sexta-feira, 29 de junho de 2012

STJ EDITA 10 NOVAS SÚMULAS.

Corte Especial do STJ aprova dez novas súmulas. 

Fonte MIGALHAS.

29/6/2012
A Corte Especial do STJ aprovou nesta quinta-feira, 28, dez novas súmulas. Elas são o resumo de entendimento consolidado nos julgamentos da Corte. Embora não tenham efeito vinculante, servem de orientação a toda a comunidade jurídica sobre a jurisprudência firmada pelo tribunal que tem a missão constitucional de unificar a interpretação da lei federal no país. Confira os enunciados:
Justiça gratuita para pessoa jurídica
Súmula 481: "Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais."
Extinção de processo cautelar
Súmula 482: "A falta de ajuizamento da ação principal no prazo do art. 806 do CPC acarreta a perda da eficácia da liminar deferida e a extinção do processo cautelar."
Depósito prévio pelo INSS
Súmula 483: "O INSS não está obrigado a efetuar depósito prévio do preparo por gozar das prerrogativas e privilégios da Fazenda Pública."
Preparo após fechamento dos bancos
Súmula 484: "Admite-se que o preparo seja efetuado no primeiro dia útil subsequente, quando a interposição do recurso ocorrer após o encerramento do expediente bancário."
Arbitragem
Súmula 485: "A Lei de Arbitragem aplica-se aos contratos que contenham cláusula arbitral, ainda que celebrados antes da sua edição."
Impenhorabilidade de imóvel locado
Súmula 486: "É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família."
Título judicial com base em norma inconstitucional
Súmula 487: "O parágrafo único do art. 741 do CPC não se aplica às sentenças transitadas em julgado em data anterior à da sua vigência."
Repartição de honorários
Súmula 488: "O parágrafo 2º do art. 6º da Lei 9.469/97, que obriga à repartição dos honorários advocatícios, é inaplicável a acordos ou transações celebrados em data anterior à sua vigência."  
Continência de ação civil pública
Súmula 489: "Reconhecida a continência, devem ser reunidas na Justiça Federal as ações civis públicas propostas nesta e na Justiça estadual."
Condenação inferior a 60 salários mínimos
Súmula 490: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a 60 salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas."

quarta-feira, 27 de junho de 2012

VEM AÍ O V CONGRESSO PAULISTA DE DIREITO DE FAMÍLIA DO IBDFAMSP.











LOCAL: TEATRO FREI CANECA. SÃO PAULO. CAPITA.
DATA: 23 A 25 DE AGOSTO DE 2012.

TEMA: PATRIMÔNIO E SUCESSÃO. 

PALESTRANTES CONVIDADOS:
- MIN. SIDNEI BENETI.
- GISELDA HIRONAKA.
- RODRIGO DA CUNHA PEREIRA. 
- EUCLIDES BENEDITO DE OLIVEIRA.
- ANTONIO CARLOS MATHIAS COLTRO.
- FRANCISO JOSÉ CAHALI. 
- GLADSTON MAMEDE.
- ROLF MADALENO.
- JOSÉ FERNANDO SIMÃO.
- FLÁVIO TARTUCE.
- JOÃO AGUIRRE.
- MARCELO TRUZZI OTERO.
- MÁRIO LUIZ DELGADO.
- CHRISTIANO CASSETTARI

terça-feira, 26 de junho de 2012

ARTIGO DE RODRIGO DA CUNHA PEREIRA SOBRE O ABANDONO AFETIVO.

DEVER DOS PAIS.

Rodrigo da Cunha Pereira. Doutor em Direito Civil pela UFPR. Presidente do IBDFAM-Nacional. Advogado.

O STJ julgou em 24/04 uma de suas ações mais importantes sob o ponto de vista do alcance social e político. Ele condenou um pai a indenizar sua filha por tê-la abandonado afetivamente. Já tivemos decisões semelhantes nos tribunais do RS, SC, PR, SP e pioneiramente em Minas Gerais em 2004. Também é inédito o fato de o STJ reposicionar-se sobre a questão, imprimindo-lhe força. Em 2005, ele havia negado pedido semelhante.
A revolução paradigmática desta decisão é que ela absorve de vez e põe em seu devido lugar o valor e princípio jurídico norteador e catalisador de todas as relações de família: o afeto. Para o Direito, ele vai muito além de sentimento. Não se pode obrigar ninguém a amar ninguém. 
Mas o Estado deve chamar à responsabilidade aqueles que não cuidam de seus filhos através da reparação civil. A afetividade pode se traduzir como fonte de obrigação jurídica porque significa atenção, imposição de limites, convivência e todos os cuidados necessários para o desenvolvimento saudável de uma criança ou adolescente. Sem isso não há sujeito, não há humanidade. 
É obrigação dos pais cuidarem dos seus filhos. E aqueles que descumprem tal obrigação estão infringindo regras do Código Civil (art.1634, II) e o princípio constitucional da paternidade responsável devendo sofrer as sanções da lei, sob pena de ela tornar-se mera regra moral, ou seja, virar letra morta.
Um pai condenado a indenizar o filho pelo descumprimento da obrigação jurídica de educá-lo certamente se afastará ainda mais do filho. Isto é óbvio! 
Mas quem opta por entrar na Justiça também já esgotou todas as tentativas de aproximação e deve ter passado toda a vida esperando e mendigando algum afeto deste pai (mães dificilmente abandonam o filho) e este ato é apenas o seu grito de desespero já que nada mais podia ser feito. Pelo menos ele pôde perguntar oficialmente: Pai, por que me abandonaste? O valor da indenização é simbólico, pedagógico e educativo e até poderia ser destinado a instituições de crianças abandonadas. Não há dinheiro no mundo que pague o abandono afetivo. Isto também é óbvio.
A dor de um filho abandonado pelo pai, que o privou do direito à convivência, de amparo afetivo, moral e psíquico e de ser cuidado por ele, afronta também o princípio da dignidade humana. Kant já tinha "cantado essa bola" há séculos em sua Fundamentação da Metafísica dos Costumes: o amor enquanto inclinação não pode ser ordenado, mas o bem fazer por dever, que rende em princípios de ação e não em compaixão. É só esse amor que pode ser ordenado.
Se os pais fossem mais presentes na vida de seus filhos, desejados ou não, planejados ou não, os índices de criminalidade juvenil, gravidez na adolescência, drogadição e outros sintomas de desestruturação do sujeito poderiam ser reduzidos. Daí a dimensão social e política da decisão do STJ que apenas confirmou que os pais devem ser responsabilizados juridicamente pelo necessário dever de criação, educação e cuidado dos filhos

sexta-feira, 22 de junho de 2012

RESUMO. INFORMATIVO 499 DO STJ.

SÚMULA n. 472

A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 473

O mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 474

A indenização do seguro DPVAT, em caso de invalidez parcial do beneficiário, será paga de forma proporcional ao grau da invalidez. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 475

Responde pelos danos decorrentes de protesto indevido o endossatário que recebe por endosso translativo título de crédito contendo vício formal extrínseco ou intrínseco, ficando ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 476

O endossatário de título de crédito por endosso-mandato só responde por danos decorrentes de protesto indevido se extrapolar os poderes de mandatário. Rel. Min. Raul Araújo, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 477

A decadência do art. 26 do CDC não é aplicável à prestação de contas para obter esclarecimentos sobre cobrança de taxas, tarifas e encargos bancários. Rel. Min. Raul Araújo, em 13/6/2012.

SÚMULA n. 478

Na execução de crédito relativo a cotas condominiais, este tem preferência sobre o hipotecário. Rel. Min. Raul Araújo, em 13/6/2012.

JUROS COMPENSATÓRIOS ("JUROS NO PÉ"). INCIDÊNCIA ANTERIOR À ENTREGA DAS CHAVES. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA.

A Seção, por maioria, decidiu que não é abusiva a cláusula de cobrança de juros compensatórios incidentes em período anterior à entrega das chaves nos contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em construção sob o regime de incorporação imobiliária. Observou o Min. Antonio Carlos Ferreira que, a rigor, o pagamento pela compra de um imóvel em fase de produção deveria ser feito à vista. Não obstante, em favorecimento financeiro ao comprador, o incorporador pode estipular o adimplemento da obrigação mediante o parcelamento do preço, inclusive, em regra, a prazos que vão além do tempo previsto para o término da obra. Em tal hipótese, afigura-se legítima a cobrança dos juros compensatórios, pois o incorporador, além de assumir os riscos do empreendimento, antecipa os recursos para o seu regular andamento. Destacou-se que seria injusto pagar na compra parcelada o mesmo valor correspondente da compra à vista. Acrescentou-se, ainda, que, sendo esses juros compensatórios um dos custos financeiros da incorporação imobiliária suportados pelo adquirente, deve ser convencionado expressamente no contrato ou incluído no preço final da obra. Concluiu-se que, para a segurança do consumidor, em observância ao direito de informação insculpido no art. 6º, II, do CDC, é conveniente a previsão expressa dos juros compensatórios sobre todo o valor parcelado na aquisição do bem, permitindo, dessa forma, o controle pelo Judiciário. Além disso, afirmou o Min. Antonio Carlos Ferreira que se esses juros não puderem ser convencionados no contrato, serão incluídos no preço final da obra e suportados pelo adquirente, sendo dosados, porém, de acordo com a boa ou má intenção do incorporador. Com base nesse entendimento, deu-se provimento aos embargos de divergência para reconhecer a legalidade da cláusula contratual que previu a cobrança dos juros compensatórios de 1% a partir da assinatura do contrato. EREsp 670.117-PB, Rel. originário Min. Sidnei Beneti, Rel. para acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira, julgados em 13/6/2012


 
INDENIZAÇÃO. DESPESAS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA.

A reclamante, vencedora na demanda, não tem direito de exigir ressarcimento pelas despesas pagas com honorários advocatícios contratuais para o ajuizamento da reclamação trabalhista. Inicialmente, destacou-se que, nos termos do art. 114 da CF, após a redação dada pela EC 45/2004, é da Justiça do Trabalho a competência para a análise da questão levantada no presente recurso. Contudo, no caso específico, diante da jurisdição iterada, cuja competência se determina derivadamente da competência jurisdicional de origem, cabe a esta Corte julgar os embargos de divergência, em que se apontam como paradigma decisões em recurso especial deste Tribunal. Quanto ao mérito, asseverou-se que a simples contratação de advogado para o ajuizamento de reclamação trabalhista não induz, por si só, a existência de ilícito gerador de danos materiais. Segundo se afirmou, não há qualquer ilicitude tanto na conduta do reclamado em defender-se como na do reclamante de obter uma prestação jurisdicional – o direito de ação –, sendo-lhes, ao contrário, direitos assegurados constitucionalmente. Acrescentou-se, ademais, que é facultativa a constituição de advogado para o acompanhamento das demandas na Justiça do Trabalho, logo não seria possível responsabilizar o reclamado por tal fato. EREsp 1.155.527-MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgados em 13/6/2012.


AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. CONVERSÃO DO DEPÓSITO EXTRAJUDICIAL EM JUDICIAL.

Compete ao depositante o ônus de comprovar à instituição financeira depositária a efetiva propositura da ação de consignação em pagamento para que o depósito extrajudicial passe a ser tratado como judicial (art. 6º, parágrafo único, da Res. n. 2.814 do Bacen). Isso porque nos depósitos feitos extrajudicialmente incide a correção monetária pela TR e, com o ajuizamento da ação consignatória, passam a incidir as regras referentes às cadernetas de poupança. Assim, o banco depositário não está obrigado a efetuar a complementação dos depósitos feitos, de início, extrajudicialmente, para fazer incidir a remuneração conforme os índices da caderneta de poupança, quando o depositante não o informou da propositura da ação. Portanto, o ônus de complementar os valores faltantes cabe ao depositante, pois foi ele quem deixou de cumprir seu dever de notificar o banco. RMS 28.841-SP, Rel. Sidnei Beneti, julgado em 12/6/2012. 



DANO MORAL. PRESERVATIVO EM EXTRATO DE TOMATE.

A Turma manteve a indenização de R$ 10.000,00 por danos morais para a consumidora que encontrou um preservativo masculino no interior de uma lata de extrato de tomate, visto que o fabricante tem responsabilidade objetiva pelos produtos que disponibiliza no mercado, ainda que se trate de um sistema de fabricação totalmente automatizado, no qual, em princípio, não ocorre intervenção humana. O fato de a consumidora ter dado entrevista aos meios de comunicação não fere seu direito à indenização; ao contrário, divulgar tal fato, demonstrando a justiça feita, faz parte do processo de reparação do mal causado, exercendo uma função educadora. Precedente: REsp 1.239.060-MG, DJe 18/5/2011. REsp 1.317.611-RS, Min. Rel. Nancy Andrighi, julgado em 12/6/2012.


ACIDENTE DE TRABALHO. DANOS MORAIS. CULPA DE NATUREZA LEVE. AFASTAMENTO DA SÚM. N. 229/STF.

