quarta-feira, 11 de novembro de 2015

LANÇAMENTO. COLEÇÃO PROFESSOR RUBENS LIMONGI FRANÇA. ADOÇÃO DE EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS. ADRIANA TELLES DE MIRANDA

Prezados Leitores do Blog.  

Informo o lançamento da obra Adoção de Embriões Excedentários à luz do Direito Brasileiro, da Professora Adriana Telles de Miranda. 

O livro é originário da sua tese de doutorado, defendida na FADISP, sob minha orientação. 

A publicação é pela Grupo GEN/Método, dentro da coleção Professor Rubens Limongi França. 

Bons estudos a todos. 

Professor Flávio Tartuce 

sábado, 7 de novembro de 2015

REPRODUÇÃO ASSISTIDA GANHA PROVIMENTO. POR JONES FIGUEIRÊDO ALVES

Reprodução assistida ganha Provimento

Por Jones Figueirêdo Alves.

Recentemente, o Conselho Federal de Medicina editou a Resolução nº 2.121/2.015, de 16 de julho, especificando novas normas éticas para o emprego das técnicas de reprodução assistida, como as de (i) permitir exceções ao limite da idade máxima de gestação de RHA estabelecido aos cinquenta anos, admitidas por fundamentos científicos e sem os riscos graves de saúde; (ii) disciplinar a transferência embrionária, em quantitativos dependentes de determinada idade; (iii) disciplinar a gestação de substituição (cessão temporária de útero), entre muitas outras diretivas.
Mas não é só: torna expressas as permissões (i) do uso das técnicas de reprodução assistida para relacionamentos homoafetivos e de pessoas solteiras e (ii) da gestação compartilhada em união homoafetiva feminina em que não exista infertilidade.
Nessa linha, foram também recentemente editados Enunciados jurídicos, segundo os quais se considera possível o registro de nascimento de filhos de casais homoafetivos, havidos de reprodução assistida, diretamente no cartório de Registro Civil, tornando dispensável a propositura de uma ação judicial, sempre que haja regulamentação da Corregedoria local. (Enunciado nº 608, da VII Jornada de Direito Civil, do Conselho da Justiça Federal, em 29.09.2015 e Enunciado nº 12, do X Congresso Brasileiro de Direito de Família, do IBDFAM, de 23.10.2015).
Pois bem. Agora é editado o Provimento nº 21/2015, de 29.10.2015, da Corregedoria Geral de Justiça de Pernambuco (publicado no DPJ-PE, de 04.11.2015, pgs. 161-162), de nossa autoria enquanto Corregedor Geral de Justiça em exercício, regulamentando o procedimento de registro de nascimento de filhos havidos de reprodução assistida, por casais heteroafetivos ou homoafetivos, e tornando admitida, expressamente, a multiparentalidade.
É o primeiro normativo registral veiculado por Corregedoria Geral de Justiça, no país, a sufragar o entendimento exposto nos referidos Enunciados e na diretriz da Resolução nº 2.121/2015, do CFM.
O Provimento institui medidas desburocratizantes ao registro civil e serve, com ineditismo, a desjudicializar as hipóteses de reprodução assistida, quando para os fins de registro, exigível era a intervenção judicial, designadamente diante dos inúmeros casos de gestação de substituição (gestação por outrem) ou de projetos parentais por casais homoafetivos.
O provimento é exauriente a orientar os Ofícios de Registro Civil para a lavratura dos assentos de nascimento, com a documentação a instruir os registros, importando segurança, celeridade e eficiência para o ato registral e buscando contribuir, juridicamente, com a evolução científica dos direitos de reprodução. Bem de ver, é a justiça correcional que se coloca a serviço do cidadão e da ciência.
As técnicas de reprodução humana assistida (RHA) no projeto parental de geração de um filho assumem avanços científicos que o direito tem assistido, de perto, sem acompanha-los, todavia, em molduras jurídicas adequadas. A falta de normas legais disciplinadoras, em paridade com as diversas vertentes da RHA, tem sido suprida, apenas, por normas éticas para a utilização das técnicas, constantes de Resoluções do Conselho Federal de Medicina.
Antes, as técnicas de reprodução assistida eram destinadas, apenas, ao mero enfrentamento de problemas de infertilidade.
Agora, para além disso, o manejo científico, no trato da procriação, ganha novas demandas de interesse, a exemplo: 
(i) do congelamento de óvulos, em sua preservação para gravidez futura, postergada a maternidade por circunstâncias e razões diversas, como a de um tratamento de câncer ou da prioridade da realização profissional da mulher, no mercado de trabalho;
(ii) da utilização ou não de embriões excedentários, havidos das técnicas de fertilização, quando se discute a custódia, os eventuais descartes ou a destinação deles para pesquisa de células-tronco embrionárias ou, ainda, para a adoção;
(iii) dos projetos parentais constituídos por famílias monoparentais (formadas por mãe ou pai e o filho) ou por famílias homoafetivas, formadas por pessoas do mesmo sexo, onde, inexoravelmente, a maternidade ou paternidade se apresentam dúplices.
Em todos os casos, o direito tem ficado aquém da melhor resposta jurídica, diante da inexistência de instrumentos legais específicos, reservando-se apenas à doutrina e à jurisprudência, por decisões judiciais consentâneas, as soluções tópicas e ideais diante do que a ciência médica da reprodução assistida tem empreendido em prol dos direitos reprodutivos ou procriativos.
O Provimento nº 21/2015, da Corregedoria Geral da Justiça de Pernambuco, de 29.10.2015, é um feliz começo, colocando a reprodução assistida no direito que lhe cabe.

