sábado, 29 de fevereiro de 2020

RESUMO. INFORMATIVO 664 DO STJ.

RESUMO. INFORMATIVO 664 DO STJ. 28 DE FEVEREIRO DE 2020.
SEGUNDA SEÇÃO
PROCESSO
CC 151.130-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por maioria, julgado em 27/11/2019, DJe 11/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Cláusula compromissória arbitral. Art. 58 do Estatuto Social da Petrobras. Submissão da União. Impossibilidade.
DESTAQUE
A União, na condição de acionista controladora da Petrobras, não pode ser submetida à cláusula compromissória arbitral prevista no Estatuto Social da Companhia, seja em razão da ausência de lei autorizativa, seja em razão do próprio conteúdo da norma estatutária.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A controvérsia reside em investigar o juízo competente – arbitral ou estatal – para a ação indenizatória movida por investidores em face da Petrobrás e também da União, diante da cláusula compromissória contida no artigo 58 do Estatuto da Companhia.
No atual estágio legislativo, não há dúvidas acerca da possibilidade da adoção da arbitragem pela Administração Pública, direta e indireta, bem como da arbitrabilidade nas relações societárias, a teor das alterações promovidas pelas Leis n.s 13.129/2015 e 10.303/2001.
A referida exegese, contudo, não autoriza a utilização e a extensão do procedimento arbitral à União na condição de acionista controladora da Petrobras, seja em razão da ausência de lei autorizativa ou estatutária (arbitrabilidade subjetiva), seja em razão do conteúdo do pleito indenizatório transcender o objeto indicado na cláusula compromissória (arbitrabilidade objetiva). Nesse sentido, não se pode afastar a exigência de regramento específico que apresente a delimitação e a extensão de determinado procedimento arbitral ao sócio controlador, notadamente em se tratando de ente federativo em que a própria manifestação de vontade deve estar condicionada ao princípio da legalidade.
Nos exatos termos da cláusula compromissória prevista no art. 58 do Estatuto da Petrobras, a adoção da arbitragem está restrita "a disputas ou controvérsias que envolvam a Companhia, seus acionistas, os administradores e conselheiros fiscais", tendo por objeto a aplicação das disposições contidas na Lei n. 6.404/1976.
Em tal contexto, considerando a discussão prévia acerca da própria existência da cláusula compromissória em relação ao ente público – circunstância em que se evidencia inaplicável a regra da "competência-competência" – sobressai a competência exclusiva do Juízo estatal para o processamento e o julgamento de ações indenizatórias movidas por investidores acionistas da Petrobras em face da União e da Companhia.

TERCEIRA TURMA
PROCESSO
REsp 1.816.039-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Condomínio. Convenção outorgada pela construtora. Unidades imobiliárias ainda não comercializadas. Redução da taxa condominial. Impossibilidade. Benefício de caráter subjetivo em detrimento da coletividade condominial.
DESTAQUE
É nula a cláusula de convenção outorgada pela própria construtora que prevê a redução da taxa condominial das suas unidades imobiliárias ainda não comercializadas.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Em regra, a divisão do valor da taxa condominial se dá com base na fração ideal da unidade imobiliária, podendo a convenção estabelecer de maneira diversa.
No caso, discute-se a validade de cláusula da convenção que permite à construtora/incorporadora do empreendimento imobiliário o pagamento de apenas 30% (trinta por cento) do valor da taxa condominial ordinária, enquanto não for comercializada. A convenção foi outorgada pela própria construtora, que no momento da constituição do condomínio detinha mais de 2/3 (dois terços) da fração ideal das unidades imobiliárias.
Cumpre ressaltar que a taxa condominial é fixada de acordo com a previsão orçamentária de receitas e de despesas, bem como para constituir o fundo de reserva com a finalidade de cobrir eventuais gastos de emergência. Em razão disso, por questões meramente lógicas, se uma ou várias unidades imobiliárias recebem a redução do valor da taxa ordinária, a consequência é a oneração dos demais condôminos. Há, desse modo, enriquecimento sem causa da parte que se beneficia com o pagamento a menor, em detrimento de toda a coletividade condominial, com evidente violação do inciso I do art. 1.334 do CC/2002, que assenta expressamente a observância da proporcionalidade da cota condominial.
De fato, a convenção outorgada pela construtora/incoporadora pode estabelecer o critério do rateio da cota devida por cada condômino, mas isso não significa a possibilidade de criar benefício de caráter subjetivo a seu favor a ponto de reduzir ou isentar do pagamento da cota condominial.
Ademais, a disponibilidade dos serviços e a possibilidade de fruição são requisitos essenciais para ensejar o pagamento da cota condominial. Assim, se o condomínio tem, em sua área de lazer, piscina, sauna, academia e o condômino não usufrui nenhum deles, não pode utilizar esse argumento para postular a redução do valor da taxa devida.