No caso, o recorrente processou a recorrida, empresa industrial, buscando indenização por danos morais, estéticos e emergentes cumulados com lucros cessantes decorrentes de acidente do trabalho. Alegou que, por não trabalhar com equipamentos de proteção, sofreu graves sequelas em acidente ocorrido em 1980. A sentença, proferida antes da EC n. 45/2004, reconheceu a culpa da recorrida e condenou-a a pagar quinhentos salários mínimos por danos morais, mais a diferença entre o valor recebido do INSS e seu último salário, até atingir 65 anos de idade. O acórdão recorrido deu provimento à apelação da recorrida, concluindo que, somente com o advento da CF/1988, é que passou a ser devida a parte da indenização pelo ato ilícito em dano causado por acidente ocorrido no trabalho, independentemente do grau da culpa. O Min. Relator asseverou que a jurisprudência da Terceira e da Quarta Turma firmou-se no sentido de que, desde a edição da Lei n. 6.367/1976, para a responsabilidade do empregador, basta a demonstração da culpa, ainda que de natureza leve, não sendo mais aplicável a Súm. n. 229/STF, que previa a responsabilização apenas em casos de dolo ou culpa grave. Uma vez reconhecida a culpa da recorrida, cumpre ao STJ aplicar o direito à espécie, nos termos do art. 257 do RISTJ e da Súm. n. 456/STF, por analogia. Assim, perfeitamente cabível a condenação em danos morais. Diante dessa e de outras considerações, a Turma deu parcial provimento ao recurso e fixou a indenização em R$ 250 mil, devendo a correção monetária ser contada a partir da publicação da presente decisão e os juros de mora a partir da data do evento danoso, nos termos da Súm. n. 54/STJ. Em acréscimo, deverá a recorrida pagar mensalmente ao recorrente a diferença salarial determinada pela sentença nos termos por ela fixados, até a data em que o recorrente completar 65 anos de idade. REsp 406.815-MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 12/6/2012. 


INDENIZAÇÃO. MATÉRIA JORNALÍSTICA. DIREITO DE INFORMAR. LIBERDADE DE IMPRENSA.

A Turma deu provimento ao recurso para afastar a responsabilização da empresa jornalística, ora recorrente, pelo pagamento de indenização ao recorrido (magistrado), sob o entendimento de que, no caso, não existiria ilícito civil, pois a recorrente teria atuado nos limites do exercício de informar e do princípio da liberdade da imprensa. O Min. Relator observou que a análise relativa à ocorrência de abuso no exercício da liberdade de expressão jornalística a ensejar reparação civil por dano moral a direitos da personalidade fica a depender do exame de cada caso concreto; pois, em tese, sopesados os valores em conflito, máxime quando atingida pessoa investida de autoridade pública, mostra-se recomendável que se dê prevalência à liberdade de informação e de crítica. Na hipótese dos autos, tem-se que a matéria jornalística relacionou-se a fatos de interesse da coletividade, os quais dizem respeito diretamente aos atos e comportamentos do recorrido na condição de autoridade. Tratou a recorrente, na reportagem, em abordagem não apenas noticiosa, mas sobretudo de ácida crítica que atingiu o ora recorrido, numa zona fronteiriça, de marcos imprecisos, entre o limite da liberdade de expressão e o limiar do abuso do direito ao exercício dessa liberdade. Esses extremos podem ser identificados no título e noutras passagens sarcásticas da notícia veiculada de forma crítica. Essas, porém, estão inseridas na matéria jornalística de cunho informativo, baseada em levantamentos de fatos de interesse público, que não extrapola claramente o direito de crítica, principalmente porque exercida em relação a casos que ostentam gravidade e ampla repercussão social. O relatório final da "CPI do Judiciário" fora divulgado no mesmo mês da publicação da matéria jornalística, em dezembro de 1999; elaborada, portanto, sob o impacto e a influência daquele documento público relevante para a vida nacional. E como fatos graves foram imputados ao ora recorrido naquele relatório, é natural que revista de circulação nacional tenha dado destaque à notícia e emitido cáustica opinião, entendendo-se amparada no teor daquele documento público. Portanto, essa contemporaneidade entre os eventos da divulgação do relatório final da CPI e da publicação da notícia eivada de ácida crítica ao magistrado é levada em conta para descaracterizar o abuso no exercício da liberdade de imprensa. Desse modo, embora não se possa duvidar do sofrimento experimentado pelo recorrido, a revelar a presença de dano moral, este não se mostra indenizável, dadas as circunstâncias do caso, por força daquela "imperiosa cláusula de modicidade" subjacente a que alude a Suprema Corte no julgamento da ADPF 130-DF. Precedentes citados do STF: ADPF 130-DF, DJe de 5/11/2009; do STJ: REsp 828.107-SP, DJ 25/9/2006. REsp 801.109-DF, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 12/6/2012.

 
APLICAÇÃO. REPARAÇÃO. ART. 387, IV, DO CPP.

A alteração advinda da Lei n. 11.719/2008, que determinou ao juiz que, ao proferir a sentença condenatória, fixe o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (art. 387, IV, do CPP), é norma processual. Tal norma modificou apenas o momento em que deve ser fixado o mencionado valor, aplicando-se imediatamente às sentenças proferidas após a sua entrada em vigor. Ocorre que, no caso, inexistem elementos suficientes para que o juiz fixe um valor, ainda que mínimo, para reparar os danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido (ou seus sucessores). Além disso, na hipótese, o delito é homicídio e eventuais danos não são de simples fixação, até porque provavelmente são de natureza material e moral. Assim, não houve contrariedade ao dispositivo legal supradito. REsp 1.176.708-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 12/6/2012.

 

quarta-feira, 20 de junho de 2012

DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DO TJSP. DOCUMENTÁRIO SOBRE O GOLEIRO BRUNO PODERÁ SER EXIBIDO. TUTELA DA LIBERDADE DE IMPRENSA.


Fonte: Migalhas.

Documentário sobre caso do goleiro Bruno poderá ser exibido

20/6/2012



A juíza Patricia Maiello Ribeiro Prado, da 41ª vara Cível de SP, negou ontem, 19, liminar que pedia a proibição de um documentário que seria exibido por uma emissora de TV a cabo, sobre o caso envolvendo o ex-goleiro Bruno e a ex-modelo Eliza Samudio.


Os advogados do ex-atleta requeriam a suspensão do uso de sua imagem de forma vinculada à condição de culpado, pedindo a condenação da emissora ao pagamento de indenização por danos morais, danos patrimoniais e, ainda, lucros cessantes.

A defesa de Bruno alegava em seu pedido que "a divulgação de programa jornalístico narrando os fatos a ele imputados como crime, ainda sob investigação judicial, atingiriam sua imagem por ficar vinculado à figura de culpado pelo fato criminoso".

A magistrada, no entanto, afirmou em sua decisão que "não é possível extrair tal ofensa à sua honra ou imagem, pois a mera narrativa dos fatos e discussão sobre eles, por si só, não pode ser obstada pelo Poder Judiciário, sob pena de haver verdadeira censura prévia, o que é vedado. A liberdade de imprensa e de informação assegura o direito à veiculação de toda e qualquer informação de interesse público".

E prosseguiu, lembrando que, "desse modo, a divulgação dos fatos, ainda que criminosos e não julgados por decisão transitada em julgado, não pode ser impedida, cabendo a ré cuidar para não incorrer em sensacionalismo e exposição desnecessária da imagem do envolvido".
A magistrada determinou também que o autor apresente, em 10 dias, o montante pretendido a título de indenização por danos morais, pois o pedido sem a indicação de qualquer parâmetro viola o artigo 286 do CPC. "A apresentação de pedido incerto dificulta sobremaneira a defesa, pois não sabendo qual o valor que a indenização poderá atingir a parte não tem parâmetros para escolher qual o advogado mais adequado para patrocinar a defesa dos seus interesses", disse ainda na decisão.
Veja a íntegra da decisão.
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Despacho Proferido
Vistos. 1.
Trata-se de ação indenizatória com pedido de tutela antecipada ajuizada por BRUNO FERNANDES DAS DORES DE SOUZA contra CANAL A&E, ambos qualificados nos autos, visando, em caráter liminar, a suspensão do uso de sua imagem de forma vinculada à condição de culpado pela prática de ato ilícito ainda não julgado por decisão transitada em julgado por meio do Canal A&E e do site www.canalae.com.br.
Ao final, requer a procedência do pedido para condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais a serem arbitrados, danos patrimoniais e, ainda, lucros cessantes. É sabido que a liberdade de imprensa e de informação, embora sejam princípios constitucionais, não são absolutas, devendo serem exercidas pelos meios de comunicação com responsabilidade, ética e consciência para que sejam respeitados outros direitos e garantias fundamentais igualmente assegurados no texto constitucional a todos os cidadãos, tais como: a intimidade, a privacidade, a honra, a imagem das pessoas. Evidente, portanto, que se trata de clássica hipótese em que há a colidência de direitos constitucionais, os quais devem ser limitados entre si (princípio da relatividade ou da convivência das liberdades públicas).
No caso dos autos, o autor alega que a divulgação de programa jornalístico narrando os fatos a ele imputados como crime, e ainda sob investigação judicial, atingiriam sua imagem por ficar vinculado à figura de culpado pelo fato criminoso.
Ocorre que, em sede de cognição sumária, não é possível extrair tal ofensa à sua honra ou imagem, pois a mera narrativa dos fatos e discussão sobre eles, por si só, não pode ser obstada pelo Poder Judiciário, sob pena de haver verdadeira censura prévia, o que é vedado.
Ora, a liberdade de imprensa e de informação assegura o direito à veiculação de toda e qualquer informação de interesse público, cabendo ao meio de comunicação acautelar-se para não se distanciar do “animus narrandi”.
E, caso não observada tal cautela, passa a responder, civil e criminalmente, pelo ato praticado, que, certamente, ofenderá a honra do autor.
Desse modo, a divulgação dos fatos, ainda que criminosos e não julgados por decisão transitada em julgado, não pode ser impedida, cabendo à ré cuidar para não incorrer em sensacionalismo e exposição desnecessária da imagem do envolvido, ora autor.
Ante o exposto, ausente a verossimilhança do direito alegado, indefiro a liminar requerida. 2. Emende o autor à inicial, em 10 dias, estimando o montante pretendido a título de indenização por danos morais e recolhendo as custas em complemento.
Tal se dá porque o pedido de fixação pelo juízo, sem a indicação de qualquer parâmetro, viola o artigo 286, do CPC, observando-se que a hipótese não se enquadra em nenhuma das exceções previstas no indigitado artigo. Em realidade, melhor do que ninguém sabe a parte estimar o montante em pecúnia que deseja para ver reparado o dano moral dito sofrido.
A apresentação de pedido incerto dificulta sobremaneira a defesa.
Não sabendo qual o valor que a indenização poderá atingir, a parte não tem parâmetros sequer para escolher qual o advogado mais adequado para patrocinar a defesa dos seus interesses.
A parte fica à mercê do entendimento do magistrado e não tem como apresentar defesa específica sobre eventual exorbitância da pretensão.
De outra banda, o pedido incerto torna cômoda a situação do autor.
No caso de improcedência, a sucumbência será mínima, o que não daria se a parte expressamente indicasse o montante pretendido e este fosse alto.
No mesmo prazo, regularize o autor a representação processual, trazendo aos autos a via original da procuração e substabelecimento acostados aos autos (fls. 35/36), bem como junte aos autos a declaração atualizada de bens para que seja apreciada a gratuidade processual requerida.
Int.

STJ APROVA SETE NOVAS SÚMULAS SOBRE DIREITO PRIVADO.

FONTE: SITE DO STJ. 

19/06/2012 - 10h49 

SÚMULAS  - Segunda Seção aprova sete novas súmulas sobre direito privado.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou sete enunciados de súmulas relativas a matérias de direito privado. As súmulas do STJ não têm efeito vinculante, mas servem de resumo e consolidação do entendimento consensual do Tribunal.
Das súmulas aprovadas, cinco decorrem de decisões em recursos representativos de controvérsia repetitiva. Quando publicadas, os precedentes e referências legislativas que as embasaram poderão ser consultados por meio da página de pesquisa de jurisprudência do site do STJ. 

Comissão de permanência
A Súmula 472 trata da cobrança de comissão de permanência. Diz o enunciado: “A cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.”

Seguro habitacional
A Súmula 473 dispõe que “o mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada”.

DPVAT
O seguro DPVAT é objeto da Súmula 474: “A indenização do seguro DPVAT, em caso de invalidez parcial do beneficiário, será paga de forma proporcional ao grau da invalidez.”

Protesto indevido
A responsabilidade do endossatário por protesto indevido é abordada nas Súmulas 475 e 476. Diz o texto aprovado para a Súmula 475: “Responde pelos danos decorrentes de protesto indevido o endossatário que recebe por endosso translativo título de crédito contendo vício formal extrínseco ou intrínseco, ficando ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes e avalistas.”
Já a Súmula 476 dispõe que “o endossatário de título de crédito por endosso-mandato só responde por danos decorrentes de protesto indevido se extrapolar os poderes de mandatário”.

Prestação de contas
A aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em ação de prestação de contas é tratada na Súmula 477: “A decadência do artigo 26 do CDC não é aplicável à prestação de contas para obter esclarecimentos sobre cobrança de taxas, tarifas e encargos bancários”.

Preferência de crédito
Já a Súmula 478 aborda a questão da preferência dos créditos condominiais sobre o hipotecário. Diz o enunciado: “Na execução de crédito relativo a cotas condominiais, este tem preferência sobre o hipotecário.”

segunda-feira, 18 de junho de 2012

LIBERDADE X TUTELA DA IMAGEM. BIOGRAFIA DE ANDERSON SILVA RETIRADA DO MERCADO.

FONTE: Migalhas. 18.06.2012.  

Vai encarar?

Proibida a comercialização da biografia do lutador Anderson Silva

18/6/2012
A juíza de Direito Sibele Lustosa, da 14ª vara Cível de Curitiba/PR, deferiu liminar para proibir a comercialização da biografia de Anderson Silva "Anderson Spider Silva – O relato de um campeão nos ringues da vida". O pedido foi feito por Rudimar Fedrigo, dono da academia na qual o lutador dos pesos-médios do UFC treinou no início da carreira.

