RESUMO. INFORMATIVO 765 DO STJ. 7 DE MARÇO DE 2023.
CORTE ESPECIAL - JULGAMENTO NÃO CONCLUÍDO
Processo
REsp 1.795.982-SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, sessão de julgamento do dia 1º/3/2023.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Dano moral. Indenização. Art. 406 do Código Civil. Critério de correção. Juros de mora. Taxa Selic. Pedido de vista.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Trata-se de pedido de indenização por dano moral em que se discute a possibilidade de se aplicar a taxa Selic em detrimento da correção monetária somada aos juros de mora.
O relator, Ministro Luis Felipe Salomão, votou contra a utilização da taxa Selic nos casos de dívidas decorrentes de responsabilidade civil contratual ou extracontratual. Em seu voto, o Ministro ponderou que a taxa Selic não é espelho do mercado, e que não reflete a real depreciação da moeda.
Após o voto do Ministro relator conhecendo do recurso especial e negando-lhe provimento, pediu vista antecipada o Ministro Raul Araújo.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
TERCEIRA TURMA
Processo
REsp 2.017.759-MS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Ação de obrigação de fazer. Plano de saúde. Home Care. Internação domiciliar substitutiva da internação hospitalar. Insumos necessários ao tratamento de saúde. Cobertura obrigatória. Custo do atendimento domiciliar limitado ao custo diário em hospital.
DESTAQUE
A cobertura de internação domiciliar, em substituição à internação hospitalar, deve abranger os insumos necessários para garantir a efetiva assistência médica ao beneficiário - insumos a que ele faria jus caso estivesse internado no hospital -, sob pena de desvirtuamento da finalidade do atendimento em domicílio, de comprometimento de seus benefícios e da sua subutilização enquanto tratamento de saúde substitutivo à permanência em hospital.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Destaca-se que, na saúde suplementar, os Serviços de Atenção Domiciliar - SAD, na modalidade de internação domiciliar podem ser oferecidos pelas operadoras como alternativa à internação hospitalar. Somente o médico assistente do beneficiário poderá determinar se há ou não indicação de internação domiciliar em substituição à internação hospitalar e a operadora não pode suspender uma internação hospitalar pelo simples pedido de internação domiciliar. Caso a operadora não concorde em oferecer o serviço de internação domiciliar, deverá manter o beneficiário internado até sua alta hospitalar.
Quando a operadora, por sua livre iniciativa ou por previsão contratual, oferecer a internação domiciliar como alternativa à internação hospitalar, o Serviço de Atenção Domiciliar - SAD deverá obedecer às exigências mínimas previstas na Lei n. 9.656/1998, para os planos de segmentação hospitalar, em especial o disposto nas alíneas "c", "d", "e" e "g", do inciso II do artigo 12 da referida Lei.
Acrescenta-se a isso que, nos termos da jurisprudência desta Corte, "é abusiva a cláusula contratual que veda a internação domiciliar (home care) como alternativa à internação hospitalar"
É dizer, a cobertura de internação domiciliar, em substituição à internação hospitalar, deve abranger os insumos necessários para garantir a efetiva assistência médica ao beneficiário, ou seja, aqueles insumos a que ele faria jus acaso estivesse internado no hospital, sob pena de desvirtuamento da finalidade do atendimento em domicílio, de comprometimento de seus benefícios, e da sua subutilização enquanto tratamento de saúde substitutivo à permanência em hospital.
Por sinal, o atendimento domiciliar deficiente, nessas hipóteses, levará, ao fim e ao cabo, a novas internações hospitalares, as quais obrigarão a operadora, inevitavelmente, ao custeio integral de todos os procedimentos e eventos delas decorrentes.
Não por outro motivo, a Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.378.707/RJ (julgado em 26/5/2015, DJe 15/6/2015), decidiu, à unanimidade, que "nos contratos de plano de saúde sem contratação específica, o serviço de internação domiciliar (home care) pode ser utilizado em substituição à internação hospitalar, desde que observados certos requisitos como a indicação do médico assistente, a concordância do paciente e a não afetação do equilíbrio contratual nas hipóteses em que o custo do atendimento domiciliar por dia supera o custo diário em hospital".
