DOAÇÃO FEITA AOS CÔNJUGES
ZENO VELOSO
Pedro e Rafaela casaram sob o regime da comunhão parcial de bens. Como se sabe, nesse regime, não se comunicam os bens que cada um dos cônjuges adquirir na constância do matrimônio, por doação ou por herança, nos termos do art. 1.659, I, do Código Civil.
Durante o casamento, eles compraram dois apartamentos. Esses imóveis estavam no nome de Pedro, pois na escritura de compra e venda apareceu apenas o marido. Apesar disso, o imóvel não é só dele, pois a metade é da esposa, Rafaela, uma vez que no regime da comunhão parcial entram na comunhão os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges, como prevê o art. 1.660, I, do Código Civil.
Além desses dois apartamentos, os pais de Rafaela fizeram doação, a ela e ao marido, de um terreno edificado com uma casa, em área nobre da cidade. Note-se bem: a doação não foi feita apenas à filha dos doadores, mas à filha e ao marido dela, portanto, ao casal.
Pedro e Rafaela não tiveram filhos, mas a mulher tinha uma filha, de um relacionamento anterior, chamada Maria Francisca. Com o falecimento prematuro de Rafaela, Maria Francisca, já formada em arquitetura, antes da missa de 30º dia da genitora, ingressou com ação de inventário, no Fórum, mandando citar o padrasto, Pedro, para acompanhá-la.
Logo na petição inicial, Maria Francisca enuncia que o casal (Pedro e Rafaela) tinha três (03) imóveis, os dois apartamentos e a casa, alegando que o viúvo é meeiro desses bens, por força do regime de bens do casamento, e, como Rafaela não deixou bens particulares, ele não concorre com a filha da falecida, o que quer dizer, Pedro é somente meeiro, não é herdeiro, conforme o art. 1.829, I, do Código Civil, e propos, então, que o patrimônio seja partilhado da seguinte maneira: metade dos três imóveis ficará para Pedro, na sua qualidade de viúvo-meeiro, e a outra metade ficará para Maria Francisca, como filha e herdeira.
Assim estava posta a questão, quando Pedro, numa recepção, contou o que estava acontecendo e, como havia um advogado sentado à mesa, o professor Flávio Tartuce, perguntou se estava mesmo tudo correto e quando tempo iria passar o processo para que a partilha fosse feita.
O advogado, então, para surpresa de Pedro, que tinha sido informado de que a petição da enteada estava certíssima, disse que os dois apartamentos, realmente, caberiam ao viúvo e à filha de Rafaela, metade para cada um. No entanto, o terreno edificado com a casa não devia estar sendo inventariado, não devia ser objeto de partilha, por uma razão muito simples: esse terreno edificado com a casa era de propriedade exclusiva do viúvo, Pedro, e a herdeira, Maria Francisca, não tinha direito algum sobre esse bem.
Quase todos os autores que abordam o assunto e tratam dele, no passado e atualmente, chamam a atenção para uma regra, praticamente escondida no capítulo da doação, no Código Civil. Em muitos casos, alguns imóveis não deviam ter sido trazidos a inventário. Sugiro, sobre a matéria, a leitura de dois livros: o clássico “Da Doação” (Saraiva, São Paulo, 2ª ed., 1972, página 210), do professor Agostinho Alvim, civilista emérito, antigo professor catedrático da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e “O contrato de doação” (Saraiva, São Paulo, 2007, página 100), do juiz de Direito e professor baiano, Pablo Stolze Gagliano, casado com Kalline, e ambos são meus afilhados queridos.
Em síntese, o tema vem regulado no art. 551 do Código Civil em vigor, cuja redação é a seguinte: “Art. 551. Salvo declaração em comentário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual”. “Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo”. Note-se que o Código Civil anterior, que começou a vigorar em 1917, já trazia o mesmo preceito, no art. 1.178, parágrafo único. Trata-se, então de uma solução velha de quase cem anos no direito brasileiro, e, parece incrível, é pouco conhecida e aplicada.
No caso acima analisado, como a doação do terreno edificado com a casa foi feita conjuntamente ao marido e à mulher, com a morte da mulher, a metade desta não vai pertencer aos seus herdeiros, o que aconteceria, nos casos gerais, mas essa metade vai acrescer à metade do viúvo, que ficará dono da totalidade do imóvel.