PROCESSO
REsp 1.670.338-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 04/02/2020, DJe 07/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Cônjuge meeiro. Reserva de meação. Honorários de sucumbência. Dívida que não foi contraída em benefício do casal. Dever de comprovação. Desnecessidade.
DESTAQUE
Tratando-se de condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais, não é possível exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Nos termos do art. 655-B do CPC/1973, incluído pela Lei n. 11.382/2006, havendo penhora de bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução deve recair sobre o produto da alienação do bem.
Para impedir que a penhora recaia sobre a sua meação, o cônjuge meeiro deve comprovar que a dívida executada não foi contraída em benefício da família.
Tratando-se de dívida proveniente da condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais em demanda da qual o cônjuge meeiro não participou, é inegável o direito deste à reserva de sua meação.
Os honorários advocatícios consagram direito do advogado contra a parte que deu causa ao processo, não se podendo exigir do cônjuge meeiro, que não integrou a relação processual da lide originária, a comprovação de que a dívida executada não foi contraída em benefício do casal ou da família.
Nesse contexto, não tem nenhuma relevância para a solução da causa saber se o cônjuge meeiro obteria ou não proveito econômico em caso de procedência da ação proposta em juízo, salvo se estivesse o advogado do próprio autor da referida demanda a cobrar os honorários contratuais pelos serviços prestados.

PROCESSO
REsp 1.737.476-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Ação de despejo. Existência de colocadores. Litisconsórcio ativo necessário. Inexistência.
DESTAQUE
A ação de despejo não exige a formação de litisconsórcio ativo necessário.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Inicialmente, não há margem para dúvida, na jurisprudência do STJ, acerca da existência de solidariedade entre os locadores, quando não houver ressalva no instrumento contratual, conforme disposição do art. 2º da Lei de Locações (Lei n. 8.245/1991).
Ademais, quando há diversos locatários para um mesmo imóvel, este STJ entendeu pela existência de litisconsórcio passivo necessário, devendo haver a citação de todos os locatários para o devido processamento da ação.
Por outro lado, parece não subsistir os motivos que conduzam à necessidade de formação de litisconsórcio ativo necessário, quando da multiplicidade de locadores. Isso porque, em primeiro lugar, não há que se mencionar o intuito protetivo do instituto com relação aos proprietários do imóvel, que certamente prescindem dessa garantia. Ademais, o art. 114 do CPC/2015 afirma a regra geral quanto à formação do litisconsórcio, a qual fica restrita à necessidade de citação de todos para a eficácia da sentença.
Por sua vez, o art. 2º, caput, da Lei de Locações estipula uma regra de direito material com relação à solidariedade, ao dispor que: "Havendo mais de um locador ou mais de um locatário, entende-se que são solidários se o contrário não se estipulou". No entanto, é cediço que da solidariedade não se extrai, como consequência necessária, a formação de litisconsórcio necessário para a resolução deste conflito.
De fato, acerca do tema do litisconsórcio ativo necessário, este Tribunal Superior já se manifestou no sentido de que sua aceitação deve ocorrer apenas em situações excepcionalíssimas, em razão da potencial ofensa ao direito constitucional de ação e de acesso à justiça.
No entanto, tratando-se de condomínio, deve-se aplicar à hipótese a regra insculpida no art. 1.314 do CC/2002, segundo a qual "cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la" e, assim, permitir que um dos condôminos colocadores exerça a prerrogativa de encerrar o contrato de locação.
Dessa forma, não há razão para que se inclua entre as situações excepcionais para a formação do litisconsórcio ativo necessário o pedido de despejo por encerramento do contrato de locação.

