quinta-feira, 2 de março de 2017

RESUMO. INFORMATIVO 596 DO STJ. MARÇO DE 2017



PROCESSO
REsp 1.483.930-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 23/11/2016, DJe 1/2/2017. (Tema 949)
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Cobrança de taxas condominiais. Dívidas líquidas previamente estabelecidas em deliberações de assembleias gerais constantes das respectivas atas. Prazo prescricional.

DESTAQUE
Na vigência do Código Civil de 2002, é quinquenal o prazo prescricional para que o condomínio geral ou edilício (vertical ou horizontal) exercite a pretensão de cobrança de taxa condominial ordinária ou extraordinária, constante em instrumento público ou particular, a contar do dia seguinte ao vencimento da prestação.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A questão controvertida consiste em saber, na vigência do CC/2002, o prazo prescricional para a cobrança de dívidas condominiais ordinárias e extraordinárias. À luz do CC/2002, não cabe a aplicação do prazo geral e residual do art. 205, pois o art. 206, § 5º, I, ao dispor que prescreve em 5 (cinco) anos "a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular", amolda-se ao caso. Nesse passo, o novo CPC, ao estabelecer, no art. 784, X, que são títulos executivos extrajudiciais o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas, corrobora o entendimento firmado no âmbito do STJ de que se cuida de obrigação líquida. É dizer, conforme iterativos julgados das duas turmas de Direito Privado do STJ, "[a] pretensão de cobrança de cotas condominiais, por serem líquidas desde sua definição em assembleia geral de condôminos, bem como lastreadas em documentos físicos, adequa-se com perfeição à previsão do art. 206, § 5º, inc. I, do CC/02, razão pela qual se aplica o prazo prescricional quinquenal". (AgRg no REsp 1.454.743-PR, Quarta Turma, DJe 26/11/2014). Consoante os precedentes que se formaram nesta Corte Superior, o art. 206, § 5º, inc. I, do CC/02, com clareza, exige "apenas" que a dívida seja líquida, constante de instrumento particular ou público, que, pois, demonstre-a. E não, necessariamente, que tenha sido contraída em um desses instrumentos.   O fato de o dever de pagar taxa condominial decorrer da lei, e não de negócio jurídico, é impertinente para a solução da questão, pois, como visto, o dispositivo não estabelece esse critério. A taxa condominial é débito previamente deliberado em assembleia geral - constante e definido, pois, na respectiva ata, que, consoante propugnam a doutrina e a jurisprudência, tem de instruir a exordial da ação para a comprovação do débito cobrado e a garantia do contraditório ao devedor. Ademais, o prazo para a perda da pretensão – tema de direito material – não deve ser definido pelo instrumento processual utilizado pelo condomínio. Por ocasião do julgamento do REsp 1.101.412-SP (sob o rito do art. 543-C do CPC/1973), sufragando a mesma tese consubstanciada na Súmula 503/STJ, foi expressamente ressalvado que é fora de dúvida que não é o tipo de ação – de conhecimento em sua pureza ou monitória – utilizada pelo credor, que define o prazo prescricional para a perda da pretensão. Nesse sentido, menciona-se recente precedente da Quarta Turma do STJ (AgInt no REsp 1.452.757-SP, Quarta Turma, DJe 18/10/2016).
PROCESSO
MS 19.088-DF, Rel. Min. Herman Benjamin, por maioria, julgado em 14/12/2016, DJe 3/2/2017.
RAMO DO DIREITO
DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO EMPRESARIAL
TEMA
Sociedade de segurança privada controlada parcial e indiretamente por empresa de capital estrangeiro. Interpretação do art. 11 da Lei 7.102/1983 conforme a alteração promovida na Constituição pela Emenda n. 6.