Segundo Rudimar, a obra contém depoimento de Anderson a um jornalista da Folha de S. Paulo, no qual o lutador teria falado que ele prejudicou outros lutadores e que o considerava "uma pessoa do mal".
Para Fedrigo, o atleta ofendeu sua honra e cometeu injúria e difamação ao afirmar ainda que ele "nunca tomou um beliscão na vida" e ao colocar em dúvida a lisura de pagamentos da academia a lutadores. O ex-treinador também reivindica uma indenização por danos morais.
  • Processo: 0030124-25.2012.8.16.0001
Veja abaixo a íntegra da decisão.

I - RUDIMAR FEDRIGO ajuizou ação deobrigação de fazer contra ANDERSON SILVA eSEXTANTE GMT EDITORES LTDA.
Aduz, em sintese, que no livro "Anderson Spider Silva - O relato de um campeão nos ringues da vida" - lançado pela segunda ré e no qual o primeiro, em depoimento a um jornalista, narra a sua vida - há trechos que violam a intimidade, a vida privada e a honra do autor. Requer, em liminar, seja a ré Sextante a)compelida a recolher os exemplares já distribuídos e à venda, mas ainda sob sua consignação, b) proibida de distribuir os livros existentes em estoque sob sua guarda, c) bem como de realizar nova edição da obra sem exclusão dos trechos sobre o autor, tudo sob pena de multa.II - Cumpre, de inicio, consignar que li nesta manhã o livro em questão, cujo exemplar instrui a petição inicial.
De fato, há trechos na obra que autorizam a concessão da liminar.
Isso porque na p. 62 afirma ser o autor "do mal" e que teria prejudicado outras pessoas. Repete às f. 81/82 a afirmação de que Rudimar prejudicou pessoas. Na p. 73 diz que "Rudimar, dono da academia nunca tomou um beliscão na vida, nem faixa preta é".
Ainda, coloca em dúvida a postura do autor, ao mencionar que um integrante da academia Chute Boxe teria proferido palavras "pesadas e lançavam uma sombra sobre a eventual lisura na prestação de contas da Chute Boxe" (p.88) e, na p. seguinte, que palavras ainda mais pesadas foram ditas, que "atingiam a honra de Rudimar".
Portanto, a principio e em juízo de cognição sumária, e não obstante o direito de livre manifestação,não se pode ignorar que as afirmações atingem esfera intima do autor. É grave acusação de que o proprietário e professor de academia que promove lutas nem faixa preta seria, ao passo que o autor, por sua vez, trouxe um certificado às f. 86. Ainda mais quando o primeiro réu narra e destaca no livro a necessidade do titulo para ministrar aulas (p. 61/62).Também atribuir a outrem a pecha de pessoa "do mal" e por em dúvida sua lisura atingem sua honra subjetiva.Portanto, a principio, a impressão é de uma intenção de desqualificar o autor. Ressalte-se que a tutela a título inibitório resguarda de forma muito mais eficiente o bem jurídico do que indenização posterior, se for o caso.
Considerando, ainda, que o autor afirma não ter sido consultado nem autorizado, presentes elementos a deferir a liminar.
Por isso, defiro o pedido de liminar, para determinar que a segunda ré: a) recolha, no prazo de dez dias, em todos os pontos de venda os exemplares do livro "Anderson Spider Silva - O relato de um campeão nos ringues da vida" que estejam sob a sua guarda, já distribuídos e à venda, ou seja, tão somente aqueles que estão sob sua consignação (excluídos os exemplares vendidos pela ré aos pontos de venda, e que já não mais lhe pertencem) , sob pena de multa de R$300,00 (trezentos reais) por exemplar nãorecolhido;b) não distribua exemplares existentes em estoque sob sua guarda, igualmente sob pena de multa deR$300,00 (trezentos reais) por exemplar, cuja comercialização e distribuição seja posterior à intimação dessa decisão e c) bem como não realize nova edição da obra semexclusão dos trechos sobre o autor, também sob pena de multa de R$300,00 (trezentos reais) por exemplar cuja comercialização, distribuição ou edição sejam posteriores à intimação dessa decisão.
III - Intimem-se da liminar e citem-se os réus para apresentar contestação no prazo de quinze dias, e por intermédio de advogado, sob pena de presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial.
IV - Com as respostas, intime-se para impugnação.
Int. Dil.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

CURSO AASP. DIREITO CONTRATUAL. TEMAS ATUAIS.




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Curso - Direito Contratual: polêmicas atuais A AASP - Associação dos Advogados de São Paulo promoverá, no período de 18 a 21 de junho de 2012, às 19 h, o curso intitulado “DIREITO CONTRATUAL: POLÊMICAS ATUAIS”, com transmissão ao vivo, via satélite, para diversas cidades do Brasil, em locais com total conforto e estrutura.

Coordenação
Dr. Flávio Tartuce

Corpo docente
Dr. André Borges de Carvalho Barros
Dr. Bruno Miragem
Dr. Flávio Tartuce
Dr. José Fernando Simão

Serão abordamos os seguintes temas
- A tutela contratual do consumidor e suas polêmicas.
- Locação imobiliária: recentes alterações legislativas e suas consequências.
- Questões polêmicas relativas ao contrato de fiança.
- O contrato de seguro na atual jurisprudência do STJ.

Durante as exposições os participantes poderão fazer indagações aos palestrantes.

Escolha a cidade e faça sua inscrição pela Internet até 17/6.

Para se inscrever na modalidade presencial (São Paulo), Clique Aqui.

CIDADES

AÇAILÂNDIA/MA

ALVORADA DO OESTE/RO

ARAGUAÍNA/TO

BAGÉ/RS

BALSAS/MA

BENTO GONÇALVES/RS

BURITIS/RO

CACOAL/RO

CARUARU/PE

COLORADO DO OESTE/RO

FARROUPILHA/RS

FRANCA/SP

GARANHUNS/PE

GURUPI/TO

JARU/RO

JI-PARANÁ/RO

LAJEADO/RS

MACAPÁ/AP

MONTES CLAROS/MG

OURO PRETO DOESTE/RO

PIMENTA BUENO/RO

PORTO ALEGRE/RS

PORTO VELHO/RO

PRESIDENTE MÉDICE/RO

RECIFE/PE

RIO PARDO/RS

ROLIM DE MOURA/RO

ROSÁRIO DO SUL/RS

SANTA MARIA/RS

SANTOS/SP

SÃO LEOPOLDO/RS

SÃO LUIS/MA

SARANDI/RS

SOBRADINHO/RS

TEÓFILO OTONI/MG

TRAMANDAÍ/RS

URUGUAIANA/RS

VENÂNCIO AIRES/RS

VAGAS LIMITADAS

Informações: telefone (11) 3291 9200

sexta-feira, 8 de junho de 2012

RESUMO. INFORMATIVO 498 DO STJ.

COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS.
A Seção, por maioria, entendeu ser da Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar ação de cobrança de honorários advocatícios contratuais em razão dos serviços prestados em ação trabalhista. No caso, advogados prestaram serviços para sindicato, sendo que a entidade figurou no polo ativo na qualidade de substituto dos seus filiados. Em razão do reconhecimento da miserabilidade dos substituídos, foram fixados honorários sucumbenciais de 15% (Súm. n. 229, III, do TST). Com o êxito na ação, o sindicato requereu a retenção de parte do crédito devido aos substituídos para pagamento de honorários contratuais, com base no art. 22, § 4º, da Lei n. 8.906/1994. Após ter o pedido indeferido na Justiça do Trabalho, os advogados ajuizaram diversas ações de cobrança individuais na Justiça estadual, obtendo a antecipação da tutela. Em seguida, foi encaminhado ofício da Justiça estadual para Justiça do Trabalho solicitando a constrição dos valores para pagamento dos honorários contratuais. Por entender ser competente para apreciação da questão, o juízo trabalhista suscitou o conflito de competência. O Min. Relator destacou o enunciado da Súm. 363/STJ, que determina a competência da Justiça estadual para execução de honorários advocatícios contratuais. Contudo, como havia pedido de retenção de verba nos autos da execução trabalhista, com base no art. 22, § 4º, do EOAB, a competência é da Justiça especializada. Com esses argumentos, a Seção, por maioria, reconheceu a competência da Justiça laboral, cassando a antecipação de tutela deferida pela Justiça comum por ser descabida. Precedentes citados: CC 110.959-SP, DJe 29/3/2011, e CC 111.172-AM, DJe 18/11/2010. CC 112.748-PE, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 23/5/2012.


HC. EXECUÇÃO DE DÉBITO ALIMENTAR. PRISÃO CIVIL. NATUREZA DAS VERBAS.
Apenas o inadimplemento de verbas de caráter alimentar autoriza a execução nos termos do rito previsto no art. 733 do CPC. A verba destinada à ex-esposa para manutenção de sítio –que não constitui sua moradia – até a efetivação da partilha dos bens comuns do casal não tem natureza jurídica de alimentos. Logo é insuficiente para embasar o decreto de prisão civil por dívida alimentar. Na espécie, tal verba foi estabelecida com o objetivo de impedir que a ex-esposa, responsável pela administração do bem comum do casal até a partilha, retirasse da sua pensão alimentícia, destinada, única e exclusivamente, a sua subsistência, o valor necessário ao custeio de outras despesas, no caso, a manutenção de bem imóvel de responsabilidade de ambos os litigantes.HC 232.405-RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 22/5/2012.

DENUNCIAÇÃO DA LIDE. CDC. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO.

A Turma, ao rever orientação dominante desta Corte, assentou que é incabível a denunciação da lide nas ações indenizatórias decorrentes da relação de consumo seja no caso de responsabilidade pelo fato do produto, seja no caso de responsabilidade pelo fato do serviço (arts. 12 a 17 do CDC). Asseverou o Min. Relator que, segundo melhor exegese do enunciado normativo do art. 88 do CDC, a vedação ao direito de denunciação da lide não se restringiria exclusivamente à responsabilidade do comerciante pelo fato do produto (art. 13 do CDC), mas a todo e qualquer responsável (real, aparente ou presumido) que indenize os prejuízos sofridos pelo consumidor. Segundo afirmou, a proibição do direito de regresso na mesma ação objetiva evitar a procrastinação do feito, tendo em vista a dedução no processo de uma nova causa de pedir, com fundamento distinto da formulada pelo consumidor, qual seja, a discussão da responsabilidade subjetiva. Destacou-se, ainda, que a única hipótese na qual se admite a intervenção de terceiro nas ações que versem sobre relação de consumo é o caso de chamamento ao processo do segurador – nos contratos de seguro celebrado pelos fornecedores para garantir a sua responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (art. 101, II, do CDC). Com base nesse entendimento, a Turma negou provimento ao recurso especial para manter a exclusão de empresa prestadora de serviço da ação em que se pleiteia compensação por danos morais em razão de instalação indevida de linhas telefônicas em nome do autor e posterior inscrição de seu nome em cadastro de devedores de inadimplentes.REsp 1.165.279-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 22/5/2012.

PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. COMUNICABILIDADE DA ESFERA PENAL E CIVIL.
A extinção da punibilidade, em função da prescrição retroativa, não vincula o juízo cível na apreciação de pedido de indenização decorrente do ato delituoso. No caso, após o atropelamento, foram ajuizadas uma ação penal por lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (art. 303 do CTB) e uma ação de reparação de danos materiais e morais pela vítima. A ação cível ficou suspensa até a conclusão da penal. Quanto a esta, a sentença reconheceu a autoria e materialidade do fato e aplicou a pena. Na apelação, o tribunal acolheu a preliminar de prescrição, na forma retroativa, da pretensão punitiva do Estado. Retomado o julgamento da ação indenizatória, a sentença julgou improcedente o pedido, reconhecendo a culpa exclusiva da vítima, fundamentando-se nas provas produzidas nos autos. Na apelação, o tribunal reformou a sentença com base exclusiva no reconhecimento da autoria e materialidade presentes na sentença criminal, condenando a motorista ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. Dessa decisão foi interposto o recurso especial. O Min. Relator afirmou ser excepcional a hipótese de comunicação das esferas cível e penal, conforme interpretação do art. 1.525 do CC/1916 (art. 935 do CC/2002) e do art. 65 do CPP. Ressaltou, ainda, que o art. 63 do CPP condiciona a execução cível da sentença penal condenatória à formação da coisa julgada no juízo criminal. No caso, não houve reconhecimento definitivo da autoria e materialidade delitiva, pois o acórdão, ao reconhecer a prescrição da pretensão punitiva, rescindiu a sentença penal condenatória e extinguiu todos os seus efeitos, incluindo o efeito civil previsto no art. 91, I, do CP. Com esses e outros argumentos, a Turma deu provimento ao recurso para anular o acórdão do Tribunal de origem e determinar novo julgamento da apelação, com base nos elementos de prova do processo cível, podendo, ainda, ser utilizados os elementos probatórios produzidos no juízo penal, a título de prova emprestada, observado o contraditório. REsp 678.143-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 22/5/2012

quarta-feira, 6 de junho de 2012

ARTIGO DE JOSÉ FERNANDO SIMÃO SOBRE RECENTE DECISÃO DO STJ SOBRE ABANDONO AFETIVO.


De Alexandre a Luciane - da cumplicidade pelo Abandono ao Abandono punido!
 
José Fernando Simão. Livre-docente, Doutor e Mestre pela Faculdade de Direito da USP. Professor associado do Departamento de Direito Civil da USP. Advogado e consultor jurídico. 
 
Fonte: Jornal Carta Forense. 
 

