terça-feira, 27 de abril de 2021

RESUMO. INFORMATIVO 693 DO ST

INFORMATIVO N. 693 DO STJ. PUBLICAÇÃO EM 26 DE ABRIL DE 2021.

CORTE ESPECIAL

Processo

HDE 1.809/EX, Rel. min. Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 22/04/2021.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Homologação de decisão estrangeira. Sentença arbitral estrangeira. Relação patrimonial. Valor da causa. Fixação de honorários advocatícios. Equidade (CPC, Art. 85, § 8º).

Destaque

Em sede de homologação de decisão estrangeira, aplica-se a norma do § 8º do art. 85 do CPC, fixando-se os honorários advocatícios por equidade.

Informações do Inteiro Teor

Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Corte Especial entendia, ao menos na maioria dos casos encontrados na base de dados da jurisprudência do STJ, que a aplicação da norma do § 4º do art. 20 é que deveria nortear o julgador na fixação, por equidade, de honorários do advogado em decisão prolatada em homologação de sentença estrangeira, e não a regra do § 3º do mesmo dispositivo legal.

De forma geral, a Corte Especial se inclinava no sentido de entender que o arbitramento dos honorários advocatícios de sucumbência nas decisões homologatórias de sentença estrangeira, seja para deferir o pedido ou para indeferi-lo, deveria ser feito com base na equidade, à luz do art. 20, § 4º, do revogado CPC de 1973, norma correspondente à do § 8º do art. 85 do atual Código de Processo Civil.

Após o advento do novo Código, a análise da base de dados da jurisprudência do STJ revela que, para fins de fixação de honorários advocatícios sucumbenciais na homologação de decisão estrangeira (HDE), há acórdãos da colenda Corte Especial que ora aplicam o § 2º do art. 85 do CPC de 2015, que se refere às hipóteses de arbitramento no montante de 10% a 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico ou do valor atualizado da causa, ora assentam o § 8º do mesmo artigo, o qual trata a respeito das hipóteses de arbitramento de tal verba por equidade.

A segunda orientação alicerça-se, preponderantemente, no fundamento de que o procedimento de homologação de sentença estrangeira não tem natureza condenatória ou proveito econômico imediato e, por essa razão, descabe considerar os parâmetros de condenação, de proveito econômico ou mesmo do valor da causa como bases de cálculo dos honorários advocatícios, pois, afinal, o mérito da decisão homologada não é objeto de deliberação nesta Corte. Assim, a decisão a ser homologada é, em si, fator exógeno à decisão homologatória a ser proferida.

Essa é a orientação que mais se coaduna com o instituto da decisão de natureza predominantemente homologatória.

Assim, não se tem condenação, nem proveito econômico imediato ou valor da causa aptos a dar legítimo respaldo à aplicação das bases de cálculo previstas, respectivamente, no citado § 2º do art. 85 do CPC de 2015, ou seja: 1º) o "valor da condenação"; 2º) o valor "do proveito econômico obtido"; e 3º) "valor atualizado da causa".

Contudo, não se pode olvidar que o valor da causa pode ser um dos critérios norteadores do julgador no arbitramento, por equidade, da quantia a ser paga a título de honorários advocatícios sucumbenciais, quando a causa originária, tratar de relações patrimoniais.

É o que expressamente dispõe o próprio § 8º do art. 85, que manda o julgador atentar para que, no "valor dos honorários por apreciação equitativa", seja observado "o disposto nos incisos do § 2º", isto é: o grau de zelo do profissional; o lugar de prestação do serviço; a natureza e a importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

Assim, quando a causa na qual proferida a decisão a ser homologada envolve relações patrimoniais, o valor atribuído à causa é indicativo do relevo, da importância que tem a causa para as partes litigantes. Então, nessa hipótese, de ação versando sobre relações patrimoniais, o valor da causa será observado como um dos critérios norteadores do julgador no arbitramento de honorários sucumbenciais por equidade, conforme expressamente dispõe o próprio § 8º do multicitado art. 85.

