RESUMO. INFORMATIVO 754 DO STJ. 24 DE OUTUBRO DE 2022.
TERCEIRA TURMA
Processo
REsp 1.929.450-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/10/2022.
Tema
Responsabilidade civil. Doações inoficiosas. Ação declaratória de nulidade. Extravio de elementos probatórios. Ação de indenização por danos morais e materiais. Ausência de nexo causal. Teoria da perda de uma chance. Não cabimento.
DESTAQUE
Não se aplica a teoria da perda de uma chance para responsabilizar empresa que deixou de apresentar seus livros societários em prazo hábil para subsidiar impugnação de alegada doação inoficiosa por um de seus sócios, na hipótese de não restar comprovado o nexo de causalidade entre o extravio dos livros e as chances de vitória na demanda judicial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia situa-se em torno da responsabilidade civil por perda de uma chance, especialmente a viabilidade de indenização da chance perdida em razão da dificuldade de obtenção de elementos probatórios em prazo hábil para impugnação de alegadas doações inoficiosas que teriam diluído a participação social do falecido genitor das recorrentes em favor dos demais filhos.
Na perda de uma chance, há prejuízo certo, e não apenas hipotético, situando-se a certeza na probabilidade de obtenção de um benefício frustrado por força do evento danoso imputado. Repara-se a chance perdida, e não o dano final.
No caso, a alegação central é de que teriam sido realizadas diversas doações pelo seu pai, ao longo da vida, beneficiando os seus irmãos unilaterais, caracterizando-se como inoficiosas.
Pugnaram, assim, pela reparação de danos oriundos da conduta da empresa, que deixou de apresentar dois livros societários em ação de exibição de documentos, os quais comprovariam ter o falecido pai delas doado somente aos seus outros irmãos cotas de sua participação societária.
Os pressupostos para o reconhecimento da responsabilidade civil por perda de uma chance, no caso concreto, foram bem sintetizados no acórdão de origem: "(i) a viabilidade e a probabilidade de sucesso de futura ação declaratória de nulidade de doações inoficiosas; (ii) a viabilidade e a probabilidade de sucesso de futura ação de sonegados; (iii) a existência de nexo de causalidade entre o extravio de dois livros e as chances de vitória nas demandas judiciais."
No entanto, o tribunal de origem concluiu que ainda que a companhia tivesse cumprido a decisão judicial que determinou a exibição dos livros, a situação hereditária das autoras dificilmente seria modificada.
Isto é, consignou-se que não há nexo de causalidade entre o extravio dos dois livros da companhia e o insucesso no ajuizamento de ações declaratória de nulidade de doações, por inoficiosas, ou de sonegados, por ausência de colação.
Processo
REsp 1.809.207-PA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/10/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Restituição do valor depositado judicialmente. Incidência de correção monetária e de juros moratórios. Pretensão de incidência adicional de juros remuneratórios. Descabimento. Rubrica destinada a remunerar capital emprestado com anuência das partes.
DESTAQUE
Não incidem juros remuneratórios na restituição de depósito judicial.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia consiste em definir a extensão da obrigação do banco depositário de restituir ao seu titular o valor depositado judicialmente no bojo de ação de inventário, especificando-se, a esse fim, quais rubricas sobre tal quantia deve a instituição financeira fazer incidir.
Além da atualização monetária (indispensável à restituição do capital em sua inteireza) e dos juros moratórios, no caso, pretende-se, ainda, a remuneração do capital depositado judicialmente por quase 50 (cinquenta) anos - incidência de juros remuneratórios.
Esclarece-se, inicialmente, que os juros remuneratórios ou compensatórios possuem por propósito remunerar o capital emprestado, tendo origem, por regra, na convenção estabelecida entre as partes. Resultam de uma utilização consentida de capital alheio. Estes, por evidente, não se confundem com os juros moratórios, que têm como fundamento a demora na restituição do capital ou o descumprimento de obrigação e podem decorrer da lei ou da convenção entre as partes.