Alexandre, menino das Minas Gerais, fruto do casamento de seus pais, criado no amor e afeto até seus sete anos.
Luciane, nascida fora do casamento em terras paulistanas, com o estigma da bastardia que ainda paira na sociedade brasileira, apesar de afrontar claramente os preceitos constitucionais.
Alexandre foi vítima de um fenômeno comum. Seus pais se divorciaram, e com o fim da conjugalidade e constituição de nova família, seu pai entendeu que havia se encerrado a parentalidade, negando-se a conviver com o menor, a ter com ele qualquer relação que não a jurídica.
Luciane, por sua vez, nunca teve um pai em sentido fático ou jurídico. Só conseguiu ser reconhecida como filha após um longo procedimento judicial, e, mesmo assim, após o reconhecimento, só recebeu de seu pai hostilidades.
Alexandre recebia a pensão religiosamente, e materialmente estava provido. Seu pai entendia que seus deveres aí se encerravam, já que o convívio com o filho era um direito seu e, como qualquer direito, poderia não ser exercido.
Luciane não recebeu o apoio material que decorre da paternidade, tendo sofrido privações desde sua infância. Após o reconhecimento da paternidade por meio de decisão judicial, Luciane precisou ainda exigir judicialmente os alimentos, porque continuava a ser ignorada por seu pai.
As diferenças entre Alexandre e Luciane são diversas, mas algo os une: foram vítimas de uma das mais perversas condutas por parte de seus pais: o ABANDONO FILIAL.
O pai de Alexandre teve novos filhos em seu segundo casamento. O pai de Luciane teve filhos em seu casamento. Quanto a estes, os filhos da nova união (pai de Alexandre) ou da união desejada e socialmente aceita (pai de Luciane) o tratamento se revelava impecável. Carinho, presença, preocupação, um bom dia ao acordarem, um feliz Natal no dia 25 de dezembro, as férias na praia e muito carinho, até nos pequenos gestos, como um sorvete oferecido, uma brincadeira na piscina, um bilhete de feliz aniversário.
Já com relação a Alexandre e Luciane, havia apenas uma conduta: a absoluta indiferença. Seus pais nunca se preocuparam se os filhos estavam bem, se sentiam dores ou frio, se comida havia na sua mesa, se teriam férias, se tinham bom desempenho escolar, se aquela febre advinha de uma gripe ou de doença mais séria.
Não passaram juntos sequer um dia dos pais, um Natal em família, uma viagem de férias, um aniversário dos menores. Não receberam presentes, nem carinho, nem bilhetes, nem um bom dia, nem uma pergunta sobre sua saúde, se estavam felizes ou não.
Além destas semelhanças e das diferenças apontadas, Alexandre e Luciane se distinguem pela forma de tratamento que receberam do Poder Judiciário: no caso do Alexandre houve por parte do Judiciário uma cumplicidade, o abandono contou com as bênçãos do STJ. Já no caso de Luciane, o STJ fez Justiça com "J" maiúsculo.
Em 29 de novembro de 2005, disse o STJ o seguinte: "RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária." (REsp 757.411/MG, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES).
As razões invocadas pelo Ministro Relator para ser cúmplice do abandono e chancelar o desamparo, dando a benção estatal é de causar estranheza: "O pai, após condenado a indenizar o filho por não lhe ter atendido às necessidades de afeto, encontrará ambiente para reconstruir o relacionamento ou, ao contrário, se verá definitivamente afastado daquele pela barreira erguida durante o processo litigioso? Quem sabe admitindo a indenização por abandono moral não estaremos enterrando em definitivo a possibilidade de um pai, seja no presente, seja perto da velhice, buscar o amparo do amor dos filhos".
A razão do decisum é curiosa e pode ser traduzida pela seguinte ideia: se o pai se negou a ser pai durante o período em que Alexandre mais precisava, quem sabe Alexandre será um bom filho quando seu pai, na velhice, dele precisar?
Afirmou o Ministro Fernando Gonçalves: "por certo um litígio entre as partes reduziria drasticamente a esperança do filho de se ver acolhido, ainda que tardiamente, pelo amor paterno. O deferimento do pedido, não atenderia, ainda, o objetivo de reparação financeira, porquanto o amparo nesse sentido já é providenciado com a pensão alimentícia, nem mesmo alcançaria efeito punitivo e dissuasório, porquanto já obtidos com outros meios previstos na legislação civil, conforme acima esclarecido."
E quais seriam as sanções possíveis, segundo o Ministro? A perda do poder familiar. O argumento beira o ridículo. Se o pai fosse destituído do poder familiar seria premiado, porque se veria totalmente livre de seus deveres. A destituição do poder familiar ocorreria no interesse do pai e não do menor!
A conclusão do julgado que puniu Alexandre foi a seguinte: "Como escapa ao arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar, ou a manter um relacionamento afetivo, nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a indenização pleiteada."
Esta frase demonstra um velho ranço de alguns juristas, minoritários é verdade. Falar de conceitos sem os conhecê-los o que acaba por gerar absurdos jurídicos. O direito não define afeto. A disciplina que o faz é a psicanálise.
Em momento nenhum Alexandre pretendia receber indenização por falta de amor. Seria uma tese pueril a ser defendida por alguém de bom senso. Amor é algo camoniano, fogo que arde sem se ver, ferida que dói e não se sente. Amor e afeto não se confundem conforme veremos.
Em 02 de maio de 2012, o mesmo STJ, com nova composição, atento a um direito de família mais humano e solidário, julgou o caso da Luciane. A Ministra Nancy Andrighi deixou claro que "na hipótese, não se discute o amar - que é uma faculdade - mas sim a imposição biológica e constitucional de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerar ou adotar filhos" (Informativo STJ 496, REsp 1.1.59.242/SP)[1].
Confundir cuidado com amor foi erro lamentável que abonou o abandono e serviu de estímulos aos péssimos genitores. Esclarecer que amor e afeto não se confundem revelou, de maneira pedagógica, a sensibilidade da Ministra Nancy Andrighi.
Afeto, segundo definição da psicanálise, nas palavras Giselle Câmara Groeninga, é, "no direito, em ramos da filosofia e no senso comum, identificado com o amor. Em nossa visão positivista era inclusive visto como dissociado do pensamento. Mas, ele é muito mais do que isto. Sem dúvida, uma qualidade que nos caracteriza é a ampla gama de sentimentos com que somos dotados e que nos vinculam - uns aos outros, de forma original face a outras espécies. Com base nos afetos, que se transformam em sentimentos, é que criamos as relações intersubjetivas - compostas de razão e emoção - do que nos move. À diferença dos outros animais, somos constituídos, além dos instintos, de sua tradução mental em impulsos de vida e de morte. Estes ganham a qualidade mental de afetos - energia mental com a qualidade de ligação, de vinculação = libido, Eros, ou de desligamento, de não existência = morte, Thanatos. São estes impulsos que nos afetam, desde dentro, e que se transformam em sentimentos - que ganham um sentido, uma direção na relação com as outras pessoas, com nuances que variam do amor ao ódio, em combinações variadas. É por meio dos afetos que valorizamos e julgamos a experiência em prazerosa, desprazerosa, boa, má. Mas vamos além disto, e valoramos nossas experiências também de acordo com o pensamento, com a experiência e com valores construídos nas relações e apreendidos do meio social. São os afetos que nos vinculam das mais diversas formas às pessoas. E é certo que também somos afetados pelos estímulos externos que são traduzidos, interpretados mentalmente segundo as experiências passadas e a valoração que lhes foram atribuídas. Somos seres axiológicos por excelência, e parte desta qualidade que nos é inerente vem justamente dos afetos" (Descumprimento do dever de convivência: danos morais por abandono afetivo. A interdisciplina sintoniza o direito de família com o direito à família. In A outra face do Poder Judiciário - Decisões inovadoras e mudanças de paradigmas. Coord. Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka. Belo Horizonte: Del Rey/São Paulo: Escola Paulista de Direito - EPD. 2005).
A valorização do afeto remonta ao brilhante trabalho de João Baptista Vilella, jurista de primeira grandeza, escrito no início da década de 80, tratando da desbiologização da paternidade. Na essência, o trabalho procura dizer que o vínculo familiar seria mais um vínculo de afeto do que um vínculo biológico. Assim surgiria uma nova forma de parentesco civil, a parentalidade socioafetiva, baseada na posse de estado de filho.
O julgado em que o STJ pune o abandono e põe fim à irresponsabilidade parental ressalta que "os sentimentos de mágoa e tristeza causados pela negligência paterna e o tratamento como filha de segunda classe, que a recorrida levará ad perpetuam, é perfeitamente apreensível e exsurgem das omissões do pai (recorrente) no exercício de seu dever de cuidado em relação à filha e também de suas ações que privilegiaram parte de sua prole em detrimento dela, caracterizando o dano in re ipsa e traduzindo-se, assim, em causa eficiente à compensação".
Frisou o Ministro Sidnei Beneti, que "os atos pelos quais se exteriorizou o abandono, que devem ser considerados neste processo, não são genéricos, mas, sim, concretos, apontados na petição inicial como fatos integrantes da causa de pedir, ou seja: 1º) Aquisição de propriedades, por simulação, em nome dos outros filhos;  2º) Desatendimento a reclamações da autora quanto a essa forma de aquisição disfarçada; 3º) Falta de carinho, afeto, amor e atenção, apoio moral, nunca havendo sentado no colo do pai, nunca recebendo conselhos, experiência e ajuda na escola, cultural e financeira;  4º) Falta de auxílio em despesas médicas, escolares, abrigo, vestuário e outras; 5º) Pagamento de pensão somente por via judicial; 6º) Somente haver sido reconhecida judicialmente como filha".
A clareza da argumentação do Ministro Beneti fala por si. Nada mais a acrescentar. O Poder Judiciário se revelou coerente com a função que dele se esperar: atribuiu responsabilidade a quem tem e dela se furta.
Fala-ser em "monetarização do afeto", como pensam alguns, é algo pueril que significa ausência completa de conhecimento jurídico. É lição basilar que a indenização tem por escopo retornar a vítima ao estado anterior ao dano (statu quo ante). Contudo, há casos em que este retorno, esta volta se revelam impossíveis. Há mais de dois séculos o Direito já decidiu que, sendo o retorno impossível, a vítima recebe um valor pecuniário, não para reparar o que não pode reparar, mas para compensar aquilo que se perdeu. Nesse sentido, toda a indenização por dano moral (exemplo clássico é a morte de um parente querido) significaria "monetarização do afeto"? Quem defende esta tese pueril, poderia responder qual seria a forma adequada de se punir o causador de dano moral.
A indenização muito representa para Luciane e para muitas outras pessoas abandonadas afetivamente. Para Luciane, compensa-se um vazio, já que os danos que sofreu são irreparáveis. O dinheiro não preenche o vazio, mas dá uma sensação de que a conduta lesiva não ficou impune. Para outros filhos abandonados, nasce a esperança de que poderão receber do Poder Judiciário uma decisão que puna os maus pais, já que o afeto não receberam e nunca receberão.
Para os pais, que se comportam como doadores de esperma, ou como provedores materiais descompromissados, fica o aviso: a irresponsabilidade será punida! A conduta lesiva não será tolerada pelo Poder Judiciário. 
E, para o Ministro Fernando Gonçalves fica uma lição. 
A Justiça tarda mas não falha.


[1].   O TJ/SP já havia admitido esta reparação no ano de 2008.  "Responsabilidade civil. Dano moral. Autor abandonado pelo pai desde a gravidez da sua genitora e reconhecido como filho somente após propositura de ação judicial. Discriminação em face dos irmãos. Abandono moral e material caracterizados. Abalo psíquico. Indenização devida. Sentença reformada. Recurso provido para este fim. Apelação com revisão 5119034700", TJSP, Rel. Des. CAETANO LAGRASTA, j. 12.8.2008).



terça-feira, 5 de junho de 2012

MEIO AMBIENTE LABORAL FUTEBOLÍSTICO E RESPONSABILIDADE CIVIL. DE NEY MARANHÃO.

Meio ambiente laboral futebolístico e responsabilidade civil
Publicado em 06/2012
Abordaremos apenas alguns aspectos da temática da responsabilidade civil e suas implicações junto ao complexo mundo do atleta de futebol.

1. INTRODUÇÃO

O mundo do atleta de futebol – geralmente tratado, no senso comum, com um ar fantasioso, recheado de noções ligadas à fama e ao dinheiro – contém uma dimensão pouco refletida: sua específica facetalaborativa.
Uma vez que detentora de uma estruturação fático-jurídica extremamente peculiar, as poucas tentativas de aproximação científica praticadas em direção ao contexto laboral futebolístico acabam por ser enormemente dificultadas. Mas essa missão se torna bem mais espinhosa quando o ponto de vista do intérprete volta-se à rica teoria da reparação de danos.
Neste breve texto, ousaremos dar alguns passos nesse terreno assaz pantanoso. Para tanto, abordaremosapenas alguns aspectos da temática da responsabilidade civil e suas implicações junto ao complexo mundo do atleta de futebol.
Desde logo fica o alerta: o objetivo do escrito não se volta aoferecer respostas prontas e acabadas. O escopo de qualquer incursão científica, que busca entrecruzar teoria e prática, sempre será uma empreitada marcada, ao mesmo tempo, pela ousadia e cautela, pela ânsia de compreender e pela humildade de respeitar. Eis o espírito que norteou este breve arrazoado, do início ao fim.
Cuida-se, aqui, portanto e por ora, de um punhado de pequenas reflexões, a merecer prosseguimento investigatório, lançando luz sobre um tão específico e muitas vezes negligenciado campo da vivência juslaboral.

2. NECESSÁRIO ALICERCE TEÓRICO: MEIO AMBIENTE LABORAL FUTEBOLÍSTICO E PROTEÇÃO DA PESSOA HUMANA ENQUANTO ATLETA DE FUTEBOL

Permitimo-nos alinhavar, adiante, mesmo que rapidamente, algo do que forma o alicerce teórico deste estudo, a fim de conferir maior inteligibilidade às colocações que se seguem e maior cientificidade às singelas reflexões que almejamos ofertar.