TERCEIRA TURMA

Processo

REsp 1.922.153/RS, Rel. min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Doação. Direito intertemporal. Cláusula de reversão em favor de terceiro. Validade à luz do código civil de 1916. Doação com cláusula de reversão em favor de herdeiros do donatário. Implemento da condição após a entrada em vigor do código civil de 2002. Possibilidade.

Destaque

É válida e eficaz a cláusula de reversão em favor de terceiro, aposta em contrato de doação celebrado à luz do CC/1916, ainda que a condição resolutiva se verifique apenas sob a vigência do CC/2002.

Informações do Inteiro Teor

Cinge-se a controvérias a dizer se é válida e eficaz a doação com cláusula de reversão, celebrada sob a vigência do CC/1916, em benefício de apenas alguns dos herdeiros do donatário, na hipótese em que a morte deste se verificar apenas sob a vigência do CC/2002.

Na hipótese, levando-se em consideração que o contrato de doação foi celebrado em 1987, a validade da cláusula de reversão em apreço deve ser aferida à luz das disposições do CC/1916, não havendo que se cogitar da aplicação do novo Código Civil para esse mister.

Feita essa consideração, cumpre verificar, portanto, se, no sistema anterior ao advento do CC/2002, era possível inserir a referida cláusula em contrato de doação.

No que diz respeito ao seu conteúdo, tanto o art. 1.174 do CC/1916, quanto o caput do art. 547 do CC/2002, admitem a denominada cláusula de reversão, também denominada de cláusula de retorno ou de devolução: CC/1916, Art. 1.174. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário; CC/2002, Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário. Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.

Observa-se dos dispositivos legais acima mencionados que, ao contrário do CC/2002, o diploma anterior, a despeito de autorizar a cláusula de reversão em favor do doador, nada dizia acerca da reversão em favor de terceiro.

Muito embora existam respeitáveis opiniões em contrário, ante a lacuna legislativa, deve-se admitir a cláusula de reversão em favor de terceiro na hipótese de doações celebradas na vigência do CC/1916 em prestígio à liberdade contratual e à autonomia privada.

Assim, não obstante a validade da cláusula em apreço, cumpre verificar se a cláusula de reversão estipulada em benefício de apenas alguns dos herdeiros do donatário é eficaz na hipótese em que a morte deste - fato que representa o implemento da condição - se verificar apenas sob a vigência do CC/2002.

De início, importa consignar que, em se tratando de matéria relativa à direito intertemporal, incide o disposto no caput do art. 2.035 do CC/2002, segundo o qual que a validade dos atos jurídicos subordina-se aos ditames da lei anterior, mas os seus efeitos, desde que produzidos após a vigência do novo Código, em regra, a ele estarão subordinados.

Observa-se que a impossibilidade de retroação dos efeitos da lei nova para atingir a validade de atos jurídicos já celebrados coaduna-se com a regra esculpida no inciso XXXVI, do art. 5º da Constituição Federal, que impõe o respeito ao ato jurídico perfeito, o que, aliás, conduziu parcela da doutrina a apontar a inconstitucionalidade da segunda parte do dispositivo em comento.

O mencionado dispositivo legal deve ser interpretado, sistematicamente, com o previsto no caput do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que estabelece a proteção ao direito adquirido: "a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada".

O deslinde da presente crise de direito material, portanto, perpassa pela verificação da existência ou não, na espécie, de direito adquirido - o que afastaria a incidência do novel Diploma - ou de efeitos produzidos somente após a entrada em vigor do novo Código, o que atrairia a incidência de suas normas, a teor do art. 2.035.

Com efeito, com o implemento da condição, ao mesmo tempo em que se resolve a propriedade, ocorre a atribuição desse direito subjetivo patrimonial aos terceiros em prol dos quais a cláusula foi pactuada. Não se trata, pois, de sucessividade, mas sim de simultaneidade.

A partir da interpretação do art. 126 do CC/2002 (correspondente ao art. 122 do CC/1916) e do § 2º do art. 6º da LINDB, parte da doutrina, influenciada pelo direito francês, sustenta a existência de efeito retroativo nas condições, motivo pelo qual poderia se falar em verdadeiros direitos adquiridos nas hipóteses de atos jurídicos sujeitos à condição suspensiva.