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Processo
REsp 1.902.410-MG, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 28/2/2023, DJe 3/3/2023.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Termo de compromisso firmado por funcionário que não tinha poderes para representar clube esportivo. Diretor-geral do futebol de base. Validade do negócio jurídico. Aplicação da teoria da aparência.
DESTAQUE
É válido o negócio jurídico firmado por Diretor-geral de Clube de Futebol, por aplicação da Teoria da aparência, quando atuar em nome e no interesse do clube, em negócio jurídico que lhe gerou proveito econômico, ainda que não tenha poderes para representá-lo.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A questão controvertida versa acerca da possibilidade de se exigir de pessoa jurídica o cumprimento de obrigação prevista em contrato firmado por pessoa que, embora sua funcionária, não tem, à luz de seu Estatuto Social, poderes para representá-la.
Nos termos do art. 47 do Código Civil, como regra, as pessoas jurídicas apenas se obrigam pelos atos de seus administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo.
No caso, o clube de futebol assinou Termo de Compromisso por meio do qual o jogador foi apresentado ao clube e nele efetivamente atuou, tendo sido posteriormente negociado a outro clube. Porém, tal dispositivo legal, nos termos do Enunciado n. 145 da III Jornada de Direito Civil, não afasta a Teoria da Aparência na situação, porquanto o signatário, Diretor-geral do Futebol de Base, atuou em nome e no interesse do clube, em negócio jurídico que lhe gerou proveito econômico.
A doutrina corrobora que, "de fato, afigura-se merecedora de tutela a confiança legítima investida por terceiro diante de circunstâncias objetivas que indiquem que a pessoa que celebra o negócio em nome da pessoa jurídica efetivamente possui poderes para fazê-lo. Nesse caso, a pessoa jurídica restará vinculada à conduta do administrador aparente, tal qual ocorreria se celebrado por administrador regularmente dotado de poderes".
Assim, razoável que o instrumento contratual em questão, referente a jovem e promissor talento futebolístico, pudesse ser assinado pelo Diretor-geral do Futebol de Base, especialmente quando o documento parece ter sido confeccionado pelo próprio clube.
Por outro lado, o Clube suscita, perante terceiros, a nulidade do negócio jurídico por ofensa ao próprio Estatuto Social quando, em verdade, ele próprio acabou por se aproveitar economicamente desse contrato, o que demonstra efetivo comportamento contraditório e, portanto, contrário à boa-fé objetiva ao tentar impor a seu contratante a observância de norma prevista em seu Estatuto Social que foi por ele próprio descumprida, vício que não pode ser invocado por quem lhe deu causa.
Portanto, àquele que deu causa ao vício não é dado invocá-lo para arguir a nulidade do negócio jurídico. Logo, a aplicação da 'teoria dos atos próprios', como concreção do princípio da boa-fé objetiva, segundo a qual a ninguém é lícito fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior ou posterior interpretada objetivamente, segundo a lei, os bons costumes e a boa-fé.
Processo
Processo em segredo de Justiça, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 28/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO DESPORTIVO
Tema
Transferência de atleta profissional de futebol. Direitos federativos. Direitos econômicos. Diferença. Entidade de prática desportiva. Compartilhamento dos direitos econômicos. Cessão civil. Possibilidade.
DESTAQUE
O compartilhamento de direitos econômicos relativos a atleta profissional de futebol por meio de cessão civil por entidade de prática desportiva não é vedado pelo ordenamento jurídico.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia busca definir a diferença entre direitos federativos e direitos econômicos e se o compartilhamento dos últimos por meio de cessão civil pela entidade de prática desportiva a terceiro importaria violação dos arts. 27-B, 27-C e 28, inciso II, da Lei n. 9.615/1998.
Os direitos federativos estão relacionados ao vínculo desportivo do atleta com a entidade de prática desportiva, acessório ao vínculo empregatício, e são constituídos com o registro do contrato especial de trabalho desportivo na entidade de administração do desporto, como dispõe o art. 28, § 5º, da Lei n. 9.615/1998. São indivisíveis, embora possam ser transferidos a título oneroso ou gratuito, na última hipótese, como ocorre nos casos de empréstimo de atletas, regulado pelo art. 39 da referida lei.
Os direitos econômicos decorrem da obrigatoriedade de se estabelecer cláusula indenizatória nos contratos de trabalho desportivo, podendo tal cláusula ser juridicamente enquadrada como expectativa de direito.