Transportando-se tais definições ao depósito judicial, chega-se à conclusão inequívoca de não haver incidência de juros remuneratórios ao valor depositado, a cargo da instituição financeira.
Por sua vez, o depósito judicial constituiu um relevante instrumento destinado a dar concretude à vindoura tutela jurisdicional, o qual é viabilizado por meio de convênios realizados entre instituições financeiras (públicas) e o Poder Judiciário, sendo regido pelas normas administrativas por este último editadas.
Desse modo, o banco depositário, exercente de função auxiliar do Juízo, não estabelece nenhuma relação jurídica com o titular do numerário depositado. O depósito é realizado em decorrência de ordem emanada pelo Juízo, não havendo, pois, nenhum consentimento, pelo titular (muitas vezes, ainda incerto), a respeito da utilização desse capital, muito menos avença acerca da remuneração desse capital.
Segundo as lições doutrinárias, "o depositário não tem posse, que é a relação apreciável por direito privado, mas sim poder público sobre a coisa, derivado do seu dever de detê-la". Não é despiciendo anotar, inclusive, que, ainda que se procedesse a um paralelo entre o depósito judicial e o contrato de depósito bancário - realidades distintas que, por isso, não comportariam sequer comparação -, a remuneração do capital não consubstancia condição inerente a esse tipo de contrato bancário.
Ao tecer as características principais do contrato de depósito bancário, o qual, por suas particularidades, muito se distancia da figura do depósito, a doutrina é peremptória em afirmar "não ser da essência do depósito bancário a remuneração pela permanência dos recursos em mãos do banco".
Nos termos do art. 629 do Código Civil (e art. 1.266 do CC/1916), o depositário é obrigado a restituir a coisa depositada "com todos os frutos e acrescidos". Nessa medida, o banco depositário deve restituir a quantia depositada judicialmente, sobre a qual deve incidir correção monetária (Súmulas n. 179 e 271/STJ) e juros de mora à taxa legal, como fundamento na demora na restituição do capital ao seu titular.
Processo
REsp 1.969.648-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 18/10/2022, DJe 21/10/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Nulidade de compra e venda imobiliária. Simulação em detrimento da partilha de bens do casal. Negociação entre empresas de "fachada". Existência de subordinação e parentesco entre os sócios das empresas envolvidas. Simulação manifestamente demonstrada.
DESTAQUE
O reconhecimento de simulação na compra e venda de imóvel em detrimento da partilha de bens do casal gera nulidade do negócio e garante o direito à meação a ex-cônjuge.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Na análise do vício da simulação, devem ser considerados os seguintes elementos: a consciência dos envolvidos na declaração do ato, sabidamente divergente de sua vontade íntima; a intenção enganosa em relação a terceiros; e o conluio entre os participantes do negócio.
Segundo a doutrina, são indícios palpáveis para a conclusão positiva de simulação: alienação de todo o patrimônio do agente ou de grande parte dele; relações já citadas de parentesco ou amizade íntima entre os simuladores, bem como relação de dependência hierárquica ou meramente empregatícia ou moral; antecedentes e a personalidade do simulador; existência de outros atos semelhantes praticados por ele; decantada falta de possibilidade financeira do adquirente: preço vil; não-transferência de numerário no ato nas contas bancárias dos participantes; continuação do alienante na posse da coisa alienada; o fato de o adquirente não conhecer a coisa adquirida.
No caso, as circunstâncias que evidenciam seguramente a ocorrência de simulação no negócio jurídico envolvendo a compra e venda do imóvel, em detrimento à meação de bens: (1) imóvel que desde a aquisição foi utilizado como residência do casal e do filho; (2) parentesco e subordinação entre os sócios das empresas "de fachada", envolvidas na compra do imóvel, e o ex-marido; (3) ausência de comprovação de transferência bancária em dinheiro entre tais empresas para a aquisição do imóvel; (4) comprovação de que o ex-marido era o administrador de fato e movimentava as contas bancárias de tais empresas envolvidas no negócio; (5) diversas denúncias, ações judiciais e investigações acerca de envolvimento do ex-marido e outros em esquemas de blindagem de patrimônio; e (6) ajuizamento de ação declaratória de impenhorabilidade do imóvel, por parte ex-marido, sob o fundamento de se tratar de bem de família.
