RESUMO. INFORMATIVO 591 DO STJ.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE PARA VERBAS
SUCUMBENCIAIS EM EMBARGOS DE TERCEIRO. RECURSO REPETITIVO. TEMA 872. Nos
Embargos de Terceiro cujo pedido foi acolhido para desconstituir a constrição
judicial, os honorários advocatícios serão arbitrados com base no princípio da
causalidade, responsabilizando-se o atual proprietário (embargante), se este
não atualizou os dados cadastrais; os encargos de sucumbência serão suportados
pela parte embargada, porém, na hipótese em que esta, depois de tomar ciência
da transmissão do bem, apresentar ou insistir na impugnação ou recurso para
manter a penhora sobre o bem cujo domínio foi transferido para terceiro. Em relação ao tema, a sucumbência
deve ter por norte a aplicação do princípio da causalidade. Nesse sentido, a
Súmula n. 303 do STJ dispôs especificamente: "Em embargos de terceiro,
quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários
advocatícios." Na hipótese em análise, os Embargos de Terceiro visavam à
desconstituição de penhora efetuada sobre imóvel não mais integrante do
patrimônio da parte executada. Nesse contexto, o adquirente do imóvel, ao não
providenciar a transcrição do título na repartição competente, expõe o bem à
indevida constrição judicial em demandas ajuizadas contra o antigo
proprietário. Isso porque as diligências realizadas pelo oficial de Justiça ou
pela parte credora em face do antigo proprietário do imóvel, destinadas à
localização de bens, no caso específico daqueles sujeitos a registro (imóveis,
veículos), são feitas mediante consulta aos Cartórios de Imóveis (Detran, no
caso de veículos), razão pela qual a desatualização dos dados cadastrais
fatalmente acarretará a efetivação da indevida penhora sobre o bem. Nessas
condições, não é lícito que a omissão do atual proprietário do imóvel no
cumprimento de um dever legal implique, em favor da parte negligente, que esta
deva ser considerada vencedora na demanda, para efeito de atribuição dos
encargos de sucumbência. Assim, em regra, não haverá condenação da parte
embargada - a qual promovia execução contra o antigo proprietário - quando
verificado que o imóvel não teve devidamente registrada a alteração na
titularidade dominial. Excetua-se a hipótese em que a parte credora, mesmo
ciente da transmissão da propriedade, opuser resistência e defender a
manutenção da penhora - o que evidencia o conflito de interesses na demanda,
apto a ensejar a aplicação do princípio da sucumbência. REsp 1.452.840-SP, Rel. Min. Herman Benjamin,
Primeira Seção, julgado em 14/9/2016, DJe 5/10/2016.
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
CABIMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA PROIBIÇÃO DE TRÁFICO DE VEÍCULOS PESADOS
EM MUNICÍPIO. É cabível ação civil pública proposta por Ministério Público
Estadual para pleitear que Município proíba máquinas agrícolas e veículos
pesados de trafegarem em perímetro urbano deste e torne transitável o anel
viário da região. Em
primeiro lugar, se é certo que os Poderes são harmônicos entre si (art. 2º da
CF) e que o Executivo tem prioridade indiscutível na implementação de políticas
públicas, indubitável também é que, em termos abstratos, o ordenamento jurídico
em vigor permite que o Poder Judiciário seja chamado a intervir em situações
nas quais a atitude ou a omissão do Administrador se afigure ilegítima. O STJ,
atento ao assunto, tem admitido a legitimidade do Ministério Público e a
adequação da ação civil pública como meio próprio de se buscar a implementação
de políticas públicas com relevante repercussão social (REsp 1.367549-MG,
Segunda Turma, DJe 8/9/2014; AgRg no AREsp 50.151-RJ, Primeira Turma, DJe
16/10/2013; REsp 743.678-SP, Segunda Turma, DJe 28/9/2009; REsp 1.041.197-MS,
Segunda Turma, DJe 16/9/2009; REsp 429.570-GO, Segunda Turma, DJ 22/3/2004).
