RESUMO.
INFORMATIVO 577 DO STJ.
DIREITO CIVIL.
DESPROPORÇÃO ENTRE A QUANTIA PAGA INICIALMENTE E O PREÇO AJUSTADO. Se a
proporção entre a quantia paga inicialmente e o preço total ajustado evidenciar
que o pagamento inicial englobava mais do que o sinal, não se pode declarar a
perda integral daquela quantia inicial como se arras confirmatórias fosse,
sendo legítima a redução equitativa do valor a ser retido. Quanto às arras, deve-se destacar que elas têm duas funções: a)
confirmatória (principal); e b) penitencial (secundária). As arras
confirmatórias podem significar princípio de pagamento, na medida em que o
negócio efetivamente se concretizar. Marcam, portanto, o início da execução do
negócio. Convém esclarecer que o valor dado a título de arras confirmatórias
deve ser integralmente perdido, ou seja, quando a parte que deu as arras não
executar o contrato, não terá direito à devolução do "sinal" por ter
dado causa à rescisão. Mas, se o valor do pagamento inicial englobava mais do
que o sinal, o percentual de retenção deve ser reduzido. Isso porque não é
razoável o entendimento de que todo o referido valor inicial pago seja
enquadrado como sinal ou arras confirmatórias e, em consequência, sujeite-se ao
perdimento em prol do vendedor. Entender de forma diversa implicaria onerar
excessivamente a parte que deu as arras, ainda que a ela tenha sido atribuída
culpa pela rescisão do contrato, e beneficiar a parte que as recebeu. Em outras
palavras, seria uma fonte de enriquecimento desproporcional. Observe-se que a
orientação jurisprudencial do STJ é no sentido de que a fixação das arras
confirmatórias se dá em percentual inferior a 20% do valor do bem, variando,
mais precisamente, entre 10% e 20% (AgRg no REsp 1.013.249-PE, Quarta Turma,
DJe de 8/6/2010; e REsp 355.818-MG, Quarta Turma, DJ 13/10/2003). Nessa linha
intelectiva, convém mencionar o Enunciado n. 165 da III Jornada de Direito
Civil do CJF: "Em caso de penalidade, aplica-se a regra do art. 413 ao
sinal, sejam as arras confirmatórias ou penitenciais". Esclareça-se que o
art. 413 do CC estabelece que "a penalidade deve ser reduzida
equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em
parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em
vista a natureza e a finalidade do negócio". REsp 1.513.259-MS, Rel. Min. João Otávio de
Noronha, julgado em 16/2/2016, DJe 22/2/2016.
DIREITO CIVIL.
DIREITO AO RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE BIOLÓGICA. O filho tem direito de
desconstituir a denominada "adoção à brasileira" para fazer constar o
nome de seu pai biológico em seu registro de nascimento, ainda que preexista
vínculo socioafetivo de filiação com o pai registral. De fato, a jurisprudência do STJ entende que "Não há que se falar
em erro ou falsidade se o registro de nascimento de filho não biológico
efetivou-se em decorrência do reconhecimento de paternidade, via escritura
pública, de forma espontânea, quando inteirado o pretenso pai de que o menor
não era seu filho; porém, materializa-se sua vontade, em condições normais de
discernimento, movido pelo vínculo socioafetivo e sentimento de nobreza"
(REsp 709.608-MS, Quarta Turma, DJe 23/11/2009). Nada obstante, o
reconhecimento do estado biológico de filiação constitui direito
personalíssimo, indisponível e imprescritível, consubstanciado no princípio
constitucional da dignidade da pessoa humana (REsp 1.215.189-RJ, Quarta Turma,
DJe 1º/2/2011; e AgRg no REsp 1.203.874-PB, Terceira Turma, DJe 18/8/2011).
Ademais, há precedentes do STJ no sentido de que é possível o desfazimento da
"adoção à brasileira", mesmo no caso de vínculo socioafetivo, se
assim opta o interessado. Dessa forma, a paternidade socioafetiva em face do
pai registral não pode ser óbice à pretensão do filho de ver alterado o seu
registro para constar o nome de seu pai biológico, sob pena de ofensa ao art.
1.596 do CC, segundo o qual "Os filhos, havidos ou não da relação de
casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação". Precedentes
citados: REsp 1.352.529-SP, Quarta Turma, DJe 13/4/2015; e REsp 1.256.025-RS,
Terceira Turma, DJe 19/3/2014. REsp 1.417.598-CE, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 17/12/2015, DJe 18/2/2016
DIREITO CIVIL.