Não se nega que sejam as cláusulas indenizatória e compensatória desportivas devidas exclusivamente à entidade de prática desportiva ou ao atleta. O que ocorre é que esses direitos são tratados nessas operações como expectativa de direitos, em momento antecedente aos requisitos que os constituem como devidos, e que podem ou não ocorrer.
Nesse aspecto, a negociação de tal expectativa de direitos se dará nas hipóteses do art. 28, I, "a", da Lei n. 9.615/1998, ou seja, quando houver transferência do atleta durante a vigência do contrato de trabalho desportivo, sendo denominada nesse mercado como "direitos econômicos".
Ao tempo dos fatos, os chamados direitos econômicos eram negociados tanto com clubes como com investidores e outros interessados, em operações relativas à transferência do vínculo desportivo, mas que tinham por objeto o futuro e incerto recebimento da indenização prevista na cláusula indenizatória, obrigatória por força da lei para essa espécie de contrato de trabalho.
Como o atleta e a nova entidade de prática desportiva empregadora são solidariamente responsáveis pelo pagamento da cláusula indenizatória desportiva, conforme § 2º do art. 28 da Lei n. 9.615/1998, o interesse em operações dessa natureza decorre exatamente do contexto do mercado envolvido.
Os atletas originalmente vinculam-se desportivamente a entidades que realizam sua formação e, com o passar do tempo e o desenvolvimento de seus talentos, a expectativa de que a cláusula indenizatória alcance cifras expressivas torna a expectativa desse direito de recebê-la altamente atrativa aos clubes.
Assim, embora os clubes sejam os titulares do direito ao recebimento dos valores previstos na cláusula indenizatória, o mercado desportivo organizou-se de modo a tornar a expectativa desse direito um ativo relevante e negociável.
Evidente que a própria lógica do negócio parece desvirtuar a razão pela qual são previstas cláusulas indenizatórias. É dizer, o próprio clube supostamente prejudicado pelo descumprimento contratual é que na maioria das vezes negocia a transferência do vínculo federativo do atleta antes do término do contrato de trabalho e, por consequência, os direitos econômicos correspondentes.
Ainda que atualmente esses negócios só possam ser entabulados entre entidades de prática desportiva, contexto diverso daquele existente na época da operação, o certo é que não há vedação legal à cessão de direitos econômicos.
Portanto, no caso, a cessão de crédito sobre 10% (dez por cento) dos direitos econômicos relacionados com a operação, ou seja, percentual sobre a expectativa do valor que seria recebido a título de cláusula indenizatória em razão da transferência do vínculo desportivo do atleta para o clube estrangeiro continuou hígida, sendo válida e eficaz em relação ao clube recorrente, sem que se possa falar em violação dos arts. 27-B, 27-C e 28, inciso II, da Lei n. 9.615/1998.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Lei n. 9.615/1998, arts. 27-B, 27-C , 28, caput, I, "a", II, § 2º e § 5º, e art. 39
Processo
REsp 1.844.690-CE, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Ação rescisória. Desconstituição de título judicial condenatório. Cumprimento de sentença. Inclusão no polo ativo de terceiro estranho à lide. Pessoa jurídica distinta daquela que sucedeu a parte ré no processo originário. Legitimidade ativa. Não configuração. Terceiro juridicamente interessado. Não configuração. Interesse meramente econômico.
DESTAQUE
Não possui legitimidade para a propositura da ação rescisória de título judicial condenatório o terceiro, pessoa jurídica distinta daquela que sucedeu a parte ré no processo originário, indevidamente incluído no polo passivo na fase de cumprimento de sentença.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia resume-se a saber se o banco que integra o mesmo conglomerado econômico de pessoa jurídica que incorporou outra instituição financeira possui legitimidade para o ajuizamento de ação rescisória visando à desconstituição de título judicial condenatório proferido contra esta.
No caso, em que pese ter sido admitida a existência de documento oficial emitido pelo Banco Central do Brasil por meio do qual se conclui que a instituição financeira não foi incorporada pelo banco, mas por outra pessoa jurídica que integra o mesmo conglomerado econômico, foi reconhecida a legitimidade do banco, pois teria sido quem foi indicado como parte executada no pedido de cumprimento de sentença.