Ora, não é preciso maior reflexão para constatar que o ordenamento do trânsito
de veículos no perímetro das cidades tem importância central nas sociedades
modernas e repercute em inúmeros assuntos de interesse público. Ressalte-se que
o inciso I do art. 1º da Lei n. 7.347/1985 e o caput do art. 3º do mesmo
diploma são claros em dispor que a ação civil pública é meio processual
adequado para discutir temas afetos à ordem urbanística e para a obtenção de
provimento jurisdicional condenatório de obrigação de fazer. Sobre a adequação
da ação civil pública para veicular tema afeto à segurança no trânsito, há ao
menos um precedente do STJ que serve de apoio ao raciocínio exposto (REsp
725.257-MG, Primeira Turma, DJ 14/5/2007). REsp 1.294.451-GO, Rel. Min. Herman
Benjamin, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESE DE
IMPENHORABILIDADE DE IMÓVEL COMERCIAL. É impenhorável o único imóvel comercial
do devedor quando o aluguel daquele está destinado unicamente ao pagamento de
locação residencial por sua entidade familiar. Inicialmente, registre-se que o STJ pacificou a
orientação de que não descaracteriza automaticamente o instituto do bem de
família, previsto na Lei n. 8.009/1990, a constatação de que o grupo familiar
não reside no único imóvel de sua propriedade (AgRg no REsp 404.742-RS, Segunda
Turma, DJe 19/12/2008; e AgRg no REsp 1.018.814-SP, Segunda Turma, DJe
28/11/2008). A Segunda Turma também possui entendimento de que o aluguel do
único imóvel do casal não o desconfigura como bem de família (REsp 855.543-DF,
Segunda Turma, DJ 3/10/2006). Ainda sobre o tema, há entendimento acerca da
impossibilidade de penhora de dinheiro aplicado em poupança, por se verificar
sua vinculação ao financiamento para aquisição de imóvel residencial (REsp
707.623-RS, Segunda Turma, DJe 24/9/2009). REsp 1.616.475-PE, Rel. Min. Herman
Benjamin, julgado em 15/9/2016, DJe 11/10/2016.
DIREITO DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE EM QUE
INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR NÃO PODE RECUSAR A MATRÍCULA DE ALUNO. Instituição
de ensino superior não pode recusar a matrícula de aluno aprovado em vestibular
em razão de inadimplência em curso diverso anteriormente frequentado por ele na
mesma instituição. Inicialmente, destaque-se que a prestação de serviços
educacionais se caracteriza como relação de consumo (REsp 647.743-MG, Terceira
Turma, DJe 11/12/2012), motivo pelo qual devem incidir as regras destinadas à
proteção do consumidor, o qual, por ser a parte mais vulnerável, merece
especial atenção quando da interpretação das leis que, de alguma forma, incidem
sobre as relações consumeristas. Ademais, não se pode olvidar que a educação, dada sua extrema
relevância para o desenvolvimento da sociedade, é um direito consagrado
constitucionalmente, como prevê o art. 205 da CF. Diante disso, observa-se que
o art. 5º da Lei n. 9.870/1999 expressamente autoriza a negativa da instituição
de ensino superior em renovar a matrícula de aluno inadimplente. No entanto, a
hipótese aqui analisada não diz respeito à mera renovação de matrícula, mas sim
à constituição de nova relação jurídica, ainda que na mesma instituição de
ensino. Assim, não se mostra razoável que se proceda a uma interpretação
extensiva da Lei em apreço de modo a prejudicar o consumidor, em especial
aquele que almeja a inserção no ambiente acadêmico. Não é esse o ideal
balizador do ordenamento jurídico pátrio, o qual possui como escopo assegurar
as diretrizes hermenêuticas de interpretação mais benéficas ao sujeito mais
vulnerável da relação. Por fim, é importante lembrar que não se pretende
construir um entendimento no sentido de que dívida com instituição de ensino
seja inexigível. Eventual cobrança de valores em aberto pode ser realizada,
porém pelos meios legais ordinários. O que não se admite é negativa de
matrícula fundamentada no fato de o aluno estar inadimplente com relação a mensalidades
de outro curso da mesma instituição, uma vez que não há respaldo legal para
tanto. REsp 1.583.798-SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 24/5/2016, DJe