2.1. Rede Protetiva Geral: Aproximando-se da Esplendorosa Axiologia Constitucional

A Constituição Federal fixou como fundamento da República a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), tendo como um de seus objetivos fundamentais a promoção do bem de todos (CF, art. 3º, IV), ficando garantido, também a todos, o direito à igualdade e à segurança (CF, art. 5º, caput), firmando-se, no plano juslaboral, um valioso fomento à ampliação de uma rede protetiva cada vez mais intensa e garantidora da dignidade humana do trabalhador (CF, art. 7º, caput), resguardando-se também a todos os trabalhadores – inclusive quando atleta de futebol – o direito de redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (CF, art. 7º, XXII).
Nosso ordenamento jurídico exige ainda que tanto a propriedade quanto o contrato atinjam sua função social[1]. Noutras palavras: o empregador–mesmo sendo entidade de prática desportiva–,seja na dimensão jurídico-patrimonial de seus bens, seja na dimensão jurídico-contratual de seus trabalhadores, precisa se realizar, como pessoa jurídica, no cotidiano, dentro das asas da “livre iniciativa”, todavia vinculado ao desiderato maior de, em última instância, sempre prestar homenagem à dignidade humana e aos demais princípios substanciais incrustrados no bojo constitucional. No fundo mesmo, a verdade é que a iniciativa empresarial nada tem de “livre”, à vista da sua necessária adstrição à função social que a Constituição se lhe impõe.
Não sem razão nossa Constituição Federal, ao elencar os fundamentos da República Federativa do Brasil, também aponta como tal “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa” (CF, artigo 1º, IV). Perceba-se, por oportuno, que, pela clara dicção do texto constitucional, nem o “trabalho” e nem a “livre iniciativa”, em si mesmos considerados, constituem fundamento da República Federativa do Brasil, mas, isto sim, a expressão social desses fenômenos, a sua incontornável conformação axiológica aos ditames constitucionais, ou seja, se e somente se densificados na realidade prática enquanto elementos que se harmonizem para a construção de uma sociedade cada vez mais livre, justa e solidária (CF, artigo 3º, I), com a promoção do bem de todos (CF, artigo 3º, IV).

2.2. Rede Protetiva da Pessoa Humana: Confrontando Papéis Sociais

Cogitemos de estar emum belo sábado, ocasião em que determinada pessoa dirige-se ao supermercado, assumindo, ipso facto, de modo preponderante, o papel social de consumidor. Enquanto tal, usufrui, no campo da teoria da reparação de danos, de toda uma prodigiosa rede protetiva que lhe reserva a possibilidade de buscar reparações sem qualquer necessidade de demonstrar culpa por parte do lesionante, ou seja, é de ordem objetiva. Não é só: havendo mais de um ofensor, a responsabilidade que se impõe a cada qual é compartilhada e direta, ou seja, é de matiz solidário[2].
Estamos, agora, no domingo, quando a mesma pessoa dirige-se ao estádio de futebol, assumindo, precipuamente, o papel social detorcedor[3]. Nesse cenário, na mesma esteira do que ocorre quando compra um liquidificador ou um sanduíche, passa a gozar de uma rede protetiva que garante ressarcimento que prescinde de prova do elemento culpa (objetiva) e engloba, em uma inarredável responsabilidade solidária, todos aqueles que concorreram para uma eventual lesão que venha a sofrer (Lei n° 10.671/2003, art. 39-B).
Invadimos, neste momento, a temida segunda-feira, quando o mesmo cidadão então se desloca ao seu local de trabalho – o mesmíssimo supermercado que visitou no sábado. Agora, investindo-se, preponderantemente, do papel social de trabalhador, tem para si, segundo a exegese que tradicionalmente se faz do ordenamento jurídico, uma responsabilidade civil subjetiva (CF, art. 7º, XXVIII[4]), a demandarinequívoca prova do fator culpa, resguardando, em face daqueles que se agregam para lhe causar dano, uma responsabilidade meramente subsidiária[5].
Ora, chega mesmo a ser gritante a discrepância de tratamento que o sistema jurídico confere à pessoa humana, a depender do papel social em que preponderantemente está investida.Causa espécie a falta de razoabilidade das conclusões que brotam de um tal cenário jurídico, onde a pessoa humana consumidora e torcedora é mais valorizada que a pessoa humana trabalhadora. Noutras palavras:não se pode aceitar a fixação de um modelo de sociedade em que o homem que vai ao supermercado e ao estádio de futebol goza de maior proteção social que aquele que está no trabalho.Aqui, a nosso sentir, sucede franca violação do postulado constitucional da igualdade material (CF, art. 3º, IV, e art. 5º, caput).
Registre-se, por oportuno, que quando o texto constitucional fala no bem de todos, não abarca apenas a noção comum, presa a uma ótica meramente quantitativa, alusiva à necessidade de que tal benesse abarque o maior número de pessoas. É preciso ir além, injetando na expressão “bem de todos” o máximo de eficácia existenciale socialque sua dicção permitir, de modo a legitimar a conclusão de que esse bem deve alcançar a integralidade da mesma pessoa, seja em face de toda a sua especial conformação psicossomática (corpo, alma e espírito), seja em face de todos os papéis sociais que lograr assumir em sua complexa trajetória de vida (pai, filho, trabalhador, contratante, eleitor, consumidor, torcedor etc.).

2.3. A Permanente Construção de uma Específica Rede Protetiva Destinada a Tutelar a Dignidade Humana do Trabalhador no Âmbito da Teoria da Responsabilidade Civil

Muito embora seja comum se afirmar que, no particular da responsabilidade civil patronal, há de incidir a responsabilidade subjetiva, por força do que dispõe o artigo 7º, inciso XXVIII, da Carta da República, é preciso lembrar, também, que no caput desse mesmo dispositivo está consagrada, em semelhante nível constitucional, a cláusula devedação de retrocesso quanto às condições sociais do trabalhador, quando reza serem direitos dos trabalhadores urbanos e rurais aqueles ali relacionados, “além de outros que visem à melhoria de sua condição social”.
Na verdade – é bom que se diga –, o que pretendeu mesmo o legislador constituinte não foi simplesmente fixar uma cláusula de não retrocesso social, como corriqueiramente divulgado nos sítios doutrinários. In vero, foi bem mais além, na medida em que tencionou mesmo foi prescrever, em termos mais precisos, uma cláusula de crescente avanço social, como expressão de algo maior, qual seja, a cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana (CF, artigos 1º, inciso III, e 5º, § 2º)[6].
Destarte, o que se deduz é que nossas disposições constitucionais, quando consideradas com mais vagar, revelam-nos um estupendo estímulo a produções jurídicas que se prestem a dar contínua concretude ao comando de seelevar, cada vez mais, ao longo do tempo, a condição social do cidadão trabalhador, enquanto expressão de tutela da sua dignidade humana (CF, artigo 1º, III) e dos valores sociais do trabalho (CF, artigo 1º, IV, artigo 5º, caput, artigo 6º, caput, artigo 170, caput e artigo 193).
O artigo 7º, caput, in fine, da Carta da República, representa tão-somente a expressão específica de um comando muito maior, também expressamentevisualizadona CartaConstitucional. É algo como uma cláusula particular defomento ao contínuo processo de avanço das condições sociais de vida da classe obreira. E onde estaria a cláusula geral? Está situada no artigo 5º, § 2º, da Lex Legum, assim vazado: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (grifamos).Portanto, ambas incorporam notáveis cláusulas jurídicas que impelem a continuidade desse interessante fluxo normativo tendente à contínua proteção do trabalhador.
Logo, incorrem em gravíssimo equívoco aqueles que se abraçam, de olhos fechados, à gramaticalidade do texto constitucional, para afirmar que a fixação da responsabilidade subjetiva do empregador aos casos de danos causados aos trabalhadores em geral representaria uma incontornável diretriz restritiva imposta pelo legislador constituinte, de modo a frustrar qualquer intenção em se aplicar, a favor da classe obreira, uma responsabilidade civil de ordem objetiva[7].
Pois bem. Diante da influência desse vetor, que almeja densificar, no máximo de sua potencialidade, a dignidade da pessoa humana do trabalhador, podemos concluir que, por exemplo, no caso de acidentes de trabalho, a regra seria a incidência da responsabilidade civil subjetiva, todavia, caso o empregador desempenhe atividade que induza risco diferenciado a desfavor do obreiro, incidirá a responsabilidade objetiva, mercê do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil[8]medida que se impõe como mais um fator de melhoria da condição social do obreiro, exatamente como propugnou a Constituição Federal na cabeça de seu artigo 7º.
Deveras, estamos mesmo convencidos que o Código Civil de 2002, ao estatuir uma cláusula geral de responsabilidade civil objetiva pelo risco da atividade (artigo 927, parágrafo único), trouxe ao cenário jurídico uma disposição altamente útil para esse desiderato de aprimorar a condição social do trabalhador, já que no mundo hodierno há diversas atividades empresariais cuja execução implica natural indução do obreiro a riscos mais acentuados que aqueles suportados pelos demais membros da sociedade.
Noutras palavras: ao garantir a plena reparabilidade dos danos ocasionados aos obreiros, decorrentes do risco que sua dinâmica laborativa lhes impõe, por certo esse dispositivo cível se encaixa como uma luva no anseio constitucional de contínuo fomento à melhoria da condição social do trabalhador. Há, portanto, uma íntima conexão técnico-axiológica entre o artigo 7º, caput, da Carta da República, e o artigo 927, parágrafo único, do Código Civil de 2002, claramente lavrada na ambiência do paradigma contemporâneo da responsabilidade civil, que tem seguido na linha de se buscar ao máximo a plena reparação da vítima de danos injustos[9].
Há mais: em se partindo da perspectiva aqui defendida, também se descortina a possibilidade de refletir a incidência da responsabilidade civil objetiva, em prol da proteção da pessoa humana do trabalhador, quando se estiver diante de eventos danosos de cunho ambiental. 
Perceba-se, a propósito, que está inequivocamente sedimentado no âmbito do direito brasileiro que o meio ambiente laboral constitui relevante dimensão do meio ambiente em geral, fato que decorre do próprio texto da Carta Magna (CF, art. 200, VIII[10]) e que já ecoa altissonante na mais abalizada doutrina jurídica ambiental[11], bem assim na jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal[12]. Por consequência, em determinadas ocasiões todo o plexo tuitivo afeto ao Direito Ambiental também há de ser canalizado, com seu intenso vigor normativo, perante os domínios do Direito do Trabalho, o que inclui, por certo, a responsabilidade objetiva e solidária que dele naturalmente floresce[13].
No caso em tela, a própria prática do futebol, reconhecidamente um esporte que exige elevado esforço muscular e constante contato físico com o adversário, é atividade cujos riscos implicados são mesmo patentes, na medida em que facilitadora, por exemplo, de lesões e fraturas[14]. Além disso, a natural exposição ao público torcedor também é elemento potencializador de riscos, o que é algo até certo ponto natural quando se está diante de grandes aglomerados de pessoas.Não há dúvidas, portanto, que sua atuação futebolística o insere em uma especial condição de risco, bem superior àquela que rodeia o cidadão comum[15].
Como gizamos alhures, o trabalhador, segundo expresso comando constitucional, tem o direito à redução dos riscos inerentes ao seu trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (CF, art. 7º, XXII), sendo essa uma diretriz que invariavelmente também há de beneficiar aquele específico trabalhador que desempenha suas atividades no seio futebolístico.
Logo, quando um clube de futebol propicia, voluntária ou involuntariamente, o surgimento ou a continuidade de uma prática ou de um ambiente que produz riscos acentuados à saúde física e mental do atleta de futebol, com malferimento de sua dignidade humana, a estruturação jurídica advinda desse pacto de trabalho deixa de cumprir sua incontornável finalidade social, desbordando das balizas ético-sociais que lhe foram constitucionalmente impostas, seja por ofensa direta à dignidade dessa específica modalidade de trabalhador, seja por ofensa indireta à própria sociedade, que, ali, naquele “microcosmos” fático-social, vê frustrado o intento constitucional de garantir o bem de todos.

3.RÁPIDA INCURSÃO PRÁTICA: DANOS À SAÚDE FÍSICA E MENTAL DO ATLETA DE FUTEBOL – ALGUMAS SITUAÇÕES-TIPO

Constitui tarefa impossível esgotar as hipóteses em que podem ocorrer possíveis danos à figura do atleta de futebol, enquanto pessoa humana trabalhadora. Servimo-nos, então, a partir de agora, de alguns casos mais emblemáticos e que certamente suscitam enorme desafio às reflexões do jurista preocupado com a reparação de danos na seara futebolística. Vejamos.

