, havendo sido instituídas como um instrumento indispensável a um funcionamento razoável do sistema imobiliário. REsp 1.399.024-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/11/2015, DJe 11/12/2015.
DIREITO CIVIL. SAQUE INDEVIDO EM CONTA BANCÁRIA E DANO MORAL. O banco deve compensar os danos morais sofridos por consumidor vítima de saque fraudulento que, mesmo diante de grave e evidente falha na prestação do serviço bancário, teve que intentar ação contra a instituição financeira com objetivo de recompor o seu patrimônio, após frustradas tentativas de resolver extrajudicialmente a questão. Não se desconhece que, em princípio, o saque de numerário atinge apenas o patrimônio do sujeito, sobressaindo a violação a um direito de propriedade e, por conseguinte, um dano eminentemente patrimonial. Nessa esteira, vale citar precedente do STJ (REsp 540.681-RJ, Terceira Turma, DJ 10/10/2005) que firmou entendimento no sentido de que "O saque fraudulento feito em conta bancária pode autorizar a condenação do banco por omissão de vigilância. Todavia, por maior que seja o incômodo causado ao correntista ou poupador, o fato, por si só, não justifica reparação por dano moral". Necessário frisar que a adoção desse entendimento não impede, diante de situações peculiares aferíveis mediante o exame de cada caso concreto, o reconhecimento de danos extrapatrimoniais passíveis de compensação. Assim, é prudente destacar que a retirada indevida de quantia depositada em conta poupança ou corrente nem sempre gera, automaticamente, dano moral passível de indenização, isto é, prejuízo in re ipsa, pois dependerá do exame das circunstâncias que envolveram cada hipótese submetida à apreciação judicial. Na situação em análise, embora grave a falha na prestação do serviço, a instituição financeira não adotou quaisquer providências hábeis a solucionar o problema narrado pelo consumidor, tanto que se fez necessário o ajuizamento de uma ação judicial, em que pleiteado, além do dano moral, aquele de cunho patrimonial, consistente nos valores sacados indevidamente da conta bancária. Tais circunstâncias são suficientes à caracterização do dano moral, porquanto não podem ser concebidos como meros dissabores, inerentes à vida social. Efetivamente, ante as circunstâncias acima ressaltadas, houve, na espécie, inegável violação à segurança legitimamente esperada pelo consumidor, que, além de ter seu patrimônio subtraído indevidamente, viu frustradas as tentativas de resolução extrajudicial da questão. Ora, o consumidor somente está vendo restituído o seu dinheiro, indevidamente retirado de sua conta bancária, após ter intentado uma ação judicial que obrigou a instituição financeira a recompor os depósitos. Evidente que essa circunstância vai muito além de um mero dissabor, transtorno ou aborrecimento corriqueiro, não sendo admissível compreender que o intento e longo acompanhamento de uma demanda judicial, único instrumento capaz de refazer seu patrimônio e compelir o banco a proceder à reparação, seja acontecimento normal, comum no cotidiano de qualquer indivíduo. Ademais, há que salientar que, além do caráter compensatório, a possibilidade de indenização do dano extrapatrimonial também detém funções sancionatórias e preventivas, vale afirmar, visam ao desestímulo na prática de novas faltas/falhas na prestação do serviço, notadamente em demandas submetidas aos ditames do CDC. AgRg no AREsp 395.426-DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Rel. para acórdão Marco Buzzi, julgado em 15/10/2015, DJe 17/12/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIZAÇÃO DE CONSUMIDOR POR PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EXTRAJUDICIAIS. Não é abusiva a cláusula prevista em contrato de adesão que impõe ao consumidor em mora a obrigação de pagar honorários advocatícios decorrentes de cobrança extrajudicial. A cobrança, em favor do credor, de honorários advocatícios extrajudiciais é prática muito comum e, em nada, mostra-se abusiva. Isso porque, além de não causar prejuízo indevido para o devedor em atraso e representar importante segmento no mercado de trabalho dos advogados, ela tem apoio nas normas dos arts. 389, 395 e 404 do CC, as quais atribuem ao devedor a responsabilidade pelas despesas e prejuízos causados em razão de sua mora ou inadimplemento, neles incluindo expressamente os honorários advocatícios. Portanto, não há dúvidas acerca da responsabilidade do devedor inadimplente pelos honorários advocatícios do profissional contratado pelo credor para a cobrança extrajudicial de débito em atraso, obrigação essa que decorre da lei, e independe, pois, de previsão contratual. Estabelecido isso, tem-se que, no caso de existir cláusula expressa em contrato de adesão acerca da incidência de honorários advocatícios extrajudiciais na hipótese de cobrança de consumidor em mora, é necessário compatibilizar as referidas disposições da legislação civil com o disposto no art. 51, XII, do CDC ("Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: [...] XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor"), de modo a assegurar ao consumidor, independentemente de previsão contratual, o mesmo direito a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais conferido ao credor. De fato, o efeito direto do descumprimento da obrigação, que no caso se caracteriza pela mora, é o dever de reparar integralmente o prejuízo injustamente causado ao credor. Ademais, afasta-se o argumento de que os honorários decorrentes de cobrança extrajudicial, embora integrando as verbas indenizáveis ope legis, só podem ser reavidos pelo credor mediante procedimento judicial próprio, porquanto essa exigência iria na contramão do contexto moderno em que se pretende desafogar o Judiciário. Por fim, havendo expressa previsão contratual, não se pode afirmar que a cobrança de honorários advocatícios extrajudiciais em caso de mora ou inadimplemento, ainda que em contrato de adesão, seja indevida. REsp 1.002.445-DF, Rel. originário Min. Marco Buzzi, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 26/8/2015, DJe 14/12/2015.