Partindo dessas premissas, seria possível concluir que, em se tratando de direito adquirido, não poderia o novo Código Civil retroagir, prejudicando o direito dos beneficiários da cláusula de reversão, a teor do disposto no inciso XXXVI do art. 5º da Constituição Federal e do caput do art. 6º da LINDB, notadamente porque, ao tempo da celebração da doação, não havia qualquer vedação à referida cláusula.

Não se olvida, é verdade, que parcela da doutrina rechaça a existência de direito adquirido na hipótese de atos jurídicos sujeitos à condição suspensiva: "a condição suspensiva, até que se cumpra, impede o direito adquirível, só dá ao credor a esperança".

16. De fato, dispõe o art. 125 do CC/2002 (correspondente ao art. 118 do CC/1916), que "subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa". Desse modo, tratando-se de condição suspensiva, os efeitos do negócio jurídico - ou de determinada cláusula negocial - só se verificariam após o implemento da condição.

Diante dessas considerações, importa consignar que, no período de pendência, isto é, no lapso temporal entre a celebração do negócio e a realização da condição, muita embora não exista já direito adquirido, há a atribuição ao sujeito beneficiado, de um direito expectativo, que representa a eficácia mínima dos atos jurídicos condicionados.

Trata-se, a rigor, de posição jurídica que se traduz no direito à aquisição de um outro direito - o chamado direito expectado - e que não se confunde com a mera expectativa de direito, que é minus e conceito pré-jurídico.

Assim, ainda que não se reconheça, antes do implemento da condição, hipótese de verdadeiro direito adquirido, não há como se afastar a caracterização, ao menos, de direito expectativo digno de tutela jurídica.

No caso, portanto, não incidem as disposições do CC/2002, isto é, o fato de o implemento da condição suspensiva haver ocorrido após o advento do novo Código, em nada afeta a eficácia da cláusula de reversão, que permanece hígida e garantida pela ultratividade da lei pretérita.

Por fim, importa destacar que, fosse a referida cláusula nula toda a doação seria maculada de nulidade, porquanto tratar-se-ia de condição juridicamente impossível, nos termos do inciso I do art. 123 do CC/2002 (correspondente ao art. 166 do CC/1916).

Assim, seja por se tratar de verdadeiro direito adquirido, seja por estar cristalizado direito expectativo em favor dos herdeiros beneficiados, é imperioso concluir, a partir de uma interpretação sistemática dos arts. 125, 126 e 2.035 do CC/2002 e art. 6º, caput e § 2º da LINDB, que não incide, na espécie, as normas previstas no CC/2002, o que, como corolário lógico, conduz ao reconhecimento da validade e da eficácia da cláusula de reversão em apreço.

Processo

REsp 1.645.757, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 06/04/2021, DJe 08/04/2021

Tema

Sociedade Anônima de capital fechado. Termo no Livro de Transferência de Ações Nominativas. Ausência de prazo fixado. Caracterização da mora. Interpelação do devedor. Necessidade.

Destaque

Na Sociedade Anônima de capital fechado, não fixado prazo para que seja lavrado o termo no Livro de Transferência de Ações Nominativas, é indispensável a interpelação do devedor para que fique caracterizada a mora.

Informações do Inteiro Teor

Cumpre assinalar, de início, que na Sociedade Anônima de capital fechado, a transferência das ações nominativas registradas (não escriturais) somente ocorre por termo lavrado no Livro de Transferência de Ações Nominativas, conforme dispõe o art. 31, § 1º, da Lei n. 6.404/1976.

No caso, a parte afirma que nem o contrato, nem a lei de regência, estabelecem prazo para que seja lavrado o termo no Livro de Transferência de Ações Nominativas, de forma que a mora somente ficou caracterizada a partir da data da notificação, tendo sido realizada a prestação imediatamente.

A questão que se põe a debate, então, é definir em que momento a inércia do cedente caracteriza o inadimplemento, autorizando a parte lesada a pedir a resolução do contrato ou exigir-lhe o cumprimento, com a cumulação de perdas e danos.