3.1. Assédio Moral: Jogadores, Comissão Técnica, Dirigentes, Crônica Esportiva, Patrocinadores, Ostracismo e Torcida

O assédio moral é figura reconhecidamente multidimensional. Cuida-se de fenômeno altamente complexo e que se realiza de diferentes maneiras.
Infelizmente, a figura do assédio moral é muito comum no campo futebolístico.
Não raro se ouve falar do assédio de determinados jogadores em relação ao técnico, regra geral materializado pelo insistente “corpo mole” expressado em campo, no velado objetivo de, pela sequência de resultados insatisfatórios, proporcionar a demissão do líder do escrete. Esse instrumento de afetação da dignidade humana também sói acontecer através de um único jogador, seja pela sua capacidade de agregação, seja pelo seu nome e fama. Cuida-se de genuíno assédio moral vertical ascendente.
Também é comum o assédio do técnico em relação a um ou mais jogadores, deixando-os fora da escalação da equipe titular ou mesmo do próprio banco de reservas, por motivos alheios à qualidade futebolística.Acontece ainda de serem lançados a um injustificado treinamento ou preparo físico totalmente à parte do grupo, inclusive em local diverso daquele em que costumeiramente se reúnem,em circunstâncias claramente reveladoras de imposição de umadesocupação sistemática e arbitrária, com sérios prejuízos à dignidade humana e à carreira do atleta[16].
A realidade demonstraque essa péssima ocorrência, aliada a duras e contundentes cobranças,pode também advir da Diretoria do clube empregador. Logo em seguida a alguma derrota da equipe frente a um jogo relevante,já é mesmo notória a reunião que se segue nos vestiários, “a portas fechadas” edirigidaquase sempre pelo seu Presidente, cujo conteúdo, comenta-se, seriaexageradamente ríspido, confrontador e humilhante.
O assédio pode decorrer também da própriacrônica esportiva, que, a depender do grau de penetração de mídia e influência política na Diretoria do Clube, pode certamente perseguir determinado profissional pertencente ao elenco.
O mesmo pode ocorrer no que concerne à própria torcida, notadamente as torcidas organizadas, cujo envolvimento com a Diretoria do Clube podemcertamente redundar na mesma tática de perseguição e assédio. Não raro, os próprios membros da Diretoria do Clube autorizam que integrantes de torcidas organizadas ingressem no campo de treinamento com vistas a fazer cobranças de melhores resultados, inclusive buscando fazer influência na própria escalação do time.
É possível ir mais longe. Ouve-se, aqui e acolá, acerca da enorme influência alcançada pelos próprios patrocinadoreseempresários, que, investindo alto no grupo ou mesmo que apenas em determinado atleta, lançam mão de influenciar na silhueta tática da equipe e no grupo que comporá a escalação titular, de modo a favorecer aos seus exclusivos interesses comerciais.
Cuida-se, nessas últimas situações, de genuíno assédio moral vertical descendente.
Igualmente, sucede de ocorrer problemas entre os próprios jogadores, de modo a decidirem isolar, por completo, do ambiente coletivo da equipe, um ou alguns de seus integrantes. Cuida-se, já aqui, de típico caso de assédio moral horizontal[17].

3.2. Assédio Sexual: Categorias de Base, Confinamento e Escalação

Quanto ao assédio sexual, infelizmente também é fator muito presente no meio ambiente laboral futebolístico, principalmente nas categorias de base. Há denúncias dando conta de que o ambiente de alguns alojamentos e departamentos futebolísticos seria marcado pelo abuso em face de crianças e adolescentes, debaixo de simples promessas de fornecimento de alimentação, vale-transporte ou mesmo materiais esportivos, como chuteiras, luvas e uniforme. Esse é um combate extremamente difícil, haja vista as notórias dificuldades em se controlar tal tipo de agrupamento humano, aliado ao eloquente silêncio que expressa o medo em fazer a denúncia. Trata-se, aqui, de um aspecto que mereceria especial atenção por parte do Ministério Público do Trabalho.
O mesmo assédio sexual se potencializarianos constantes lapsos de tempo reservados à concentração, quando as dimensões física e emocional, em tese,deveriam ser inteiramente resguardadas e aplicadas na busca do êxito da equipe frente a determinado jogo ou torneio[18]. Registre-se, ademais, que o assédio sexual também pode ser fator de contundente influência na própria escalação da equipe, com prejuízo aos aspectos técnico e ético do certame, com franca violação da dignidade humana do atleta de futebol.

3.3.Preparo Físico Extenuante

Tem sido cada vez mais frequente a queixa de determinados jogadores quanto a um invocado excesso de exercícios impostos pelo preparador físico do Clube, gerando um grau de extenuação muscular altamente facilitador de lesões. Tal situação se agrava na medida em que sobre os atletas recai um grau de subordinação bem mais forte que aquele existente junto aos trabalhadores em geral[19], o que favorece uma mais fácil submissão a procedimentos físicos perigosamente exaurientes.
Efetivamente, impõe-se aos empregadores futebolísticos que atentem para uma programação de exercícios físicos adequada ao perfil psicossomático de cada atleta e dentro dos parâmetros clínicos consentâneos com as peculiaridades de organismo reservadas a cada qual.

3.4.Calendário Desportivo Desumano

Por vezes, esse incremento de ocorrência de lesões musculares chega a um grau tão elevado que não soa absurdo atribuir tão preocupante circunstância à frenética sequência de jogos a que muitos jogadores são submetidos, participando simultaneamente de diversos campeonatos, em algumas oportunidades até mesmo entrando em campo três vezes por semana.
A falta de razoabilidade na elaboração das tabelas de jogos também é circunstância que deveria merecer intensa fiscalização por parte das autoridades públicas e sindicais, à vista da necessidade de se garantir que a prática futebolística não engendre danos à vida e à saúde dos atletas.

3.5.Condições Climáticas Desfavoráveis: Temperatura e Altitude Ambientais

Questão que precisa ser igualmente avaliada concerne aos horários dos jogos. Em Belém do Pará, onde o calor é intenso, é mesmo comum a prática de jogos em pleno sol de meio dia, sob uma temperatura que pode suplantar os insuportáveis 40° graus, sujeitando a saúde do atleta de futebol a um risco desnecessário – expediente não raro praticado por força de interesse patronal exclusivamente financeiro, consistente na economiade valores pela não utilização dos holofotes do estádio. O mesmo problema ocorre com a prática do futebol em um ambiente reconhecidamente gélido, como se dá em partes da Europa.
Decerto, eventuais prejuízos decorrentes de uma tal opção de momento e horário de jogo devem ser ressarcidos perante o organizador do evento, e, solidariamente, também perante o clube de futebol, como empregador que anuiu com a realização de uma partida em condições climáticas notoriamentedesfavoráveis[20].
Recorde-se, aqui, também, a interessante questão ligada à saúde e segurança do trabalhador atleta de futebol, consistente em buscar o reconhecimento de que jogos em elevadasaltitudes podem acarretar sérios prejuízos ao equilíbrio corporal e à própria vida do atleta.
Questiona-se, por conta de tudo isso e muito mais, se, para além da reparação civil por danos, no campo repressivo individual, também não seria lícito, no campo preventivo coletivo, o fomento a investidas do ente sindical ou do Ministério Público do Trabalho com vistas a coibir determinados abusos lesivos à saúde dos atletas de futebol, realizando, quem sabe, um frequente controle do programa de exercícios físicos impostos a cada jogador ou mesmo propondo um calendário desportivo anual de perfil mais humano, alcançando ainda, no aspecto internacional, quanto ao Ministério Público do Trabalho, vedação expressa de jogos em localidades onde o nível de altitude alcance níveis arriscados para a saúde humana.

3.6. Torcida Organizada: Amor e Ódio

É preciso refletir, ainda, sobre os casos em que os danos perpetrados em face do atleta são praticados, por exemplo, pela própriatorcida.
Embora, a rigor, das arquibancadas sempre se espere o necessário estímulo e incentivo para a boa prática futebolística, contribuindo para o êxito da equipe, tem sido fenômeno cada vez mais constante brotar dessa “apaixonada” torcida exatamente o contrário: ódio, rancor e ira, materializados, muitas vezes, em agressões físicas e verbais para com os atletas, imersos em pleno exercício de sua atividade laborativa. Tais fatos podem ocorrernão apenas no local do evento esportivo, podendo ser praticados, também, em suas imediações, no trajeto de ida e volta ou mesmo no local de treinamento.
Aqui, é preciso distinguir as situações, perquirindo se a lesão fora ou não praticada por torcida organizada.
Segundo a lei, considera-se torcida organizada a pessoa jurídica de direito privado ou existente de fato, que se organize para o fim de torcer e apoiar entidade de prática esportiva de qualquer natureza ou modalidade (Lei n° 10.671/2003 [Estatuto do Torcedor], art. 2°-A – incluído pela Lei nº 12.299/2010).
De acordocom o legislador, a torcida organizada que, em evento esportivo, promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores, árbitros, fiscais, dirigentes, organizadores ou jornalistas será impedida, assim como seus associados ou membros, de comparecer a eventos esportivos pelo prazo de até 3 (três) anos (Lei n° 10.671/2003, art. 39-A – incluído pela Lei nº 12.299/2010), respondendo civilmente, de forma objetiva e solidária, pelos danos causados por qualquer dos seus associados ou membros no local do evento esportivo, em suas imediações ou no trajeto de ida e volta para o evento (Lei n° 10.671/2003, art. 39-B – incluído pela Lei nº 12.299/2010).
Tratando-se, portanto, de dano praticado por integrantes de torcidas organizadas – formalmente constituídas ou não –, sua responsabilidade se impõe independentemente de apuração de qualquer culpa, o que, certamente, inclui prejuízos praticados em face dos atletas profissionais de futebol. Mas não é só: impõe-se também reconhecer às agremiações esportivas responsabilidade objetiva por danos causados a terceiros pelas torcidas organizadas, agindo nessa qualidade, quando, de qualquer modo, as financiem ou custeiem, direta ou indiretamente, total ou parcialmente[21].
Quanto ao torcedorem geral, a preocupação com a prevenção e repressão aos fenômenos da violência por ocasião de competições desportivas exigiu do legislador o estabelecimento de um extenso rol de condições de seu acesso e permanência no recinto desportivo, incluindo, dentre outros comandos semelhantemente relevantes: não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência; não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, inclusive de caráter racista ou xenófobo; não entoar cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos; não arremessar objetos, de qualquer natureza, no interior do recinto esportivo; não incitar e não praticar atos de violência no estádio, qualquer que seja a sua natureza; bem como não invadir e não incitar a invasão, de qualquer forma, da área restrita aos competidores (Lei n° 10.671/2003, art. 13-A – incluído pela Lei nº 12.299/2010).
Vale pontuar que, muito embora tais disposições, em tese, sejam voltadas, pelo menos segundo a dicção da lei, à proteção do torcedor, é seguro afirmar que, na esteira do plexo teórico já destacado anteriormente – cujo nascedouro, reafirmamos, está na própria Constituição Federal –, a ratioda legislaçãoiniludivelmente está centrada na proteção da integridade física e psíquica de todo aquele que se encontra envolto na ambiência do recinto desportivo, o que inclui, pelo menos no que respeita ao futebol, não só os torcedores, mas também os comentaristas, os radialistas, os gandulas, os árbitros e, por óbvio, os próprios jogadores. Enfim, o objetivo da lei não está em proteger o torcedor, mas sim em proteger a pessoa humana inserta no ambiente desportivo, cuja dignidade ostenta o valioso posto de fundamento da República Federativa do Brasil (CF, art. 1°, III).
Logo, por exemplo, se a torcida, em geral, entoar cânticos racistas em relação a determinado jogador, mesmo que não se podendo apontar se tratar de ato praticado ou insuflado por torcida organizada ou por qualquer torcedor em específico, ainda assim não pode haver dúvidas de que faz jus o atleta vitimado, na órbita da seara cível, a buscar a respectiva indenização pelo abalo de ordem moral que possivelmente tenha sofrido (Lei n° 10.671/2003, art. 13-A, parágrafo único – incluído pela Lei nº 12.299/2010[22]),
Isso se dá porque a tendência contemporânea da responsabilidade civil – reiteramos – está centrada na cada vez mais crescente ênfase na pessoa da vítima, e sua justa reparação, em detrimento da clássica ênfase na pessoa do ofensor, e sua reprovável conduta[23]. Logo, o fato de não se poder apontar, individualmente, o praticante da ofensa, não pode servir de justificativa para deixar sem ressarcimento a vítima de dano injusto[24].
Portanto, não sendo o caso de lesão praticada por torcida organizada, mas sim por um conglomerado de pessoas ou de grupo não identificáveis, pensamos que, para não se impor dano injusto à vítima, deveria responder pela reparação, independentemente de culpa, a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes, por aplicação do art. 14, parte inicial[25],e art. 19[26], ambos da Lei n° 10.671/2003. Além disso, é possível defender também a responsabilidade solidária da entidade responsável pela organização da competição, legalmente equiparada a fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, como expressamente pontuado pelo art. 3º da Lei n° 10.671/2003[27]. Cuidar-se-ia de uma proteção ancorada em uma espécie de responsabilidade pressuposta[28],com evidentepresunção de causalidade[29].
Certamente que o ajuizamento desse tipo de ação deveria ocorrer nos sítios da Justiça do Trabalho. Perceba-se, a propósito, que o artigo 114, inciso I, da Carta Magna, com a redação impressa pela EC 45/04, já não mais restringe os limites competenciais da Justiça Especializada Obreira a um debate que necessariamente deva envolver os dois principais atores da relação de emprego (“trabalhadores e empregadores”), como sempre firmara a tradição constitucional brasileira (foco nos integrantes da relação jurídica – matiz subjetivo), mas, de forma bem mais ampla, exige agora que tais ações sejam simplesmente “oriundas da relação de trabalho”, sem qualquer restrição, pois, quanto aos sujeitos envolvidos (foco na natureza da relação jurídica – matiz objetivo)[30].
Ora, o atleta que, na ambiência do recinto esportivo, sofre mordaz e inequívoca manifestação racista ou discriminatória, provinda da torcida presente ao estádio, faz jus a uma reparação por dano moral[31], haja vista o contido no art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, e artigos 186 e 927, ambos do Código Civil, sendo certo que, na medida em que praticada no contexto de sua função laborativa, a respectiva ação indenizatória há de ser processada e julgada perante a Justiça Federal Especializada do Trabalho, mercê do quanto dispõe o art. 114, I, da Constituição Federal[32].
Logo, por conta de todo o exposto, impor-se-ia reconhecer a favor do ser humano atleta de futebol uma proteção pelo menos similar àquela reservada ao ser humano torcedor, que, segundo a lei, tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das partidas (Lei n° 10.671/2003, art. 13), logrando usufruir máxima reparabilidade de seus danos,na medida em que, equiparado a consumidor, tal reparação está lastreada em uma invejável responsabilidade de cunho objetivo(Lei n° 9.615/1998, art. 42, § 3°[33]) e de matiz solidário (Lei n° 10.671/2003, art. 19[34]), no que tange aos responsáveis pelo pagamento da indenização.
E, em assim sendo, uma tal ilação afinada estaria, sem qualquer sombra de dúvida, com aquele intenso fluxo protetivo, já acentuado, que tenciona alavancar, continuamente, a condição social do cidadão trabalhador, enquanto expressão de tutela da sua dignidade humana (CF, art. 1º, III, art. 5º, § 2º, e art. 7º, caput).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS: POR UMA NECESSÁRIA “LABORIZAÇÃO” E “HUMANIZAÇÃO” DO MUNDO FUTEBOLÍSTICO