A simulação como causa de nulidade (não de anulabilidade), do negócio jurídico e, dessa forma, como regra de ordem pública que é, pode ser declarada até mesmo de ofício pelo juiz da causa (art. 168, parágrafo único, do CC/2002).
Nesse sentido, o art. 167 do CC/2002 é claro ao prescrever que é nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma.
E ainda, o enunciado n. 294 da IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal pontuou que sendo a simulação uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode ser alegada por uma das partes contra a outra.
Processo
REsp 1.799.039-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 04/10/2022, DJe 07/10/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Contrato paritário. Cláusula expressa afastando a cobrança ou indenização em caso de ruptura antecipada. Equilíbrio econômico. Autonomia privada. Legislação específica. Boa-fé. Função social do contrato. Expectativa das partes. Cláusula abusiva. Não demonstrada.
DESTAQUE
A cláusula que desobriga uma das partes a remunerar a outra por serviços prestados na hipótese de rescisão contratual não viola a boa-fé e a função social do contrato quando presente equilíbrio entre as partes contratantes no momento da estipulação.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A Lei n. 13.874/2019, também intitulada de Lei da Liberdade Econômica, em seu art. 3°, VIII, determinou que são direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal, ter a garantia de que os negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública.
O controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos empresariais é mais restrito do que em outros setores do Direito Privado, pois as negociações são entabuladas entre profissionais da área empresarial, observando regras costumeiramente seguidas pelos integrantes desse setor da economia.
Assim, não obstante a liberdade de contratação e a autonomia privada sejam princípios fundamentais no Direito Civil, eles não são absolutos, porquanto encontram limites na função social do contrato, na probidade e na boa-fé objetiva.
A existência de equilíbrio e liberdade entre as partes durante a contratação, bem como a natureza do contrato e as expectativas são itens essenciais a serem observados quando se alega a nulidade de uma cláusula com fundamento na violação da boa-fé objetiva e na função social do contrato.
Em se tratando de contrato de prestação de serviços firmado entre dois particulares os quais estão em pé de igualdade no momento de deliberação sobre os termos do contrato, considerando-se a atividade econômica por eles desempenhada, inexiste legislação específica apta a conferir tutela diferenciada para este tipo de relação, devendo prevalecer a determinação do art. 421, do Código Civil.
Processo
AgInt no REsp 1.716.741-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/09/2022, DJe 19/09/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Indexação pelo Custo Unitário Básico da Construção Civil (CUB). Legitimidade apenas no período de construção do imóvel. Substituição pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) após a conclusão do imóvel.
DESTAQUE
O CUB-SINDUSCON é indexador válido para a correção monetária das prestações ajustadas relativamente ao período de edificação do imóvel e após a conclusão da obra deve incidir o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
No tocante à incidência do Custo Unitário Básico da Construção Civil (CUB) como indexador do contrato de promessa de compra e venda, esta Corte tem decidido que "o CUB-SINDUSCON é indexador válido para a correção monetária das prestações ajustadas relativamente ao período de edificação do imóvel objeto do contrato. […] Após a conclusão da obra, não é mais possível a utilização de tal índice." (STJ, AgRg no AgRg no Ag 941.737/MG, relator Ministro Humberto Gomes De Barros, Terceira Turma, julgado em 3/12/2007, DJ de 14/12/2007, p. 416.)
"No contrato de compra e venda de imóvel com a obra finalizada não é possível a utilização de índice setorial de reajuste, pois não há mais influência do preço dos insumos da construção civil." (STJ, REsp 936.795/SC, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 08/04/2008, DJe 25/04/2008).