A Corte de origem se valeu do art. 104, parágrafo único, da Lei n. 6.404/1976, que dispõe que a companhia deve diligenciar para que os atos de transferências e averbações nos livros sociais sejam praticados no menor prazo possível, para concluir que a obrigação não foi cumprida a tempo.

O referido dispositivo legal, porém, não parece ter o alcance que lhe foi dado, pois além de não prever um prazo específico, era necessário o comparecimento das partes para assinar o termo, não cabendo a diligência nessa fase somente à companhia. Ademais, o art. 104 da LSA fala em reparação de eventuais prejuízos e não em desfazimento do negócio.

Assim, o que se constata é que, não existindo prazo no contrato ou na lei, a mora somente se configura após a notificação do devedor para o cumprimento da obrigação.

Processo

REsp 1.919.208/MA, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Contrato de locação de imóvel urbano. Resilição. Restituição do bem em condições precárias. Locador que foi injustamente privado de seu uso e gozo. Lucros cessantes. Indenização devida.

Destaque

É devida indenização por lucros cessantes pelo período em que o imóvel objeto de contrato de locação permaneceu indisponível para uso, após sua devolução pelo locatário em condições precárias.

Informações do Inteiro Teor

Nos termos dos arts. 569 do CC/02 e 23 da Lei 8.245/91, incumbe ao locatário usar e gozar do bem locado de forma regular, tratando-o com o mesmo cuidado como se fosse seu e, finda a locação, restituí-lo ao locador no estado em que o recebeu, ressalvadas as deteriorações decorrentes do seu uso normal.

Recai sobre o locatário a responsabilidade pela deterioração anômala do bem, circunstância que autoriza o locador a exigir, para além da rescisão do ajuste, indenização por perdas e danos.

A determinação das perdas e danos está submetida ao princípio da reparação integral, de maneira que devem abranger tanto o desfalque efetivo e imediato no patrimônio do credor, como a perda patrimonial futura, a teor do disposto no art. 402 do CC/02.

Para além dos danos emergentes, a restituição do imóvel locado em situação de deterioração enseja o pagamento de indenização por lucros cessantes, pelo período em que o bem permaneceu indisponível para o locador.

A ausência de prova categórica de que o imóvel seria imediatamente locado a outrem se fosse devolvido pelo locatário em boas condições de uso não impede a caracterização dos lucros cessantes. A simples disponibilidade do bem para uso e gozo próprio, ou para qualquer outra destinação que pretendesse o locador, tem expressão econômica e integra a sua esfera patrimonial, que restou reduzida pelo ilícito contratual.

Processo

REsp 1.846.502/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Plano de saúde coletivo empresarial. Resilição unilateral. Legalidade. Inconformismo. Usuário. Plano Individual. Migração. Impossibilidade. Modalidade não comercializada.

Destaque

A operadora não pode ser obrigada a oferecer plano individual a usuário de plano coletivo extinto se ela não disponibiliza no mercado tal modalidade contratual.

Informações do Inteiro Teor

Na hipótese de cancelamento do plano privado coletivo de assistência à saúde, deve ser permitido que os empregados ou ex-empregados migrem para planos individuais ou familiares, sem o cumprimento de carência, desde que a operadora comercialize esses planos.

Nesse sentido são os arts. 1º e 3º da Res. CONSU n. 19/1999, que disciplinaram a absorção do universo de consumidores pelas operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde que operam ou administram planos coletivos que vierem a ser liquidados ou encerrados.

Além disso, não é ilegal a recusa de operadoras de planos de saúde de comercializarem planos individuais por atuarem apenas no segmento de planos coletivos. Com efeito, não há norma alguma que as obrigue a atuar em determinado ramo de plano de saúde.

Por outro lado, ainda não pode ser aplicada, por analogia, a regra do art. 30 da Lei n. 9.656/1998, na tentativa de conciliar o dever de proteção ao consumidor com o direito da operadora de rescindir unilateralmente a avença coletiva e que não oferece, em contrapartida, plano na modalidade individual ou familiar.