Propugnamos, aqui, um ponto de vista que confira ênfase à dimensão constitucional do tema relativo à responsabilidade civil e o mundo do futebol, destacando a incongruência infraconstitucional que acarreta melhor condição social ao homem-consumidor e ao homem-torcedor, em detrimento do homem-trabalhador.
Essa inaceitável situação certamente viola o postulado da igualdade material e despreza a cláusula de crescente avanço socialda classe trabalhadora, ambos sedimentados na Carta Magna (CF, art. 3º, IV, art. 5º, caput e § 2º, e art. 7º, caput).
É preciso ter em conta, ainda, que a reflexão e o enfrentamento das diversas nuances aqui levantadas demandarão um sadio estreitamento das relações institucionais travadas entre o Judiciário Trabalhista e a Procuradoria do Trabalho, em prol da realização da justiça social, a configurar aquilo que recentíssima doutrina chama de “parceirização trabalhista”[35].
Propiciará, também, um poderoso incremento dessa inevitável transdisciplinariedade que tem sido uma marca da atual quadra da ciência jurídica, a exigir do operador do Direito um domínio cada vez amplo de conceitos e informações alheios ao específico rincão jurídico, hauridos, muitas vezes, de setores do conhecimento umbilicalmente ligados, por exemplo, à Sociologia, à Pscicologia e à própria Medicina.
No mais, cumpre afastar a conotação insistentemente lúdica emprestada ao atleta de futebol, passando a enxergá-lo também no papel social de trabalhador – apenas envolvido em uma dinâmica laborativa toda especial. Cumpre, pois, “laborizar” a atividade futebolística.
Além disso, também é necessário conferir condições mais humanas àqueles que trabalham nessa específica dimensão trabalhista, de forma a demandar tratamento mais consentâneo com o postulado da dignidade humana (CF, art. 1º, III).
Enfim, é preciso aproximar o homo ludens do homo faber.
Tudo sempre em vista da máxima efetividade da axiologia constitucional.