A legitimidade para a propositura da ação rescisória não pode ser definida a partir da constatação de quem está respondendo, ainda que indevidamente, ao pedido de cumprimento de sentença, senão pela averiguação de quem foi diretamente alcançado pelos efeitos da coisa julgada formada na decisão rescindenda, ou seja, quem integrava a relação jurídico-processual na demanda originária da qual resultou o título judicial que se busca rescindir.
Nos termos do art. 967 do Código de Processo Civil de 2015, são legitimados para a propositura de ação rescisória quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular, o terceiro juridicamente interessado, o Ministério Público e aquele que não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a intervenção.
O fato de ter sido apresentado pedido de cumprimento de sentença contra pessoa jurídica distinta daquela que sucedeu a parte ré no processo originário não serve ao propósito de lhe conferir legitimidade para a propositura da ação rescisória, nem sequer sob a condição de terceiro interessado, tendo em vista que o interesse capaz de conferir legitimidade ativa ao terceiro é apenas o jurídico, e não o meramente econômico.
Ainda sob a disciplina do revogado art. 487, II, do Código de Processo Civil de 1973, que também conferia legitimidade ao terceiro juridicamente interessado para propor ação rescisória, esta Corte Superior de Justiça bem delimitou o conceito de "interesse jurídico" para fins de aplicação do referido preceito legal, no sentido de que "revela-se pela titularidade de relação jurídica conexa com aquela sobre a qual dispôs sentença rescindenda, bem como pela existência de prejuízo jurídico sofrido".
Assim, deve ser julgada extinta a ação rescisória ajuizada pelo banco, por ilegitimidade ativa ad causam.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil, art. 967
Processo
AgInt nos EDcl no REsp 2.006.859-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/2/2023, DJe 15/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Tempestividade. Dia do servidor público (28 de outubro). Segunda-feira de carnaval. Quarta-feira de Cinzas. Os dias que precedem a sexta-feira da Paixão. Dia de Corpus Christi. Feriados locais. Necessidade de comprovação no ato da interposição do recurso. Art. 1.003, § 6º, do Código de Processo Civil.
DESTAQUE
O dia do servidor público (28 de outubro), a segunda-feira de carnaval, a quarta-feira de Cinzas, os dias que precedem a sexta-feira da Paixão e, também, o dia de Corpus Christi não são feriados nacionais, em razão de não haver previsão em lei federal, de modo que deve a parte comprovar a suspensão do expediente forense quando da interposição do recurso, por documento idôneo.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O artigo 1.003, § 6º, do Código de Processo Civil estabelece que o recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso, o que impossibilita a regularização posterior.
O dia do servidor público (28 de outubro), a segunda-feira de carnaval, a quarta-feira de Cinzas, os dias que precedem a sexta-feira da Paixão e, também, o dia de Corpus Christi não são feriados nacionais, em razão de não haver previsão em lei federal, de modo que o dever da parte de comprovar a suspensão do expediente forense quando da interposição do recurso, por documento idôneo, não é elidido.
Desse modo, os recursos interpostos na instância de origem, mesmo que endereçados a esta Corte Superior, observam o calendário de funcionamento do tribunal local, não podendo se utilizar, para todos os casos, dos feriados e das suspensões previstas em Portaria e no Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, que muitas vezes não coincidem com os da Justiça estadual.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil, art. 1.003, § 6º.
QUARTA TURMA
Processo
REsp 1.717.144-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Cumprimento de sentença. Ausência de bens passíveis de excussão. Suspensão. Longo período de tempo sem diligências por parte do credor. Juros e correção monetária. Suspensão da fluência. Não cabimento. Supressio. Não configuração.
DESTAQUE
A suspensão do cumprimento de sentença, em virtude da ausência de bens passíveis de excussão, por longo período de tempo, sem diligência por parte do credor, não configura supressio, de modo que não obsta a fluência dos juros e da correção monetária.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O Tribunal de origem, malgrado tenha afastado a prescrição intercorrente, ou seja, tenha reconhecido que a fluência do tempo não extinguira a pretensão do exequente, identificou que a inação do exequente foi significativa na convicção de que o direito não mais se exerceria. Como consequência, excluiu do montante devido os juros e atualização monetária desde o momento da suspensão do feito.