INAPLICABILIDADE DO DIREITO DE PREFERÊNCIA EM CONTRATO DE COMPRA E VENDA
CELEBRADO ENTRE CONDÔMINOS. O direito de preferência previsto no art. 504 do CC
aplica-se ao contrato de compra e venda celebrado entre condômino e terceiro, e
não àquele ajustado entre condôminos. O
art. 504 do CC enuncia que: "Não pode um condômino em coisa indivisível
vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O
condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o
preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de
cento e oitenta dias, sob pena de decadência. Parágrafo único. Sendo muitos os
condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de maior valor e, na falta de
benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem iguais, haverão a parte
vendida os comproprietários, que a quiserem, depositando previamente o
preço". Partindo-se da literalidade do previsto nesse artigo, infere-se
que o direito de preferência deve ser observado apenas nos casos em que a
alienação se pactue entre consorte e estranho, e não entre consortes.
Efetivamente, o caput do aludido dispositivo é bastante claro quanto à incidência da preempção
apenas nas hipóteses de negócio jurídico envolvendo terceiro/estranho ao
condomínio. Aliás, necessário destacar que a ratio da positivação da referida norma sobre o direito de
prelação se cinge justamente à conciliação dos objetivos particulares daquele
que pretende alienar sua fração com a (possível) manutenção da comunidade de
coproprietários, até porque, conforme entendimento doutrinário, "[...] a
função social recomenda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares
originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no
grupo". A referida preocupação está inserida, outrossim, no parágrafo
único do art. 1.314 do CC, segundo o qual: "Nenhum dos condôminos pode alterar
a destinação da coisa comum, nem dar posse, uso ou gozo dela a estranhos, sem o
consenso dos outros". Com efeito, a alienação de frações ideais entre
condôminos refoge à finalidade intrínseca ao direito de preferência, uma vez
que não se tratará de hipótese de ingresso de terceiro/estranho à comunhão.
Pelo contrário, serão mantidos os consortes, apenas com alterações no
percentual da parte ideal daquele que adquiriu a parcela de outrem. Esse
entendimento, aliás, já foi adotado por esta Corte, em antigo precedente da
Terceira Turma (REsp 19.538-SP, DJ 17/5/1993), no qual analisado o art. 1.139
do CC/1916 - norma correspondente ao atual art. 504 do CC. Além disso, não é
cabível o argumento de que o parágrafo único do art. 504 do CC, ao enunciar
que: "Sendo muitos os condôminos, preferirá o que tiver benfeitorias de
maior valor e, na falta de benfeitorias, o de quinhão maior. Se as partes forem
iguais, haverão a parte vendida os comproprietários, que a quiserem,
depositando previamente o preço", teria estendido o direito de preempção
às hipóteses de alienação entre consortes. Em verdade, o referido parágrafo
único apenas complementa a norma enunciada no caput, estabelecendo o procedimento a ser adotado caso mais
de um condômino venha manifestar o seu direito de preferência, por ocasião da
alienação de fração ideal à terceiro alheio à comunhão. Ademais, tratando-se de
restrição à liberdade de contratar, o instituto em comento - direito de
preferência - deve ser interpretado de forma restritiva. Assim, se a lei de
regência (art. 504 do CC) apenas o institui em relação às alienações a
estranhos, não cabe ao intérprete, extensivamente, aplicar essa norma aos casos
de compra e venda entre consortes. REsp 1.137.176-PR, Rel. Min. Marco Buzzi,
julgado em 16/2/2016, DJe 24/2/2016.
DIREITO CIVIL.
