sexta-feira, 5 de março de 2010

RESUMO. INFORMATIVO 423 DO STJ.

COMPETÊNCIA. FORO. ELEIÇÃO. ABUSIVIDADE.
A Turma decidiu que, na hipótese em que uma empresa com filiais em diversas localidades firma contrato com consumidores nelas domiciliados, com cláusulas prévias, elegendo sua sede como o foro para futuras e eventuais demandas, é possível avaliar, desde logo, a intenção do fornecedor de restringir a defesa do consumidor aderente. Daí que o fundamento adotado pelas instâncias ordinárias, i.e., a existência de relação jurídica regida pelo CDC, por si só, não determina que seja abusiva a cláusula de eleição de foro. Assim, provido em parte o recurso, para determinar que o tribunal de origem analise o foro eleito pelas partes nos termos propostos, no sentido de melhor examinar se tal cláusula dificulta o acesso da parte hipossuficiente ao Poder Judiciário. Ademais, é vedado, na via especial, aferir a abusividade da cláusula de eleição de foro nos termos propostos, por demandar a análise de elementos fáticos. Precedentes citados: REsp 56.711-SP, DJ 20/3/1995; CC 64.524-MT, DJ 9/10/2006; REsp 403.486-SP, DJ 12/8/2002, e CC 30.712-SP, DJ 30/9/2002. REsp 1.089.993-SP, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 18/2/2010.

RESPONSABILIDADE CIVIL. CORTESIA. TRANSPORTE.
A Turma decidiu que, no caso de transporte desinteressado, de simples cortesia, só haverá possibilidade de condenação do transportador mediante a prova de dolo ou culpa grave (Súm. n. 145-STJ). Outrossim, responde por culpa grave o condutor de veículo que transporta passageiro gratuitamente, de forma irregular, em carroceria aberta de caminhão, em que é previsível a ocorrência de graves danos, mesmo crendo que não acontecerão. No caso, não cabe a pretendida redução da condenação, por não ter sido apontada a lei vulnerada pelo acórdão recorrido, razão pela qual incide a Súm. n. 284-STF por analogia. REsp 685.791-MG, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS), julgado em 18/2/2010.

DIREITOS AUTORAIS. CLÍNICA MÉDICA.
A Turma confirmou o entendimento do tribunal a quo de que é devido o pagamento de direitos autorais em razão da exibição de programas televisivos nas dependências de clínica médica pediátrica, pois elas se caracterizam como ambientes de frequência coletiva, tais como os hotéis, academias, bares e restaurantes. Contudo, no caso, não é devida a multa do art. 109 da Lei n. 9.610/1998 (vinte vezes o valor que originariamente deveria ser pago), visto que, conforme precedentes, ela só é devida nos casos em que exista comprovada má-fé e ação deliberada para usurpar o direito autoral. Precedentes citados: REsp 791.630-RJ, DJ 4/9/2006; REsp 556.340-MG, DJ 11/10/2004; REsp 111.105-PR, DJ 10/2/2003; REsp 329.860-RJ, DJ 1º/2/2005; AgRg no EDcl no Ag 938.715-RJ, DJe 23/5/2008, e REsp 439.441-MG, DJ 10/3/2003. REsp 742.426-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 18/2/2010.

