RESUMO. INFORMATIVO 550 DO STJ.
DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DE PARCELAS EM CASO DE MIGRAÇÃO
ENTRE PLANOS DE BENEFÍCIOS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. Não cabe o
resgate, por participante ou assistido de plano de benefícios, das parcelas
pagas a entidade fechada de previdência privada complementar quando, mediante
transação extrajudicial, tenha ocorrido a migração dos participantes ou
assistidos a outro plano de benefícios da mesma entidade. A Súmula 289 do STJ (“A restituição das parcelas pagas
pelo participante a plano de previdência privada deve ser objeto de correção
plena, por índice que recomponha a efetiva desvalorização da moeda”) trata de
hipótese em que há o rompimento do vínculo contratual com a entidade de
previdência privada, e, portanto, não de situação em que, por acordo de
vontades, envolvendo concessões recíprocas, haja migração de participante em
gozo do benefício de previdência privada para outro plano, auferindo em
contrapartida vantagem. Ademais, os arts. 14, III, e 15, I, da LC 109/2001
esclarecem que a portabilidade não caracteriza resgate, sendo manifestamente
inadequada a aplicação deste instituto e da Súmula 289 para caso em que o assistido
não se desligou do regime jurídico de previdência privada. Dessarte, nos termos
de abalizada doutrina, a migração – pactuada em transação – de planos de
benefícios administrados pela mesma entidade fechada de previdência privada
ocorre em um contexto de amplo redesenho da relação contratual previdenciária,
com o concurso de vontades do patrocinador, da entidade fechada de previdência
complementar, por meio de seu conselho deliberativo, e autorização prévia do
órgão público fiscalizador, operando-se não o resgate de contribuições, mas a
transferência de reservas de um plano de benefícios para outro, geralmente no
interior da mesma entidade fechada de previdência complementar. Ora, se para a
migração fosse aplicada a mesma solução conferida ao resgate, essa solução
resultaria em tratamento igualitário para situações desiguais, em flagrante
violação à isonomia. Outrossim, estabelece o art. 18 da LC 109/2001 que cabe ao
plano de benefícios arcar com as demais despesas – inclusive com o
resgate vindicado –, por isso não cabe ser deferido o resgate das contribuições
vertidas ao plano, sob pena de lesão aos interesses dos demais assistidos
e participantes do plano de benefícios primevo a que eram vinculados, e
consequente violação ao art. 3º, VI, da LC 109/2001. O CDC traça regras que
presidem a situação específica do consumo e, além disso, define princípios
gerais orientadores do direito das obrigações; todavia, "[é] certo que, no
que lhe for específico, o contrato" continua regido pela lei que lhe é
própria. (REsp 80.036/SP, Quarta Turma, DJ 25-3-1996.) Desse modo, em
conformidade com entendimento doutrinário, não cabe a aplicação do CDC
dissociada das normas específicas inerentes à relação contratual de previdência
privada complementar e à modalidade contratual da transação... – negócio
jurídico disciplinado pelo Código Civil, inclusive no tocante à disciplina
peculiar para o seu desfazimento. AgRg no AREsp 504.022-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 10/9/2014.
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE PELO
SALDO DEVEDOR RESIDUAL DE FINANCIAMENTO CELEBRADO NO ÂMBITO DO SFH (ART. 543-C
DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Nos contratos de financiamento celebrados no âmbito
do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), sem cláusula de garantia de cobertura
do Fundo de Compensação das Variações Salariais (FCVS), o saldo devedor
residual deverá ser suportado pelo mutuário. A previsão do saldo devedor
residual decorre da insuficiência das prestações pagas pelo mutuário em repor o
capital mutuado, pois o reajuste das prestações vinculadas aos índices
aplicados à categoria profissional nem sempre acompanha o valor da inflação, o
que cria um desequilíbrio contratual capaz de afetar, em última análise, a
higidez do próprio sistema de financiamento habitacional. Ao lado de tal
circunstância, destaca-se o fato de que o art. 2º do Decreto-Lei 2.349/1987,
legislação específica sobre a matéria, é claro a respeito da responsabilidade
dos mutuários pelo pagamento do saldo devedor residual: “Nos contratos sem
cláusulas de cobertura pelo FCVS, os mutuários finais responderão pelos
resíduos dos saldos devedores existentes, até sua final liquidação, na forma
que for pactuada, observadas as normas expedidas pelo Conselho Monetário
Nacional”. Precedentes citados: AgRg no AREsp 282.132-PB, Terceira Turma, DJe
7/3/2014; e AgRg no AREsp 230.500-AL, Quarta Turma, DJe 28/10/2013. REsp 1.447.108-CE e REsp 1.443.870-PE, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 22/10/2014.