JONES FIGUEIRÊDO ALVES – O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco e Mestre em Ciências Jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), coordena a Comissão de Magistratura de Família. Autor de diversas obras jurídicas, integra a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas.


quinta-feira, 5 de novembro de 2015

RESUMO. INFORMATIVO 570 DO STJ.

RESUMO. INFORMATIVO 570 DO STJ.

DIREITO ADMINISTRATIVO. REVALIDAÇÃO NO BRASIL DE DIPLOMAS DE UNIVERSIDADES DA AMÉRICA LATINA E CARIBE. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). TEMA 615. O Decreto n. 80.419/77 - que incorporou a Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Estudos, Títulos e Diplomas de Ensino Superior na América Latina e no Caribe - não foi revogado pelo Decreto n. 3.007/99 nem traz norma específica que vede os procedimentos de revalidação dos diplomas que têm respaldo nos artigos 48 e 53, V, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Assim, as universidades públicas brasileiras não estão obrigadas a reconhecer automaticamente os diplomas de ensino superior expedidos por universidades da América Latina e do Caribe. Saliente-se que "a Convenção Regional sobre o Reconhecimento de Estudos, Títulos e Diplomas de Ensino Superior na América Latina e no Caribe, incorporada ao ordenamento jurídico nacional por meio do Decreto n. 80.419/77, não foi, de forma alguma, revogada pelo Decreto n. 3.007, de 30 de março de 1999. Isso porque o aludido ato internacional foi recepcionado pelo Brasil com status de lei ordinária, sendo válido mencionar, acerca desse particular, a sua ratificação pelo Decreto Legislativo n. 66/77 e a sua promulgação através do Decreto n. 80.419/77. Dessa forma, não há se falar na revogação do Decreto que promulgou a Convenção da América Latina e do Caribe em foco, pois o Decreto n. 3.007/99, exarado pelo Sr. Presidente da República, não tem essa propriedade" (REsp 1.126.189-PE, Primeira Turma, DJe 13/5/2010). Pela leitura do art. 5º do Decreto 80.419/1977 - segundo o qual os Estados Contratantes se comprometem a adotar as medidas necessárias para tornar efetivo, o quanto antes possível, para efeito de exercício de profissão, o reconhecimento dos diplomas, títulos os graus de educação superior emitidos pelas autoridades competentes de outro dos Estados Contratantes -, vê-se o nítido caráter programático da referida norma. Inexiste, portanto, determinação específica de reconhecimento automático dos diplomas. Além disso, o STJ, quando apreciou a questão da revalidação de diplomas sob o enfoque da Lei 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira), pelo rito do art. 543-C do CPC, concluiu que "o art. 53, inciso V, da Lei 9.394/96 permite à universidade fixar normas específicas a fim de disciplinar o referido processo de revalidação de diplomas de graduação expedidos por estabelecimentos estrangeiros de ensino superior, não havendo qualquer ilegalidade na determinação do processo seletivo para a revalidação do diploma, porquanto decorre da necessidade de adequação dos procedimentos da instituição de ensino para o cumprimento da norma, uma vez que de outro modo não teria a universidade condições para verificar a capacidade técnica do profissional e sua formação, sem prejuízo da responsabilidade social que envolve o ato" (REsp 1.349.445-SP, Primeira Seção, DJe 14/5/2013). Precedentes citados: REsp 1.315.454-PE, Primeira Turma, DJe 24/2/2014; AgRg no AgRg nos EDcl no REsp 1.165.265-SC, Segunda Turma, DJe 19/12/2011; EDcl nos EDcl no REsp 1.055.035-RS, Segunda Turma, DJe 24/9/2009; e REsp 939.880-RS, Segunda Turma, DJe 29/10/2008. REsp 1.215.550-PE, Rel. Min. Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 23/9/2015, DJe 5/10/2015.