7/10/2016.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
DISPENSA DO REQUISITO TEMPORAL PARA A LEGITIMAÇÃO ATIVA DE ASSOCIAÇÃO EM AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. É dispensável o requisito temporal (pré-constituição há mais de
um ano) para associação ajuizar ação civil pública quando o bem jurídico
tutelado for a prestação de informações ao consumidor sobre a existência de
glúten em alimentos. De fato, o STJ, por ocasião do julgamento do REsp
1.479.616-GO (Terceira Turma, DJe 16/4/2015), consignou que: "'atualmente,
o único tratamento eficaz [para a doença celíaca] é uma dieta isenta de glúten
durante toda a vida', pois não existem medicamentos capazes de impedir as lesões
e que o corpo ataque o intestino na presença de glúten. Daí a importância da informação nas
embalagens de alimentos comercializados de que é 'isento de glúten' ou qual a
quantidade ministrada da proteína. Isso porque, se porventura uma pessoa com doença
celíaca consumir alimentos com glúten ou traços de glúten, a ingestão poderá
provocar uma inflamação crônica apta a impedir a absorção de nutrientes. Além
do art. 31 do Código de Defesa do Consumidor, que estatui uma 'obrigação geral
de informação' ao consumidor, a Lei n. 10.674/2003 prevê, em seu art. 1º, que
'Todos os alimentos industrializados deverão conter em seu rótulo e bula,
obrigatoriamente, as inscrições 'contém Glúten' ou 'não contém Glúten',
conforme o caso'. Dessa forma, por versar a ação sobre direitos individuais
homogêneos, a solução do feito não se limita aos membros da associação autora,
haja vista abranger todos os consumidores submetidos às mesmas condições
descritas nos autos. Portanto, muito embora o art. 5º, inciso V, 'a' da Lei n.
7.347/1985 disponha que a associação deverá estar constituída há pelo menos 1
(um) ano, nos termos da lei civil, o requisito formal pode ser dispensado
quando presente, como na hipótese, interesse social de um grupo indeterminável
de interessados, como prevê o parágrafo 4º do referido dispositivo legal, bem
como o art. 82, § 1º, do CDC. O Superior Tribunal de Justiça [...] já
reconheceu a legitimidade de associação que complete um ano de existência no
curso do processo, conforme o princípio da economia processual [...]. Ademais,
[...] o caso concreto versa acerca de interesses individuais homogêneos,
conhecidos como transindividuais, referindo-se a um grupo determinável de
pessoas, no caso, os doentes celíacos, cujos interesses excedem sobremaneira o
âmbito estritamente individual, tendo em vista as circunstâncias de fato de
origem comum (incolumidade da saúde). Assim, a relação consumerista subjacente
e divisível é pertinente a todo indivíduo que adquira produtos alimentícios no
mercado de consumo e que tenha suscetibilidade à referida proteína. Com efeito,
atualmente se admite que as ações coletivas, quando propostas por uma
associação, longa manus da coletividade, pressupõem uma legitimação prévia,
oriunda do fim institucional relativo à tutela de interesses difusos (meio
ambiente, saúde pública, consumidor, dentre outros), cujos interesses dos seus
associados podem se sobrepor ao requisito da constituição temporal, formalidade
superável em virtude da dimensão do dano ou relevância do bem jurídico a ser protegido
e cuja defesa coletiva é ínsita à própria razão de ser da requerente. Em
verdade, cumpre[-se] um mandamento constitucional, pois o art. 196 prevê que a
'saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação'. Sob a ótica do direito público, o risco da
falta de informação a que está submetido o consumidor celíaco, hipervulnerável
por natureza, também já foi objeto de julgamento nesta Corte no REsp n. 586.316
(DJe 19/3/2009), de relatoria do Ministro Herman Benjamim, que considerou
pertinente o pedido formulado pelo PROCON quanto à necessidade de advertência
dos malefícios do glúten em embalagens de produtos alimentícios, sob pena de
sanções administrativas. Por fim, consigne-se que a concessão da legitimidade
às associações e entes afins para a propositura da ação civil pública visa, em