DIREITO CIVIL. CLÁUSULA CONTRATUAL QUE
INSTITUI PRAZO DE CARÊNCIA PARA DEVOLUÇÃO DE VALORES APLICADOS EM TÍTULO DE
CAPITALIZAÇÃO. Desde que redigida em estrita obediência ao previsto na legislação
vigente, é válida a cláusula contratual que prevê prazo de carência para
resgate antecipado dos valores aplicados em título de capitalização. Inicialmente,
importante salientar que a estipulação de cláusula de carência para resgate
visa proteger os recursos da capitalização, a fim de impedir que a desistência
de algum dos aderentes prejudique os demais detentores de títulos dentro de uma
mesma sociedade de capitalização, impedindo o cumprimento de obrigações
previstas pela companhia como, por exemplo, o pagamento da premiação por
sorteio. Deve-se ter em mente que o desfalque repentino do plano, caso não haja
cláusula estipulando a carência, poderá impossibilitar o funcionamento das
sociedades, prejudicando os demais detentores de títulos de capitalização e
colocando em risco a própria atividade econômica. Analisando detidamente os
dispositivos que regulamentam a matéria (art. 71, § 1º, da CNSP 15/1992 e art.
23, §§ 1º e 2º, da Circular Susep 365/2008), nota-se que o primeiro admite,
genericamente, a estipulação de prazo de carência; enquanto o segundo, de forma
específica, permite a fixação de prazo de carência não superior a 24 meses,
contados da data de início de vigência do título de capitalização. Ressalte-se
que a validade de cláusula contratual instituidora de prazo de carência pode
perfeitamente ser analisada à luz da regulamentação do CNSP e da Susep, desde
que sejam respeitados os limites explicitados no ato de delegação respectivo,
qual seja, o Decreto-Lei 261/1967. Ademais, eventual lacuna legislativa também
pode – e deve – ser suprida pela aplicação do CC e do CDC. O sistema de
proteção ao consumidor busca conferir equilíbrio à relação entre consumidor e
fornecedor; todavia, não tem por objetivo criar ou proteger situação em que o
consumidor leve vantagem indevida sobre o fornecedor. EREsp 1.354.963-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado
em 24/9/2014.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
PRORROGAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL NO CASO DE IMPLEMENTAÇÃO DO TERMO AD QUEM
DURANTE O RECESSO FORENSE. Na hipótese em que o Tribunal suspenda, por força de
ato normativo local, os atos processuais durante o recesso forense, o termo
final do prazo prescricional que coincidir com data abrangida pelo referido
recesso prorroga-se para o primeiro dia útil posterior ao término deste. A Corte Especial
do STJ uniformizou o entendimento de que o prazo decadencial para o ajuizamento
da ação rescisória prorroga-se para o primeiro dia útil seguinte, caso venha a
findar no recesso forense, sendo irrelevante a controvérsia acerca da natureza
do prazo para ajuizamento da ação, se prescricional ou decadencial, pois, em
ambos os casos, o termo ad quem seria prorrogado (EREsp 667.672-SP, DJe
26/6/2008). Desse modo, na linha do precedente da Corte Especial e outros
precedentes do STJ, deve-se entender cabível a prorrogação do termo ad quem
do prazo prescricional no caso. Precedentes citados: REsp 969.529-SC, Primeira
Turma, DJe 17/3/2008; e REsp 167.413-SP, Primeira Turma, DJ 24/8/1998. REsp 1.446.608-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
julgado em 21/10/2014.