PROCESSO
REsp 1.761.274-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Investigação de paternidade. Representação judicial do menor. Guarda concedida a terceiro sem a destituição do poder familiar. Exercício do poder-dever de representação que cabe, em regra, aos pais não destituídos.
DESTAQUE
A concessão de guarda do menor não implica automática destituição do poder-dever familiar dos pais para representá-lo em juízo.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A representação legal do filho menor, que é uma das vertentes do pleno exercício do poder familiar, deverá ser exercida, em regra, pelos pais, ressalvadas as hipóteses de destituição do poder familiar, quando ausentes ou impossibilitados os pais de representar adequadamente o menor ou quando houver colisão de interesses entre pais e filhos.
Entretanto, o fato de ter sido concedida a guarda permanente a terceiro que não compõe o núcleo familiar não implica em automática destituição – ou em injustificada restrição – do exercício do poder familiar pela genitora, sobretudo porque medida dessa espécie não prescinde de cognição exauriente em ação a ser proposta especificamente para essa finalidade.
Assim, não havendo nenhum óbice ao ajuizamento da ação investigatória de paternidade pelo menor representado pela genitora, descabe a propositura da referida ação pela guardiã, ressalvada a possibilidade de, na inércia da genitora, a ação ser proposta pelo Ministério Público e, excepcionalmente, até mesmo pela própria guardiã, desde que presentes circunstâncias excepcionais que justifiquem a concessão a ela de poderes de representação judicial.

PROCESSO
REsp 1.645.589-MS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
TEMA
Relação de consumo. Cobrança judicial indevida. Má-fé demonstrada. Art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. Inexistência dos pressupostosArt. 940 do Código Civil. Norma complementar. Incidência.
DESTAQUE
A cobrança judicial indevida de dívida oriunda de relação de consumo admite a aplicação da sanção prevista no art. 940 do Código Civil.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Os artigos 940 do Código Civil e 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor possuem pressupostos de aplicação diferentes e incidem em hipóteses distintas.
A aplicação da pena prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC apenas é possível diante da presença de engano justificável do credor em proceder com a cobrança, da cobrança extrajudicial de dívida de consumo e de pagamento de quantia indevida pelo consumidor.
No que se refere ao artigo 940 do CC, este somente pode ser aplicado quando a cobrança se dá por meio judicial e fica comprovada a má-fé do demandante, independentemente de prova do prejuízo.
Dessa forma, mesmo diante de uma relação de consumo, se inexistentes os pressupostos de aplicação do art. 42, parágrafo único, do CDC, deve ser aplicado o sistema geral do Código Civil, no que couber.
Destaca-se que o art. 940 do CC é norma complementar ao art. 42, parágrafo único, do CDC e, no caso, sua aplicação está alinhada ao cumprimento do mandamento constitucional de proteção do consumidor.

PROCESSO
REsp 1.807.216-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Cumprimento de sentença condenatória de alimentos. Exame da gratuidade a partir da situação econômica do representante legal do menor. Impossibilidade. Presunção de insuficiência econômica do menor.
DESTAQUE
Em ação judicial que versa sobre alimentos ajuizada por menor, não é admissível que a concessão da gratuidade de justiça esteja condicionada a demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O direito ao benefício da gratuidade de justiça possui natureza individual e personalíssima, não podendo ser automaticamente estendido a quem não preencha os pressupostos legais para a sua concessão e, por idêntica razão, não se pode exigir que os pressupostos legais que autorizam a concessão do benefício sejam preenchidos por pessoa distinta da parte, como o seu representante legal.
Em se tratando de direito à gratuidade de justiça pleiteado pelo menor, é apropriado que, inicialmente, incida a regra do art. 99, §3º, do novo CPC, deferindo-se o benefício ao menor em razão da presunção de sua insuficiência de recursos decorrente de sua alegação, ressalvando-se, todavia, a possibilidade de o réu demonstrar, com base no art. 99, §2º, do novo CPC, a posteriori, a ausência dos pressupostos legais que justificam a gratuidade, pleiteando, em razão disso, a revogação do benefício concedido.
Essa forma de encadeamento dos atos processuais privilegia, a um só tempo, o princípio da inafastabilidade da jurisdição, pois não impede o imediato ajuizamento da ação e a prática de atos processuais eventualmente indispensáveis à tutela do direito vindicado, e também o princípio do contraditório, pois permite ao réu que produza prova, ainda que indiciária, de que não se trata de hipótese de concessão do benefício.
Deve também ser levada em consideração a natureza do direito material que é objeto da ação e, nesse contexto, não há dúvida de que não pode existir restrição injustificada ao exercício do direito de ação em que se busque o adimplemento de obrigação de natureza alimentar.
Com efeito, o fato de a representante legal das partes possuir atividade remunerada e o elevado valor da obrigação alimentar que é objeto da execução não podem, por si só, servir de empeço à concessão da gratuidade de justiça aos menores credores dos alimentos.