DIREITO CIVIL. PRAZO PRESCRICIONAL DA PRETENSÃO DE REEMBOLSO DE DESPESAS DE CARÁTER ALIMENTAR. Se a mãe, ante o inadimplemento do pai obrigado a prestar alimentos a seu filho, assume essas despesas, o prazo prescricional da pretensão de cobrança do reembolso é de 10 anos, e não de 2 anos. Realmente, se, na hipótese em análise, houvesse sub-rogação da pessoa que assumiu as despesas de caráter alimentar, essa pessoa, na qualidade de terceira interessada, substituiria, na condição de credor, o alimentado com todas as suas características e atributos (art. 349 do CC), e, apesar de propiciar a satisfação do credor originário, remanesceria o vínculo obrigacional anterior (agora, entre o terceiro adimplente e o devedor). Dessa maneira, havendo sub-rogação, o prazo prescricional a incidir na espécie seria o previsto no art. 206, § 2º, do CC: 2 anos para a pretensão de cobrança de prestações alimentares. Contudo, na situação aqui analisada, o credor não pode ser considerado terceiro interessado, não podendo ser futuramente obrigado na quitação do débito. Desse modo, não há falar em sub-rogação, porquanto não existe enquadramento a nenhuma das hipóteses previstas no art. 346 do CC e, principalmente, porque o direito a alimentos é pessoal, não podendo sua titularidade ser transferida a outrem, tampouco os seus atributos. Nessa hipótese, está caracterizada a gestão de negócios, que ocorre quando uma pessoa, "sem autorização do interessado, intervém na gestão de negócio alheio", dirigindo-o "segundo o interesse e a vontade presumível de seu dono, ficando responsável a este e às pessoas com que tratar" (art. 861 do CC). Inclusive, no capítulo específico da gestão de negócios, há previsão especial atinente ao dever legal de alimentos àquele que os presta no lugar daquele que era realmente obrigado: "Quando alguém, na ausência do indivíduo obrigado a alimentos, por ele os prestar a quem se devem, poder-lhes-á reaver do devedor a importância, ainda que este não ratifique o ato" (art. 871 do CC). Nesse contexto, observa-se que a razão de ser do instituto, notadamente por afastar eventual necessidade de concordância do devedor, é conferir a máxima proteção ao alimentado e, ao mesmo tempo, garantir àqueles que prestam socorro o direito de reembolso pelas despesas despendidas, evitando o enriquecimento sem causa do devedor de alimentos. Dessa forma, reconhecida a ocorrência de gestão de negócios, deve-se ter, com relação ao reembolso de valores, o tratamento conferido ao terceiro não interessado, notadamente por não haver sub-rogação, nos termos do art. 305, caput, do CC, segundo o qual o "terceiro não interessado, que paga a dívida em seu próprio nome, tem direito a reembolsar-se do que pagar; mas não se sub-roga nos direitos do credor". Nesse sentido, aliás, a Terceira Turma do STJ (REsp 1.197.778-SP, DJe 1º/4/2014) já afirmou que "equipara-se à gestão de negócios a prestação de alimentos feita por outrem na ausência do alimentante. Assim, a pretensão creditícia ao reembolso exercitada por terceiro é de direito comum, e não de direito de família". Em razão disso, inclusive, é o entendimento do STJ pelo não cabimento da execução de alimentos e de seu rito especialíssimo por quem prestou alimentos no lugar do verdadeiro devedor (REsp 859.970-SP, Terceira Turma, DJ 26/3/2007). Apesar disso, não se pode deixar de destacar que há precedente antigo desta Quarta Turma do STJ que, aparentemente, está em sentido diverso, tendo-se pela ocorrência da sub-rogação: "Solvidas as prestações alimentícias (mensalidades e transporte escolares dos filhos menores) pela mãe (ex-mulher) e não pelo originariamente obrigado (o pai), o reconhecimento da sub-rogação em favor da primeira torna impróprio para a execução o rito do art. 733 do CPC, com o modo de coerção que lhe é inerente, a prisão, em face da inexistência de atualidade dos alimentos" (REsp 110.241-SP, DJ 19/12/2003). No entanto, no caso de um terceiro alheio à obrigação alimentar e que vem a pagar o débito, é o próprio legislador que assevera se tratar de gestão de negócios. Sendo assim, a prescrição a incidir na espécie não é a prevista no § 2º do art. 206 do CC, mas a regra geral prevista no art. 205 do CC, segundo o qual a "prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor". REsp 1.453.838-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 24/11/2015, DJe 7/12/2015.



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