É que a aplicação da analogia somente é viável quando houver vácuo normativo (art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB), o que não é a situação analisada. Além disso, mesmo se houvesse omissão normativa, o art. 30 da Lei n. 9.656/1998 - que regula o direito de manutenção, como beneficiário, de ex-empregado demitido sem justa causa em plano de saúde coletivo - não guarda ressonância com a hipótese sob exame. Isso porque, no caso, o plano coletivo foi extinto, não existindo mais fática e juridicamente, ao passo que na situação evidenciada pelo dispositivo legal em apreço, o ex-empregado pode permanecer na apólice grupal empresarial ainda em vigência.

Ressalta-se que a exploração da assistência à saúde pela iniciativa privada também possui raiz constitucional (arts. 197 e 199, caput e § 1º, da CF), merecendo proteção não só o consumidor, mas também a livre iniciativa e o livre exercício da atividade econômica (arts. 1º, IV, 170, IV e parágrafo único, e 174 da CF).

Desse modo, devem ser sopesados tanto os direitos do consumidor quanto os das empresas, não havendo superioridade de uns sobre os outros.

Assim, inclusive conforme prevê o art. 35-G da Lei n. 9.656/1998, a legislação consumerista incide subsidiariamente nos planos de saúde.

Logo, esses dois instrumentos normativos devem ser aplicados de forma harmônica nesses contratos relacionais, mesmo porque lidam com bens sensíveis, como a manutenção da vida, ou seja, visam ajudar o usuário a suportar riscos futuros envolvendo a sua higidez física e mental, assegurando o devido tratamento médico.

Processo

REsp 1.890.327/SP, Rel. min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 20/04/2021.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR

Tema

Imóvel entregue em metragem a menor. Vício aparente. Pretensão de abatimento proporcional do preço. Venda ad mensuram. Prazo decadencial. Art. 501 do CC/2002.

Destaque

Na hipótese em que as dimensões de imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão (venda ad mensuram), aplica-se o prazo decadencial de 1 (um) ano, previsto no art. 501 do CC/2002, para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço

Informações do Inteiro Teor

A entrega de bem imóvel em metragem diversa da contratada não pode ser considerada vício oculto, mas sim aparente, dada a possibilidade de ser verificada com a mera medição das dimensões do imóvel - o que, por precaução, o adquirente, inclusive, deve providenciar tão logo receba a unidade imobiliária.

É de 90 (noventa) dias o prazo para o consumidor reclamar por vícios aparentes ou de fácil constatação no imóvel por si adquirido, contado a partir da efetiva entrega do bem (art. 26, II e § 1º, do CDC).

O prazo decadencial previsto no art. 26 do CDC relaciona-se ao período de que dispõe o consumidor para exigir em juízo alguma das alternativas que lhe são conferidas pelos arts. 18, § 1º, e 20, caput, do mesmo diploma legal (a saber, a substituição do produto, a restituição da quantia paga, o abatimento proporcional do preço e a reexecução do serviço), não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato.

Nesta última hipótese, à falta de prazo específico no CDC que regule a hipótese de reparação de danos decorrentes de vício do produto, entende-se que deve ser aplicado o prazo geral decenal do art. 205 do CC/02.

Para as situações em que as dimensões do imóvel adquirido não correspondem às noticiadas pelo vendedor, cujo preço da venda foi estipulado por medida de extensão ou com determinação da respectiva área (venda ad mensuram), aplica-se o disposto no art. 501 do CC/02, que prevê o prazo decadencial de 1 (um) ano para a propositura das ações previstas no antecedente artigo (exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço).

Isso significa dizer que, também na hipótese de venda ad mensuram - e consequente aplicação da legislação civilista -, convém sublinhar que o prazo decadencial previsto no art. 501 do CC/02 refere-se, tão somente, à propositura de ação para exigir o complemento da área, reclamar a resolução do contrato ou o abatimento proporcional do preço, não se confundindo com o prazo prescricional a que se sujeita o consumidor para pleitear indenização decorrente da má-execução do contrato.

No caso, o Tribunal de origem deixou expressamente consignada a natureza da ação ajuizada, isto é, de abatimento proporcional do preço, afastando-se, por não se tratar de pretensão indenizatória, o prazo prescricional geral de 10 (dez) anos previsto no art. 205 do CC/02.