O instituto da supressio não se confunde com a extinção dos direitos, de exigência ou formativos, pela prescrição ou pela decadência, embora tais institutos tenham como ponto comum seu fundamento na necessidade de estabilização das relações jurídicas.
A supressio consubstancia-se na impossibilidade de se exercer um direito por parte de seu titular em razão de seu não exercício por certo período variável de tempo e que, em razão dessa omissão, gera da parte contrária uma expectativa legítima de que não seria mais exigível. Portanto, pelo não exercício do direito passível de ser exercido por um lapso temporal - não determinável a priori - a outra parte da relação obrigacional confia que a situação se estabilizou e que não será compelida a cumpri-la, revelando-se, pois, certo abrandamento do princípio pacta sunt servanda, não mais tomado no sentido absoluto típico de sua formulação liberal.
Há, por conseguinte, um deslocamento do eixo meramente temporal e, em decorrência, subjetivamente indiferente, para a análise da omissão do credor distendida no tempo e do correlato efeito quanto à expectativa do devedor na preservação da estabilidade jurídica gerada por aquele comportamento. A omissão, portanto, ganha relevância jurídica ao provocar na outra parte a convicção de que o direito subjetivo não mais será exercido.
Portanto, para a configuração da supressio e a decorrente perda do direito subjetivo de exigência ou formativo, deve-se perquirir, concretamente, acerca da relevância jurídica da omissão da parte e de sua repercussão na convicção da outra parte, confiante de que o direito não será exercido. Torna-se patente, por conseguinte, que o instituto da supressio constitui fragmento do princípio da boa-fé objetiva, em sua feição limitadora de direitos e, por esse motivo, é tratado pela doutrina como o exercício inadmissível de direitos. Embora reconhecido pela jurisprudência antes mesmo de sua previsão normativa, atualmente o princípio da boa-fé objetiva tem assento no art. 422 do Código Civil.
Contrariamente, na prescrição - extinção da pretensão - e na decadência - extinção do direito potestativo ou formativo - não há que se indagar acerca da observância da boa-fé ou do dever de lealdade ou confiança, porquanto seu elemento operativo é a simples fluência do tempo legalmente determinado. Assim, independentemente da conduta do credor, o mero transcurso do tempo implicará a extinção do direito de seu titular.
Curiosamente, o desenvolvimento do instituto da supressio, como de outros relacionados à inadmissibilidade do exercício de direitos, liga-se exatamente ao fenômeno inflacionário e ao abrandamento do princípio do nominalismo, para, com fundamento na boa-fé em sua vertente objetiva, interferir no cumprimento das obrigações.
No caso presente, contudo, a supressio não tem aplicação, porquanto não se permite o reconhecimento de que a suspensão do processo de execução, em razão da inexistência de bens, tenha incutido no executado a expectativa legítima de que não seria mais exercido. Ora, o direito do exequente foi efetivamente exercido ao ajuizar a ação e ao ser dado início ao cumprimento da sentença transitada em julgado. Conquanto determinadas vicissitudes a que estão sujeitos os processos judiciais possam implicar delongas em seu desenvolvimento ou mesmo na concretização do direito das partes, tais circunstâncias não podem ser consideradas verdadeiramente significativas, de modo a qualificar uma omissão como relevante para a extinção do direito.
Em casos tais, o exequente permanece em uma situação de espera, e o elemento significativo para a circunstância da suspensão do processo - e o protraimento da concretização do direito reconhecido na sentença - não é sua omissão, mas a ausência de patrimônio passível de excussão para o adimplemento da obrigação. Infere-se, pois, que não se pode caracterizar a relevância jurídica da paralisação do processo como causa para a extinção do direito, integral ou parcialmente, pela ocorrência da supressio.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Processo
REsp 1.759.745-SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 28/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO MARCÁRIO
Tema
Publicidade. Utilização de propaganda comparativa. Empresa que se autoavalia como a melhor no que faz. Exagero tolerável. Puffing. Licitude. Propaganda enganosa. Concorrência desleal. Não configuração. Avaliação subjetiva de cada consumidor.
DESTAQUE
É lícita a peça publicitária em que o fabricante ou o prestador de serviço se autoavalia como o melhor naquilo que faz, prática caracterizada como puffing.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a determinar se configuraria propaganda enganosa ou concorrência desleal a utilização do claim "Melhor em tudo o que faz", pois seria uma informação passível de medição objetiva.