PROCESSO
REsp 1.835.778-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 04/02/2020, DJe 06/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
TEMA
Cumprimento de sentença. Pedido de inclusão do nome do executado em cadastro de inadimplentes, nos termos do art. 782 § 3º, do CPC/2015. Exigência de prévia recusa administrativa dos órgãos de proteção ao crédito. Desnecessidade.
DESTAQUE
O requerimento de inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes, nos termos do que dispõe o art. 782, § 3º, do CPC/2015, não depende da comprovação de prévia recusa administrativa das entidades mantenedoras do respectivo cadastro.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Em relação às medidas executivas típicas, uma das novidades trazidas pelo novo diploma processual civil é a possibilidade de inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, a qual encontra previsão expressa no art. 782, § 3º, do CPC de 2015, que assim dispõe: "A requerimento da parte, o juiz pode determinar a inclusão do nome do executado em cadastros de inadimplentes".
Da referida norma, verifica-se que a negativação do nome pela via judicial somente será possível por requerimento da parte, nunca de ofício.
Saliente-se que tal medida se mostra extremamente importante na concretização do princípio da efetividade do processo, pois acarreta significativa limitação ao crédito do devedor, em razão da negativação de seu nome, sendo um instrumento eficaz para assegurar a satisfação da obrigação.
Vale ressaltar que a medida prevista no art. 782, § 3º, do CPC/2015 não impõe ao Juiz o dever de determinar a negativação do nome do devedor, pois se trata de mera faculdade - em razão do uso da forma verbal "pode" -, e não de uma obrigação legal, devendo ser analisadas as particularidades do caso concreto.
Ocorre que, conquanto o magistrado não esteja obrigado a deferir a medida executiva prevista no referido dispositivo, não se revela legítimo o fundamento adotado pelas instâncias ordinárias no caso ora em julgamento, no sentido de que "o acionamento do aparato judiciário somente se justifica se o credor não conseguir obter administrativamente a averbação da existência da ação nos referidos cadastros".
Ora, além de o Tribunal de origem ter criado um requisito não previsto em lei para a adoção da medida executiva de negativação do nome do devedor, tal entendimento está na contramão de toda a sistemática trazida com o novo Código de Processo Civil, em que se busca a máxima efetividade da tutela jurisdicional prestada, conforme já destacado.
Com efeito, em decorrência do princípio da efetividade do processo, a norma do art. 782, § 3º, do CPC/2015, que possibilita a inscrição do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes, deve ser interpretada de forma a garantir maior amplitude possível à concretização da tutela executiva, não sendo razoável que o Poder Judiciário imponha restrição ao implemento dessa medida sem qualquer fundamento plausível e em manifesto descompasso com o propósito defendido pelo novo CPC, especialmente em casos como o presente, em que as tentativas de satisfação do crédito foram todas frustradas.
Por fim, destaque-se que não se olvida que nada impede que o credor requeira extrajudicialmente a inclusão do nome do devedor em cadastros de inadimplentes. Todavia, também não há qualquer óbice para que esse requerimento seja feito diretamente pela via judicial, no bojo da execução, como possibilita expressamente o art. 782, § 3º, do CPC/2015.
Aliás, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ implementou o sistema "SerasaJud", mediante termo de cooperação técnica firmado com o Serasa, justamente com o intuito de facilitar a tramitação de ofícios expedidos pelo Poder Judiciário com ordens de inscrição de nomes no respectivo cadastro de inadimplentes, facilitando, assim, a operacionalização do disposto no art. 782, §§ 3º a 5º, do CPC/2015.