DIREITO DO CONSUMIDOR. CLÁUSULA-MANDATO VOLTADA À EMISSÃO DE CAMBIAL CONTRA O USUÁRIO DE CARTÃO DE CRÉDITO. Nos contratos de cartão de crédito, é abusiva a previsão de cláusula-mandato que permita à operadora emitir título cambial contra o usuário do cartão. Inicialmente, é imprescindível esclarecer que o instituto jurídico da cláusula-mandato em sentido amplo, inserida nos contratos de cartão de crédito, possui três sentidos distintos, que embora decorram da relação de representação existente entre os interessados, ensejam efeitos jurídicos e materiais totalmente diversos. O primeiro, inerente a todos os contratos de cartão de crédito (tenham eles sido estabelecidos com as instituições financeiras ou com as administradoras de cartão private label), é aquele por meio do qual a administradora/mandatária do cartão se compromete a honrar, mediante eventual anuidade e até o limite de crédito estipulado para aquele consumidor/mandante, o compromisso assumido por este perante comerciantes ou prestadores de serviços. O segundo, inerente aos contratos de cartão private label, refere-se à autorização dada pelo consumidor à administradora do cartão de crédito para que, em seu nome, obtenha recursos no mercado financeiro para saldar eventuais dívidas e financiamentos advindos do uso do cartão. O terceiro diz respeito à atribuição de poderes às administradoras/mandatárias do cartão de crédito para emissão de títulos de crédito em nome do consumidor/mandante. Com exceção dos cartõesprivate label, a financeira emissora do cartão concede o financiamento, não havendo que se falar em cláusula-mandato para obter recursos no mercado, uma vez que a própria administradora de cartão/financeira já dispõe do numerário em caixa para saldar eventuais dívidas mediante o financiamento do débito. Já relativamente ao cartão do tipo private label, a administradora do cartão de crédito não é um banco, razão pela qual o mandato conferido pelos consumidores à operadora, a fim de que esta obtenha recursos no mercado, é elemento essencial para se viabilizar o bom andamento do sistema e do ajuste do contrato, porquanto a operadora, no modelo de operação ora em evidência, não é detentora de recursos próprios ou alheios, a possibilitar a cobertura da dívida contraída pelo usuário que não salda a fatura por completo. Assim, a tomada de empréstimo pela administradora em nome de seu cliente, para financiá-lo, é procedimento que atende ao interesse do usuário do cartão de crédito, haja vista que busca como intermediária, perante o mercado, os recursos necessários ao financiamento do consumidor/mandante. Nesse tipo de disposição contratual não se evidencia qualquer abuso de direito, pois a atuação da administradora de cartão se dá em favor e no interesse do cliente, que avaliará a conveniência de saldar desde logo o valor total cobrado ou efetuar o pagamento mínimo da fatura, parcelando o restante para os meses seguintes. Por esta razão, há inúmeros precedentes do STJ assentindo com a validade dessa cláusula-mandato que possibilita ao mandatário a tomada de recursos perante instituições financeiras, quando inserida no bojo do contrato de cartão de crédito (AgRg no Ag 554.940-RS, Quarta Turma, DJ 16/8/2004; e AgRg no REsp 545.569-RS, Terceira Turma, DJ 31/5/2004). Por outro lado, compreende-se por abusiva a cláusula-mandato que prevê a emissão de título de crédito por parte do mandatário contra o mandante, haja vista que tal procedimento expõe o outorgante à posição de extrema vulnerabilidade, a ponto de converter-se em prática ilegítima, visto que dela resulta um instrumento cambial apto a possibilitar a pronta invasão de seu patrimônio por meio da compensação bancária direta ou pela via executiva, reduzindo, inegavelmente, a sua capacidade defensiva, porquanto a expropriação estará lastrada em cártula que, em regra, por mera autorização contratual firmada em contrato de adesão, será sacada independentemente da intervenção do devedor/mandante. Sob este aspecto, há muito foi sedimentado o entendimento no âmbito do STJ acerca da ilegalidade da cláusula-mandato destinada ao saque de títulos, consoante se extrai do enunciado da Súmula 60 do STJ, assim redigido: "É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste". Isso porque é característica marcante dos títulos de crédito a executoriedade, ou seja, a sua autossuficiência jurídica é assegurada tendo em vista os princípios da cartularidade, da literalidade e da autonomia. Assim, o valor nele contido é certo, e a transmissão de sua titularidade encontra amparo na imunidade dos vícios que não sejam incidentes sobre a própria cártula. Esses atributos facilitam, sobremaneira, a obtenção do valor inserido no título, por meio de procedimento executivo, que terá limitado campo de defesa, em razão das características intrínsecas ao documento executado. Ademais, o saque de título contra usuário de cartão de crédito por parte de sua operadora, mediante mandato, não evidencia benefício ao outorgante, pois resulta daí obrigação cambial a ser saldada, limitando-se o campo de defesa do titular do cartão quanto à existência da dívida ou do quantum devido, uma vez que, lançada a cártula, o questionamento do débito no processo executivo é extremamente restrito, face aos atributos e características intrínsecas ao título de crédito. Certamente, a supressão da fase cognitiva para a formação dos elementos obrigacionais cambiais assumidos em nome do cliente só interessa à operadora de cartão de crédito, porquanto possibilita a obtenção de seu crédito de forma mais célere, em detrimento dos princípios da ampla defesa e do contraditório. Ora, a regra no instituto do mandato é que o representante deve atuar em nome do representado, respeitando e agindo dentro dos interesses do mandante, a fim de que não haja um conflito de interesses, tal como o estabelecido quando o mandatário atua em seu próprio interesse, celebrando contrato consigo mesmo ou autocontrato. Assim, não pode o representante agir objetivando o seu próprio interesse concernente ao saneamento de eventual dívida, pois a cláusula-mandato para o saque de título cambial, por somente beneficiar ao mandatário, é considerada abusiva. A propósito, o núcleo do conceito de abusividade presente no art. 51 do CDC está na existência de encargos que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada perante o fornecedor, ou seja, funda-se no desequilíbrio das posições contratuais. No caso, a nulidade da modalidade de cláusula-mandato se verifica em razão de sua potestatividade, uma vez que deixa ao alvedrio do mandatário a expedição de cambial, sem que esteja presente a indicação prévia ao usuário do cartão do fator externo que concorreu para a emissão da cártula, dando ciência dos moldes segundo os quais fora concebida. Não é demasiado referir, também, a ocorrência de situação lesiva aos interesses do usuário do cartão, quando este for compelido a pagar dívida já quitada, pois, ocorrendo a circulação do título de crédito, o consumidor cujo débito perante a operadora do cartão já tiver sido saldado poderá, mesmo assim, ser demandado a cumprir a obrigação inserida na cártula por terceiro que dela portar, uma vez que a obrigação cambial é autônoma e independente da relação jurídica-base ensejadora da emissão do título. Assim, em virtude de a cláusula-mandato permissiva de emissão de título de crédito possibilitar a criação de obrigação cambial contra o próprio mandante, em real e efetivo interesse do mandatário, evidencia-se a abusividade nos poderes conferidos pelo mandato, mormente porque a atuação do mandatário deve ser no estrito benefício do cliente/consumidor/mandante, e não contra ele. Desse modo, a cláusula-mandato que possibilita ao mandatário a emissão de cambial contra o mandante, mesmo quando inserida nos contratos de cartão de crédito, é inegavelmente abusiva (art. 51, IV, do CDC). Cumpre destacar que a declaração de ilegalidade da cláusula-mandato permissiva de emissão de cambial, nos contratos de cartão de crédito, não representa risco para a continuidade desse modelo de pagamento, porquanto somente a maneira de se prestar a garantia é que sofrerá limitação, não sendo admitida a expedição de cártula contra o usuário/consumidor. REsp 1.084.640-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 23/9/2015, DJe 29/9/2015.