última análise, mobilizar a sociedade civil para participar de questões de
ordem pública, coadunando-se com a ideia de Estado Democrático de Direito, ao
facilitar, por meio do Poder Judiciário, a discussão de eventual interesse
público, ampliando o acesso da sociedade civil à Justiça". Com efeito, é
fundamental assegurar os direitos de informação e segurança ao consumidor
celíaco, que está adstrito à dieta isenta de glúten, sob pena de graves riscos
à saúde, o que, em última análise, tangencia a garantia a uma vida digna. REsp 1.600.172-GO,
Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 15/9/2016, DJe 11/10/2016.
DIREITO CIVIL. CONSTRUÇÃO EM TERRENO ALHEIO
DE AQUEDUTO PARA PASSAGEM DE ÁGUAS. O proprietário de imóvel tem direito de
construir aqueduto no terreno do seu vizinho, independentemente do
consentimento deste, para receber águas provenientes de outro imóvel, desde que
não existam outros meios de passagem de águas para a sua propriedade e haja o
pagamento de prévia indenização ao vizinho prejudicado. O que caracteriza um determinado direito
como de vizinhança é a sua imprescindibilidade ao exercício do direito de
propriedade em sua função social. Ressalte-se, nesse contexto, que a doutrina
estrangeira costumava identificar os institutos dos direitos de vizinhança como
"servidões legais". Entretanto, há que distinguir os dois institutos,
conforme entendimento doutrinário acolhido em julgamento da Terceira Turma do
STJ: "Não é rara a confusão entre servidões e direito de vizinhança. Ambas
as espécies se identificam enquanto limitam o uso da propriedade plena. Mas, na
verdade, desponta uma diferença de origem e finalidade. As primeiras se fixam
por ato voluntário de seus titulares e as segundas decorrem de texto expresso
de lei. A par disso, o direito de vizinhança está endereçado a evitar um dano
('de damno evitando'), o qual, se verificado, impede o aproveitamento do
prédio. Na servidão não se procura atender uma necessidade imperativa. Ela visa
à concessão de uma facilidade maior ao prédio dominante" (REsp 223.590-SP,
DJ 17/9/2001). Por um lado, para um determinado direito ser qualificado como de
vizinhança, é necessário que a utilização de parcela da propriedade alheia seja
essencial ao aproveitamento do prédio, razão pela qual será exigível, de
maneira impositiva, por decorrência da lei, a submissão do direito de
propriedade de um vizinho ao do outro. Por outro lado, consoante o disposto no
art. 1.378 do CC/2002, "a servidão proporciona utilidade para o prédio
dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono", o que
significa dizer que, por meio de uma relação jurídica de direito real, um
prédio, dito serviente, submete-se a alguma utilidade em favor de outro prédio,
dito dominante, transferindo-lhe certas faculdades de uso e de fruição. As
servidões, portanto, possuem a natureza de direito real na coisa alheia; os
direitos de vizinhança, diferentemente, caracterizam limitações legais ao
próprio exercício do direito de propriedade, com viés notadamente recíproco e
comunitário. O direito à água é um direito de vizinhança, um direito ao
aproveitamento de uma riqueza natural pelos proprietários de imóveis que sejam
ou não abastecidos pelo citado recurso hídrico, haja vista que, de acordo com a
previsão do art. 1º, I e IV, da Lei n. 9.433/1997, a água é um bem de domínio
público, e sua gestão deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas. Nessa
conjuntura, ademais, conforme a previsão do art. 1.293 do CC/2002, "é
permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos proprietários
prejudicados, construir canais, através de prédios alheios, para receber as
águas a que tenha direito, indispensáveis às primeiras necessidades da vida, e,
desde que não cause prejuízo considerável à agricultura e à indústria, bem como
para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas, ou a drenagem de
terrenos". Na hipótese, como a água é um bem de domínio público de uso
múltiplo, tem, portanto, o proprietário do imóvel direito de a ela ter acesso.