Assim sendo, "a utilização do CUB-Sinduscon, índice de idêntica natureza do INCC, somente se afigura incabível após a conclusão da obra do imóvel." (STJ, AgRg no REsp 761.275/DF, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/12/2008, DJe de 26/2/2009.)
Dessa forma, "após a conclusão da obra do imóvel" (STJ, AgRg no REsp 761.275/DF) deve incidir o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). (STJ, AgRg no AgRg no Ag 941.737/MG).
Processo
Processo sob segredo de justiça, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 11/10/2022, DJe 24/10/2022.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Tema
Ação de adoção de pessoa maior. Pedido formulado pela mãe biológica em relação à filha adotada anteriormente na infância. Consentimento dos pais adotivos e da adotanda. Possibilidade jurídica do pedido. Finalidade protetiva das normas relacionadas ao ECA.
DESTAQUE
O pedido de nova adoção formulado pela mãe biológica, em relação à filha adotada por outrem, anteriormente, na infância, não se afigura juridicamente impossível.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
De acordo com a nova redação dos arts. 1.618 e 1.619 do CC/2002, a adoção de crianças será regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. No mesmo sentido a adoção de adultos, que também dependerá da assistência efetiva do Poder Público e de sentença constitutiva, e será regida pela mesma Lei, no que couber.
Portanto, não subsiste mais a discussão em torno de se determinar qual é o documento legal regente das adoções. Atualmente, todas as adoções, sejam de crianças, adolescentes ou adultos, serão regidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, guardadas as particularidades próprias das adoções de adultos.
Contudo, uma vez proposta demanda judicial, o julgamento desta deve ter como referência a lei vigente no momento do ajuizamento da ação. No caso, a demanda foi ajuizada em agosto de 2003, quando a adoção de adultos era regulada pelo Código Civil de 2002.
Então para o julgamento da presente ação de adoção de pessoa maior, deve-se considerar dois aspectos relevantes: a) o regramento aplicável ao pedido de adoção é aquele vigente à época da propositura da ação, ou seja, a redação original dos arts. 1.618 e seguintes do Código Civil de 2002; b) a pessoa maior foi adotada em 1986, antes, portanto, do Estatuto da Criança e do Adolescente, quando era vigente o Código de Menores (Lei n. 6.697/1979).
É inequívoco que a adoção realizada na infância é válida e irrevogável, mesmo considerando-se que foi realizada sob a égide do Código de Menores (art. 37 da Lei n. 6.697/1979). Criou-se novo vínculo de filiação, com a consequente desconstituição do vínculo da adotada com os pais biológicos e parentes consanguíneos, exceto quanto aos impedimentos matrimoniais.
No caso, a genitora ajuizou ação de adoção, no intuito de adotar sua filha biológica, maior de idade e capaz, a qual fora adotada na infância. Com o passar dos anos, mãe e filha biológicas foram se aproximando cada vez mais e passaram a nutrir um desejo recíproco de retornarem a ser mãe e filha, com o que concordam os pais adotivos.
Todavia, na demanda, não se postula a nulidade ou revogação da adoção anterior, mas o deferimento de outra: adoção de pessoa maior, regida pelo Código Civil de 2002, não sujeita (ao tempo da propositura da ação) ao regime especial do Estatuto da Criança e do Adolescente, embora dependendo de procedimento judicial e sentença constitutiva (art. 1.623, parágrafo único, do CC/2002).
A lei não traz expressamente a impossibilidade de se adotar pessoa anteriormente adotada. Basta, portanto, o consentimento das partes envolvidas, ou seja, os pais ou representantes legais, e da concordância do adotando.
Cabe ressaltar que o argumento de que a adoção é irrevogável, consoante a antiga redação do art. 48 do ECA (atual art. 39, § 1º), não conduz à conclusão de que o pedido é juridicamente impossível. Isso, porque a finalidade da irrevogabilidade da adoção é proteger os interesses do menor adotado, em se tratando de criança e adolescente.