REQUISITOS DO INSTRUMENTO PROCURATÓRIO PARA A VALIDADE DA DOAÇÃO. É inválida a
doação realizada por meio de procurador se o instrumento procuratório concedido
pelo proprietário do bem não mencionar o donatário, sendo insuficiente a
declaração de poderes gerais na procuração. Nos termos legais (art. 538 do CC), objetivamente, "Considera-se
doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu
patrimônio bens ou vantagens para o de outra". De forma subjetiva, a
doação representa um gesto de generosidade ou filantropia que resulta da
vontade desinteressada do doador de praticar uma liberalidade. É contrato
festejado na sociedade em virtude da valorização que se dá às condutas animadas
por solidariedade e caridade. A despeito do caráter de liberalidade (animus
donandi), segundo doutrina, existe no
âmbito jurídico uma dupla preocupação relativamente a essa modalidade
contratual: "de um lado, a permissão da prática da liberalidade como
legítima e espontânea manifestação de vontade; de outra banda, o
estabelecimento de uma proteção fundamental à pessoa do doador, evitando
prejuízos a quem pratica um ato de generosidade". Assim, atento ao risco
de o nobre propósito de doar ser desvirtuado ou forjado, inclusive por mascarar
negócio jurídico distinto, existem institutos vocacionados a controlar a sua
regularidade, sendo que sua caracterização depende da conjugação de elementos
subjetivos e objetivos, quais sejam: a) o sujeito (doador e donatário); b) o
objeto a ser doado; c) oanimus donandi (intenção/vontade do doador de praticar a liberalidade visando
enriquecer o donatário); d) a transferência de bens ou vantagens em favor do
donatário; e) a aceitação de quem recebe, afinal é com o consentimento de quem
se beneficia que passa o donatário a assumir deveres éticos, morais e jurídico
para com o benfeitor; e f) a forma pela qual se opera a doação. Ressalte-se que
o ordenamento jurídico permite a doação por procurador constituído pelo doador,
desde que ostente instrumento de mandato com poderes especiais, nos termos do
art. 661, §1º, do CC: "Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar
outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a
procuração de poderes especiais e expressos". Assim, diante da solenidade
que a doação impõe, em razão da disposição de patrimônio que acarreta, somente
o mandatário munido de poderes especiais para o ato é que pode representar o
titular do bem a ser doado. Assinale-se que a doutrina e a jurisprudência
brasileiras têm admitido a doação por procuração, desde que o doador cuide de
especificar o objeto da doação e o beneficiário do ato (donatário). A
propósito, o STJ já exarou o entendimento de que o animus
donandi materializa-se pela indicação
expressa do bem e do beneficiário da liberalidade, razão por que é insuficiente
a cláusula que confere poderes genéricos para a doação (REsp 503.675-SP,
Terceira Turma, DJ 27/6/2005). REsp 1.575.048-SP, Rel. Min. Marco Buzzi,
julgado em 23/2/2016, DJe 26/2/2016.
DIREITO PROCESSUAL
CIVIL. VALIDADE DE CLÁUSULA ARBITRAL QUE RESERVE A SOLUÇÃO DE DETERMINADAS
SITUAÇÕES PARA A VIA JUDICIAL. É válida a cláusula compromissória que
excepcione do juízo arbitral certas situações especiais a serem submetidas ao
Poder Judiciário. Isso porque a
Lei n. 9.307/1996 não exige, como condição de existência da cláusula
compromissória, que a arbitragem seja a única via de resolução admitida pelas
partes, para todos os litígios e em relação a todas as matérias. Cabe lembrar,
ainda, que a liberdade de contratar encontra respaldo no art. 425 do CC, que
estabelece ser "[...] lícito às partes estipular contratos atípicos,
observadas as normas gerais fixadas neste Código". Caso os contratantes
pudessem o mais, que seria afastar da jurisdição estatal todos os litígios
eventualmente decorrentes do contrato, remetendo-os à arbitragem, certamente
poderiam o menos, prevendo hipóteses especiais em que determinadas divergências
fossem submetidas ao Judiciário. Trata-se de o contrato não ignorar o princípio
da inafastabilidade da tutela jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF), com o qual
convive a Lei de Arbitragem, aplicável apenas a direitos disponíveis.
Determinadas questões urgentes, especialmente as anteriores à instauração do
painel arbitral, não só podem como devem ser ajuizadas no Judiciário, para que
as partes não se vejam num "vazio jurisdicional", em que não poderiam
alcançar tutela judicial ou arbitral (porque não instalada ainda a arbitragem).
Nesse sentido, o STJ possui relevantes precedentes: CC 111.230-DF, Segunda
Seção, DJe 3/4/2014; REsp 1.277.725-AM, Terceira Turma, DJe 8/3/2013; e REsp
1.297.974-RJ, Terceira Turma, DJe 19/6/2012. Como se vê nos precedentes, mesmo
nas hipóteses em que as partes não estabeleceram previamente a competência do
Judiciário sobre determinados litígios decorrentes do contrato, o STJ aplicou o
princípio da inafastabilidade da jurisdição, pela impossibilidade de ser
exercida a jurisdição arbitral antes de instaurada a arbitragem e constituído o
painel arbitral. Desse modo, não pode ser considerada nula a cláusula
compromissória constante de acordo que excepcione ou reserve certas situações
especiais a serem submetidas ao Judiciário, mormente quando essas demandem
tutelas de urgência. A contrario sensu, nulidade haveria em previsão que vedasse
completamente toda e qualquer apreciação de litígio pelo Judiciário. O convívio
harmônico dos juízos arbitrais com os órgãos do Judiciário constitui ponto
fundamental ao prestígio da arbitragem. Na escala de apoio do Judiciário à
arbitragem, ressai como aspecto essencial o da execução específica da cláusula
compromissória, sem a qual a convenção de arbitragem quedaria inócua. REsp 1.331.100-BA, Rel. Min. Maria Isabel
Gallotti, Rel. para acórdão Min. Raul Araújo, julgado em 17/12/2015, DJe
22/2/2016.
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