DIREITO CIVIL. NOTIFICAÇÃO POR E-MAIL PARA O EXERCÍCIO DE DIREITO DE PREFERÊNCIA. É válida a notificação por e-mail enviada ao franqueador para o exercício do direito de preferência previsto em contrato de franquia, no caso em que, não tendo o contrato previsto forma específica para a notificação e sendo o correio eletrônico meio usual de comunicação entre franqueador e franqueado, houve ciência inequívoca do franqueador quanto à data do envio e do recebimento da mensagem, segurança quanto à legitimidade do remetente para tratar do assunto e, quanto ao conteúdo, respeito aos requisitos estabelecidos na cláusula contratual. A validade da notificação por e-mail exige o atendimento de certos requisitos, para o fim de assegurar a efetividade da notificação em si, bem como o exercício do direito de preferência. A respeito da forma eleita pelo franqueado para notificar a franqueadora, o correio eletrônico (e-mail), é possível afirmar que esta cumpriu a finalidade essencial do ato: dar ciência de forma incontestável do teor da notificação. Atualmente, no ambiente empresarial, é inegável que a utilização de correspondência eletrônica (e-mail) é veículo usual e indispensável de intercâmbio de informação, pois é ferramenta que aprimora e agiliza a comunicação. A dinâmica das relações negociais, na maioria das vezes, requer agilidade do processo decisório, e a eficiência na comunicação é relevante fator para tal fim. A busca pela agilidade nas empresas vai em direção ao tempo real, ao instantâneo, e nesse cenário, as singularidades do correio eletrônico vêm ao encontro dessas necessidades. Ademais, é mecanismo capaz de superar dificuldades relacionadas à distância, dispensando, em regra, a presença física das partes. No âmbito do Poder Judiciário, a edição da Lei 11.419/2006 foi importante marco na informatização do processo judicial. Através dela, introduziu-se o uso do meio eletrônico na tramitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças processuais, demonstrando que o norte é o aprimoramento das operações realizadas no ambiente eletrônico. Por outro lado, a introdução de novas tecnologias aplicadas tanto nas relações negociais como também no âmbito dos processos judiciais, a despeito da evidente agilização dos procedimentos, com ganhos de tempo, de trabalho e de recursos materiais, deve ser vista com precaução, considerando-se os riscos e as dificuldades próprias do uso de sistemas informatizados. Na hipótese, o juízo de cautela sobre a segurança da informação foi observado. REsp 1.545.965-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 22/9/2015, DJe 30/9/2015.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA DE DIREITOS AUTORAIS PROPOSTA PELO ECAD. Na ação de cobrança de direitos autorais proposta pelo ECAD em desfavor de sociedade empresária executante de serviço de radiodifusão, o Termo de Comprovação de Utilização Musical não é fonte de prova imprescindível para comprovação do fato constitutivo do direito do autor. De início, releva anotar que o ECAD é associação civil, portanto, de natureza privada, constituída pelas associações de direitos do autor, com a finalidade de defesa e cobrança dos direitos autorais. Em razão da adoção pelo legislador brasileiro do sistema de gestão coletiva, a Lei 9.610/1998 (Lei de Direitos Autorais) reservou ao ECAD a exclusividade quanto à arrecadação e distribuição dos direitos autorais relativos à reprodução e divulgação de obras musicais e fonogramas. Apesar do reconhecido monopólio do ECAD, a natureza privada da atividade (exploração de direitos autorais) e da própria entidade legitimada à sua exigência, o Termo de Comprovação de Utilização Musical não goza de qualquer presunção, tais como gozam os autos de infração emitidos por entidades fiscalizadoras (e, portanto, prestadoras de serviço público), devendo ser analisado no contexto das demais provas produzidas. Além disso, o fato de o mencionado termo, na praxe, não contar com a participação do infrator em sua formação suscita questionamento quanto à sua força probandi. Com efeito, a Terceira Turma do STJ, em precedente antigo, albergou o entendimento de que o referido Termo, ainda que produzido unilateralmente, associado à presunção decorrente da notoriedade do fato gerador - evidente na hipótese de atividade de emissor de rádio - seria suficiente para inverter o ônus probandi. Desse modo, reconheceu-se que caberia à emissora de rádio a produção de contraprova, demonstrando estar em conformidade com as exigências da Lei 9.610/1998 (REsp 612.615-MG, Terceira Turma, DJ 7/8/2006). As bases fáticas desta hipótese são evidentemente diversas das ora verificadas. Isso porque, no precedente, houve a efetiva juntada do Termo, o qual não contava com a assinatura da emissora de rádio demandada, em razão de sua manifesta recusa. No presente caso, todavia, não houve a juntada do referido documento, o que serviu de fundamento exclusivo para se concluir pela ausência de comprovação do fato constitutivo do direito alegado. Conquanto, na hipótese em análise, não se tenha juntado o Termo de Comprovação de Utilização Musical, esse documento não é, de conformidade com a legislação, o fato constitutivo do direito. Isso porque, a obrigação sub judice tem sua origem na exploração - reprodução e divulgação - de obras musicais, protegidas pela Constituição Federal enquanto direitos imateriais dos autores. Noutros termos, como bem alertado no precedente da Terceira Turma, é a exploração de obras musicais que faz nascer a obrigação de pagamento do preço ao ECAD, tanto que este pagamento deve ser providenciado antes mesmo da utilização. Assim, o fato constitutivo do direito é a divulgação e transmissão de músicas e fonogramas, e não a lavratura de um termo, que, ao fim e ao cabo, tem por finalidade facilitar a comprovação de uma inadimplência já ocorrida e que não pode ser utilizada como forma de dificultar a realização do escopo da própria associação. Desse modo, demonstrando-se por qualquer meio probatório a exploração não autorizada ou sem o correspondente pagamento prévio dos direitos autorais, estará comprovado o fato constitutivo do direito, cabendo, a partir daí, à parte ex adversa a comprovação de fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito, conforme a clássica distribuição do ônus probatório (art. 333, II, do CPC). Portanto, não é razoável nem legal a exigência de produção de um documento específico (Termo de Comprovação de Utilização Musical) como requisito essencial de ação de cobrança, quando a própria lei não o exige. Ressalte-se que o referido documento - como qualquer outro documento - nada mais é do que mera fonte de prova, a qual pode, em regra, ser substituída por qualquer outro meio de prova. REsp 1.391.090-MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 22/9/2015, DJe 9/10/2015.
DIREITO CIVIL. APLICAÇÃO DE MULTA A CONDÔMINO ANTISSOCIAL. A sanção prevista para o comportamento antissocial reiterado de condômino (art. 1.337, parágrafo único, do CC) não pode ser aplicada sem que antes lhe seja conferido o direito de defesa. De fato, o Código Civil - na linha de suas diretrizes da socialidade, cunho de humanização do direito e de vivência social, da eticidade, na busca de solução mais justa e equitativa, e da operabilidade, alcançando o direito em sua concretude - previu, no âmbito da função social da posse e da propriedade, no particular, a proteção da convivência coletiva na propriedade horizontal. Assim, os condôminos podem usar, fruir e livremente dispor das suas unidades habitacionais, assim como das áreas comuns (art. 1.335 do CC), desde que respeitem outros direitos e preceitos da legislação e da convenção condominial. Nesse passo, o art. 1.337 do CC estabelece sancionamento para o condômino que reiteradamente venha a violar seus deveres para com o condomínio, além de instituir, em seu parágrafo único, punição extrema àquele que reitera comportamento antissocial. A doutrina especializada reconhece a necessidade de garantir o contraditório ao condômino infrator, possibilitando, assim, o exercício de seu direito de defesa. A propósito, esta é a conclusão do enunciado 92 da I Jornada de Direito Civil do CJF: "Art. 1.337: As sanções do art. 1.337 do novo Código Civil não podem ser aplicadas sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo". Por se tratar de punição imputada por conduta contrária ao direito, na esteira da visão civil-constitucional do sistema, deve-se reconhecer a aplicação imediata dos princípios que protegem a pessoa humana nas relações entre particulares, a reconhecida eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que também deve incidir nas relações condominiais, para assegurar, na medida do possível, a ampla defesa e o contraditório. Ressalte-se que a gravidade da punição do condômino antissocial, sem nenhuma garantia de ampla defesa, contraditório ou devido processo legal, na medida do possível, acaba por onerar consideravelmente o suposto infrator, o qual fica impossibilitado de demonstrar, por qualquer motivo, que seu comportamento não era antijurídico nem afetou a harmonia, a qualidade de vida e o bem-estar geral, sob pena de restringir o seu próprio direito de propriedade. Por fim, convém esclarecer que a prévia notificação não visa conferir uma última chance ao condômino nocivo, facultando-lhe, mais uma vez, a possibilidade de mudança de seu comportamento nocivo. Em verdade, a advertência é para que o condômino faltoso venha prestar esclarecimentos aos demais condôminos e, posteriormente, a assembleia possa decidir sobre o mérito da punição. REsp 1.365.279-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/8/2015, DJe 29/9/2015.