DESTAQUE
A restrição veiculada pelo art. 11 da Lei 7.102/1983, de acordo com a Constituição Federal, não impede a participação de capital estrangeiro nas sociedades nacionais (art. 1.126 do CC) que prestam serviço de segurança privada.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Discute-se se é possível que pessoa jurídica que atua no setor de segurança privada tenha sócios estrangeiros ou tenha entre os seus sócios outra pessoa jurídica que, por sua vez, tenha participação de capital estrangeiro. O art. 11 da Lei 7.102/1983, editado na ordem constitucional anterior à Constituição de 1988, foi recepcionado por esta, mas foi parcialmente revogado, visto que seu alcance se tornou muito menor, a partir da Emenda Constitucional 6. O dispositivo teria sido a princípio integralmente recepcionado pela Constituição de 1988, já que esta, em seu art. 171, distinguiu empresa brasileira de empresa brasileira de capital nacional, permitindo que determinados setores de atividades fossem reservados apenas às segundas. Entretanto, o referido dispositivo foi explicitamente revogado pelo art. 3º da Emenda Constitucional 6, de 15 de agosto de 1995, e caíram as discriminações contra empresas brasileiras fundadas na origem do seu capital, salvo raros casos objeto de tratamento constitucional específico. A partir da Emenda n. 6, a lei não mais pode discriminar entre empresa brasileira de capital nacional e empresa brasileira de capital estrangeiro, ou seja, desde que uma empresa seja brasileira (constituída no Brasil e sujeita às leis brasileiras), a origem do seu capital é irrelevante. Tal tipo de discriminação só seria possível, hoje, nos casos previstos no próprio texto constitucional, como ocorre com as empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e imagens, objeto de tratamento especial no art. 222 da CF/88. É certo que o art. 172 da Constituição estabelece que “a lei disciplinará, com base no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro, incentivará os reinvestimentos e regulará a remessa de lucros”. Tal dispositivo, entretanto, não admite interpretação que permita restrições em setores não explicitamente previstos na Constituição, pois isso nulificaria a revogação do art. 171 pela Emenda 6, de 1995. Consequentemente, hoje, a interpretação conforme a constituição do art. 11 da Lei 7.102/83 deve ser a de que ele veda apenas que empresas constituídas no exterior atuem no setor de segurança privada. Todavia, empresas que sejam constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no país são empresas brasileiras, na exata dicção do art. 1.126 do Código Civil, sendo irrelevante que tenham na sua composição societária, direta ou indiretamente, participação ou controle pelo capital estrangeiro.
TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.348.154-DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016.
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Serviço bancário de saque excedente. Cobrança de tarifa sobre o excesso. Afronta à legislação consumerista. Não ocorrência.

DESTAQUE
É legítima a cobrança, pelas instituições financeiras, de tarifas relativas a saques quando estes excederem o quantitativo de quatro realizações por mês.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O debate consiste em saber se a cobrança de tarifa bancária, a partir da realização do quinto saque no mês efetivado pelo correntista, em terminais de autoatendimento, violaria as normas protetivas do CDC. Discute-se, outrossim, se a cobrança da aludida tarifa se desviaria da natureza do contrato de depósito. A Lei n. 4.595/1964 atribui ao Conselho Monetário Nacional competência exclusiva para disciplinar as operações creditícias em todas as suas formas, bem como limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos, comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive, os prestados pelo Banco Central da República do Brasil. Sem descurar da essencialidade do serviço de saque em relação a contrato de conta-corrente, a partir da entrada em vigor da Resolução n. 3.518/2007 do BACEN, o Conselho Monetário Nacional passou a, expressamente, definir os serviços bancários que poderiam ser objeto de remuneração, no que se inseriu o de saques excedentes em terminal eletrônico, assim considerados pela norma como aqueles superiores a quatro no mesmo mês. Essa normatização restou reproduzida pela Resolução n. 3.919 de 2010, atualmente em vigor. Segundo a norma sob comento, a partir do quinto saque mensal, esse serviço deixa de ser essencial ao contrato de conta-corrente de depósitos à vista, a permitir, por conseguinte, que as instituições financeiras atuantes nesse seguimento do mercado financeiro efetuem a respectiva cobrança. Nesse ponto, rechaça-se a tese defendida pelo Ministério Público de que a cobrança da tarifa prevista em Resolução não seria idônea, ao argumento de que as regras do mercado financeiro não poderiam se sobrepor ao Código de Defesa do Consumidor. De fato, não se trata de simplesmente conferir prevalência a uma resolução do Banco Central, em detrimento da lei infraconstitucional (no caso, o Código de Defesa do Consumidor), mas, sim, de bem observar o exato campo de atuação dos atos normativos (em sentido amplo) sob comento, havendo, entre eles coexistência harmônica.  Assim, conclui-se que é indiscutível a aplicação da lei consumerista às relações jurídicas estabelecidas entre instituições financeiras e seus clientes. E, de igual modo, que é inquestionável, a especialidade da Lei n. 4.595/1964 como reguladora do Sistema Financeiro Nacional, que, como visto, atribuiu ao Conselho Monetário Nacional a competência, entre outras, para regular a remuneração dos serviços bancários, exercendo-a com a referida Resolução n. 3.919 de 2010. No que toca ao contrato de conta-corrente de depósito à vista, a instituição financeira contratada mantém e conserva o dinheiro do correntista contratante, disponibilizando-o para transações diárias, por meio de serviços bancários como o são os saques, os débitos, os pagamentos agendados, os depósitos, a emissão de talionários de cheques, etc. Tais serviços bancários, sempre que não qualificados como essenciais — inerentes à espécie de contrato bancário —, são remunerados por meio da cobrança de tarifas, desde que previamente estipuladas entre as partes contratantes e devidamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil, por deliberação do Conselho Monetário Nacional. Desse modo, a remuneração pelo serviço de saque excedente não se confunde com as obrigações das partes contratantes oriundas do contrato de depósito, que, embora, em regra, seja unilateral e gratuito, pode, sim, ser, bilateral e oneroso, diante de convenção das partes, atividade ou profissão do depositário (art. 628 do Código Civil). A tarifa sob comento incide pela efetiva utilização de um serviço bancário posto à disposição do correntista, qual seja, a realização de saque excedente (ao número de quatro, no mês), e não como contraprestação ao depósito propriamente feito.

