SÚMULA 547. Nas ações em que se pleiteia o
ressarcimento dos valores pagos a título de participação financeira do
consumidor no custeio de construção de rede elétrica, o prazo prescricional é
de vinte anos na vigência do Código Civil de 1916. Na vigência do Código Civil
de 2002, o prazo é de cinco anos se houver previsão contratual de ressarcimento
e de três anos na ausência de cláusula nesse sentido, observada a regra de
transição disciplinada em seu art. 2.028. Segunda Seção, aprovada em 14/10/2015, DJe
19/10/2015.
SÚMULA 548. Incumbe ao credor a exclusão
do registro da dívida em nome do devedor no cadastro de inadimplentes no prazo
de cinco dias úteis, a partir do integral e efetivo pagamento do débito. Segunda Seção,
aprovada em 14/10/2015, DJe 19/10/2015.
SÚMULA 549. É válida a penhora de bem de
família pertencente a fiador de contrato de locação.Segunda Seção, aprovada em
14/10/2015, DJe 19/10/2015.
SÚMULA 550. A utilização de escore de
crédito, método estatístico de avaliação de risco que não constitui banco de
dados, dispensa o consentimento do consumidor, que terá o direito de solicitar
esclarecimentos sobre as informações pessoais valoradas e as fontes dos dados
considerados no respectivo cálculo. Segunda Seção, aprovada em 14/10/2015, DJe
19/10/2015.
SÚMULA 551. Nas demandas por
complementação de ações de empresas de telefonia, admite-se a condenação ao
pagamento de dividendos e juros sobre capital próprio independentemente de
pedido expresso. No entanto, somente quando previstos no título executivo,
poderão ser objeto de cumprimento de sentença. Segunda Seção, aprovada em 14/10/2015, DJe
19/10/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SUSTAÇÃO DE PROTESTO E
PRESTAÇÃO DE CONTRACAUTELA. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES.
8/2008-STJ). TEMA 902. A legislação de regência estabelece que o documento
hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de
obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. Portanto, a sustação de
protesto de título, por representar restrição a direito do credor, exige prévio
oferecimento de contracautela, a ser fixada conforme o prudente arbítrio do
magistrado. A teor do art. 17, § 1º, da Lei de Protesto, o título ou documento de
dívida cujo protesto tiver sido sustado judicialmente só poderá ser pago,
protestado ou retirado com autorização judicial. É dizer, a sustação do
protesto implica retenção do título de crédito, inviabilizando, pois, a sua
execução e, por conseguinte, restringindo, ainda que provisoriamente, o próprio
direito fundamental do credor de acesso à justiça e de haver imediatamente seu
crédito, mediante atos de agressão ao patrimônio do devedor efetuados por meio
do Judiciário. Ademais, em interpretação sistemática do diploma processual,
apenas para um exercício de comparação, é bem de ver que, como o documento
cambiário apresentado a protesto tem que ser título hábil à execução (título de
crédito), a sustação do protesto implica obstar a execução por título
extrajudicial, efeito que, com a vigência do art. 739-A, § 1º, do CPC/1973, nem
os embargos do executado produzem, a menos que, "sendo relevantes seus
fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao
executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já
esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes". Nessa ordem
de ideias, a sustação do protesto, por meio transverso, inviabiliza a própria
execução aparelhada pelo título levado a protesto, não havendo nenhum
sentido/razoabilidade em que seja feita sem a exigência de caução ou depósito,
igualmente exigidos para a suspensão da execução. Nesse sentido, leciona a
doutrina que, para a execução de medida antecipatória/acautelatória, mesmo
quando se tratar de provimento de natureza reversível, há o dever de
salvaguardar o núcleo essencial do direito fundamental à segurança jurídica do
réu; "não fosse assim o perigo de dano não teria sido eliminado, mas
apenas deslocado da esfera do autor para a do demandado". Com efeito, à
luz do disposto no art. 804 do CPC/1973 (art. 300 do novo CPC) há muito está
consolidado na jurisprudência dos tribunais que, para a sustação do protesto
cambial de título hábil à execução, é necessário, para que se resguarde também
os interesses do credor, o oferecimento de contracautela. Por isso é que a
jurisprudência do STJ só admite a sustação do protesto quando as circunstâncias
de fato, efetivamente, autorizam a proteção do devedor, com a presença da
aparência do bom direito e, de regra, com o depósito do valor devido ou, a
critério ponderado do juiz, quando preste caução idônea. Por fim, enfatiza-se
que a hipótese em questão - em que é apontado a protesto documento apto a
aparelhar a execução judicial, isto é, título que caracteriza prova escrita de
obrigação pecuniária líquida, certa e exigível - não se confunde com a situação
em que o magistrado, v.g., constata
que o título está prescrito para a execução cambial, hipótese que atrai a
tutela de evidência prevista no novo CPC e refoge ao controle efetuado pelo
tabelião, caracterizando o hipotético ato do apontamento a protesto, à luz da
iterativa jurisprudência do STJ, por si só, abusivo; mas é certo que, em todo
caso, o excepcional deferimento da medida sem contracautela (resguardo dos
interesses do credor) deverá ser devidamente fundamentado pelo juiz.