Processo

REsp 1.605.604/MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Prestação de serviços advocatícios. Falecimento do mandante. Cláusula quota litis. Êxito. Prescrição. Termo Inicial. Implementação de condição suspensiva. Art. 199, I, CC/2002.

Destaque

A existência de cláusula quota litis em contrato de prestação de serviços advocatícios faz postergar o início da prescrição até o momento da implementação da condição suspensiva.

Informações do Inteiro Teor

O prazo prescricional é contado, em regra, a partir do momento em que configurada lesão ao direito subjetivo, não influindo para tanto ter ou não seu titular conhecimento pleno do ocorrido ou da extensão dos danos (art. 189 do CC/2002).

O termo inicial do prazo prescricional, em situações específicas, pode ser deslocado para o momento de conhecimento da lesão, aplicando-se excepcionalmente a actio nata em seu viés subjetivo.

Nas ações de cobrança de honorários advocatícios contratuais, ocorrendo o falecimento do mandante, o termo inicial da prescrição, em regra, é a data da ciência desse fato pelo advogado (mandatário).

A existência de cláusula quota litis em contrato de prestação de serviços advocatícios faz postergar o início da prescrição até o momento da implementação da condição suspensiva.

No caso, por mais que a morte do mandante possa deflagrar o início do prazo prescricional, o instrumento contratual estipulou que o recebimento da referida verba honorária está submetido ao êxito da reclamação trabalhista e a sua exigibilidade condicionada à liberação dos valores.

Incide, portanto, o art. 199, I, CC/2002: "Não corre igualmente a prescrição (...) pendendo condição suspensiva".

QUARTA TURMA

Processo

REsp 1.819.075-RS, Rel. p/ acórdão Min. Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 20/04/2021

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Condomínio. Destinação residencial. Contrato atípico de hospedagem. Airbnb. Locação concomitante de partes do imóvel a diferentes pessoas. Inviabilidade.

Destaque

É vedado o uso de unidade condominial com destinação residencial para fins de hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de aposentos existentes nos apartamentos, a diferentes pessoas, por curta temporada.

Informações do Inteiro Teor

No caso, tem-se um contrato atípico de hospedagem, que expressa uma nova modalidade, singela e inovadora de hospedagem de pessoas, sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas.

Assim, esse contrato atípico de hospedagem configura atividade aparentemente lícita, desde que não contrarie a Lei de regência do contrato de hospedagem típico, regulado pela Lei n. 11.771/2008, como autoriza a norma do art. 425 do Código Civil, ao dizer: "É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código".

No caso específico de unidade condominial, também devem ser observadas as regras dos arts. 1.332 a 1.336 do CC/2002, que, por um lado, reconhecem ao proprietário o direito de usar, fruir e dispor livremente de sua unidade e, de outro, impõem o dever de observar sua destinação e usá-la de maneira não abusiva, com respeito à Convenção Condominial.

Ademais, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no Condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício.

Portanto, existindo na Convenção de Condomínio regra impondo destinação residencial, mostra-se inviável o uso das unidades particulares que, por sua natureza, implique o desvirtuamento daquela finalidade residencial (CC/2002, arts. 1.332, III, e 1.336, IV).

Com isso, fica o condômino obrigado a "dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação" (CC, art. 1.336, IV), ou seja, destinação residencial, carecendo de expressa autorização para dar destinação diversa, inclusive para a relativa à hospedagem remunerada, por via de contrato atípico.

Processo

REsp 1.583.007-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 20/04/2021 

Ramo do Direito

DIREITO REGISTRAL

Tema

Registro de marca. Sinais integrantes da propriedade industrial olímpica. Nulidade. Proteção especial. Teoria da diluição. Marketing de emboscada. Não cabimento.

Destaque

É nulo o registro de marca nominativa de símbolo olímpico ou paraolímpico.

Informações do Inteiro Teor

A controvérsia está em definir se é válido ou não o registro da marca nominativa "fogo olímpico" para identificar álcool e álcool etílico, na medida em que existente previsão legal (artigo 15 da Lei n. 9.615/1998) conferindo ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB) - e ao Comitê Paraolímpico Brasileiro (CPOB) - a exclusividade de uso de símbolos olímpicos e paraolímpicos, assim como das denominações "jogos olímpicos", "olimpíadas", "jogos paraolímpicos" e "paraolímpiadas".