QUARTA TURMA
PROCESSO
REsp 1.433.650-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 19/11/2019, DJe 04/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Sucessão. Renúncia à herança. Ato formal e solene. Escritura pública. Ato não sujeito à condição ou termo. Requerimento de anulação de negócio jurídico pelos renunciantes. Impossibilidade.
DESTAQUE
Aquele que renuncia a herança não tem legitimidade para pleitear eventual nulidade de negócio jurídico que envolva um dos bens que integram o patrimônio do de cujus.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Diferentemente da informalidade do ato de aceitação da herança, a renúncia a ela, como exceção à regra, exige a forma expressa, cuja solenidade deve constar de instrumento público ou por termos nos autos (art. 1807 do Código Civil), ocorrendo a sucessão como se o renunciante nunca tivesse existido, acrescendo-se sua porção hereditária a dos outros herdeiros da mesma classe.
Além disso, a renúncia e a aceitação à herança são atos jurídicos puros não sujeitos a elementos acidentais. Essa é a regra estabelecida no caput do art. 1808 do Código Civil, segundo o qual não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes, sob condição (evento futuro incerto) ou termo (evento futuro e certo).
No caso, a renúncia realizou-se nos termos da legislação de regência, produzindo todos os seus efeitos: a) ocorreu após a abertura da sucessão, antes que os herdeiros aceitassem a herança, mesmo que presumidamente, nos termos do art. 1807 do CC/2002; b) observou-se a forma por escritura pública, c) por agentes capazes, havendo de se considerar que os efeitos advindos do ato se verificaram.
Diante desse cenário, os renunciantes não têm interesse na decretação de nulidade ou anulação do negócio jurídico, que, segundo alegam, realizou-se à margem do ordenamento, tendo em vista que, fosse considerado nulo o negócio, retornando o bem ao patrimônio da falecida irmã, a cuja herança renunciaram, nenhum proveito teriam com a nova situação.
Nessa linha, perfeita a renúncia, considera-se como se nunca tivessem existido os renunciantes, não remanescendo nenhum direito sobre o bem objeto do negócio acusado de nulo, nem sobre bem algum do patrimônio.

PROCESSO
REsp 1.595.832-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 29/10/2019, DJe 04/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL
TEMA
Contrato de mútuo com cláusula de alienação fiduciária. Imóvel indicado como garantia. Proteção do bem de família. Descabimento.
DESTAQUE
A proteção conferida ao bem de família pela Lei 8.009/90 não importa em sua inalienabilidade, revelando-se possível a disposição do imóvel pelo proprietário, inclusive no âmbito de alienação fiduciária.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a definir se é válida a pactuação da alienação fiduciária em garantia de imóvel de moradia em contrato de mútuo, na hipótese em que inexistente qualquer alegação de vício de consentimento do beneficiário da proteção.
Importante assinalar, de início, que o o bem de família legal (proteção estatal disciplinada pela Lei n. 8.009/1990) apresenta características diferentes do bem de família voluntário ou convencional (artigos 1.711 a 1.722 do Código Civil).
Segundo a doutrina, o bem de família voluntário, que depende de ato voluntário, gera a inalienabilidade e impenhorabilidade, vez que instituído o bem de família, através do procedimento público no Cartório Imobiliário, torna-se impenhorável e inalienável, restringindo sua comerciabilidade. Por outro lado, o bem de família legal, regulado pela Lei n. 8.009/1990, gera, apenas, a impenhorabilidade, não respondendo pelas dívidas civis, trabalhistas, comerciais, fiscais, previdenciárias e de qualquer natureza, não se revelando crível pudesse a norma legal impedir a livre disposição (alienação) do bem por parte de seu titular.
Desse modo, à luz da jurisprudência dominante das Turmas de Direito Privado: (a) a proteção conferida ao bem de família pela Lei n. 8.009/1990 não importa em sua inalienabilidade, revelando-se possível a disposição do imóvel pelo proprietário, inclusive no âmbito de alienação fiduciária; e (b) a utilização abusiva de tal direito, com evidente violação do princípio da boa-fé objetiva, não deve ser tolerada, afastando-se o benefício conferido ao titular que exerce o direito em desconformidade com o ordenamento jurídico.