DIREITO DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE DANO
MORAL IN RE IPSA PROVOCADO POR COMPANHIA AÉREA. No caso em que companhia aérea,
além de atrasar desarrazoadamente o voo de passageiro, deixe de atender aos
apelos deste, furtando-se a fornecer tanto informações claras acerca do
prosseguimento da viagem (em especial, relativamente ao novo horário de
embarque e ao motivo do atraso) quanto alimentação e hospedagem (obrigando-o a
pernoitar no próprio aeroporto), tem-se por configurado dano moral indenizável
in re ipsa, independentemente da causa originária do atraso do voo. Inicialmente,
cumpre destacar que qualquer causa originária do atraso do voo – acidente
aéreo, sobrecarga da malha aérea, condições climáticas desfavoráveis ao
exercício do serviço de transporte aéreo etc. – jamais teria o condão de
afastar a responsabilidade da companhia aérea por abusos praticados por ela em
momento posterior, haja vista tratar-se de fatos distintos. Afinal, se assim
fosse, o caos se instalaria por ocasião de qualquer fatalidade, o que é
inadmissível. Ora, diante de fatos como esses – acidente aéreo, sobrecarga da
malha aérea ou condições climáticas desfavoráveis ao exercício do serviço de
transporte aéreo –, deve a fornecedora do serviço amenizar o desconforto
inerente à ocasião, não podendo, portanto, limitar-se a, de forma evasiva,
eximir-se de suas responsabilidades. Além disso, considerando que o contrato de
transporte consiste em obrigação de resultado, o atraso desarrazoado de voo,
independentemente da sua causa originária, constitui falha no serviço de
transporte aéreo contratado, o que gera para o consumidor direito a assistência
informacional e material. Desse modo, a companhia aérea não se libera do dever
de informação, que, caso cumprido, atenuaria, no mínimo, o caos causado pelo
infortúnio, que jamais poderia ter sido repassado ou imputado ao consumidor.
Ademais, os fatos de inexistir providência quanto à hospedagem para o
passageiro, obrigando-o a pernoitar no próprio aeroporto, e de não ter havido
informações claras quanto ao prosseguimento da viagem permitem aferir que a
companhia aérea não procedeu conforme as disposições do art. 6º do CDC. Sendo
assim, inexiste na hipótese caso fortuito, que, caso existisse, seria
apto a afastar a relação de causalidade entre o defeito do serviço (ausência de
assistência material e informacional) e o dano causado ao consumidor. No caso
analisado, reputa-se configurado o dano moral, porquanto manifesta a lesão
injusta a componentes do complexo de valores protegidos pelo Direito, à qual a
reparação civil é garantida por mandamento constitucional, que objetiva
recompor a vítima da violação de seus direitos de personalidade (art. 5º, V e
X, da CF e art. 6º, VI, do CDC). Além do mais, configurado o fato do serviço, o
fornecedor responde objetivamente pelos danos causados aos consumidores, nos
termos do art. 14 do CDC. Sendo assim, o dano moral em análise opera-se in
re ipsa, prescindindo de prova de prejuízo. Precedentes citados: AgRg no Ag
1.410.645-BA, Terceira Turma, DJe 7/11/2011; e AgRg no REsp 227.005-SP,
Terceira Turma, DJ 17/12/2004. REsp 1.280.372-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 7/10/2014.
DIREITO CIVIL. CONTRATAÇÃO DE SEGURO COM
COBERTURA PARA MORTE ACIDENTAL E POSTERIOR MORTE DO SEGURADO POR CAUSAS
NATURAIS. Contratado apenas o seguro de acidentes pessoais (garantia por morte
acidental), não há falar em obrigação da seguradora em indenizar o beneficiário
quando a morte do segurado decorre de causa natural, a exemplo da doença
conhecida como Acidente Vascular Cerebral (AVC). Inicialmente, é
necessário fazer a distinção entre seguro de vida e seguro de acidentes
pessoais. No primeiro, a cobertura de morte abrange causas naturais e também
causas acidentais; já no segundo, apenas os infortúnios causados por acidente
pessoal são garantidos, como, por exemplo, a morte acidental. Nesse passo,
importante diferenciar também os conceitos de morte acidental e de morte
natural para fins securitários. A morte acidental evidencia-se quando o
falecimento da pessoa decorre de acidente pessoal, sendo este – de acordo a
Resolução CNSP 117/2004 – definido como um evento súbito, exclusivo e
diretamente externo, involuntário e violento. Já a morte natural configura-se
por exclusão, ou seja, por qualquer outra causa, como as doenças em geral, que
são de natureza interna, a exemplo do Acidente Vascular Cerebral. Ressalte-se
que, apesar dessa denominação – “acidente” –, o AVC é uma patologia, ou seja,
não decorre de causa externa, mas de fatores internos e de risco da saúde da
própria pessoa que levam à sua ocorrência. Dessa forma, sendo a morte do
segurado decorrente de causa natural, desencadeada apenas por fatores internos
à pessoa – como o AVC –, e tiver sido contratada apenas a garantia por morte
acidental, não há falar em obrigação da seguradora em indenizar o beneficiário.