Precedentes citados: REsp 627.759-MG, Terceira Turma, DJ 8/5/2006; e AgRg no Ag
1.238.302-MG, Quarta Turma, DJe 1º/2/2011. REsp 1.340.236-SP, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, Segunda Seção, julgado em 14/10/2015, DJe 26/10/2015.
DIREITO CIVL. INAPLICABILIDADE DO CDC ÀS ENTIDADES
FECHADAS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. O Código de Defesa do Consumidor não é
aplicável à relação jurídica entre participantes ou assistidos de plano de
benefício e entidade de previdência complementar fechada, mesmo em situações
que não sejam regulamentadas pela legislação especial. É conveniente
assinalar, para logo, que não se cogita aqui em afastamento das normas
especiais inerentes à relação contratual de previdência privada para aplicação
do Diploma Consumerista, visto que só terá cabimento pensar na sua aplicação a
situações que não tenham regramento específico na legislação especial
previdenciária de regência. Dessarte, como regra basilar de hermenêutica, no
confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico, deve
prevalecer a regra excepcional. Nesse passo, há doutrina afirmando que, como o
CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade há clara
prevalência da lei especial nova pelos critérios de especialidade e cronologia.
Desse modo, evidentemente, não caberá, independentemente da natureza da entidade
previdenciária, a aplicação do CDC de forma alheia às normas específicas
inerentes à relação contratual de previdência privada complementar. Esse
entendimento foi recentemente pacificado no STJ, em vista da afetação à Segunda
Seção do STJ do AgRg no AREsp 504.022-SC (DJe 30/09/2014), tendo constado da
ementa que "[...] é descabida a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor alheia às normas específicas inerentes à relação contratual de
previdência privada complementar e à modalidade contratual da transação,
negócio jurídico disciplinado pelo Código Civil, inclusive no tocante à
disciplina peculiar para o seu desfazimento". Por oportuno, o conceito de
consumidor (art. 2º do CDC) foi construído sob ótica objetiva, porquanto
voltada para o ato de retirar o produto ou serviço do mercado, na condição de
seu destinatário final. Por sua vez, fornecedor (art. 3º, § 2º, do CDC) é toda
pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de prestação de
serviços, compreendido como "atividade fornecida no mercado de consumo,
mediante remuneração" - inclusive as de natureza financeira e securitária
-, salvo as de caráter trabalhista. Nessa linha, afastando-se do critério
pessoal de definição de consumidor, o legislador possibilita, até mesmo às
pessoas jurídicas, a assunção dessa qualidade, desde que adquiram ou utilizem o
produto ou serviço como destinatário final. Dessarte, consoante doutrina
abalizada sobre o tema, o destinatário final é aquele que retira o produto da
cadeia produtiva (destinatário fático), mas não para revendê-lo ou utilizá-lo
como insumo na sua atividade profissional (destinatário econômico). No ponto em
exame, parece evidente que há diferenças sensíveis e marcantes entre as
entidades de previdência privada aberta e fechada. Embora ambas exerçam
atividade econômica, apenas as abertas operam em regime de mercado, podem
auferir lucro das contribuições vertidas pelos participantes (proveito
econômico), não havendo também nenhuma imposição legal de participação de
participantes e assistidos, seja no tocante à gestão dos planos de benefícios,
seja ainda da própria entidade. Nesse passo, assinala-se que, conforme disposto
no art. 36 da LC 109/2001, as entidades abertas de previdência complementar são
constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas. Elas, salvo as
instituídas antes da mencionada lei, têm necessariamente, finalidade lucrativa
e são formadas por instituições financeiras e seguradoras, autorizadas e
fiscalizadas pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), vinculada ao
Ministério da Fazenda, tendo por órgão regulador o Conselho Nacional de Seguros
Privados (CNSP). Assim, parece nítido que as relações contratuais entre as
entidades abertas de previdência complementar e participantes e assistidos de
seus planos de benefícios - claramente vulneráveis - são relações de mercado,
com existência de legítimo auferimento de proveito econômico por parte da
administradora do plano de benefícios, caracterizando-se genuína relação de
consumo. Contudo, no tocante às entidades fechadas, as quais, por força de lei,
são organizadas "sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins
lucrativos", a questão é tormentosa, pois há um claro mutualismo entre a
coletividade integrante dos planos de benefícios administrados por essas
entidades. Nesse diapasão, o art. 34, I, da LC 109/2001 deixa límpido que as
entidades fechadas de previdência privada "apenas" administram os
planos (inclusive, pois, o fundo formado, que não lhes pertence), havendo,
conforme dispõe o art. 35, gestão compartilhada entre representantes dos
participantes e assistidos e dos patrocinadores nos conselhos deliberativo
(órgão máximo da estrutura organizacional) e fiscal (órgão de controle interno).