Essa expressão caracteriza-se como puffing, sendo forma de publicidade que utiliza o exagero publicitário como método de convencimento dos consumidores.
A respeito deste método publicitário, a doutrina aponta que "haverá muitos casos em que o puffing, ainda que utilizado intencionalmente para atrair o consumidor incauto, acaba não podendo ser capaz de tornar enganoso o anúncio. Isso é muito comum nos casos dos aspectos subjetivos típicos dos produtos ou serviços: quando se diz que é o 'mais gostoso'; tenha 'o melhor paladar'; 'o melhor sabor'; 'o lugar mais aconchegante'; 'o mais acolhedor'; 'a melhor comédia'; 'o filme do ano'; etc. Como tais afirmações dependem de uma avaliação crítica (ou não) subjetiva de cada consumidor, fica difícil, senão impossível, atribuir de fato a possibilidade da prova da verdade da afirmação. Afinal, gosto é difícil de discutir".
No caso, de acordo com o exposto nas razões do especial, as peças publicitárias dariam a entender ser o seu produto melhor do que outros em relação aos atributos cor, consistência e sabor, e, por esse motivo, a ocorrência de propaganda enganosa, bem como concorrência desleal capazes de violar, respectivamente, o art. 37 do Código de Defesa do Consumidor e o art. 195 da Lei da Propriedade Industrial.
Contudo, não é razoável proibir o fabricante ou prestador de serviço de se autoproclamar o melhor naquilo que faz, mormente porque essa é a autoavaliação do seu produto e a meta a ser alcançada, ainda mais quando não há nenhuma mensagem depreciativa no tocante aos seus concorrentes.
Além disso, a empresa concorrente, em sua argumentação, realiza uma excessiva infantilização do consumidor médio brasileiro, como se a partir de determinada peça publicitária tudo fosse levado ao pé da letra, ignorando a relevância das preferências pessoais, bem como a análise subjetiva de custo-benefício.
Percebe-se, desse modo, que os exemplos indicados pela doutrina como de puffing se amoldam perfeitamente à hipótese sub judice, qual seja, uma afirmação exagerada que depende de uma avaliação crítica subjetiva para averiguação, não sendo possível mensuração objetiva.
Nesse sentido, caso se considere existir conteúdo comparativo na expressão entre o produto de uma empresa e os demais da mesma espécie oferecidos no mercado, o entendimento do STJ firmou-se no sentido de admitir a publicidade comparativa, desde que obedeça ao princípio da veracidade das informações, seja objetiva e não abusiva. A propaganda ilegal é aquela que induz em erro o consumidor, causando confusão entre as marcas, ocorrendo de maneira a depreciar a marca do concorrente, com o consequente desvio de sua clientela, prestando informações falsas e não objetivas (REsp 1.377.911/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 2/10/2014, DJe 19/12/2014).
Não há, na expressão veiculada nas propagandas comerciais, nenhuma depreciação aos produtos de suas concorrentes, apenas exortação ao seu próprio, o que não é vedado pela legislação brasileira.
Portanto, é lícita a utilização da frase "Melhor em tudo o que faz".
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Código de Defesa do Consumidor, art. 37
Lei n. 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial), art. 195
Processo
AgInt no REsp 1.802.192-MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/12/2022, DJe 15/12/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Ação de usucapião. Reconhecimento. Liquidação de sentença. Ausência de pedido expresso na inicial. Decisão extra petita. Não configuração.
DESTAQUE
Não configura decisão extra petita a sentença que, reconhecendo a usucapião, determina a liquidação para individualizar a área usucapida, ainda que não haja pedido expresso na inicial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Nos termos do art. 492 do Código de Processo Civil, é vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
Por sua vez, o mesmo diploma legal, no art. 141, dispõe que "o juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte".
Daí se reconhece que a atuação de ofício do magistrado que ultrapassa os limites do pedido inicial enseja decisão extra petita.
Esta Corte já definiu que não há violação dos limites da causa quando o julgador reconhece os pedidos implícitos formulados na petição inicial, não estando restrito ao que está expresso no capítulo referente aos pedidos, sendo-lhe permitido extrair da interpretação lógico-sistemática da petição inicial aquilo que a parte pretende obter, aplicando o princípio da equidade (AgInt no REsp 1.823.194/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 14/2/2022, DJe 17/2/2022).