DIREITO CIVIL. AUSÊNCIA DE PRAZO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE ADJUDICAR COMPULSORIAMENTE IMÓVEL OBJETO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. O promitente comprador, amparado em compromisso de compra e venda de imóvel cujo preço já tenha sido integralmente pago, tem o direito de requerer judicialmente, a qualquer tempo, a adjudicação compulsória do imóvel. O compromisso de compra e venda é espécie de contrato por meio do qual o promitente vendedor se obriga a outorgar a escritura pública do imóvel ao promissário comprador após o integral pagamento do preço. Realizado o cumprimento dos deveres por ambas as partes contratantes, o contrato definitivo de compra e venda será celebrado. Ressalte-se que o compromisso de compra e venda não pode ficar sujeito a eventuais situações atentatórias por parte dos contratantes, uma vez que se exige a boa-fé em todas as fases da negociação. Dessa maneira, garantiu-se ao promissário comprador a propositura da ação de adjudicação compulsória quando a demanda se fundar na inércia do promitente vendedor que recebeu a quantia pela alienação do imóvel e deixou de emitir a escritura pública de compra e venda. Cumpre esclarecer que direito subjetivo é o poder da vontade consubstanciado na faculdade de agir e de exigir de outrem determinado comportamento para a realização de um interesse, cujo pressuposto é a existência de uma relação jurídica. Por sua vez, encapsulados na fórmula poder-sujeição, estão os chamados direitos potestativos, a cuja faculdade de exercício não se vincula propriamente qualquer prestação contraposta (dever), mas uma submissão à manifestação unilateral do titular do direito, muito embora tal manifestação atinja diretamente a esfera jurídica de outrem. Os direitos potestativos, são insuscetíveis de violação, porque a eles não se relaciona nenhum dever, mas uma submissão involuntária, como salienta remansosa doutrina. De outro lado, somente os direitos subjetivos estão sujeitos a violações, e, quando ditas violações são verificadas, nasce, para o titular do direito subjetivo, a faculdade (poder) de exigir de outrem uma ação ou omissão (prestação positiva ou negativa), poder tradicionalmente nomeado de pretensão. Nessa ordem de ideias, pode-se afirmar que a prescrição é a perda da pretensão inerente ao direito subjetivo em razão da passagem do tempo, ao passo que a decadência se revela como o perecimento do próprio direito potestativo pelo seu não exercício no prazo determinado. Posta essa distinção, convém apontar que, por meio da propositura de ação de adjudicação, permite-se, cumpridos os requisitos legais para a efetivação do contrato definitivo, a substituição da vontade do promitente vendedor por sentença que valerá como título para registro no cartório de imóveis. Por tal razão, o art. 466-A do CPC assevera que o autor - no caso, o promissário comprador - poderá obter uma sentença que produza os mesmos efeitos do contrato a ser firmado. Ou seja, permite-se ao Poder Judiciário a ingerência na esfera jurídica do promitente vendedor, a qual o submeterá à exigência do titular do direito. No caso, é válido ponderar que não se profere sentença condenatória obrigando o promitente vendedor a celebrar contrato definitivo de compra e venda com a consequente determinação de outorga de escritura pública ao promissário comprador. Ao contrário disso, a própria decisão judicial gera a constituição de uma nova relação jurídica para garantir a definitividade da contratação, cuja sentença substituirá a vontade da parte renitente. Assim, verifica-se que a ação de adjudicação compulsória possui características de ação constitutiva, tendo em vista que a sentença judicial possui a mesma eficácia de escritura pública de compra e venda do imóvel, sendo que não houve exteriorização da vontade por resistência injustificada do promitente vendedor, aliada a um fundo declaratório quanto ao reconhecimento do direito de realização do negócio definitivo. Nesse passo, mostra-se oportuno assinalar que a doutrina compreende que as tutelas condenatórias se sujeitam a prazos prescricionais, enquanto as tutelas constitutivas (positivas ou negativas) obedecem a prazos decadenciais. De modo contrário, as tutelas meramente declaratórias (v.g., de nulidade) e as constitutivas sem previsão de prazo em lei não se sujeitam a prazo prescricional ou decadencial. À primeira vista, a circunstância de o pedido de adjudicação compulsória consubstanciar-se em exercício de direito potestativo - e reclamar, por outro lado, uma tutela de natureza constitutiva - poderia conduzir à conclusão de que tal pedido estaria, em tese, sujeito a prazo decadencial. Entretanto, isso não ocorre, haja vista a inexistência de previsão legal. De fato, o Código Civil de 1916, malgrado tenha baralhado as hipóteses de prescrição e decadência, previu para a decadência a tipicidade das situações sujeitas a tal fenômeno. E mais, o Código Civil de 2002, assim como o Estatuto Civil de 1916, não tem um prazo geral e amplo de decadência, como tem em relação ao prazo de prescrição. Tanto o CC/1916 quanto o CC/2002 fizeram a opção de elencar de forma esparsa e sem excluir outros diplomas, os direitos potestativos cujo exercício está sujeito a prazo decadencial. Portanto, à míngua de previsão legal, o pedido de adjudicação compulsória, quando preenchidos os requisitos da medida, poderá ser realizado a qualquer momento. REsp 1.216.568-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/9/2015, DJe 29/9/2015.