Notas

[1] Constituição Federal/1988, artigo 5º, XXIII: “a propriedade atenderá a sua função social”; Código Civil/2002, artigo 421: “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.
[2]Podemos citar, como exemplo dessa assertiva, os seguintes artigos: CDC, artigo 7º, parágrafo único: “Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo”; CDC, artigo 12: “O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos”; CDC, artigo 14: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”; CDC, artigo 25, caput: “É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas seções anteriores”; CDC, artigo 25, § 1º: “Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores”; CDC, artigo 25, § 2º: “Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou importador e o que realizou a incorporação”.
[3] Falamos “precipuamente” porque não desconhecemos que o torcedor, no perfil aqui destacado, também não deixa de ser uma espécie de consumidor.
[4] Constituição Federal, art. 7º, XXVIII: “seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorre em dolo ou culpa”.
[5] TST, Súmula 331, item IV: “O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial”.
[6] “(...) a realização plena da dignidade humana, como quer o projeto constitucional em vigor, não se conforma com a setorização da tutela jurídica ou com a tipificação de situações previamente estipuladas, nas quais pudesse incidir o ordenamento. Não parece suficiente o mecanismo simplesmente repressivo, próprio do direito penal, de incidência normativa limitada aos momentos patológicos das relações jurídicas, no momento em que ocorre a violação do direito, sob a moldura de situações-tipo. A tutela da pessoa humana, além de superar a perspectiva setorial (direito público e direito privado), não se satisfaz com as técnicas ressarcitória e repressiva (binômio lesão-sanção), exigindo, ao reverso, instrumentos de proteção do homem, considerado em qualquer situação jurídica de que participe, contratual ou extracontratual, de direito público ou de direito privado. Assim é que, no caso brasileiro, em respeito ao texto constitucional, parece lícito considerar a personalidade não como um novo reduto de poder do indivíduo, no âmbito do qual seria exercido a sua titularidade, mas como valor máximo do ordenamento, modelador da autonomia privada, capaz de submeter toda a atividade econômica a novos critérios de validade. Nesta direção, não se trataria de enunciar um único direito subjetivo ou classificar múltiplos direitos da personalidade, senão, mais tecnicamente, de salvaguardar a pessoa humana em qualquer momento da atividade econômica, quer mediante os específicos direitos subjetivos (previstos pela Constituição e pelo legislador especial – saúde, imagem, nome etc), quer como inibidor de tutela jurídica de qualquer ato jurídico patrimonial ou extrapatrimonial que não atenda à realização da personalidade. (...) Com efeito, a escolha da dignidade da pessoa humana como fundamento da República, associada ao objetivo fundamental de erradicação da pobreza e da marginalização, e de redução das desigualdades sociais, juntamente com a previsão do § 2º do art. 5º, no sentido de não exclusão de quaisquer direitos e garantias, mesmo que não expressos, desde que decorrentes dos princípios adotados pelo texto maior, configuram uma verdadeira cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, tomada como valor máximo pelo ordenamento” (TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. 3ª Edição, Rio de Janeiro : Renovar, 2004, p. 47-50).Essa extraordinária formulação teórica já está devidamente sedimentada na doutrina pátria. É o que se vê do Enunciado 74 da IV Jornada de Direito Civil (2006), assim gravado: “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, inc. III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação”.
[7] “A Constituição da República estabelece um patamar mínimo de direitos do trabalhador, não impedindo que norma infraconstitucional introduza regras mais benéficas, conforme se depreende do seu art. 5º, § 2º e do art. 7º, caput. Assim, por óbvio, o art. 7º da CRFB, que constitui rol de direitos mínimos do trabalhador (conforme caput do mesmo artigo), não pode, em boa hermenêutica, ser interpretado como um limitador dos direitos deste, nem tampouco um rol de garantias do empregador, parte mais forte da relação” (PRITSCH, Cesar Zucatti. Responsabilidade Civil Decorrente de Acidente de Trabalho ou Doença Ocupacional. Revista LTr. nº 76, março/2012, p. 311-312).
[8]CC, art. 927, parágrafo único: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.
[9] Sobre a importância jurídica e o raio de ação normativa do art. 927, parágrafo único, do Código Civil, confira-se: MARANHÃO, Ney Stany Morais. Responsabilidade Civil Objetiva pelo Risco da Atividade: Uma Perspectiva Civil-Constitucional. São Paulo : GEN/Método, 2010.
[10] CF, art. 200: “Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (...) VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho” (grifamos).
[11] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 13ª Edição. São Paulo : Saraiva, 2012, p. 77.
[12] “A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a ‘defesa do meio ambiente’ (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral” (ADI 3.540-MC, Relator: Ministro Celso de Mello, Plenário, julgamento em 01-09-2005, DJ de 03-02-2006) (grifamos).
[13]Fazendo esse fenomenal link entre Direito Ambiental e Direito do Trabalho, com penetrações na teoria da responsabilidade civil, confira-se, por todos: FELICIANO, Guilherme Guimarães. Saúde e Segurança no Trabalho: o Meio Ambiente do Trabalho e a Responsabilidade Civil Patronal. In: THOMÉ, CandyFlorencio; SCHWARZ, Rodrigo Garcia (organizadores). Direito Individual do Trabalho: Curso de Revisão e Atualização. Rio de Janeiro :Elsevier, 2011, p. 287-306; SCHINESTSCK, Clarissa Ribeiro. A Tutela da Saúde do Trabalhador e os Novos Rumos Traçados pelo Direito Ambiental do Trabalho. In: THOMÉ, CandyFlorencio; SCHWARZ, Rodrigo Garcia (organizadores). Direito Individual do Trabalho: Curso de Revisão e Atualização. Rio de Janeiro :Elsevier, 2011, p. 307-320.
[14] Esse risco naturalmente implicado, por sinal, é até expressamente reconhecido pelo próprio legislador, quando passou a exigir, da entidade de prática desportiva empregadora, a contratação, para os atletas profissionais, de seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos (Lei nº 9.615/1998, art. 45, caput, com redação dada pela Lei nº 12.395/2011). Cláusula semelhante também é verificada no direito italiano (Legge 23 marzo 1981, nº 91, articolo 8 – “assicurazionecontro i rischi”). Em sentido contrário, negando esse caráter imanente do risco em relação a atividades esportivas, afirma Hélder Gonçalves Dias Rodrigues que “a maioria das atividades humanas, senão todas, oferecem riscos. (...) Hodiernamente, apresenta maior risco do que as atividades desportivas o simples ‘circular’ pelos grandes centros (em razão da violência, do trânsito etc.). (...) Os riscos na atividade desportiva são aparentes, se presentes a técnica, responsabilidade e equipamentos adequados” (RODRIGUES, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas, SP : Servanda Editora, 2004, p. 189).
[15]Tencionando ofertar subsídios para a escorreita interpretação do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, a doutrina lavrou o Enunciado n. 38 da I Jornada de Direito Civil (2002), texto fruto do debate travado entre diversos estudiosos e que se encontra assim redigido: “A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade”.
[16] Como leciona com inteira propriedade Alice Monteiro de Barros, “à semelhança do que ocorre com os artistas, a inatividade poderá ocasionar-lhes prejuízos irreparáveis em seu futuro profissional, porquanto sua promoção está em sua função direta de seu efetivo emprego; a inatividade forçada aqui é muito mais grave do que em outras profissões, considerando que a carreira profissional do desportista é muito curta. Logo, viola a obrigação contratual de propiciar trabalho ao atleta a conduta do dirigente do clube ou do técnico que implique exclusão sistemática do desportista das competições, sem qualquer fundamento desportivo, senão visível intenção de condená-lo ao ostracismo com todas as suas consequências. A desocupação arbitrária, vexatória e discriminatória autoriza a rescisão indireta do contrato, sem prejuízo do dano material e/ou moral daí advindos” (BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho. 5ª Edição. São Paulo : LTr, 2012, p. 125). A autora faz alusão a um interessante caso submetido ao Judiciário argentino, onde o famoso jogador Caniggia buscou, com êxito, o reconhecimento de rescisão indireta frente ao Club Atlético Boca Juniors, alcançando ainda o direito a indenização por danos morais pelo fato do clube mantê-lo injustificadamente inativo, com notório prejuízo à sua imagem. Anote-se que o jogador Adriano, apelidado de "Imperador", recentemente afirmou pretender acionar o Sport Clube Corinthians Paulista por possível prática de ostracismo. Fonte: Programa "Fantástico", Rede Globo, em entrevista exclusiva exibida em 22 de abril de 2012.
[17] Para um estudo mais aprofundado a respeito do assédio e de suas terríveis consequências na saúde mental do trabalhador, confira-se: MARANHÃO, Ney Stany Morais. Dignidade Humana e Assédio Moral: A Delicada Questão da Saúde Mental do Trabalhador. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. V. 44, nº 87, jul./dez./2011, p. 93-103.
[18] Segundo o art. 28 da Lei nº 9.615/1998, com redação dada pela Lei nº 12.395/2011, a concentração, dentre outras medidas previstas na lei, não pode ser superior a 3 (três) dias consecutivos por semana, desde que esteja programada qualquer partida, prova ou equivalente, amistosa ou oficial, devendo o atleta ficar à disposição do empregador por ocasião da realização de competição fora da localidade onde tenha sua sede.
[19] BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e Regulamentações Especiais de Trabalho. 5ª Edição. São Paulo : LTr, 2012, p. 96.
[20] A respeito, veja-se a seguinte decisão, publicada no portal do STJ em 08-05-2009: “STJ rejeita proibição de futebol profissional das 11h às 17h. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou o mandado de injunção impetrado pela Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenape) para proibir a realização, em todo o território nacional, de partidas de futebol no período das 11h às 17h, durante os meses de novembro, dezembro, janeiro e fevereiro. No mandado, a entidade sustentou que o Ministério do Trabalho e do Emprego, responsável pela regulamentação de todas as atividades e setores de trabalho, recusa-se a estabelecer regras especificas de proteção à saúde dos atletas profissionais de futebol, que continuam obrigados a jogar nesses horários críticos. Para a Fenape, a exposição ao calor intenso, principalmente no período do horário de verão, coloca em risco a saúde e a vida dos atletas. Previsto no artigo 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal, o mandado de injunção é concedido sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, soberania e cidadania. Segundo a relatora, ministra Laurita Vaz, a Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé) impõe às entidades responsáveis pela administração do esporte profissional a observância de cuidados médicos e clínicos, bem como o oferecimento de condições necessárias à participação dos atletas nas competições. Além disso, o anexo 3 da Norma Reguladora n. 15 do Ministério do Trabalho e do Emprego já disciplina os limites de tolerância para exposição ao calor dos trabalhadores em geral. Para a ministra, não existe ausência de norma, mas um mero descontentamento da Federação com as que existem. Assim, por unanimidade, a Corte julgou o mandado de injunção extinto, sem resolução do mérito”. Fonte: <http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=91899&tmp.area_anterior=44&tmp.argumento_pesquisa=MI%20206> Acesso em: 19-04-2012. Pensamos que o tema, todavia, merece reflexão mais aprofundada.
[21] Exatamente esse é o conteúdo do Enunciado 447 da V Jornada de Direito Civil (8 a 10 de novembro de 2011).
[22]Lei n° 10.671/2003, art. 13-A, parágrafo único: “O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor ao recinto esportivo, ou, se for o caso, o seu afastamento imediato do recinto, sem prejuízo de outras sanções administrativas, civis ou penais eventualmente cabíveis”.
[23] “(...) os tradicionais filtros da reparação (culpa, nexo causal e dano) não apresentam mais, na prática jurisprudencial, o mesmo poder de contenção de outrora. Embora não tenha operado uma alteração expressa na dogmática da responsabilidade civil, o desenvolvimento do solidarismo jurídico implicou em uma mudança da postura do Poder Judiciário, que passou a flexibilizar os pressupostos técnicos do instituto de modo a proteger de modo mais intenso a vítima no âmbito das ação de indenização” (SCHREIBER, Anderson. O Futuro da Responsabilidade Civil: um Ensaio sobre as Tendências da Responsabilidade Civil Contemporânea. In: Responsabilidade Civil Contemporânea: em Homenagem a Sílvio de Salvo Venosa. RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; MAMEDE, Gladston; ROCHA, Maria Vital da (coordenadores). São Paulo : Atlas, 2011, p. 719).
[24]Por dano injusto há de se entender como aquele assim qualificado “tanto por haver sido injustamente causado como pelo fato de ser injusto que o suporte quem o sofreu” (HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Pressuposta. Belo Horizonte : Del Rey, 2005, p. 354).
[25]Lei n° 10.671/2003, art. 14, ab initio: “Sem prejuízo do disposto nos arts. 12 a 14 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo é da entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e de seus dirigentes (...)”.
[26]Lei n° 10.671/2003, art. 19:“As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo”.
[27]Lei n° 10.671/2003, art. 3º: “Para todos os efeitos legais, equiparam-se a fornecedor, nos termos da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, a entidade responsável pela organização da competição, bem como a entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo”. Segundo Hélder Gonçalves Dias Rodrigues, “no que refere aos eventos desportivos propriamente ditos, se os participantes do evento tiveram ou não que pagar pela inscrição e possibilidade de participar do certame desportivo, certamente, em ocorrendo um dano, a responsabilidade da entidade promovente, no caso a administradora do desporto, será analisada com vistas às regras de prática da modalidade desportiva e, supletivamente, às gerais do Código Civil e (as especiais) do Código de Defesa do Consumidor, dependendo da origem do dano. Concluída pela responsabilidade da entidade desportiva promotora do evento, a mesma responderá até o limite constatado do dano material, moral e estético, sofridos pelas vítimas do evento danoso” (RODRIGUES, Hélder Gonçalves Dias. A Responsabilidade Civil e Criminal nas Atividades Desportivas. Campinas, SP : Servanda Editora, 2004, p. 234).
[28] A respeito, confira-se a seminal obra: HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade Pressuposta. Belo Horizonte : Del Rey, 2005.
[29] “(...) a análise dos artigos 3º, 14 e 19 do Estatuto do Torcedor (Lei nº 10.671/2003) leva à conclusão de que o legislador preocupou-se na manutenção da incolumidade da vítima e de seu pleno ressarcimento, quando estabelece a responsabilidade dos clubes de futebol pelos danos ocasionados aos torcedores dentro do estádio, sendo esta responsabilidade definida de acordo com o mando de campo. Neste sentido, se há um dano ocasionado a um torcedor dentro do estádio de futebol, a entidade desportiva que detiver o mando de campo (estabelecido por meio da entidade organizadora do evento desportivo antes do início do campeonato) deverá indenizá-lo pelos danos, independentemente de existir aí uma causalidade direta entre a promoção do evento esportivo e o dano gerado. Busca-se a indenização dos danos por aquele que detém a maior e melhor capacidade de indenizar, portanto. Se for possível a identificação da causa do dano, no sentido de individualizar o agente (ou agentes) que com sua conduta o gerou, poderá o organizador exercitar o direito de regresso contra ele. “Ao invés de a vítima ter que provar que determinada pessoa, através de sua conduta, causou o dano que a afligiu, poderá contar com a presunção de causalidade, sendo suficiente que prove que sofreu um dano e que o dano foi consequência de determinada atividade realizada por um determinado grupo. (...) As relações internas dos membros do grupo serão resolvidas a posteriori (através do direito de regresso), mas o objetivo primordial da responsabilidade civil, qual seja, a compensação dos danos sofridos, deve ser efetivado prioritariamente” (MULHOLLAND, Caitlin Sampaio. A responsabilidade Civil por Presunção de Causalidade. Rio de Janeiro : GZ Editora, 2009, p. 223-225). Registre-se que recentemente o Supremo Tribunal Federal reafirmou a plena constitucionalidade de inúmeros dispositivos constantes do Estatuto do Torcedor, incluindo os preceitos que versam sobre responsabilidade civil (STF, ADI nº 2.937, julgamento em 23-02-2012).
[30]Marcos Fava destaca, com razão, que “o delineamento da competência material da Justiça do Trabalho decorre não mais da identificação dos sujeitos da relação, mas da própria estrutura contratual gênese: as que revelem relações de trabalho. Não se cuida, portanto, mais dos litígios entre empregados e empregadores – ou contratantes e contratados –, mas o assunto envolve todas as ações oriundas da relação de trabalho, mesmo que não haja, nos polos da composição processual, empregador e empregador – ou contratante e trabalhador” (FAVA, Marcos Neves. Competência da Justiça do Trabalho: para exorcizar o binômio fantasma empregado-empregador. In: LORENZETTI, Ari Pedro; SALES, Cleber Martins; AZEVEDO NETO, Platon Teixeira de (coordenadores). Direito e Processo do Trabalho na Atualidade. São Paulo : LTr, 2012, p. 296). Convalidando essa mesma linha de raciocínio, destacamos os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL ORIUNDO DE ASSÉDIO SEXUAL EM AMBIENTE DE TRABALHO. PRESTADORA DE SERVIÇOS QUE É DEMITIDA E RECONTRATADA POR DETERMINAÇÃO DO TOMADOR DE SERVIÇOS. RELAÇÃO DE TRABALHO CONFIGURADA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA TRABALHISTA. - Compete à Justiça Trabalhista processar e julgar ações de indenização por danos morais decorrentes de assédio sexual praticado em ambiente de trabalho, onde as partes envolvidas estão em níveis hierárquicos diferentes, mesmo que se trate de vítima que trabalhe por meio de empresa terceirizadora de serviços e que a ação seja ajuizada contra a pessoa do superior hierárquico. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo da 1a Vara do Trabalho de Jundiaí, Estado de São Paulo” (STJ, Conflito de Competência n° 78.145⁄SP, Relatora: Ministra Nancy Andrigui, 2ª Seção, DJ 03-09-2007); “CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA DO TRABALHO E JUSTIÇA FEDERAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INJÚRIA QUALIFICADA POR PRECONCEITO RACIAL SOFRIDA POR PRESTADOR (TERCEIRIZADO) DE SERVIÇOS DA CAIXA FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.1.- A expressão “as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho”, inscrita no art. 114, VI, da Constituição Federal, não restringe a competência da Justiça do Trabalho às ações ajuizadas pelo empregado contra o empregador, e vice-versa. Se o acidente ocorreu no âmbito de uma relação de trabalho, só a Justiça do Trabalho pode decidir se o tomador dos serviços responde pelos danos sofridos pelo prestador terceirizado." (AgRg no CC 82.432⁄BA, Rel. Min. ARI PARGENDLER, SEGUNDA SEÇÃO, DJ 8.11.07). 2.- No caso dos autos, embora a pretendida indenização por danos morais não decorra de ato ilícito praticado por empregado da Caixa Econômica Federal (empresa tomadora dos serviços), mas, por cliente da aludida instituição bancária, releva que no momento em que sofreu a ofensa, encontrava-se a autora prestando serviços nas dependências de uma de suas agências como trabalhadora terceirizada, tendo a petição inicial ainda, narrado circunstâncias típicas de relação laborativa atribuídas à Caixa, contra quem também foi movido o processo. 3.- Desse modo, a atração da competência da Justiça trabalhista se justifica, pois, a despeito da existência de duas relações subjacentes com naturezas jurídicas distintas: a primeira com a suposta ofensora (cliente da instituição financeira); e a segunda estabelecida diretamente com a CEF, enquanto tomadora dos serviços, vislumbra-se conexão imediata alegação de causalidade do dano sofrido com a prestação do serviço à aludida instituição financeira, havendo necessidade de que, a partir da análise da pretensão, tal como deduzida, se possa decidir, inclusive, sobre a permanência ou não da CEF no pólo passivo da demanda, avaliação que, pelas particularidades do caso, será melhor exercida pela Justiça do Trabalho e por ocasião de prolação de sentença quando se examinam todas as circunstâncias fático-probatórias do caso. 4.- Conflito de Competência conhecido, declarando-se a competência do Juízo da 2ª Vara do Trabalho de São Carlos⁄SP” (STJ, Conflito de Competência n° 97.458/SP, Relator: Ministro Sidnei Beneti, 2ª Seção, DJ 29-06-2011).
[31] “A consagração da dignidade humana como valor fundamental nas constituições do último século, associada à aplicação direta das normas constitucionais às relações privadas, veio exigir com força irresistível a ressarcibilidade, até então discutida, do dano extrapatrimonial” (SCHREIBER, Anderson. Novos Paradigmas da Responsabilidade Civil: Da Erosão dos Filtros da Reparação à Diluição dos Danos. 2ª Edição, São Paulo : Atlas, 2009, p. 87).
[32] Consigne-se que a disposição contida no art. 217, § 1º, da Constituição Federal, ao aduzir que “o Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei”, em nada pode servir de obstáculo ao exercício do direto fundamentalde ação por parte do atleta de futebol. Ora, tratando-se de cláusula que excepciona o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), decerto que sobre tal preceito há de recair interpretação necessariamente restritiva. Assim, há de se compreender que o curso forçado perante as instâncias da justiça desportiva somente pode concernir a matérias estrita e exclusivamente desportivas, ainda assim – limitou a Magna Carta – somente quando ligadas a aspectos relativos à disciplina e à própria competição em si. Desse modo, discussões de ordem trabalhista ou atinentes à saúde e segurança no trabalho poderão ser diretamente dirigidas ao Poder Judiciário, sem qualquer necessidade de prévio crivo perante a justiça desportiva. A respeito, confira-se o seguinte julgado: “Causas esportivas. Da competência da Justiça do Trabalho. Os Tribunais Esportivos são entidades com competência para resolver questões de ordem estritamente esportiva. A matéria em questão envolve direitos de natureza trabalhista, sendo, portanto, esta Justiça Especializada competente para dirimi-los. Incabível a alegação de violação do art. 217 da CF, por não abranger a hipótese prevista nos autos. Recurso de Revista não conhecido” (TST, RR-493704/1998, 2ª Turma, Relator: Ministro José Alberto Rossi, DJ 18-06-1999).
[33]Lei n° 9.615/1998, art. 42, § 3°:“O espectador pagante, por qualquer meio, de espetáculo ou evento desportivo equipara-se, para todos os efeitos legais, ao consumidor, nos termos do art. 2º da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990”.
[34]Lei n° 10.671/2003, art. 19:“As entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes respondem solidariamente com as entidades de que trata o art. 15 e seus dirigentes, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados a torcedor que decorram de falhas de segurança nos estádios ou da inobservância do disposto neste capítulo”.
[35] “A parceirização jurisdicional trabalhista tem como escopo promover mudanças no relacionamento entre os magistrados do Poder Judiciário Trabalhista e os membros do Ministério Público do Trabalho, de molde a torná-los uma espécie de parceiros na busca da realização da justiça social, nos processos e ações judiciais moleculares, em que estes agentes políticos atuam em conjunto, em suas respectivas circunscrições/jurisdições, os primeiros, especialmente, nas Varas do Trabalho, e os segundos, nas Procuradorias do Trabalho nos Municípios ou ainda nas Procuradorias Regionais nas sedes das capitais brasileiras” (SANTOS, Enoque Ribeiro dos. O Microssistema de Tutela Coletiva: Parceirização Trabalhista. São Paulo : LTr, 2012, p. 263). 

Autor

·         Ney Stany Morais Maranhão

Juiz do Trabalho no TRT da 8ª Região (PA/AP). Mestre em Direito Civil pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Università di Roma – La Sapienza (Itália). Ex-Professor do Curso de Direito da Universidade Federal do Pará (UFPA) (2011). Professor convidado da Universidade da Amazônia, em nível de pós-graduação. Professor convidado da Escola Judicial do TRT da 8ª Região.

Informações sobre o texto

Este texto representa a versão escrita de intervenção oral realizada pelo autor junto ao II Encontro Goiano de Direito Desportivo. O evento aconteceu na cidade de Goiânia (GO), entre os dias 9 e 10 de maio de 2012, sob a coordenação do nobre Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, do Tribunal Superior do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

MARANHÃO, Ney Stany Morais. Meio ambiente laboral futebolístico e responsabilidade civil . Jus Navigandi, Teresina, ano 17n. 32604 jun. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21913>. Acesso em: 4 jun. 2012.