No tocante ao plano de benefícios patrocinado por entidade da administração
pública, conforme dispõem os arts. 11 e 15 da LC 108/2001, há gestão paritária
entre representantes dos participantes e assistidos - eleitos por seus pares -
e dos patrocinadores nos conselhos deliberativos. Ademais, é bem verdade que os
valores alocados ao fundo comum obtido, na verdade, pertencem aos participantes
e beneficiários do plano, existindo explícito mecanismo de solidariedade, de
modo que todo excedente do fundo de pensão é aproveitado em favor de seus
próprios integrantes. Diante de tudo que foi assinalado, observa-se que as
regras do Código Consumerista, mesmo em situações que não sejam regulamentadas
pela legislação especial, não se aplicam às relações envolvendo participantes
e/ou assistidos de planos de benefícios e entidades de previdência complementar
fechadas. Assim, a interpretação sobre a Súmula 321 do STJ - que continua
válida - deve ser restrita aos casos que envolvem entidades abertas de
previdência.REsp 1.536.786-MG, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 26/8/2015, DJe 20/10/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE NA DISTINÇÃO DE
PREÇO PARA PAGAMENTO EM DINHEIRO, CHEQUE OU CARTÃO DE CRÉDITO. Caracteriza
prática abusiva no mercado de consumo a diferenciação do preço do produto em
função de o pagamento ocorrer em dinheiro, cheque ou cartão de crédito. Essa
proposição se ampara na constatação de que, nas compras realizadas em cartão de
crédito, é necessária uma distinção das relações jurídica entre consumidor,
emissor (eventualmente, administrador) e fornecedor. Na primeira situação,
existe uma relação jurídica entre a instituição financeira (emissora) e o
titular do cartão (consumidor), o qual obtém crédito e transfere àquela a
responsabilização pela compra autorizada mediante o pagamento da taxa de
administração ou mesmo de juros oriundos do parcelamento da fatura. Na segunda
situação, há uma relação jurídica entre a instituição financeira (empresa
emissora e, eventualmente, administradora do cartão de crédito) e o
estabelecimento comercial credenciado (fornecedor). A emissora do cartão
credencia o estabelecimento comercial e assume o risco integral do crédito e de
possíveis fraudes. Para que essa assunção de risco ocorra, o estabelecimento
comercial repassa à emissora, a cada venda feita em cartão de crédito, um
percentual dessa operação, previamente contratado. Na terceira situação, também
existe uma relação jurídica entre o consumidor e o estabelecimento comercial
credenciado (fornecedor). Aqui, o estabelecimento comercial, quando possibilita
aos consumidores efetuarem a compra mediante cartão de crédito, incrementa a
atividade comercial, aumenta as vendas e obtém lucros, haja vista a praticidade
do cartão de crédito, que o torna uma modalidade de pagamento cada vez mais
costumeira. Observa-se, assim, diante dessa análise, que o estabelecimento
comercial tem a garantia do pagamento das compras efetuadas pelo consumidor por
meio de cartão de credito, pois a administradora assume inteiramente a
responsabilidade pelos riscos do crédito, incluindo as possíveis fraudes. O
pagamento por cartão de crédito, uma vez autorizada a transação, libera o
consumidor de qualquer obrigação ou vinculação junto ao fornecedor, pois este
dará ao comprador total quitação. Assim, o pagamento por cartão de crédito é
modalidade de pagamento à vista, pro soluto, porquanto
implica, automaticamente, a extinção da obrigação do consumidor perante o
fornecedor, revelando-se prática abusiva no mercado de consumo, a qual é nociva
ao equilíbrio contratual, a diferenciação entre o pagamento em dinheiro, cheque
ou cartão de crédito. É, nesse ponto, a exegese do art. 39, V e X, do CDC:
"Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras
práticas abusivas: (...) V - exigir do consumidor vantagem manifestamente
excessiva; (...) X - elevar sem justa causa o preço de produtos ou
serviços". Ademais, o art. 36, X e XI, da Lei 12.529/2011, que estrutura o
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, considera infração à ordem