PROCESSO
REsp 1.351.058-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 26/11/2019, DJe 04/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL
TEMA
Dívida firmada por cooperativa. Fiança. Outorga conjugal. Necessidade.
DESTAQUE
É necessária outorga conjugal para fiança em favor de sociedade cooperativa.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia em definir se é válida a fiança prestada, sem outorga conjugal, para garantia de dívida de sociedade cooperativa.
Nos termos do artigo 4º da Lei n. 5.764/1971, as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados.
Nesse contexto normativo, a jurisprudência desta Corte preconiza que as Cooperativas possuem natureza civil e praticam atividades econômicas não empresariais (Código Civil de 2002), não podendo, ademais, serem qualificadas como "comerciantes" para fins de incidência da parte primeira (revogada) do Código Comercial.
Sob tal perspectiva, o revogado art. 256 do Código Comercial, vigente à época da instituição da garantia, exigia, para a caraterização da fiança como mercantil, que o afiançado ostentasse a condição de comerciante e que a obrigação objeto da garantia decorresse de uma causa comercial.
Dessa forma, em se tratando de dívida de sociedade cooperativa – a qual nem à luz do Código Comercial ou do Código Civil de 2002 ostenta a condição de comerciante ou de sociedade empresária –, não há falar em fiança mercantil, caindo por terra o fundamento exarado pelas instâncias ordinárias para afastar a exigência da outorga conjugal encartada nos artigos 235, inciso III, do Código Civil de 1916 e 1.647, inciso III, do Código Civil de 2002.
Consequentemente, inexistindo o consentimento de um dos cônjuges para a prestação da fiança civil para garantia do pagamento de dívida contraída pela por cooperativa, sobressai a ineficácia do contrato acessório, a teor da Súmula n. 332/STJ: "A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia".

PROCESSO
REsp 1.800.032-MT, Rel. Min. Marco Buzzi, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 05/11/2019, DJe 10/02/2020
RAMO DO DIREITO
DIREITO CIVIL, DIREITO EMPRESARIAL, DIREITO FALIMENTAR
TEMA
Empresário rural. Regularidade do exercício da atividade anterior ao registro do empreendedor. Pedido de recuperação judicial. Cômputo do período de exercício da atividade rural anterior ao registro. Possibilidade.
DESTAQUE
O cômputo do período de dois anos de exercício da atividade econômica, para fins de recuperação judicial, nos termos do art. 48 da Lei n. 11.101/2005, aplicável ao produtor rural, inclui aquele anterior ao registro do empreendedor.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
O art. 971 do Código Civil confere tratamento favorecido ao empresário rural, não sujeito a registro, em relação ao empresário comum. Por esse motivo é que o art. 971 dispensa o empresário rural daquela inscrição que é obrigatória para o empresário comum, estabelecendo que aquele (o rural) "pode requerer inscrição" nos termos do art. 968.
O produtor rural, por não ser empresário sujeito a registro, está em situação regular, mesmo ao exercer atividade econômica agrícola antes de sua inscrição, por ser esta para ele facultativa.
Conforme os arts. 966, 967, 968, 970 e 971 do Código Civil, com a inscrição, fica o produtor rural equiparado ao empresário comum, mas com direito a "tratamento favorecido, diferenciado e simplificado (...), quanto à inscrição e aos efeitos daí decorrentes".
Assim, os efeitos decorrentes da inscrição são distintos para as duas espécies de empresário: o sujeito a registro e o não sujeito a registro. Para o empreendedor rural, o registro, por ser facultativo, apenas o transfere do regime do Código Civil para o regime empresarial, com o efeito constitutivo de "equipará-lo, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro", sendo tal efeito constitutivo apto a retroagir (ex tunc), pois a condição regular de empresário já existia antes mesmo do registro. Já para o empresário comum, o registro, por ser obrigatório, somente pode operar efeitos prospectivos, ex nunc, pois apenas com o registro é que ingressa na regularidade e se constitui efetivamente, validamente, empresário.
Após obter o registro e passar ao regime empresarial, fazendo jus a tratamento diferenciado, simplificado e favorecido quanto à inscrição e aos efeitos desta decorrentes (CC, arts. 970 e 971), adquire o produtor rural a condição de procedibilidade para requerer recuperação judicial, com base no art. 48 da Lei n. 11.101/2005 (LRF), bastando que comprove, no momento do pedido, que explora regularmente a atividade rural há mais de 2 (dois) anos. Pode, portanto, para perfazer o tempo exigido por lei, computar aquele período anterior ao registro, pois tratava-se, mesmo então, de exercício regular da atividade empresarial.
Pelas mesmas razões, não se pode distinguir o regime jurídico aplicável às obrigações anteriores ou posteriores à inscrição do empresário rural que vem a pedir recuperação judicial, ficando também abrangidas na recuperação aquelas obrigações e dívidas anteriormente contraídas e ainda não adimplidas.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