Com efeito, o escopo da norma é vedar a revogação da filiação adotiva a fim de evitar que os adotantes simplesmente "arrependam-se" da adoção efetivada, por quaisquer motivos, e "devolvam" a criança ou adolescente adotado, sendo a irrevogabilidade uma medida de proteção, estatuída em favor dos interesses do menor adotado.
Quando o adotado, ao atingir a maioridade, deseja constituir novo vínculo de filiação e concorda com nova adoção, não faz sentido a proteção legal, ficando claro que seus interesses serão melhor preservados com o respeito à sua vontade, livremente manifestada.
A adoção de qualquer pessoa, maior ou menor de dezoito anos, deve "constituir efetivo benefício para o adotando" (CC/2002, art. 1.625), o que corresponde às "reais vantagens" da diretriz do ECA (art. 43), sendo, dessa forma, expressões que se equivalem e induzem ao princípio do melhor interesse.
Portanto, aplicando-se à espécie o regramento do Código Civil de 2002, por se tratar de adoção de pessoa maior e capaz, tem-se que todos os requisitos legais foram preenchidos na situação: a adotante é maior de dezoito anos (art. 1.618); há diferença de idade de dezesseis anos (art. 1.619); houve consentimento dos pais da adotanda e concordância desta (art. 1.621); o meio escolhido foi o processo judicial (art. 1.623); foi assegurada a efetiva assistência do Poder Público (art. 1.623, parágrafo único); o Ministério Público constatou o efetivo benefício para a adotanda (art. 1.625).
Processo
Processo sob segredo de justiça, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 04/10/2022.
Ramo do Direito
DIREITO EMPRESARIAL
Tema
Alienação de bens da massa falida. Adoção excepcional de modalidade. Rejeição da proposta pela assembleia-geral de credores. Autorização do juízo de falências. Possibilidade. Conformidade com a regra expressa no § 3º do art. 145, da Lei n. 11.101/2005.
DESTAQUE
É possível o juízo de falência autorizar modalidade alternativa de alienação de ativos, mesmo diante da rejeição da proposta pela assembleia-geral de credores.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Os arts. 144 e 145 da Lei n. 11.101/2005 preveem a possibilidade de adoção excepcional de modalidade diversa daquelas previstas no art. 142, desde que existam motivos justificados para afastar a incidência das formas ordinárias de alienação dos bens da massa falida.
Segundo a doutrina, em princípio, é atribuição da assembleia-geral de credores a opção por modalidade alternativa de realização do ativo, na forma do art. 35, II, "c", da mencionada lei, sendo competência do magistrado sua convocação.
Encaminhada à assembleia-geral de credores a análise da modalidade alternativa de alienação do ativo e, desde que aprovada por 2/3 (dois terços) dos credores presentes à assembleia (art. 46 da LREF), será homologada pelo juiz, que somente examinará a proposta sob o prisma da legalidade, nos termos do art. 145, caput.
No caso, todavia, não houve aprovação da modalidade alternativa, constando dos autos que, dos 15 (quinze) credores presentes, 9 (nove) rejeitaram a proposta, enquanto 6 (seis) se abstiveram de votar. Diante dos pareceres favoráveis do Ministério Público e do administrador judicial, o Juiz da Vara de Falências e Recuperações Judiciais autorizou o administrador judicial a firmar o acordo oferecido.
Neste aspecto, o magistrado, ao autorizar a modalidade alternativa de realização do ativo, mesmo após rejeição da proposta pela assembleia-geral de credores, agiu em conformidade com a regra expressa no § 3º do art. 145. Do dispositivo legal infere-se que, caso não aprovada a proposta pela assembleia-geral, cabe a decisão ao juiz, que possui poder discricionário de autorizá-la, devendo, no entanto, levar em consideração as manifestações do administrador judicial e do comitê de credores, caso exista.
A doutrina destaca que "essa regra, excepcional, é uma das poucas hipóteses contempladas na Lei de Recuperações e de Falências em que o juiz poderá adotar posição divergente da decisão adotada em assembleia".