REsp 1.443.115-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 21/10/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DE
JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER PARA JULGAR EXECUÇÃO
DE ALIMENTOS POR ELE FIXADOS. O Juizado de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher tem competência para julgar a execução de alimentos que tenham
sido fixados a título de medida protetiva de urgência fundada na Lei Maria da
Penha em favor de filho do casal em conflito. De fato, em se
tratando de alimentos, a regra geral é de que serão fixados perante as varas de
família. Ocorre que a Lei 11.340/2006, em seu artigo 14, estabelece que os
“Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos [...] com
competência cível e criminal, poderão ser criados [...] para o processo, o
julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência
doméstica e familiar contra a mulher”, sem especificar as causas que não se
enquadrariam na competência cível desses juizados, nas hipóteses de medidas
protetivas decorrentes de violência doméstica. Portanto, da literalidade da
lei, é possível extrair que a competência desses juizados compreende toda e
qualquer causa relacionada a fato que configure violência doméstica ou familiar
e não apenas as descritas expressamente na referida lei. E assim é, não só em
razão da lei, mas também em razão da própria natureza protetiva que ela
carrega, ou seja, é a sua naturalia negotii. O legislador, ao editar a
Lei Maria da Penha, o fez para que a mulher pudesse contar não apenas com
legislação repressiva contra o agressor, mas também visando criar mecanismos
céleres protetivos, preventivos e assistenciais a ela. Negar o direito à
celeridade, postergando o recebimento de alimentos com alteração da competência
para outro juízo, quando o especializado já os tenha fixado com urgência, seria
o mesmo que abrir ensejo a uma nova agressão pelo sofrimento imposto pela
demora desnecessária, geradora de imensa perplexidade, retrocessos inaceitáveis
perante Direitos de Terceira Geração. Saliente-se que situação diversa seria a
das Comarcas que não contem com Juizado de Violência Doméstica e Familiar
contra a Mulher, mas apenas com juízos criminais. Aí sim, estes teriam
competência apenas para o julgamento de causas criminais, cabendo às Varas
Cíveis ou de Família a fixação e julgamento dos alimentos. REsp 1.475.006-MT, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em
14/10/2014.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE E
INTERESSE PROCESSUAL DO USUFRUTUÁRIO PARA A PROPOSITURA DE AÇÃO DE CARÁTER
PETITÓRIO. O usufrutuário possui legitimidade e interesse para propor ação
reivindicatória – de caráter petitório – com o objetivo de fazer prevalecer o
seu direito de usufruto sobre o bem, seja contra o nu-proprietário, seja contra
terceiros. A
legitimidade do usufrutuário para reivindicar a coisa, mediante ação petitória,
está amparada no direito de sequela, característica de todos os direitos reais,
entre os quais se enquadra o usufruto, por expressa disposição legal (art. 1.225,
IV, do CC). A ideia de usufruto emerge da consideração que se faz de um bem, no
qual se destacam os poderes de usar e gozar ou usufruir, sendo entregues a uma
pessoa distinta do proprietário, enquanto a este remanesce apenas a substância
da coisa. Ocorre, portanto, um desdobramento dos poderes emanados da
propriedade: enquanto o direito de dispor da coisa permanece com o
nu-proprietário (ius abutendi), a usabilidade e a fruibilidade (ius
utendi e ius fruendi) passam para o usufrutuário. Assim é que o art. 1.394
do CC dispõe que o “usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e
percepção dos frutos”. Desse modo, se é certo que o usufrutuário – na condição
de possuidor direto do bem – pode valer-se das ações possessórias contra o
possuidor indireto (nu-proprietário), também se deve admitir a sua legitimidade
para a propositura de ações de caráter petitório – na condição de titular de um
direito real limitado, dotado de direito de sequela – contra o nu-proprietário
ou qualquer pessoa que obstaculize ou negue o seu direito. A propósito, a
possibilidade de o usufrutuário valer-se da ação petitória para garantir o
direito de usufruto contra o nu-proprietário, e inclusive erga omnes,
encontra amparo na doutrina, que admite a utilização pelo usufrutuário das
ações reivindicatória, confessória, negatória, declaratória, imissão de posse,
entre outras. Precedente citado: REsp 28.863-RJ, Terceira Turma, DJ 22/11/1993.