ACP. BOLETO BANCÁRIO.
Cuida-se de ação civil pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público estadual contra vários bancos, ora recorrentes, ao fundamento de que, não obstante a edição da Res. n. 2.303/1996-Bacen, que disciplina a cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras, os bancos continuaram a cobrar tarifa indevida e abusiva pelo recebimento, em suas agências, de boletos bancários ou fichas de compensação, de tal forma que o consumidor, além de pagar a obrigação constante do título, mais encargos moratórios eventualmente existentes, é compelido a pagar, também, aquele valor adicional para que o título possa ser quitado na agência bancária. Vê-se, daí, que, malgrado a controvérsia acerca da natureza jurídica dos interesses em questão, pelas circunstâncias do caso identificadas pelo Tribunal de origem e pela leitura atenta da peça inaugural, parece claro que o autor visa à proteção de interesses individuais homogêneos (art. 81, III, do CDC), sendo indiscutível sua legitimação para intentar a ACP (art. 82, I, do mesmo código). Anote-se, como consabido, estar inclusa, entre as finalidades primordiais do MP, justamente a defesa do consumidor (arts. 127 da CF/1988 e 21 da Lei n. 7.347/1985). No tocante à alegada violação dos arts. 2° e 3° do CDC, conforme decidiu o STF em ADI (que, quanto aos serviços de natureza bancária, confirmou a constitucionalidade do art. 3°, § 2°, daquele codex), a relação jurídica existente entre o contratante ou usuário de serviços bancários e a instituição financeira deve ser disciplinada pelo CDC. Já no que diz respeito à alegada violação do art. 51 também do CDC, visto que os serviços prestados pelos bancos são remunerados pela chamada tarifa interbancária (criada por protocolo assinado pela Febraban e outros entes), tal qual referido pelo tribunal de origem, a cobrança de tarifa dos consumidores pelo pagamento mediante boleto ou ficha de compensação constitui enriquecimento sem causa das instituições financeiras, pois há uma dupla remuneração pelo mesmo serviço, o que denota vantagem exagerada dos bancos em detrimento dos consumidores. Assim, cabe ao consumidor apenas o pagamento da prestação que assumiu junto a seu credor, não sendo razoável que seja responsabilizado pela remuneração de serviço com o qual não se obrigou, nem tampouco contratou, mas lhe é imposto como condição para quitar a fatura recebida seja em relação a terceiro seja do próprio banco. Há, também, desequilíbrio entre as partes, decorrente do fato de que ao consumidor não resta senão se submeter à cobrança, pois não lhe é fornecido outro meio para adimplir suas obrigações. Diante disso tudo, conclui-se ser abusiva a cobrança da tarifa pela emissão do boleto bancário nos termos dos arts. 39, V, e 51, § 1°, I e III, todos do CDC. Contudo, no tocante à pretensão de devolução em dobro dos valores pagos em razão da cobrança de emissão de boleto bancário, prosperam os recursos dos bancos; pois, como bem referido pelo juízo de primeira instância, o pedido de indenização, seja de forma simples seja em dobro, não é cabível visto que a ACP busca a proteção dos interesses individuais homogêneos de caráter indivisível. O requerimento de devolução dos valores indevidamente cobrados tem caráter subjetivo individual, por isso deve ser postulado por seus próprios titulares em ações próprias. Por fim, a indenização prevista nos arts. 97 a 100 do CDC não se confunde, como querem fazer entender os recorrentes, com a multa cominada pelo não cumprimento da obrigação de não fazer determinada pelo tribunal de origem, consubstanciada na abstenção da cobrança da tarifa de emissão do boleto bancário. A indenização, segundo já dito, deve ser requerida em ação própria, pois passível de liquidação e execução da sentença de modo individual, motivo pelo qual não se fala, na hipótese dos autos, em indenização autônoma, tampouco em destinação dessa indenização ao Fundo de Direitos Difusos. Todavia, a multa cominatória em caso de descumprimento da obrigação de não fazer, por outro lado, será destinada ao fundo indicado pelo MP (art. 13 da Lei n. 7.347/1985), uma vez que não é possível determinar a quantidade de consumidores lesados pela cobrança indevida da tarifa sob a emissão de boleto bancário. Precedentes citados do STF: ADI 2.591-DF, DJ 13/4/2007; do STJ: REsp 168.859-RJ, DJ 23/8/1999; REsp 117.965-PR, DJ 26/5/1997; REsp 1.014.547-DF, DJe 7/12/2009; REsp 537.652-RJ, DJe 21/9/2009; REsp 1.021.161-RS, DJe 5/5/2008; REsp 894.385-RS, DJ 16/4/2007; REsp 799.669-RJ, DJ 18/2/2008; REsp 762.839-SP, DJ 7/11/2005; REsp 727.092-RJ, DJ 14/6/2007, e REsp 706.449-PR, DJe 9/6/2008. REsp 794.752-MA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/2/2010.