Isso porque, para compreender os limites do pedido, é preciso também interpretar a intenção da parte com a instauração da demanda. Assim, não é extra petita o julgado que decide questão que é reflexo do pedido deduzido na inicial. Supera-se a ideia da absoluta congruência entre o pedido e a sentença para outorgar a tutela jurisdicional adequada e efetiva à parte, o que se verifica no caso concreto.
A conclusão pela necessidade de liquidação de sentença com a produção de perícia técnica para determinar e individualizar a área usucapida de imóvel maior e indiviso apenas outorga tutela jurisdicional adequada e efetiva à parte, na medida em que necessária para a expedição do mandado de registro da usucapião para certificar e dar publicidade ao domínio no cartório de registro de imóveis, mormente quando os arts. 1.238 e 1.241, parágrafo único, do Código Civil estabelecem que a sentença de usucapião servirá de título para o registo no cartório de imóveis.
Assim, a possibilidade de registro da sentença que reconheceu a usucapião de imóvel (aí incluída a necessária individualização da área usucapida) é reflexo do pedido deduzido na inicial, sendo desnecessário pedido explícito da parte nesse sentido.
Logo, não há falar em julgamento extra petita, porquanto o órgão julgador não desrespeitou os limites objetivos da pretensão inicial nem concedeu providência jurisdicional diversa da que fora requerida, em atenção ao princípio da congruência ou adstrição.
INFORMAÇÕES ADICIONAIS
LEGISLAÇÃO
Código de Processo Civil, art. 141 e art. 492
Código Civil, art. 1.238 e art. 1.241
Processo
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel. para acórdão Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, por maioria, julgado em 27/9/2022, DJe 16/2/2023.
Ramo do Direito
DIREITO DO CONSUMIDOR, DIREITO DA SAÚDE
Tema
Plano de saúde. Indisponibilidade de prestador de serviço credenciado na área de abrangência. Operadora que descumpre o dever de garantir o atendimento no mesmo município, ainda que por prestador não integrante da rede assistencial. Dever de reembolso.
DESTAQUE
Plano de saúde tem o dever de reembolsar as despesas médico-hospitalares realizadas por beneficiário fora da rede credenciada na hipótese em que descumpre o dever de garantir o atendimento no mesmo município, ainda que por prestador não integrante da rede assistencial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Controvérsia afeta à possibilidade de considerar cumprida a obrigação do plano de garantir acesso do beneficiário aos serviços e procedimentos para atendimento das coberturas, na hipótese de indisponibilidade de prestador de serviço credenciado no município de abrangência do plano, quando existir hospital credenciado em município limítrofe.
Nos termos da Resolução Normativa n. 259/2011 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), em caso de indisponibilidade de prestador credenciado da rede assistencial que ofereça o serviço ou procedimento demandado, no município pertencente à área geográfica de abrangência e à área de atuação do produto, a operadora deverá garantir o atendimento, preferencialmente, no âmbito do mesmo município, ainda que por prestador não integrante da rede assistencial da operadora do plano de saúde, cujo pagamento se dará mediante acordo entre as partes (operadora do plano e prestador).
Somente em caso de inexistência de prestador não integrante da rede assistencial no mesmo município é que será devido o atendimento em município limítrofe.
Ademais, competia à operadora de saúde ter realizado a indicação de prestador não credenciado para o atendimento da beneficiária no município de abrangência, sendo certo que o pagamento se daria "mediante acordo entre as partes", ou seja, entre a operadora e o prestador do serviço.
Ressalte-se, que, nessas hipóteses, a operadora tem a obrigação, ainda, de custear o transporte do beneficiário (ida e volta) e se, por qualquer motivo, descumprir a garantia de atendimento, incidirá o disposto no artigo 9º, que prevê reembolso integral.
Seja em razão da primazia do atendimento no município pertencente à área geográfica de abrangência, ainda que por prestador não integrante da rede credenciada, seja em virtude da não indicação, pela operadora, de prestador junto ao qual tenha firmado acordo, bem como diante da impossibilidade de a parte autora se locomover a município limítrofe, afigura-se devido o reembolso integral das despesas realizadas, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data da solicitação de reembolso, conforme previsão expressa do artigo 9° da RN n. 259/11 da ANS.
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LEGISLAÇÃO
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