sexta-feira, 30 de outubro de 2015

TJSP RECONHECE A MULTIPARENTALIDADE MAIS UMA VEZ

TJSP autoriza adoção por padrasto e multiparentalidade

Fonte: AASP.
A 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou adoção de uma mulher de 21 anos pelo padrasto, mesmo sem o consentimento do pai biológico. Assim, constarão em seu documento o nome do pai socioafetivo e do pai biológico.
De acordo com os autos, a filha alegou que seu pai é ausente desde que ela tinha dois anos de idade e, por isso, iniciou o processo de adoção quando atingiu a maioridade, para reconhecer o vínculo com seu padrasto. O pai biológico, entretanto, entrou com ação para coibir a adoção, afirmando que nunca esteve distante.
Para o relator do recurso, desembargador Moreira Viegas, “a despeito de o pai biológico não ser um desconhecido completo, a realidade dos autos explicita que nunca desempenhou a função paternal, estando afastado da filha por mais de 15 anos, tempo suficiente para estremecer qualquer relação, permitindo o estreitamento de laços com o pai socioafetivo”.

Apesar de entender que o autor da ação não pode obstruir a adoção, o magistrado afirmou que ele possui o direito de continuar sendo reconhecido como pai e que não há óbice legal para o reconhecimento de duas paternidades/maternidades, quando observada a existência de vínculos. “A multiparentalidade, com a modificação e evolução das relações familiares, bem como com a própria evolução histórica do direito, tende a ser consolidada no cenário jurídico nacional, pois é uma realidade que não pode ser ignorada".