Portanto, para que o juiz autorize modalidade de realização do ativo diversa do leilão, das propostas fechadas ou do pregão, deverá explicitar os motivos pelos quais entende ser necessária a adoção dessa medida excepcional, buscando alcançar o melhor resultado para os credores e para a massa falida (alterações introduzidas pela Lei n. 14.112/2020, art. 142, V, e e § 3º-B, III).
Processo
AgInt no REsp 1.838.866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/08/2022, DJe 31/08/2022.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Adjudicação. Agravo de instrumento pela União (Fazenda Nacional). Ausência de efeito suspensivo ope legis. Eficácia da decisão agravada. Recurso manejado após transferência de propriedade com o registro imobiliário da adjudicação. Desconstituição. Necessidade de ação.
DESTAQUE
Após a transferência da propriedade com o registro da adjudicação no cartório de registro de imóveis, o efeito suspensivo concedido posteriormente ao agravo de instrumento interposto pela União (Fazenda Nacional) não tem o condão de retroagir a fim de atingir a eficácia do registro, porquanto a desconstituição do ato não pode ser realizada nos autos da execução, sendo necessária ação anulatória.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Quanto à ineficácia do registro de adjudicação em razão do efeito obstativo do agravo de instrumento, verifica-se que a Corte de origem entendeu pela nulidade do registro da carta de adjudicação do imóvel sob o fundamento de que a decisão agravada - permitindo a adjudicação em momento anterior - não surtiu efeitos em decorrência do efeito obstativo dos recursos, tendo sido prorrogada a ineficácia da decisão com o deferimento de efeito suspensivo ao agravo.
A Corte de origem, para justificar o entendimento de que o registro efetuado seria nulo, afirma que a decisão agravada na origem "jamais surtiu efeitos, tendo em vista que, em decorrência do princípio obstativo dos recursos, prolongou-se sua ineficácia com o empréstimo de efeito suspensivo".
Embora, no caso, o acórdão tenha se referido a um princípio obstativo dos recursos para afirmar que a decisão agravada não tinha eficácia, desde a sua prolação até a interposição do agravo de instrumento, não se deve "confundir os efeitos suspensivo e obstativo dos recursos: enquanto o primeiro impede a efetividade da decisão proferida, o segundo difere o trânsito em julgado" (AgInt no REsp 1694349/RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe 18/11/2019).
Observa-se que a Corte a quo adotou o entendimento de que o agravo de instrumento teria efeito suspensivo a obstar a eficácia da decisão pela simples fluência do prazo para interposição do recurso, cujo recebimento limitou-se a prolongar a suspensão já existente.
Para o acórdão recorrido, o termo inicial de eficácia da decisão agravada na origem ocorreria quando se tornasse preclusa a via recursal ou interposto o recurso sem efeito suspensivo, como no caso, a decisão passaria a produzir efeitos a partir do recebimento do recurso. No entanto, como na hipótese foi dado efeito suspensivo ao agravo no provimento de recebimento, a eficácia da decisão permaneceria suspensa até o julgamento.
Não se discute que fica obstada, desde a origem, a eficácia da decisão sujeita a recurso dotado de efeito suspensivo por determinação legal (ope legis), porquanto nesse caso o decisum é incapaz de produzir efeitos desde a prolação, perdurando a suspensão até o julgamento do recurso. Assim como, de outro lado, que as decisões sujeitas a recurso sem efeito suspensivo são capazes de produzir efeitos desde logo, a partir de sua publicação.
Todavia, o agravo de instrumento, por expressa previsão legal contida no art. 497 do CPC/1973, não possui efeito suspensivo (ope legis) e, conforme a doutrina, a "decisão interlocutória, uma vez proferida, produz, de imediato, os efeitos que lhe são próprios, independentemente da possibilidade de interposição do agravo. Aliás, mesmo que interposto o agravo, não se suspende, de plano, o cumprimento da decisão recorrida. Esse efeito poderá ser determinado expressamente, pelo relator do recurso, que o 'suspenderá'".