Todavia, quanto ao dever (do vizinho) de suportar a passagem de aqueduto por
sua propriedade, cumpre destacar que a identificação de um direito abstrato à
água não conduz, necessariamente, ao reconhecimento do direito de vizinhança de
exigir do vizinho a passagem de aqueduto. A exegese da permissão contida no
art. 1.293 do CC/2002 deve, assim, partir da averiguação de uma contingência:
não deve haver outro meio de acesso às águas. Caso presente essa eventualidade,
a leitura de referido dispositivo há de resultar no reconhecimento de que se
cuida de verdadeiro direito de vizinhança e, portanto, limite interno inerente
ao direito de propriedade. De fato, não havendo caminho público até as águas, a
busca e a retirada estão asseguradas por lei, já que a pessoa que a elas não
tenha acesso tem para si dois direitos "o de aproveitamento da água e o
uso de um caminho para a fonte, ou nascente, ou corrente", de acordo com
entendimento doutrinário. Entretanto, se houver outros meios possíveis de
acesso à água, não deve ser reconhecido o direito de vizinhança, pois a
passagem de aqueduto, na forma assim pretendida, representaria mera utilidade -
o que afasta a incidência do art. 1.293, restando ao proprietário a
possibilidade de instituição de servidão, nos termos do art. 1.380 do CC/2002.
REsp 1.616.038-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/9/2016, DJe
7/10/2016.
DIREITO CIVIL. DIREITO DE O SEGURADOR SER
RESSARCIDO EM AÇÃO REGRESSIVA DAS DESPESAS COM REPARO OU SUBSTITUIÇÃO DE BEM
SINISTRADO. A despeito de o segurado ter outorgado termo de quitação ou
renúncia ao causador do sinistro, o segurador terá direito a ser ressarcido, em
ação regressiva contra o autor do dano, das despesas havidas com o reparo ou
substituição do bem sinistrado, salvo se o responsável pelo acidente, de
boa-fé, demonstrar que já indenizou o segurado pelos prejuízos sofridos, na justa
expectativa de que estivesse quitando, integralmente, os danos provocados por
sua conduta.