REsp 1.202.843-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 21/10/2014.
DIREITO CIVIL. REGIME DE PENALIDADES
GRADATIVAS NO CONTRATO DE CONCESSÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. Nos contratos
regidos pela Lei Ferrari (Lei 6.729/1979), ainda que não tenha sido celebrada
convenção de marca dispondo sobre penalidades gradativas (art. 19, XV), é
inválida cláusula que prevê a resolução unilateral do contrato como única
penalidade para as infrações praticadas pela concessionária de veículos
automotores. Isso
porque o art. 19, XV – que prevê o regime de penalidades gradativas – e
o art. 22, § 1º – que condiciona a resolução do contrato por iniciativa da
parte inocente à prévia aplicação de penalidades gradativas – não contêm
nenhuma ressalva quando ao momento em que produzirão efeitos, devendo-se
concluir, com base no art. 6º da LINDB, que a eficácia é imediata. Entender que
o § 1º do art. 22 seria inaplicável devido à inexistência da convenção da marca
sobre as penalidades gradativas, prevista no art. 19, frustraria um dos
principais objetivos da lei, que é impedir a resolução arbitrária do contrato.
De fato, o art. 19, ao estabelecer que "celebrar-se-ão convenções da
marca" para "estabelecer [...] o regime de penalidades
gradativas", não excluiu a possibilidade de as partes pactuarem sobre essa
matéria, enquanto não celebrada a convenção. Com efeito, ao prever uma
convenção da marca sobre o regime de penalidades gradativas, esse dispositivo
buscou garantir um tratamento uniforme das sanções contratuais a serem
aplicadas a todas as concessionárias de uma mesma fabricante – e não suprimir a
liberdade contratual. Noutro passo, como já exposto, o art. 22, § 1º, da Lei
Ferrari condiciona a resolução do contrato por culpa à aplicação de penalidades
gradativas. Ora, se o art. 19 não proíbe a pactuação de penalidades gradativas,
o art. 22 praticamente exige que tais penalidades sejam pactuadas, pois elas
passaram a ser etapa necessária para a resolução do contrato por culpa. O art.
22, § 1º, portanto, ao invés de ser "letra morta", é um mandamento
direcionado aos fabricantes, no sentido de que incluam em seus contratos uma
gradação de penalidades, uma vez que não mais se admite a resolução arbitrária
do contrato. REsp 1.338.292-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 2/9/2014.
DIREITO CIVIL. VALORAÇÃO JUDICIAL DA
GRAVIDADE DA INFRAÇÃO NO CONTRATO DE CONCESSÃO DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. Nos
contratos regidos pela Lei Ferrari (Lei 6.729/1979), não havendo convenção de
marca (art. 19, XV) nem cláusulas contratuais válidas sobre penalidades
gradativas, poderá o juiz decidir, em cada caso concreto, se a infração, ou
sequência de infrações, é grave o suficiente para justificar a resolução do
contrato, observado o caráter protetivo da referida Lei. O art. 19, XV,
da Lei 6.729/1979 dispõe que se celebrarão convenções da marca para estabelecer
normas e procedimentos relativos a regime de penalidades gradativas. O § 1º do
artigo 22, por sua vez, condiciona a resolução do contrato por iniciativa da
parte inocente à prévia aplicação de penalidades gradativas. Posto isso,
esclarece-se que quando não há convenção da marca, nem cláusulas contratuais
válidas sobre as penalidades gradativas, tem-se uma lacuna normativa. Havendo
lacuna, cabe ao juiz supri-la, por força do art. 4º da LINDB. De fato, o juiz
não pode substituir a vontade das partes e estabelecer as penalidades
contratuais cabíveis. Porém, considerando que o objetivo das penalidades
gradativas é impedir a resolução arbitrária do contrato, pode o juiz atender a
esse objetivo da lei, decidindo, em cada caso concreto, se a infração, ou
sequência de infrações, é grave o suficiente para justificar a resolução do
contrato, observado o caráter protetivo da Lei Ferrari. REsp 1.338.292-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 2/9/2014.
DIREITO EMPRESARIAL. UTILIZAÇÃO DE
PROPAGANDA COMPARATIVA. É lícita a propaganda comparativa entre produtos
alimentícios de marcas distintas e de preços próximos no caso em que: a
comparação tenha por objetivo principal o esclarecimento do consumidor; as
informações vinculadas sejam verdadeiras, objetivas, não induzam o consumidor a
erro, não depreciem o produto ou a marca, tampouco sejam abusivas (art. 37, §
2º, do CDC); e os produtos e marcas comparados não sejam passíveis de confusão.