PROCESSO
REsp 1.532.154-SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 18/10/2016, DJe 3/2/2017.
RAMO DO DIREITO
DIREITO EMPRESARIAL
TEMA
Pedido de falência instruído com título executivo extrajudicial de valor superior a 40 (quarenta) salários-mínimos. Indícios de insolvência patrimonial do devedor. Desnecessidade.

DESTAQUE
Independentemente de indícios ou provas de insuficiência patrimonial, é possível a decretação da quebra do devedor que não paga, sem relevante razão de direito, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A questão trazida nos autos restringe-se a decidir se a impontualidade do devedor seria requisito suficiente para o processamento do pedido de falência. Inicialmente, é certo que o STJ possui julgados no sentido de que o mencionado pleito de quebra não pode servir como substituto de uma ação de cobrança, de modo que não é o inadimplemento de qualquer dívida que justifica o processamento do pedido. A preocupação que norteou esses julgados, firmados na perspectiva da disciplina antiga do Direito Falimentar, procedida pelo revogado Decreto-Lei n. 7.661/1945, em que havia espaço para a formulação de pedidos de falência como substitutivo da ação de cobrança, inclusive de valores ínfimos, foi superada com a edição da Lei n. 11.101/2005, que, em seu art. 94, I, para caracterização da impontualidade, passou a exigir que a dívida seja de valor superior a quarenta salários mínimos. Basta, assim, a impontualidade do devedor no pagamento de dívida de valor superior a quarenta salários mínimos, não sendo necessários indícios ou provas da sua situação de insolvência. Nessa linha, a Quarta Turma desta Corte Superior possui julgado específico no sentido de que não se considera abusivo o pedido de falência lastreado em título cujo valor supere o limite legal de 40 (quarenta salários mínimos). Portanto, o pedido de falência com fundamento na impontualidade do devedor não se confunde com as hipóteses de insolvência de modo que a apresentação de indícios da sua insuficiência patrimonial não é pressuposto para o seu deferimento.

QUARTA TURMA
PROCESSO
REsp 1.406.200-AL, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 17/11/2016, DJe 2/2/2017.
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Contrato de participação em grupo de consórcio. Consorciado falecido antes do encerramento do grupo. Seguro prestamista. Dever de quitação das prestações. Liberação imediata da carta de crédito aos herdeiros. Cabimento.

DESTAQUE
Os herdeiros de consorciada falecida têm direito à liberação imediata da carta de crédito, em razão da quitação do saldo devedor pelo seguro prestamista, independentemente da efetiva contemplação ou do encerramento do grupo consorcial, nos termos da norma regulamentar vigente à época da contratação do consórcio (Circular Bacen 2.766/97).
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Discute-se, em ação cominatória ajuizada em desfavor da administradora de consórcios, a existência ou não de sua obrigação em proceder à liberação imediata da carta de crédito aos herdeiros da consorciada que, por ter falecido antes do término do grupo, não efetuou o pagamento de todas as prestações devidas, as quais também não foram quitadas pela seguradora (integrante do mesmo grupo econômico), ante a suposta configuração de hipótese excludente de cobertura, qual seja, doença preexistente não informada quando da assinatura do contrato. Para tanto, mister a verificação quanto ao momento a partir do qual se considera inadimplida a obrigação para fins de caracterização da mora e incidência de seus efeitos. Diferentemente do alegado pela administradora, a situação fática delineada nos autos não se amolda aos casos de consorciados desistentes ou excluídos, para os quais a Segunda Seção do STJ consolidou o entendimento de que a restituição dos valores vertidos ao grupo de consórcio não deve ser imediata, mas em até trinta dias a contar do prazo previsto contratualmente para o encerramento do plano (REsp 1.119.300/RS, DJe 27/8/2010). No sistema do consórcio, a liberação da carta de crédito ao consorciado ocorre após sua contemplação, mediante sorteio ou lance, em assembleia geral ordinária, nos termos da Circular Bacen 2.766/97, vigente à época da contratação. Vale ressaltar que o artigo 8º do referido normativo, autorizava, expressamente, a quitação total do saldo devedor pelo consorciado contemplado, cujo crédito tivesse sido utilizado. Ademais, o contrato de consórcio, datado do ano de 2006, devia, obrigatoriamente, facultar ao consorciado contemplado o recebimento do valor do crédito em espécie, mediante a quitação de suas obrigações junto ao grupo (alínea "c" do inciso IX do artigo 3º da Circular Bacen 2.766/97). Assim, se, nos termos da norma regulamentar vigente à época era possível o recebimento imediato do crédito pelo consorciado contemplado (por sorteio ou por lance) que procedesse à quitação antecipada do saldo devedor atinente a sua cota, não se revela razoável negar o mesmo direito aos herdeiros de consorciado falecido, vítimas de evento natural, involuntário e deveras traumatizante, ensejador da liquidação antecipada da dívida existente em relação ao grupo consorcial, cujo equilíbrio econômico-financeiro não correu o menor risco. A mesma interpretação se extrai do disposto no artigo 34 da circular supracitada. Outrossim, à luz da cláusula geral da função social do contrato (artigo 421 do Código Civil), deve ser observada a dimensão social do consórcio, conciliando-se o bem comum pretendido (aquisição de bens ou serviços por todos os consorciados) e a dignidade humana de cada integrante do núcleo familiar atingido pela morte da consorciada, que teve suas obrigações financeiras (perante o grupo consorcial) absorvidas pela seguradora, consoante estipulação da própria administradora.