Quando o segurado opta por acionar a garantia contratada com o segurador,
exigindo-lhe que indenize ou repare o dano realizado no bem segurado, não lhe
cabe firmar, com o causador do dano, nenhum tipo de transação que possa
importar na extinção ou diminuição do direito de regresso do segurador. Se o
fizer, o ato será absolutamente ineficaz em relação ao segurador, como
peremptoriamente determina o art. 786, § 2º, do CC/2002. Em verdade, dada a
importância social do contrato de seguro, as normas insertas no art. 786, caput
e § 2º, do CC/2002, ao assegurarem a sub-rogação do segurador nos direitos que
competirem ao segurado contra o autor do dano, independentemente da vontade
daquele, revestem-se de caráter público, não havendo como um ato negocial do
segurado excluir a prerrogativa outorgada por lei ao segurador. Quanto ao tema,
não se olvida da discussão relacionada à autonomia outorgada ao autor do dano
de, espontaneamente, indenizar integralmente a parte lesada dos danos
decorrentes do acidente - recebendo, em troca, termo de quitação - e, mesmo
assim, o segurado acionar a garantia do seguro para conserto do veículo, em
evidente ato de má-fé contratual. Nessa específica hipótese, é de se admitir
que o terceiro, se demandado em ação regressiva pelo segurador, exima-se do
ressarcimento das despesas com o bem sinistrado, basta que, a teor do disposto
no art. 333, II, do CPC/1973 (com correspondência no art. 373, II, do CPC/2015),
prove que já realizou a reparação completa dos prejuízos causados, apresentando
o recibo assinado pelo segurado ou eventuais documentos que comprovem o custeio
das despesas relacionadas à reparação e(ou) substituição do bem envolvido no
acidente. A hipótese seria, então, de improcedência do pedido regressivo e
restaria ao segurador a alternativa de demandar contra o próprio segurado, por
locupletamento ilícito, tendo em vista que, em evidente ato de má-fé
contratual, requereu, indevidamente, a cobertura securitária, posto que já
indenizado diretamente pelo autor do dano. Ressalte-se, por fim, que não se
desconhece a existência de julgados do STJ em sentido contrário ao ora
apontado, a exemplo dos REsps n. 76.952-RS (Terceira Turma, DJ 1/7/1996), 127.656-DF
(Quarta Turma, DJ 25/3/2002), 274.768-DF (Quarta Turma, DJ 11/12/2000) e
328.646-DF (Quarta Turma, DJ 25/2/2002). Todavia, observa-se que os referidos
julgamentos ocorreram sob a ótica do CC/1916, o qual não disciplinava,
especificamente, a sub-rogação operada em relação ao seguro de dano, como o faz
o art. 786 e parágrafos do atual código. Assim, com amparo no princípio da
especialidade, e considerando a necessidade de resguardar o direito de
ressarcimento das despesas do segurador perante o causador do dano, segundo os
novos paradigmas acerca do mercado securitário, deve ser privilegiada a
aplicação do art. 786, caput e § 2º, do CC/2002, em detrimento das regras
gerais do instituto do pagamento com sub-rogação (arts. 346 a 351 do CC/2002).
REsp 1.533.886-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/9/2016, DJe
30/9/2016.
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. VALIDADE DO
DESCONTO DE PONTUALIDADE INSERIDO EM CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
EDUCACIONAIS. O denominado "desconto de pontualidade", concedido pela
instituição de ensino aos alunos que efetuarem o pagamento das mensalidades até
a data do vencimento ajustada, não configura prática comercial abusiva. Em
relação à natureza jurídica, pode-se afirmar que o abono por pontualidade e a
multa contratual possuem, como traço em comum, o propósito de instar a outra
parte contratante a adimplir a sua obrigação, de garantir o cumprimento da
obrigação ajustada.