Nos dias atuais, a marca não tem apenas a finalidade de assegurar direitos ou interesses meramente individuais do seu titular, mas visa, acima de tudo, proteger os adquirentes de produtos ou serviços, conferindo-lhes subsídios para aferir a origem e a qualidade do produto ou serviço. De outra banda, tem por escopo evitar o desvio ilegal de clientela e a prática do proveito econômico parasitário. 

A distintividade é condição fundamental para o registro da marca, razão pela qual a Lei n. 9.279/1996 (LPI) enumera vários sinais não registráveis, tais como aqueles de uso comum, genérico, vulgar ou meramente descritivos, porquanto desprovidos de um mínimo diferenciador que justifique sua apropriação a título exclusivo (artigo 124, inciso VI). 

De outro lado, o inciso XIII do mesmo artigo 124 preceitua a irregistrabilidade como marca de "nome, prêmio ou símbolo de evento esportivo, artístico, cultural, social, político, econômico ou técnico, oficial ou oficialmente reconhecido, bem como a imitação suscetível de criar confusão, salvo quando autorizados pela autoridade competente ou entidade promotora do evento". 

Tal norma retrata hipótese de vedação absoluta de registro marcário de designações e símbolos relacionados a evento esportivo - assim como artístico, cultural, social, político, econômico ou técnico -, que seja oficial (realizado ou promovido por autoridades públicas) ou oficialmente reconhecido (quando for de caráter privado), o que inviabiliza "a utilização do termo protegido em qualquer classe" sem a anuência da autoridade competente ou da entidade promotora do evento. 

Em complemento à LPI, sobreveio a Lei n. 9.615/1998 - apelidada de Lei do Desporto ou de Lei Pelé -, que, em seu artigo 87, conferiu às entidades de administração do desporto ou de prática esportiva a propriedade exclusiva das denominações e dos símbolos que as identificam, preceituando que tal proteção legal é válida em todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente. 

Ademais, importante destacar que, por ocasião dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, a Lei n. 13.284/2016 criminalizou o proveito econômico parasitário, estabelecendo como figuras típicas de caráter temporário o "marketing de emboscada por associação" (divulgar marcas, produtos ou serviços, com o fim de alcançar vantagem econômica ou publicitária, por meio de associação direta ou indireta com os Jogos, sem autorização das entidades organizadoras ou de pessoa por elas indicada, induzindo terceiros a acreditar que tais marcas, produtos ou serviços são aprovados, autorizados ou endossados pelas entidades organizadoras) e o "marketing de emboscada por intrusão" (expor marcas, negócios, estabelecimentos, produtos ou serviços ou praticar atividade promocional, sem autorização das entidades organizadoras ou de pessoa por elas indicada, atraindo de qualquer forma a atenção pública nos locais oficiais com o fim de obter vantagem econômica ou publicitária). 

Outrossim, a teoria da diluição das marcas tem amparo no inciso III do artigo 130 da Lei de Propriedade Industrial, segundo o qual ao titular da marca ou ao depositante é assegurado o direito de zelar pela sua integridade material ou reputação. 

Diante desse quadro, deve ser reconhecida a nulidade do registro marcário, tendo em vista: (i) a proteção especial, em todos os ramos de atividade, conferida pelo ordenamento jurídico brasileiro aos sinais integrantes da "propriedade industrial Olímpica", que não podem ser reproduzidos ou imitados por terceiros sem a autorização prévia do COB; (ii) o necessário afastamento do aproveitamento parasitário decorrente do denominado "marketing de emboscada" pelo uso conjugado de expressão e símbolos olímpicos cujo magnetismo comercial é inegável; e (iii) o cabimento da aplicação da teoria da diluição a fim de proteger o COB contra a perda progressiva da distintividade dos signos olímpicos, cujo acentuado valor simbólico pode vir a ser maculado, ofuscado ou adulterado com a sua utilização em produto de uso cotidiano.

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