ZENO VELOSO
Pedro e Rafaela casaram sob o regime da comunhão parcial de bens. Como se sabe, nesse regime, não se comunicam os bens que cada um dos cônjuges adquirir na constância do matrimônio, por doação ou por herança, nos termos do art. 1.659, I, do Código Civil.
Durante o casamento, eles compraram dois apartamentos. Esses imóveis estavam no nome de Pedro, pois na escritura de compra e venda apareceu apenas o marido. Apesar disso, o imóvel não é só dele, pois a metade é da esposa, Rafaela, uma vez que no regime da comunhão parcial entram na comunhão os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges, como prevê o art. 1.660, I, do Código Civil.
Além desses dois apartamentos, os pais de Rafaela fizeram doação, a ela e ao marido, de um terreno edificado com uma casa, em área nobre da cidade. Note-se bem: a doação não foi feita apenas à filha dos doadores, mas à filha e ao marido dela, portanto, ao casal.
Pedro e Rafaela não tiveram filhos, mas a mulher tinha uma filha, de um relacionamento anterior, chamada Maria Francisca. Com o falecimento prematuro de Rafaela, Maria Francisca, já formada em arquitetura, antes da missa de 30º dia da genitora, ingressou com ação de inventário, no Fórum, mandando citar o padrasto, Pedro, para acompanhá-la.
Logo na petição inicial, Maria Francisca enuncia que o casal (Pedro e Rafaela) tinha três (03) imóveis, os dois apartamentos e a casa, alegando que o viúvo é meeiro desses bens, por força do regime de bens do casamento, e, como Rafaela não deixou bens particulares, ele não concorre com a filha da falecida, o que quer dizer, Pedro é somente meeiro, não é herdeiro, conforme o art. 1.829, I, do Código Civil, e propos, então, que o patrimônio seja partilhado da seguinte maneira: metade dos três imóveis ficará para Pedro, na sua qualidade de viúvo-meeiro, e a outra metade ficará para Maria Francisca, como filha e herdeira.
Assim estava posta a questão, quando Pedro, numa recepção, contou o que estava acontecendo e, como havia um advogado sentado à mesa, o professor Flávio Tartuce, perguntou se estava mesmo tudo correto e quando tempo iria passar o processo para que a partilha fosse feita.
O advogado, então, para surpresa de Pedro, que tinha sido informado de que a petição da enteada estava certíssima, disse que os dois apartamentos, realmente, caberiam ao viúvo e à filha de Rafaela, metade para cada um. No entanto, o terreno edificado com a casa não devia estar sendo inventariado, não devia ser objeto de partilha, por uma razão muito simples: esse terreno edificado com a casa era de propriedade exclusiva do viúvo, Pedro, e a herdeira, Maria Francisca, não tinha direito algum sobre esse bem.
Quase todos os autores que abordam o assunto e tratam dele, no passado e atualmente, chamam a atenção para uma regra, praticamente escondida no capítulo da doação, no Código Civil. Em muitos casos, alguns imóveis não deviam ter sido trazidos a inventário. Sugiro, sobre a matéria, a leitura de dois livros: o clássico “Da Doação” (Saraiva, São Paulo, 2ª ed., 1972, página 210), do professor Agostinho Alvim, civilista emérito, antigo professor catedrático da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e “O contrato de doação” (Saraiva, São Paulo, 2007, página 100), do juiz de Direito e professor baiano, Pablo Stolze Gagliano, casado com Kalline, e ambos são meus afilhados queridos.
Em síntese, o tema vem regulado no art. 551 do Código Civil em vigor, cuja redação é a seguinte: “Art. 551. Salvo declaração em comentário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual”. “Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo”. Note-se que o Código Civil anterior, que começou a vigorar em 1917, já trazia o mesmo preceito, no art. 1.178, parágrafo único. Trata-se, então de uma solução velha de quase cem anos no direito brasileiro, e, parece incrível, é pouco conhecida e aplicada.
No caso acima analisado, como a doação do terreno edificado com a casa foi feita conjuntamente ao marido e à mulher, com a morte da mulher, a metade desta não vai pertencer aos seus herdeiros, o que aconteceria, nos casos gerais, mas essa metade vai acrescer à metade do viúvo, que ficará dono da totalidade do imóvel.
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