econômica, a despeito de culpa ou de ocorrência de efeitos nocivos, a discriminação
de adquirentes ou fornecedores de bens ou serviços mediante imposição
diferenciada de preços, bem como a recusa à venda de bens ou à prestação de
serviços em condições de pagamento corriqueiras na prática comercial. Por sua
vez, o CDC é zeloso quanto à preservação do equilíbrio contratual, da equidade
contratual e, enfim, da justiça contratual, os quais não coexistem ante a
existência de cláusulas abusivas. A propósito, ressalte-se que o art. 51 do CDC
traz um rol meramente exemplificativo de cláusulas abusivas, num "conceito
aberto" que permite o enquadramento de outras abusividades que atentem
contra o equilíbrio entre as partes no contrato de consumo, de modo a preservar
a boa-fé e a proteção do consumidor. Precedente citado: REsp 1.133.410-RS, Terceira
Turma, DJe 7/4/2010. REsp 1.479.039-MG, Rel. Min. Humberto Martins,
julgado em 6/10/2015, DJe 16/10/2015.
DIREITO CIVIL E
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE APOSENTADORIA COMPLEMENTAR PARA INCLUSÃO DE HORAS
EXTRAS. No caso em que o direito a horas extraordinárias, cujos valores estejam
previstos no regulamento da entidade de previdência complementar como
integrantes da base de cálculo das contribuições do participante, tiver sido
reconhecido somente após a aposentadoria do empregado, o valor do benefício da
aposentadoria complementar deve ser recalculado para considerar os valores das
horas extraordinárias, devendo ser aferido no recálculo o que deixou de ser
recolhido pelo empregado e pelo patrocinador se as horas extras tivessem sido
oportunamente pagas. As
horas extras não possuem caráter geral, sendo destinadas episodicamente aos
ativos. Por constituírem salário apenas no momento em que são pagas, não se
incorporando definitivamente ao contrato de trabalho, somente se houver
previsão regulamentar é que poderão integrar o cálculo da complementação de
aposentadoria, já que não há previsão legal nesse sentido. Em outras palavras,
as horas extraordinárias não integram o cálculo da complementação de
aposentadoria, à exceção daquelas pagas durante o contrato de trabalho e que
compuseram a base de cálculo das contribuições do empregado à entidade de
previdência privada, segundo norma do próprio plano de custeio. Desse modo,
como o valor das horas extras compõe a base mensal de cálculo da contribuição
do participante à entidade de previdência privada, deve ser utilizado também,
na devida proporção, para fins de recebimento do benefício previdenciário complementar,
consoante a equação matemática prevista no regulamento. Caso contrário,
"admitir-se que o empregado contribua sobre horas extras que não serão
integradas em sua complementação geraria inaceitável desequilíbrio atuarial em
favor do fundo de pensão privado, o que não se justifica" (TST-IUJ
E-ED-RR-301900-52.2005.5.09.0661, Tribunal Pleno, DEJT 10/6/2011). Por outro
lado, deverá ser aferido, em liquidação de sentença, o montante de custeio que
o trabalhador deveria ter contribuído se o empregador tivesse pagado
corretamente as horas extras à época, devendo eventual diferença ser compensada
com os valores a que faz jus o participante em virtude da integração da
referida verba remuneratória no cálculo do benefício suplementar. Isso em
observância aos princípios da fonte de custeio e do equilíbrio
econômico-atuarial do fundo previdenciário. Havendo, portanto, apenas a
contribuição do trabalhador, deve ser reduzido pela metade o resultado da
integração do adicional de horas extras na suplementação de aposentadoria. Deve
ser facultado, contudo, ao autor verter as parcelas de custeio de
responsabilidade do patrocinador, se pagas a menor, para poder receber o
benefício integral, visto que não poderia demandá-lo na presente causa em
virtude de sua ilegitimidade passiva ad causam. Além disso, como o obreiro
não pode ser prejudicado por ato ilícito da empresa, deve ser assegurado o
direito de ressarcimento pelo que despender a título de custeio da cota
patronal, a ser buscado em demanda contra o empregador. REsp 1.525.732-RS,
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 6/10/2015, DJe 16/10/2015.