PROCESSO
REsp 1.408.152-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 1/12/2016, DJe 2/2/2017.
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Impenhorabilidade. Pequena propriedade rural. Requisitos e ônus da prova.

DESTAQUE
No que concerne à proteção da pequena propriedade rural, incumbe ao executado comprovar que a área é qualificada como pequena, nos termos legais; e ao exequente demonstrar que não há exploração familiar da terra.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A principal questão está em definir a quem pertence o ônus da prova em relação aos requisitos da pequena propriedade rural, para fins de impenhorabilidade.  Com relação à impenhorabilidade da pequena propriedade rural, a proteção ganhou status Constitucional, tendo-se estabelecido, no capítulo voltado aos direitos fundamentais, que a referida propriedade, "assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento" (art. 5°, XXVI). A Lei n. 8.009/90 e o ordenamento processual pátrio (CPC/1973, art. 649, VIII; e CPC/2015, art. 833, VIII), também trataram da questão. Nessa ordem de ideias, exige a norma constitucional e a infralegal dois requisitos para negar constrição à pequena propriedade rural: i) que a área seja qualificada como pequena, nos termos legais; e ii) que a propriedade seja trabalhada pela família. O STJ pacificou o entendimento, com relação ao ônus da prova e ao bem de família, que "cabe ao devedor o ônus da prova do preenchimento dos requisitos necessários, para enquadramento do imóvel penhorado na proteção concedida pela Lei n. 8.009/90 ao bem de família, quando sua configuração não se acha, de pronto, plenamente caracterizada nos autos". Em recente julgado da Quarta Turma, definiu-se que, para fins de proteção do bem de família previsto na Lei n. 8.009/90, basta o início de prova de que o imóvel é voltado para a família, sendo, depois disso, encargo do credor eventual descaracterização. De fato, para fins de hermenêutica, sempre se deve ter em mente que a impenhorabilidade do bem de família é irrenunciável, sendo princípio de ordem pública, com escopo de proteção da entidade familiar, à luz do direito fundamental à moradia. A regra é a impenhorabilidade, devendo suas exceções serem interpretadas restritivamente, haja vista que a norma é voltada para a proteção da família e não do patrimônio do devedor. Partindo dessa premissa, assim como ocorre na proteção do imóvel urbano, deve ser ônus do executado - agricultor - apenas a comprovação de que o seu imóvel se enquadra nas dimensões da pequena propriedade rural. No entanto, no tocante à exigência da prova de que a referida propriedade é trabalhada pela família, a melhor exegese parece ser a de conferir uma presunção de que esta, enquadrando-se como diminuta, nos termos da lei, será explorada pelo ente familiar, sendo decorrência natural do que normalmente se espera que aconteça no mundo real, inclusive, das regras de experiência (NCPC, art. 375). Isto porque o próprio microssistema de direito agrário (Estatuto da Terra; Lei n. 8.629/1993, entre outros diplomas) entrelaça os conceitos de pequena propriedade, módulo rural e propriedade familiar, havendo uma espécie de presunção de que o pequeno imóvel rural se destinará à exploração direta pelo agricultor e sua família, haja vista que será voltado para garantir sua subsistência. Ademais, não é razoável se exigir um minus do proprietário urbano (que tem proteção legal) - na qual basta o início de prova de que o imóvel é voltado para a residência -, em relação ao proprietário rural, hipossuficiente e vulnerável (com proteção constitucional), que, além da prova da pequena propriedade rural, teria um plus a demonstrar, ainda, que esta é trabalhada pela família.


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