Com
efeito, a propaganda comparativa é a forma de publicidade que identifica
explícita ou implicitamente concorrentes de produtos ou serviços afins,
consagrando-se, em verdade, como um instrumento de decisão do público
consumidor. Embora não haja lei vedando ou autorizando expressamente a
publicidade comparativa, o tema sofre influência das legislações consumerista e
de propriedade industrial nos âmbitos marcário e concorrencial. Pelo prisma dos
arts. 6º, III e IV, 36 e 37, do CDC, a publicidade comparativa não é vedada,
desde que obedeça ao princípio da veracidade das informações, seja objetiva, e
não seja abusiva. Segundo entendimento doutrinário, para que a propaganda
comparativa viole o direito marcário do concorrente, as marcas devem ser
passíveis de confusão ou a referência da marca deve estar cumulada com ato
depreciativo da imagem de seu produto, acarretando a degenerescência e o
consequente desvio de clientela. Além do mais, a doutrina também ensina que a
tendência atual é no sentido de permitir a publicidade comparativa, desde que:
a) o seu conteúdo seja objetivo – isto é, que se mostre sem enganosidade ou
abusividade, confrontando dados e características essenciais e verificáveis
(que não sejam de apreciação exclusivamente subjetiva) –, não se admitindo a
comparação que seja excessivamente geral; b) não seja enganosa (no sentido de
possibilitar a indução em erro dos consumidores e destinatários da mensagem);
c) não veicule informação falsa em detrimento do concorrente; e d) distinga de
modo claro as marcas exibidas, sem dar ensejo a confusão entre os destinatários
da mensagem e sem contribuir para a degenerescência de marca notória. De mais a
mais, a Resolução 126/1996, III, do Mercosul e o art. 32 do Código Brasileiro
de Autorregulamentação Publicitária (CBAP) também mencionam, como limite à
propaganda comparativa – além do fato de não se poder estabelecer confusão
entre os produtos ou marcas e de não ser permitido denegrir o objeto da
comparação – que o seu principal objetivo seja o esclarecimento da informação
ao consumidor. Além disso, a jurisprudência do STJ já se pronunciou no sentido
de que a finalidade da proteção ao uso das marcas – garantida pelo disposto no
art. 5º, XXIX, da CF e regulamentada pelo art. 129 da LPI – é dupla: por um
lado a protege contra usurpação, proveito econômico parasitário e o desvio
desleal de clientela alheia e, por outro, evita que o consumidor seja
confundido quanto à procedência do produto (REsp 1.105.422-MG, Terceira Turma,
DJe 18/5/2011; e REsp 1.320.842-PR, Quarta Turma, DJe 1/7/2013). Entender de
modo diverso seria impedir a livre iniciativa e a livre concorrência (arts. 1º,
IV, 170, caput, e IV, da CF), ensejando restrição desmedida à atividade
econômica e publicitária, o que implicaria retirar do consumidor acesso às
informações referentes aos produtos comercializados e o poderoso instrumento
decisório, não sendo despiciendo lembrar que o direito da concorrência tem como
finalidade última o bem-estar do consumidor. REsp 1.377.911-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado
em 2/10/2014.
DIREITO CIVIL. ERRO NA INDICAÇÃO DO
CREDOR FIDUCIÁRIO EM NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. É nula a notificação
extrajudicial realizada com o fim de constituir em mora o devedor fiduciante de
imóvel, quando na referida comunicação constar nome diverso do real credor
fiduciário. A
notificação em questão (art. 26 da Lei 9.514/1997), para além das consequências
naturais da constituição do devedor fiduciante em mora, permite, em não havendo
a purgação da mora, o surgimento do direito de averbar na matrícula do imóvel a
consolidação da propriedade em nome do credor notificante, isto é, do
fiduciário. Justamente por isso que a referida notificação/intimação do devedor
fiduciante possui requisitos especiais que, se não seguidos, acarretam sua
nulidade. Desse modo, a repercussão da notificação é tamanha que qualquer vício
em seu conteúdo é hábil a tornar nulos seus efeitos, principalmente quando se
trata de erro crasso, como há na troca da pessoa notificante. REsp 1.172.025-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado
em 7/10/2014.
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