DIREITO CIVIL.
INAPLICABILIDADE DO ART. 30 DA LEI 9.656/1998 A CONTRATO DE PARCERIA RURAL. No
caso de extinção de contrato agrário de "Parceria rural" (arts. 96, §
1º, da Lei 4.504/1964 e 4º do Decreto 59.566/1966), não é assegurado ao
parceiro outorgado o "direito de manter sua condição de beneficiário"
(art. 30 da Lei 9.656/1998) em plano de saúde coletivo instituído pela
sociedade empresária outorgante. Cumpre esclarecer que, nos termos dos arts. 96, §
1º, da Lei 4.504/1964 (Estatuto da Terra) e 4º do Decreto 59.566/1966,
"Parceria rural" é o contrato agrário pelo qual uma pessoa -
sociedade empresária outorgante (ou cedente) - se obriga a ceder a outra -
parceiro outorgado (geralmente pessoa física ou conjunto familiar, representado
pelo seu chefe) -, por tempo determinado ou não, (a) o uso específico de imóvel
rural, de parte ou partes dele, incluindo, ou não, benfeitorias, outros bens
e/ou facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração
agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa vegetal ou mista; e/ou (b) animais para cria, recria,
invernagem, engorda ou extração de matérias-primas de origem animal, mediante
partilha de riscos do caso fortuito e da força maior do empreendimento rural e
dos frutos, produtos ou lucros havidos nas proporções que estipularem,
observados os limites percentuais da lei. Como se pode verificar, essa espécie
contratual possui natureza agrocivil (e não trabalhista), haja vista que, na
sua execução, a prestação de serviços se dá sem pessoalidade, subordinação ou
exclusividade, sendo ausente qualquer remuneração periódica, dado que o
parceiro trabalhador recebe como retribuição econômica parte do resultado final
de sua produção. Nesse tipo de contrato, predomina o ânimo societário, já que
os contratantes se constituem de forma organizada e profissional com o intuito
de gerar riquezas, compartilhando riscos e lucros do negócio jurídico, de modo
a descaracterizar a existência de relação de emprego. Tanto é assim que o art.
96, VII, do Estatuto da Terra determina que "aplicam-se à parceria agrícola,
pecuária, agropecuária, agro-industrial ou extrativa as normas pertinentes ao
arrendamento rural, no que couber, bem como as regras do contrato de sociedade,
no que não estiver regulado pela presente Lei [4.504/1964]". Além disso, a
própria Justiça trabalhista possui o entendimento de que o contrato genuíno de
parceria rural não implica relação de emprego nos moldes dos arts. 2º e 3º da
CLT (TST, SDI-II, RO 7651-33.2012.5.04.0000, DEJT 7/8/2015). Ademais, mesmo a
descaracterização, em alguns casos, da parceria agrícola para um contrato de
integração vertical não se mostra apta a transmudar a natureza do vínculo: de
civil para trabalhista. Por sua vez, o art. 30 da Lei 9.656/1998 assegura o
direito de manter a condição de beneficiário em plano de saúde coletivo tão
somente ao consumidor que, "em decorrência de vínculo empregatício, no
caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa",
contribuiu para o plano. Aliás, apesar de existirem divergências doutrinárias
sobre a abrangência desse dispositivo legal - a respeito, por exemplo, da sua
aplicação aos diversos casos de demissão ou às outras relações de trabalho que
não a de emprego -, a Terceira Turma do STJ tem feito uso da interpretação
restritiva desse artigo, conforme se infere do julgamento do REsp 1.078.991-DF
(DJe 16/6/2009), no qual não aplicou o aludido art. 30 à hipótese de demissão
voluntária de empregado, tendo em vista que esse dispositivo legal apenas
garante o benefício de permanência no plano de saúde coletivo a trabalhador demitido
ou exonerado sem justa causa. Realmente, essa exegese mais estrita do art. 30
da Lei 9.656/1998 se justifica, porquanto o foco da proteção legal é o estado
de desemprego involuntário do trabalhador, que ocorre apenas nos casos de
despedida sem justa causa e dispensa indireta (falta grave praticada pelo
empregador). Portanto, como a hipótese de extinção de contrato agrário de
parceria rural não pode ser equiparada a uma dispensa sem justa causa de
trabalhador submetido ao regime celetista (art. 30 da Lei 9.656/1998) -
tampouco se enquadra como aposentadoria (art. 31 da Lei 9.656/1998) -, não há
como, diante da rescisão de parceria rural, assegurar ao parceiro outorgado o
direito de manter sua condição de beneficiário em plano de saúde coletivo instituído
pela sociedade empresária outorgante. REsp 1.541.045-RS,
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 06/10/2015, DJe 15/10/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
COBERTURA DE HOME CARE POR PLANO DE SAÚDE. Ainda que, em contrato de plano de
saúde, exista cláusula que vede de forma absoluta o custeio do serviço de home
care (tratamento domiciliar), a operadora do plano, diante da ausência
de outras regras contratuais que disciplinem a utilização do serviço, será