O julgamento teve votação unânime e contou com a participação dos desembargadores Fábio Podestá e Fernanda Gomes Camacho.



quinta-feira, 29 de outubro de 2015

ENUNCIADOS IBDFAM. X CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA

Enunciados serão diretrizes para decisões de Família e Sucessões  
Na última semana, durante a realização do X Congresso Brasileiro de Direito de Família, foram aprovados os Enunciados Programáticos do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Os Enunciados servirão de diretriz para a criação da nova doutrina e jurisprudência em Direito de Família no Brasil.
A votação foi promovida pela Diretoria da entidade junto a seus membros, sob a coordenação dos professores Flávio Tartuce, José Fernando Simão e Mário Luiz Delgado, diretores do Instituto. Das 16 propostas em pauta, 11 foram aprovadas e se somam aos 9 Enunciados aprovados em 2013, na nona edição do evento.
O X Congresso Brasileiro de Direito de Família teve como mote “Famílias Nossas de Cada Dia”. O evento reuniu mais de mil congressistas, durante dois dias, em 60 palestras no Ouro Minas Palace Hotel, em Belo Horizonte (MG) e contou com a participação dos maiores juristas do País.
Confira:
Enunciado 01.A Emenda Constitucional 66/2010, ao extinguir o instituto da separação judicial, afastou a perquirição da culpa na DISSOLUÇÃO do casamento e na quantificação dos alimentos.
Enunciado 02. A separação de fato põe fim ao regime de bens e importa extinção dos deveres entre cônjuges e entre companheiros.
Enunciado 03. Em face do princípio da igualdade das entidades familiares, é inconstitucional o tratamento discriminatório conferido ao cônjuge e ao companheiro.
Enunciado 04. A constituição de entidade familiar paralela pode gerar efeito jurídico.
Enunciado 05. Na adoção, o princípio do superior interesse da criança e do adolescente deve prevalecer sobre a família extensa.
Enunciado 6. Do reconhecimento jurídico da filiação socioafetiva decorrem todos os direitos e deveres inerentes à autoridade parental.
Enunciado 07. A posse de estado de filho pode constituir paternidade e maternidade.
Enunciado 08. O abandono afetivo pode gerar direito à reparação pelo dano causado.
Enunciado 09. A multiparentalidade gera efeitos jurídicos.
Enunciado 10. É cabível o reconhecimento do abandono afetivo em relação aos ascendentes idosos.
Enunciado 11. Na ação destinada a dissolver o casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação do casal.
Enunciado 12. É possível o registro de nascimento dos filhos de casais homoafetivos, havidos de reprodução assistida, diretamente no Cartório do Registro Civil.
Enunciado 13.  Na hipótese de adoção intuitu personae de criança e de adolescente, os pais biológicos podem eleger os adotantes.
Enunciado 14. Salvo expressa disposição em contrário, os alimentos fixados ad valorem incidem sobre todos os rendimentos percebidos pelo alimentante que possua natureza remuneratória, inclusive terço constitucional de férias, 13º salário, participação nos lucros e horas extras.
Enunciado 15. Ainda que casado sob o regime da separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário e concorre com os descendentes.
Enunciado 16. Mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial.
Enunciado 17. A técnica de ponderação, adotada expressamente pelo art. 489, § 2º, do Novo CPC, é o meio adequado para a solução de problemas práticos atinentes ao Direito das Famílias e das Sucessões.
Enunciado 18. Nas ações de divórcio e de dissolução da união estável, a regra deve ser o julgamento parcial do mérito (art. 356 do Novo CPC), para que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a demanda com a discussão de outros temas.
Enunciado 19. O rol do art. 693 do Novo CPC é meramente exemplificativo, e não taxativo.
Enunciado 20. O alimentante que, dispondo de recursos econômicos, adota subterfúgios para não pagar ou para retardar o pagamento de verba alimentar, incorre na conduta descrita no art. 7º, inc. IV da Lei nº 11.340/2006 (violência patrimonial).

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

EVENTO NA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA


COLUNA NO MIGALHAS DE OUTUBRO DE 2015. ESTATUTO DA FAMÍLIA X ESTATUTO DAS FAMÍLIAS


ESTATUTO DA FAMÍLIA X ESTATUTO DAS FAMÍLIAS.
SINGULAR X PLURAL.
EXCLUSÃO X INCLUSÃO.

Flávio Tartuce[1]