Porém, diversamente do desconto por pontualidade, a multa contratual, concebida
como espécie de cláusula penal (no caso, cláusula penal moratória), assume um
nítido viés coercitivo e punitivo, na medida em que as partes, segundo o
princípio da autonomia privada, convencionam a imposição de uma penalidade na
hipótese de descumprimento da obrigação, cujo limite, nos contratos civis, é de
10% sobre o valor da dívida (arts. 8º e 9º do Decreto n. 22.626/1933); nas
dívidas condominiais, de 2% (art. 1.336, § 1º, do CC); e nos contratos de
consumo, de 2%. Por sua vez, o desconto de pontualidade, ainda que destinado a instar
a outra parte contratante a adimplir a sua obrigação, como reverso da moeda,
constitui um idôneo instrumento posto à disposição das partes, também com
esteio na autonomia privada, destinado a encorajar, incentivar o contratante a
realizar um comportamento positivo, almejado pelas partes e pela sociedade,
premiando-o. Sob esse enfoque, e a partir de lições doutrinárias acerca do
tema, pode-se afirmar, com segurança, que as normas que disciplinam o contrato
(seja o CC, seja o CDC) comportam, além das sanções legais decorrentes do
descumprimento das obrigações ajustadas contratualmente (de caráter coercitivo
e punitivo), também as denominadas sanções positivas, que, ao contrário, tem
por propósito definir consequências vantajosas em decorrência do correto
cumprimento das obrigações contratuais. Ademais, na hipótese em que os serviços
educacionais são devidamente contratados mediante o pagamento de um preço de
anualidade certo, definido e aceito pelas partes (diluído em prestações
nominais e taxa de matrícula) e os contratantes, com esteio na autonomia
privada, ajustam entre si que, caso haja pagamento tempestivo, o adquirente do
serviço faz jus a um desconto no valor contratado, o que, a um só tempo,
facilita e estimula o cumprimento voluntário da obrigação ajustada, conferindo
ao consumidor uma vantagem, no caso, de índole patrimonial, a tese de que o
abono de pontualidade guarda, em si, uma espécie de aplicação dissimulada de
multa, a extrapolar o patamar legal previsto no § 1º do art. 52 do CDC (de 2%),
afigurar-se-á absolutamente insubsistente, pois partirá de premissa equivocada.
Em verdade, compreensão contrária à ora registrada também propõe que o Estado,
no bojo de uma relação privada e em substituição à parte contratante, estipule
o "preço ideal" pelos serviços por ela prestados, como se possível
fosse mensurar todas as variáveis mercadológicas que o empresário/fornecedor
leva em conta para definir o preço de seus serviços, em indevida intervenção no
domínio econômico. Efetivamente, a proibição da estipulação de sanções premiais
faria com que o redimensionamento dos custos do serviço pelo fornecedor (a quem
cabe, exclusivamente, definir o valor de seus serviços) fossem repassados ao
consumidor, indistintamente, tenha ele o mérito de ser adimplente ou não.
Assim, além de o desconto de pontualidade significar indiscutível benefício ao
consumidor adimplente - que pagará por um valor efetivamente menor que o preço
da anualidade ajustado -, conferindo-lhe, como já destacado, isonomia material,
tal estipulação corrobora com transparência sobre a que título os valores
contratados são pagos, indiscutivelmente. Como se vê, a multa, que tem por
propósito punir o inadimplemento, não exclui a possibilidade de se estipular a
denominada "sanção premial" pelo adimplemento, tratando-se, pois, de
hipóteses de incidência diferentes, o que, por si só, afasta a alegação de
penalidade bis in idem. REsp 1.424.814-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
julgado em 4/10/2016, DJe 10/10/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCIDÊNCIA DO ART.
4º, § 2º, DA LEI DE ARBITRAGEM EM CONTRATOS DE FRANQUIA. Em contrato de
franquia, "a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar
a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua
instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a
assinatura ou visto especialmente para essa cláusula" (art. 4º, § 2º, da
Lei de Arbitragem).