obrigada a custeá-lo em substituição à internação hospitalar contratualmente
prevista, desde que haja: (i) condições estruturais da residência; (ii)
real necessidade do atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico
do paciente; (iii) indicação do médico assistente; (iv)
solicitação da família; (v) concordância do paciente; e (vi) não
afetação do equilíbrio contratual, como nas hipóteses em que o custo do
atendimento domiciliar por dia não supera o custo diário em hospital. De fato, na Saúde Suplementar,
o tratamento médico em domicílio não foi incluído no rol de procedimentos
mínimos ou obrigatórios que devem ser oferecidos pelos planos de saúde.
Efetivamente, o home
care não
consta das exigências mínimas para as coberturas de assistência
médico-ambulatorial e de internação hospitalar previstas na Lei 9.656/1998.
Ademais, tendo em vista a normatização feita pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS) sobre a questão (art. 3º, II, III e parágrafo único da
Resolução Normativa 338/2013), verifica-se que a atenção domiciliar nos planos
de saúde não foi vedada, tampouco se tornou obrigatória, devendo obedecer à
previsão contratual ou à negociação entre as partes, respeitados os normativos
da Anvisa no caso da internação domiciliar. Apesar disso, deve-se asseverar
que, embora os planos e seguros privados de assistência à saúde sejam regidos
pela Lei 9.656/1998, as operadoras da área que prestam serviços remunerados à população
enquadram-se no conceito de fornecedor, existindo, portanto, relação de
consumo, o que implica afirmar que as regras do CDC também devem ser aplicadas
nesses tipos contratuais. Nesse sentido, incide a Súmula 469 do STJ, segundo a
qual "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de
saúde". Desse modo, ambos os instrumentos normativos incidem
conjuntamente, sobretudo porque esses contratos, de longa duração, lidam com
bens sensíveis, como a manutenção da vida. Nesse contexto, verifica-se que o
serviço de saúde domiciliar não só se destaca por atenuar o atual modelo
hospitalocêntrico, trazendo mais benefícios ao paciente - pois terá tratamento
humanizado junto da família e no lar, aumentando as chances e o tempo de
recuperação, sofrendo menores riscos de reinternações e de contrair infecções e
doenças hospitalares -, mas também, em muitos casos, é mais vantajoso para o
plano de saúde, já que há a otimização de leitos hospitalares e a redução de
custos (diminuição de gastos com pessoal, alimentação, lavanderia,
hospedagem/diárias e outros). Diante disso, será abusiva qualquer cláusula
contratual que tenha como consequência a vedação absoluta do custeio do serviço
do tratamento domiciliar como alternativa de substituição à internação
hospitalar, visto que se revela incompatível com a equidade e a boa-fé,
colocando o usuário (consumidor) em situação de desvantagem exagerada (art. 51,
IV, do CDC). Cumpre ressaltar, entretanto, que o home care não pode ser concedido de
forma automática, tampouco por livre disposição ou comodidade do paciente e de
seus familiares. Nessa conjuntura, diante da ausência de regras contratuais que
disciplinem a utilização do serviço, a internação domiciliar pode ser obtida,
não como extensão da internação hospitalar, mas como conversão desta. Para
tanto, há a necessidade de haver (i) condições estruturais da residência; (ii) real necessidade do
atendimento domiciliar, com verificação do quadro clínico do paciente; (iii) indicação do médico
assistente; (iv) solicitação da família; (v) concordância do paciente; e
(vi) não afetação do equilíbrio
contratual, como nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia
não supera o custo diário em hospital. Isso porque, nesses casos, como os
serviços de atenção domiciliar não foram considerados no cálculo atuarial do
fundo mútuo, a concessão indiscriminada deles, quando mais onerosos que os
procedimentos convencionais já cobertos e previstos, poderá causar, a longo
prazo, desequilíbrio econômico-financeiro do plano de saúde, comprometendo a
sustentabilidade das carteiras. REsp 1.537.301-RJ,
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 18/8/2015, DJe 23/10/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
ENUMERAÇÃO DOS LEGITIMADOS ATIVOS PARA AÇÃO DE INTERDIÇÃO. Não é preferencial a
ordem de legitimados para o ajuizamento de ação de interdição. De fato, a enumeração dos
legitimados pelos arts. 1.177 do CPC e 1.768 do CC é taxativa, mas não é
preferencial. Trata-se de legitimação concorrente, não sendo a propositura da
ação prerrogativa de uma única pessoa. Mais de um legitimado pode requerer a curatela,
formando-se um litisconsórcio ativo facultativo. Assim, ambos os pais, ou mesmo
mais de um parente, pode propor a ação, cabendo ao juiz escolher, em momento
oportuno, quem vai exercer o encargo. Note-se, ainda, que a redação do art.