BUSCA E APREENSÃO. HD. EXTENSÃO.
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar em que o impetrante busca a declaração de ilegalidade de extensão de mandado de busca e apreensão o qual resultou na apreensão de disco rígido (HD) do banco (supostamente de propriedade do paciente). Também pretende a impetração a análise de nulidade e suspensão de diferentes ações em razão da prova supostamente ilícita. Note-se que o paciente foi investigado em duas operações deflagradas pela Polícia Federal em momentos diferentes. A primeira ensejou a apreensão dos HDs na residência, no escritório e no banco, esse ato é atacado no writ. A segunda operação, investigação ainda em curso, refere-se a crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. O Min. Relator descartou a análise dos pedidos de suspensão de ações penais, inquéritos, bem como procedimentos incidentais, ainda não apreciados pelo tribunal a quo, para não incorrer em indevida supressão de instância. Dessa forma, a impetração foi parcialmente conhecida: só quanto à extensão da busca e apreensão do HD do banco. Ressalta o Min. Relator que a cópia acostada nos autos revela que o mandado de busca e apreensão está destinado ao endereço domiciliar e profissional do paciente e tinha como alvo documentos, bens, computadores, arquivos em meio magnético ou óptico ou outros elementos de convicção da prática de eventuais crimes em poder de quem os detiver os quais tenham relacionamento direto com os fatos. Assim, reconhece o Min. Relator que o mandado autorizava a diligência, ao determinar que a apreensão dos objetos fosse realizada por fundadas suspeitas de se relacionarem com o crime em apuração. Ademais, depois do cumprimento do mandado na residência, no escritório, no mesmo prédio do banco, por informação da secretária do paciente, chegou-se à conclusão de que também os dados estariam no HD do banco. Daí o delegado ter solicitado por telefone ao juiz de plantão autorização judicial para efetuar a cópia por espelhamento do HD do banco, o que foi concedido por fac-símile. Nesse contexto para o Min. Relator, há indícios da existência de provas relativas à investigação no servidor do banco, a justificar a apreensão, embora não tenha sido expresso o endereço do banco situado em andar no mesmo prédio em que sito o escritório. Sendo assim, conclui que o ato de busca e apreensão do HD do banco não apresenta nenhuma ilegalidade, uma vez que realizado conforme o disposto nos arts. 240 e 243 do CPP. Observa que, quanto ao acesso a dados sigilosos dos correntistas e investidores do banco, o mandado só buscou elementos que indicassem os delitos investigados contra o paciente. Asseverou, ainda, que, com o atual desenvolvimento da informática, é possível separar dados de um HD por meio digital, evitando-se quebra de sigilo de dados de terceiros acobertados por garantia constitucional e que o tribunal a quo enumerou todas as cautelas a serem observadas no caso. Por outro lado, destacou que, segundo a jurisprudência, o direito ao sigilo bancário bem como ao sigilo de dados, a despeito de ser direito constitucional, não é absoluto quando presente, em dimensão maior, o interesse público. Por fim, quanto à perda de objeto da apelação alegada pelo impetrante, considerou que o juízo de primeiro grau não revogou a decisão que determinou a busca e apreensão do HD do banco, apesar de ter discorrido sobre eventual ilegalidade, tanto que utilizou-se de medidas acautelatórias para preservar o objeto apreendido e aguardou o pronunciamento do TJ na apelação, assim, cabia ao tribunal a quo pronunciar-se. Diante do exposto, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, conheceu parcialmente da ordem e, nessa extensão, denegou-a. Os votos vencidos declaravam nula a extensão da busca e apreensão. Precedente citado: HC 15.026-SC, DJ 4/11/2002. HC 124.253-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 18/2/2010.

Um comentário:

marcius disse...

Entendo que nosso Poder Judiciário vai muito mal na tutela de direitos coletivos, no caso em particular na tutela de direitos individuais homogêneos. Ao impossibilitar, na ação contra a cobrança de boletos bancários o pedido de repetição, o STJ acabou por criar um precedente confuso, pois vai contra a letra da lei que permite condenação genérica. O problema é que torna inviável a restituição de valores, quebrando a efetiva repressão contra danos patrimoniais - direito básico do consumidor.