O Brasil vive, no presente momento, um grande conflito ideológico e, como não poderia ser diferente, tal colisão atinge não só os aplicadores do Direito como também os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional, especialmente em temas condizentes aos costumes e à família. Como exemplo desse embate, pode ser citada a tramitação de dois projetos de lei a respeito do conceito de família no Congresso Nacional.  
O primeiro deles, na Câmara dos Deputados, intitulado Estatuto da Família (PL 6.583/2013), no singular, pretende restringir o conceito de família aos casamentos e às uniões estáveis entre homens e mulheres e seus filhos. Nos termos do seu art. 1º, "esta Lei institui o Estatuto da Família e dispõe sobre os direitos da família, e as diretrizes das políticas públicas voltadas para valorização e apoiamento à entidade familiar". Em complemento, enuncia a proposta de art. 2º da norma que "para os fins desta Lei, define-se entidade familiar como o núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, por meio de casamento ou união estável, ou ainda por comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes".
 A outra projeção é o Estatuto das Famílias (PL 470/2013), no plural, em curso no Senado Federal, originário de proposta formulada pelos juristas que compõem o IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) e que, em vários de seus dispositivos, traz um conceito extensivo de família.  Cite-se, entre tantas regras, a proposta de conceito de união estável constante do seu art. 61, in verbis: "é reconhecida como entidade familiar a união estável entre duas pessoas, configurada na convivência pública, contínua, duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família". Como se nota, a proposta menciona a união de duas pessoas, não obrigatoriamente homem e mulher.
Acompanhando os debates que ocorrem na Câmara dos Deputados, e diante do momento que vive o País, o Projeto de Lei n. 6.583/2013 tem grandes chances de ser aprovado. Se isso ocorrer, não persistindo eventual veto da Presidência da República, dois são os caminhos interpretativos para a citada projeção.
O primeiro deles é o reconhecimento de sua inconstitucionalidade. Ora, é sabido que o Supremo Tribunal Federal concluiu que a união homoafetiva é entidade familiar protegida pela Constituição Federal, devendo ser aplicadas, por analogia, todas as regras previstas para a união estável heteroafetiva (julgado na ADPF 132/RJ, publicado no Informativo n. 625 da Corte, de maio de 2011). Em complemento, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu, logo após, que é possível o casamento entre pessoas do mesmo sexo, consequência natural da decisão do Supremo, pois se todas as normas são aplicáveis por analogia, o mesmo deve ser dito quanto à conversão da união estável ao casamento, retirada do art. 1.727 do Código Civil (REsp. 1.183.378/RS). Conforme o voto do Ministro Luis Felipe Salomão nesse acórdão, proferido em outubro de 2011, “é bem de ver que, em 1988, não houve uma recepção constitucional do conceito histórico de casamento, sempre considerado como via única para a constituição de família e, por vezes, um ambiente de subversão dos ora consagrados princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Agora, a concepção constitucional do casamento – diferentemente do que ocorria com os diplomas superados – deve ser necessariamente plural, porque plurais também são as famílias e, ademais, não é ele, o casamento, o destinatário final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior, que é a proteção da pessoa humana em sua inalienável dignidade. A fundamentação do casamento hoje não pode simplesmente emergir de seu traço histórico, mas deve ser extraída de sua função constitucional instrumentalizadora da dignidade da pessoa humana. Por isso, não se pode examinar o casamento de hoje como exatamente o mesmo de dois séculos passados, cuja união entre Estado e Igreja engendrou um casamento civil sacramental, de núcleo essencial fincado na procriação, na indissolubilidade e na heterossexualidade”.
Todas essas decisões fizeram o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editar, em 2013, a Resolução n. 175, que veda às autoridades competentes, caso dos responsáveis pelos Cartórios de Registro Civil de todo o País, a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo. Em suma, o casamento homoafetivo transformou-se em realidade prática do Direito Brasileiro.
No âmbito da doutrina do Direito de Família, para demonstrar qual a corrente majoritária hoje prevalecente, pontue-se que, na VII Jornada de Direito Civil, realizada pelo Conselho da Justiça Federal em setembro de 2015, aprovou-se enunciado segundo o qual é existente e válido o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Cabe esclarecer que desse evento participaram juristas com as mais variadas visões sobre o Direito de Família e, mesmo assim, a proposta aprovada conseguiu ampla maioria, o que demonstra uma sedimentação doutrinária a respeito do tema no País.  
O citado Estatuto da Família, no singular, desconsidera toda essa evolução. Sim, evolução, pois a tendência dos países ocidentais é a inclusão dos direitos civis de casais homossexuais, sem que isso represente qualquer afronta ou ofensa aos direitos das pessoas que pretendem ter uniões heteroafetivas. Nessa perspectiva, o projeto já soa totalmente inconstitucional. 
Mas não é só. O art. 2º do Projeto de Lei n. 6.583/2013 é inconstitucional por desconsiderar o conceito de família monoparental previsto no art. 226, § 4º, do Texto Maior, constituída por um dos ascendentes e seus descendentes. Como antes se transcreveu, a projeção limita a família aos pais que vivem com seus filhos, deixando de fora as famílias monoparentais existentes entre avós e netos.
Sem falar em outras entidades que também não foram contempladas, caso das famílias mosaico – de várias origens, oriundas de famílias reconstituídas – e das famílias anaparentais (na expressão criada por Sérgio Resende de Barros) – famílias sem pais, formadas por irmãos ou primos que vivem juntos, com intuito comunitário familiar.
Sabe-se, conforme os escritos de vários constitucionalistas nacionais, que a Constituição Federal Brasileira de 1988 é inclusiva, e não exclusiva, afirmação que merece especial atenção quanto tópico que regulamenta as entidades familiares em rol meramente exemplificativo (art. 226). Assim, não pode uma lei infraconstitucional limitar o texto superior na concessão de direitos civis sob pena de flagrante inconstitucionalidade.
Vale dizer, em complemento, que a Lei Maria da Penha já traz um conceito ampliativo, em seu art. 5º, inciso II, ao estabelecer que a família deve ser compreendida "como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa". Essa é a ideia de família que deve prevalecer na realidade brasileira, na opinião deste articulista, não só para os fins de incidência dessa lei, mas também de outras normas.
De toda sorte, há um segundo caminho para a interpretação do Estatuto da Família, qual seja o de adaptá-lo ao Texto Maior e a toda essa evolução. Por essa ideia, é possível firmar a premissa segundo a qual o projeto de lei apenas exemplifica algumas formas de família, sem excluir outras, caso de todas as entidades aqui citadas. Se for assim, nosso Congresso Nacional perde precioso tempo de trabalho legislativo, pois as famílias ali previstas já estão amplamente tuteladas, especialmente por serem maioria no Brasil.
Pensamos que o trabalho a ser desenvolvido é de proteção de outras constituições famílias, como propõe o Estatuto das Famílias, no plural; e não o Estatuto da Família, no singular. A inclusão deve prevalecer sobre a exclusão, pois esse é o sentido da nossa Lei Maior. Como palavras finais, vale lembrar que a Constituição Brasileira veda a discriminação no seu art. 5º, além de valorizar a dignidade da pessoa humana no seu dispositivo inaugural. A projeção no singular deixa esses valores de lado.







[1] Doutor em Direito Civil pela USP. Professor do programa de mestrado e doutorado da FADISP – Faculdade Especializada em Direito. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação lato sensu em Direito Privado da EPD – Escola Paulista de Direito, sendo coordenador dos últimos. Professor da Rede LFG. Diretor nacional e estadual do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família. Advogado e consultor jurídico em São Paulo.