Nessa mesma linha, esta Corte Superior já se manifestou em inúmeras oportunidades no sentido de que o agravo de instrumento não possui efeito suspensivo de forma automática, por força de lei, podendo tal efeito ser atribuído ao recurso ope iudicis, ou seja, através de uma decisão judicial.
Portanto, interposto o agravo de instrumento pela União (Fazenda Nacional) em intervenção manifestamente incabível e após a transferência da propriedade com o registro da adjudicação no cartório de registro de imóveis, o efeito suspensivo concedido posteriormente não tem o condão de retroagir a fim de atingir a eficácia do registro. Já a desconstituição do ato não poderia ser realizada nos autos da execução, sendo necessário, para tanto, segundo o entendimento consolidado desta Corte Superior, o ajuizamento de ação anulatória.
Processo
AgInt no REsp 1.838.866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 23/08/2022, DJe 31/08/2022.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Adjudicação. Privilégio de crédito tributário. União (Fazenda Nacional). Art. 5°, parágrafo único, da Lei n. 9.469/1997. Processo na fase de execução. Intervenção anômala. Impossibilidade.
DESTAQUE
É inviável a intervenção anômala da União na fase de execução ou no processo executivo, salvo na ação cognitiva incidental de embargos.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Nos termos do art. 5º, caput, da Lei n. 9.469/1997, "a União poderá intervir nas causas em que figurarem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais".
Por outro lado, o parágrafo único do mencionado artigo proclama que "as pessoas jurídicas de direito público poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de competência, serão consideradas partes".
O legislador, com o objetivo de proteger o patrimônio público, criou a possibilidade de intervenção ampla da União em demanda cuja decisão possa ter reflexos, diretos ou indiretos, de natureza econômica, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria.
Nessa linha de intelecção, a melhor hermenêutica aplicável é aquela que não limita essa possibilidade de intervenção a causas onde conste como parte uma pessoa jurídica de direito público, mas, do contrário, a permite inclusive naquelas entre particulares, bastando a demonstração de que a causa possa repercutir no seu patrimônio.
Sob essa perspectiva, esta Corte Superior consolidou o entendimento segundo o qual, o art. 5°, parágrafo único, da Lei n. 9.469/1997 possibilitou a intervenção da União nas causas em que a solução possa ter efeitos reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, independentemente da demonstração do interesse jurídico.
Todavia, no caso, a controvérsia consiste em saber se seria admitida a intervenção da União, com base naquele preceito legal, já se encontrando o processo na fase executiva, uma vez que a União (Fazenda Nacional) solicitou a sua intervenção anômala no processo, quando o feito encontrava-se em fase de execução com carta de adjudicação do imóvel já expedida.
Como visto, o art. 5º, caput, e parágrafo único, da Lei n. 9.469/1997, prevê uma faculdade de a União, se assim entender, intervir em feitos de cuja decisão possa advir reflexos, ainda que indiretos. Portanto, não se está diante de hipótese de litisconsórcio necessário, nem mesmo de assistência litisconsorcial. O mencionado dispositivo, ao explicitar a finalidade da intervenção - para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer -, por exegese lógica, também deixa claro que se trata de intervenção ad coadjuvandum, ou seja, está-se diante de assistência simples.
Nessa ordem de ideias, não é ocioso relembrar que, nos termos do caput, do art. 50, do CPC, para a admissão da intervenção de terceiros na modalidade assistência, é antecedente necessário a existência de causa pendente, vale dizer, causa cuja decisão final não tenha transitado em julgado, circunstância não verificada na espécie.
É que o assistente, na verdade, tem interesse que o assistido "vença a demanda" e na fase de execução, todavia, não há prolação de sentença favorável ou desfavorável, o que leva à conclusão inexorável de não ser possível, nesta fase, a assistência. Esta somente seria admissível em eventuais embargos à execução. De fato, por isso a assistência só cabe no processo de conhecimento ou cautelar, como acentuou o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira no REsp. 586/PR, Quarta Turma, julgado em 20/11/1990.
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