1.177 do CPC utiliza o verbo "poder", em vez de "dever",
evidenciando, portanto, a ideia de mera faculdade, e não obrigação.
Esclareça-se também que, conforme destacado no art. 1.775 do CC, as pessoas
habilitadas para promoverem a ação diferem das habilitadas para exercerem a
curatela sobre o interditando. Essas duas legitimidades obedecem apenas a uma
ordem taxativa, mas não preferencial e absoluta, pois caberá ao juiz analisar
cada caso concreto e aplicar o melhor para o interditando, independentemente de
o autor da ação ser indicado em primeiro lugar nos artigos citados. O que se
deve considerar, antes de tudo, é o interesse do incapaz, dado o caráter
protetivo e assistencial que tem o instituto, já que mais grave do que haver
dúvidas a respeito da legitimidade é deixar um incapaz abandonado e à mercê de
pessoas inescrupulosas e interesseiras. Não se pode insistir em uma prioridade
legal, apenas recomendada para o exercício da curatela, e não para a
propositura da ação. Registre-se que, mesmo para o exercício da curatela, o
juiz sempre haverá de analisar o melhor interesse do interditando, o que também
não torna prioritária e absoluta a ordem legal na escolha do curador.
Ressalte-se, ainda, que a interdição visa a curatela, que é imprescindível para
a proteção e o amparo do interditando, resguardando a segurança social ameaçada
ou perturbada por seus atos. Trata-se de intervenção que atende a imperativos
de ordem social. REsp 1.346.013-MG, Rel. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 13/10/2015, DJe 20/10/2015.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
LEGITIMIDADE DE PARENTE PARA PROPOR AÇÃO DE INTERDIÇÃO. Qualquer pessoa que se
enquadre no conceito de parente do Código Civil é parte legítima para propor
ação de interdição. Segundo o art. 1.177, II, do
CPC, a interdição pode ser promovida por algum parente próximo; e segundo o
art. 1.768, II, do CC, a interdição deve ser promovida por qualquer parente. O
certo é que a interdição é facultada a quem a lei reconhece como tal:
ascendentes e descendentes de qualquer grau (art. 1.591 do CC) e aqueles em
linha colateral até o quarto grau (art. 1.592 do CC). Como afinidade gera
relação de parentesco, nada impede que os afins requeiram a interdição e
exerçam a curatela. REsp 1.346.013-MG, Rel. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 13/10/2015, DJe 20/10/2015.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. INTERESSE
DE AGIR EM AÇÃO DE CANCELAMENTO DE DIVERSAS INSCRIÇÕES EM CADASTRO NEGATIVO DE
PROTEÇÃO AO CRÉDITO. Há interesse de agir na ação em que o consumidor postula o
cancelamento de múltiplas inscrições de seu nome em cadastro negativo de
proteção ao crédito, mesmo que somente uma ou algumas delas ultrapassem os
prazos de manutenção dos registros previstos no art. 43, §§ 1º e 5º, do CDC. Salienta-se,
inicialmente, que nem toda dívida inscrita em cadastro negativo de proteção ao
crédito (a exemplo do SPC e Serasa) é igual, pois cada uma delas apresenta
características próprias que as diferem das demais, tais como as partes
contratantes, o valor da obrigação, a data de vencimento, as garantias
contratuais e até eventual foro para dirimir as questões decorrentes do
negócio. Assim, como cada dívida pode gerar uma inscrição distinta,
vislumbra-se ser possível que o devedor inadimplente, sob os mais variados
fundamentos, questione individualmente cada registro. Ademais, quando o art. 43
do CDC utiliza as expressões "cadastros", "dados",
"fichas" e "informações", todas no plural, infere-se a
ideia de multiplicidade de registros a respeito do consumidor inadimplente. Em
decorrência disso, o próprio § 3º do referido dispositivo explicita que:
"O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros,
poderá exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de cinco
dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações
incorretas". Nessa linha de ideias, do ponto de vista do direito material,
é plausível concluir que, no âmbito do cadastro de inadimplentes, não há falar
em unicidade, pois é possível a existência de múltiplas anotações autônomas,
porquanto cada inscrição possuirá origem em diferentes obrigações vencidas e
não pagas. De outra banda, sob a ótica do direito processual civil, observa-se
que cada dívida enseja uma causa de pedir e um pedido, podendo ser impugnadas,
conforme o caso, nos autos de um mesmo processo ou em demanda autônoma, sem
que, neste último caso, possa caracterizar eventual litispendência. No ponto,
ressalta-se que mesmo quando a petição inicial impugnar variadas anotações,
estar-se-á diante de diversas causas de pedir, fundadas em fatos possivelmente
diferentes, na medida em que, como dito acima, cada registro corresponde a uma
dívida não paga. Por tal razão, se a parte alega que as inscrições deverão ser
canceladas em virtude de estar prescrita a pretensão de cobrança das dívidas ou
por fluência do prazo quinquenal, e, ao analisar o caso, o magistrado ou
Tribunal verificar que uma ou algumas ainda estão dentro do lapso legal de
permanência do registro, deverá julgar parcialmente procedente o pedido, com
base no art. 269, I, do CPC. Outrossim, mesmo na situação em que todos os
registros questionados ainda se encontrarem dentro do prazo de permanência das
anotações, o magistrado julgará improcedentes os pedidos, podendo a ação
declaratória de cancelamento de registro ser novamente proposta em razão da
fluência de novo lapso temporal. Desse modo, não parece possível a aplicação do
princípio da "unicidade dos cadastros de inadimplentes" para reconhecer
suposta falta de interesse de agir, tendo em vista que os registros são
derivados de débitos distintos, impugnáveis de maneira individual ou conjunta.
Ressalta-se, aliás, que entender o contrário poderia criar uma esdrúxula
hipótese de perpetuidade dos registros negativos, caso o nome do devedor fosse
inscrito no cadastro de proteção ao crédito em momentos diversos, ampliando-se,
com isso, o período máximo de permanência da inscrição negativa, em evidente
afronta aos comandos insertos nos §§ 1º e 5º do art. 43 do CDC. Além disso, não
se pode olvidar que os bancos de dados e os cadastros negativos de proteção ao
crédito atingem importante direito da personalidade, qual seja, o nome (art. 16
do CC). Por tal razão, eventuais restrições ao nome devem ser realizadas com
temperamentos e em estrita observância à ordem jurídica, principalmente diante
da tutela constitucional da dignidade da pessoa humana, imagem e privacidade.
Nessa linha de intelecção, há vozes doutrinárias que ensinam que: "A
semieternidade dos sistemas de proteção ao crédito - são conhecidos os exemplos
de mortos que integravam os bancos de dados de consumo - não instiga o
funcionamento do mercado. Em vez de acelerar as transações comerciais, a
temporalidade aberta de registros privados (ou mesmo públicos) amarra a
estrutura mercadológica, conquanto cristaliza ad eternum situações
excepcionais que podem não mais representar a realidade do comportamento normal
do indivíduo. Um caso isolado não pode ser usado para macular uma vida inteira,
passada e futura, de correção como contratante e consumidor". A par disso,
nota-se que o enunciado da Súmula 385 do STJ, a despeito de impossibilitar a
obtenção de indenização por danos morais em virtude da existência de diversas
inscrições em nome do devedor inadimplente, assegura o cancelamento de anotação
considerada irregular, permitindo inferir que este Tribunal Superior já
reconhece a existência de interesse de agir em caso de multiplicidade de
registros em nome de um único devedor. REsp 1.196.699-RS, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, julgado em 22/9/2015, DJe 20/10/2015.
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