Inicialmente, no contrato de franquia não há uma relação de consumo tutelada
pelo CDC, mas de fomento econômico, com intuito de estimular as atividades
empresariais do franqueado (REsp 632.958-AL, Quarta Turma, DJe 29/3/2010; e
REsp 687.322-RJ, Terceira Turma, DJe 9/10/2006). Assim, não há incidência das
regras protetivas do CDC a esses contratos, não se admitindo a alegação de
nulidade do compromisso arbitral com base no disposto no art. 51, VII, do CDC,
que proíbe a utilização compulsória de arbitragem. Com fundamento em doutrina e
em julgados do STJ, acrescente-se que o contrato de franquia ou franchising é
inegavelmente um contrato de adesão. Quanto à diferenciação segundo a qual
contratos "por adesão" são distintos de contratos "de
adesão", essa sutileza sintática é incapaz de representar alguma diferença
semântica relevante, pois o Direito não trata de forma distinta essas duas
supostas categorias. Além de irrelevante para a resolução da controvérsia a
distinção semântica entre contratos "de adesão" e aqueles "por
adesão", também não há embasamento jurídico para limitar o alcance do
disposto no art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.307/1996 (Lei de Arbitragem) aos
contratos representativos de relações de consumo. O contrato de adesão é apenas
uma técnica para a formação de contratos, quando exigências de economias de
escala e de uniformização do produto ou serviço se impõem a determinado
segmento econômico, mas não é tipo ou categoria autônoma de contrato. Não
podemos, assim, limitar os contratos de adesão apenas às relações de consumo,
pois, como visto, é pacífico na jurisprudência do STJ que os contratos de
franquia não consubstanciam relações de consumo, mas utilizam essa técnica para
a formação dos contratos. Ao comentar especificamente o dispositivo em análise
da Lei de Arbitragem, doutrina entende que sua função não é outra que não a de
favorecer o contratante economicamente mais fraco, a fim de evitar a imposição
de arbitragem como mecanismo de solução de controvérsias, ao prever requisitos
para a validade do compromisso arbitral em contratos de adesão. Assim, com o §
2º do art. 4º da Lei de Arbitragem, busca-se evitar que a cláusula de
compromisso arbitral seja incluída de forma leviana entre todas as demais
cláusulas do contrato. Por força dessa regra específica, todos os contratos de
adesão, mesmo aqueles que não consubstanciam relações de consumo, como os
contratos de franquia, devem observar o disposto no art. 4º, § 2º, da Lei de
Arbitragem. REsp 1.602.076-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/9/2016,
DJe 30/9/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DO
PODER JUDICIÁRIO PARA DECLARAR NULIDADE DE CLÁUSULA DE COMPROMISSO ARBITRAL. Independentemente
do estado em que se encontre o procedimento de arbitragem, o Poder Judiciário
pode declarar a nulidade de compromisso arbitral quando o vício for detectável
prima facie, como ocorre na hipótese de inobservância, em contrato de franquia,
do disposto no art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.307/1996. Como regra geral, a jurisprudência do STJ
indica a prioridade do Juízo arbitral para se manifestar acerca de sua própria
competência e, inclusive, sobre a validade ou nulidade da cláusula arbitral
(REsp 1.602.696-PI, Terceira Turma, DJe 16/8/2016). Toda regra, porém, comporta
exceções para melhor se adequar a situações cujos contornos escapam às
situações típicas abarcadas pelo núcleo duro da generalidade e que, pode-se
dizer, estão em áreas cinzentas da aplicação do Direito. Obviamente, o
princípio competência-competência (kompetenz-kompetenz) deve ser privilegiado,
inclusive para o indispensável fortalecimento da arbitragem no País. Por outro
lado, é inegável a finalidade de integração e desenvolvimento do Direito a
admissão na jurisprudência do STJ de cláusulas compromissórias
"patológicas" - como os compromissos arbitrais vazios (REsp
1.082.498-MT, Quarta Turma, DJe 4/12/2012) e aqueles que não atendam o
requisito legal específico (art. 4º, § 2º, da Lei n. 9.307/1996) - cuja
apreciação e declaração de nulidade podem ser feitas pelo Poder Judiciário
mesmo antes do procedimento arbitral. São, assim, exceções que permitem uma
melhor acomodação do princípio competência-competência a situações limítrofes à
regra geral de prioridade do Juízo arbitral. REsp 1.602.076-SP, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 15/9/2016, DJe 30/9/2016.
DIREITO CIVIL. TEMA 958. Recurso Especial afetado à Primeira Seção
com representativo da seguinte controvérsia: "validade da cobrança, em
contratos bancários, de despesas com serviços prestados por terceiros, registro
do contrato e/ou avaliação do bem." REsp 1.578.553-SP e REsp 1.578.490-SP,
Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 17/10/2016
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