Carta aberta de um jovem
advogado aos seus pares
Fonte: Migalhas.
Alexandre Gomide. Mestre
em Direito Civil pela Universidade de Lisboa. Mestrando em Direito Civil pela
USP. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação lato sensu da
Escola Paulista de Direito. Advogado em São Paulo.
Caro leitor,
permita que, aos 32 anos de idade, intitule-me jovem advogado. Esse ano
completo dez anos da minha conclusão do bacharelado e sinto que estou apenas
dando início à minha carreira.
É curioso dizer isso, aos 32.
Lembro-me que, aos 22, quando havia acabado de deixar a faculdade e já tendo
passado na OAB “de primeira”, pensava que era um advogado pronto para qualquer
embate. Aos 23, iniciei o mestrado na Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa. Ao retornar ao Brasil, já me imaginava um profissional completamente
preparado, pronto para ser sócio de qualquer grande escritório de advocacia.
Ledo engano. Os anos passaram e vi que ainda me falta muita experiência e
aprendizado.
O objetivo da presente carta, ainda
que escrita por um advogado em início de carreira é tentar mostrar ao jovem
profissional uma opinião pessoal a respeito do atual panorama da advocacia
brasileira. Isso porque, ao ler o noticiário, o jovem profissional ou estudante
pode imaginar que a advocacia, nos tempos atuais, é uma profissão em plena
decadência.
E essa sensação é justificada. O
Brasil possui 1,3 mil faculdades despejando, todos os anos, milhares de
bacharéis e outros milhares de advogados no mercado. Não é incomum entre os
colegas de faculdade, verificarmos que muitos, sem espaço no mercado, optaram
por abandonar o Direito. Além disso, vemos advogados desistindo da profissão
para tentarem a vida em outros países, em profissões tais como entregador de
pizza, pintor, dentre outras1.
Tudo isso, naturalmente, pode
ensejar o jovem profissional ou estudante a ter enorme receio em trilhar o
caminho da advocacia. É compreensível. Justamente por isso que vemos boa parte
dos estudantes, desde o início da faculdade, buscando o caminho dos concursos
públicos. Além de bem remuneradas, os cargos públicos oferecem benefícios tais
como a estabilidade e aposentadoria, o que atrai o jovem profissional.
A respeito da carreira pública, uma
observação. Vejo muitos amigos prestarem concursos, sem vislumbrar um cargo
determinado. Há colegas que prestam todo o tipo de provas: juízes, promotores,
defensores públicos, advogados em estatais e assim por diante. O que importa,
para muitos, não é o cargo em si, mas apenas uma carreira pública. Esse fato é
preocupante porque, parece-me, a carreira tem a ver com vocação. A função de um
juiz é completamente distinta de um promotor de justiça. É difícil imaginar que
o candidato queira ser todas as profissões ao mesmo tempo.
Mas àqueles que, como eu, são
apaixonados pela advocacia e que não pensam em trilhar a carreira pública, aqui
alguns apontamentos.
A advocacia não morreu, garanto.
Ser advogado é uma profissão que me honra, todos os dias. Também é possível,
acredite, ser bem remunerado por isso. Naturalmente não é um caminho fácil e há
muitos desafios.
Há seis anos resolvi, junto com um
amigo, montar a nossa própria banca de advocacia. O início é absolutamente
desafiador e, tenho certeza, a maioria dos escritórios fecha nos primeiros
meses ou anos de funcionamento. Os últimos dois anos mostraram-se mais rentáveis
e com grandes perspectivas de crescimento. Ao chegar aqui, passamos por alguns
desafios, mas, finalmente, verifico que estamos no caminho certo.
Reitero, jovem leitor, que essa não
é uma carta de um advogado com carreira consolidada, com caráter de “aconselhamento”.
É, na verdade, a união de dicas que daria a alguém menos experiente do que eu,
que possui dúvidas a respeito de seguir, ou não, na advocacia.
Vamos a eles.
Estude I. Se
você é formado por uma instituição de renome, o caminho pode ser mais fácil. De
qualquer forma, mesmo tendo se formado nas melhores faculdades, uma grande dica
é estudar. E não apenas estudar para passar na OAB. Estude para se destacar
frente aos demais e porque a advocacia de ponta requer muito preparo.
Estude II. Quando
era coordenador da Comissão dos Novos Advogados do IASP, em uma reunião por nós
organizada no escritório Pinheiro Neto, um dos nossos membros indagou ao Prof.
Cristiano Zanetti, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, quais
conselhos ele daria ao jovem advogado. Zanetti nos deu três conselhos: estude,
estude e estude. Por isso, seja você estudante ou advogado, não pare de
estudar. E, se não gosta de estudar, repense se é a advocacia (ou o Direito)
que você quer seguir.
Faça networking. Muitos
colegas não gostam de fazer networking. Penso ser algo indispensável. O grande
desafio da advocacia é conseguir clientes. Há quem não goste desse desafio.
Pessoalmente, trata-se de um desafio que gosto muito. Assim, participe de
palestras, faça parte de associações, promova bate-papos. Enfim, apareça.
Seja acadêmico. Ainda
que você não pense trilhar para a docência, seja próximo da academia. Se tiver
oportunidade, faça mestrado e doutorado. Não acredite naqueles que dizem que,
para a advocacia, pouco importa um mestrado ou doutorado. A pessoa que
normalmente diz isso é porque não possui tais titulações. A pesquisa melhora
nosso desempenho e certamente auxilia na captação de clientes.
Tenha orgulho em ser advogado. Certa
vez, um tio me perguntou: “Você pensa na carreira pública ou vai parar por
ai?”. Na hora, não entendi o que meu tio quis dizer. Momentos depois entendi
que, na cabeça dele, a advocacia estaria abaixo de outras profissões. Tive de
explicá-lo que gosto muito da profissão e não pretendo mudar. Sempre que
indagado, se você ama advocacia e não pensa em carreiras públicas, deixe isso
claro. Eu sou advogado por escolha e não falta de opções.
Se faça respeitado. É
notório que os melhores e maiores juízes brasileiros são aqueles que recebem o
advogado, com cordialidade e educação. Mas há uma minoria, com menor preparo,
comumente arrogante e, inúmeras vezes, deselegante em sala de audiência. Pior
de tudo é verificar, sobretudo no interior, colegas mais jovens que admitem o
tratamento. Certa vez fui a uma audiência em Valinhos. Ao entrar na sala de
audiências, dei boa tarde à Juíza. Ela não me respondeu. Novamente disse
boa-tarde. Mais uma vez sem resposta. Foi então que me dirigi ao escrevente e
lhe disse: poderia dizer à nobre Juíza que estou lhe dando boa tarde. Só assim,
vendo minha insistência, ela murmurou algo que entendi como “tarde”.
Respeite. Respeite
a parte contrária, seu colega adverso, promotores e serventuários. Mas não
aceite falta de respeito, principalmente na frente do seu cliente. Não tema.
Exija ser atendido pessoalmente para despachar petições que, na sua opinião,
merecem um diálogo pessoal.
Acredite. Tenha
a certeza de que seremos demandados, sempre. Qualquer empresa precisa de um
advogado ou departamento jurídico. A depender do investimento e do litígio
envolvido, as empresas não economizam. E não pense que as empresas precisam
apenas dos grandes escritórios. É comum que grandes empresas firmem contratos
longos com dois, três ou quatro escritórios, dos mais variados portes. Apenas
relembre que confiança não se conquista do dia para a noite.
___________
Nenhum comentário:
Postar um comentário