A RESERVA DA QUARTA PARTE DA HERANÇA (ART. 1.832 DO CÓDIGO CIVIL) E A SUCESSÃO HÍBRIDA

A RESERVA DA QUARTA PARTE DA HERANÇA (ART. 1.832 DO CÓDIGO CIVIL) E A SUCESSÃO HÍBRIDA[1]
Flávio Tartuce[2]
Complementando as regras básicas relativas à ordem de sucessão legítima e à vocação hereditária, com especial tratamento quanto à sucessão dos descendentes em concorrência com o cônjuge, o art. 1.832 do Código Civil de 2002 − sem correspondente na codificação anterior − trata da chamada reserva da quarta parte da herança. Conforme a sua exata redação, "em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer". O objetivo da norma é assegurar um patrimônio mínimo ao cônjuge sobrevivente, papel que era exercido, no Código Civil de 1916, pelo chamado usufruto vidual.
Como primeira observação a respeito do comando, diante da equiparação sucessória feita pelo Supremo Tribunal Federal, em julgamento encerrado no ano de 2017 e que reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil (decisum publicado no Informativo n. 840 do STF), passa ele a ter plena incidência para a união estável, o que foi reconhecido em 2019 pelo Superior Tribunal de Justiça, em julgado que ainda será aqui melhor explicado.
Como se pode perceber, a norma da codificação privada em vigor enuncia que o cônjuge – e agora também o convivente ou companheiro – recebe o mesmo quinhão que recebem os descendentes. Ademais, em continuidade, o preceito consagra a citada reserva da quarta parte da herança ao cônjuge ou ao companheiro se ele for ascendente dos descendentes com quem concorrer, geralmente pai ou mãe do filho do falecido, de cuja herança se trata. Assim, se por outro lado o cônjuge ou companheiro concorrer somente com descendentes do falecido, não haverá a referida reserva. Na verdade, o principal debate a respeito do comando somente ganha relevo se houver a concorrência com mais de três descendentes do falecido, situação em que a reserva da quarta parte seria alvo de dúvidas.
Observa-se, portanto, que a principal discussão que o dispositivo desperta tem relação com a chamada sucessão ou concorrência híbrida, expressão criada pela Professora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, presente quando o cônjuge ou convivente concorre com descendentes comuns − de ambos −, e com descendentes exclusivos do autor da herança (HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Comentários ao Código Civil. 2. ed. Coord. Antonio Junqueira de Azevedo. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 20, p. 235-236). Isso porque tal hipótese não foi prevista pelo legislador, presente uma lacuna normativa, a ser sanada pelo intérprete. A propósito, a jurista citada tem procurado analisar a polêmica que forma o cerne principal deste artigo em suas aulas e palestras sobre a sucessão legítima.
 Duas foram as correntes fundamentais que surgiram sobre essa controvérsia, conforme consta de tabela doutrinária elaborada por Francisco José Cahali, em obra de grande expressão, lançada nos anos iniciais de vigência do Código Civil de 2002 (Direito das sucessões. 3. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 189-192).
Para uma primeira corrente, tida desde o início como majoritária, em havendo a sucessão híbrida, não se deve fazer a reserva da quarta parte ao cônjuge ou ao companheiro, tratando-se todos os descendentes como se fossem exclusivos do autor da herança. Assim entendem − conforme menções constantes na citada tabela doutrinária − Caio Mário da Silva Pereira, Christiano Cassettari, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Gustavo René Nicolau, Inácio de Carvalho Neto, Jorge Fujita, Luiz Paulo Vieira de Carvalho, Maria Berenice Dais, Maria Helena Diniz, Maria Helena Braceiro Daneluzzi, Mário Delgado, Mário Roberto Carvalho de Faria, Rodrigo da Cunha Pereira, Rolf Madaleno, Sebastião Amorim, Euclides de Oliveira e Zeno Veloso; além do presente autor.
Esse entendimento prestigia os interesses e direitos dos filhos em detrimento dos do cônjuge, sendo essa a opção constitucional, como apontam os juristas citados. Adotando a premissa, na V Jornada de Direito Civil, evento promovido pelo Conselho da Justiça Federal no ano de 2011, aprovou-se o seguinte enunciado: “na concorrência entre o cônjuge e os herdeiros do de cujus, não será reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso de filiação híbrida” (Enunciado n. 527). Reitero que a destacada ementa doutrinária e todas essas afirmações têm incidência, agora, para a concorrência do companheiro com os descendentes, eis que foi ele incluído no art. 1.829 do Código Civil pela decisão do Supremo Tribunal Federal antes mencionada, com repercussão geral.
Por outra via, para uma segunda corrente doutrinária, tida como minoritária, em havendo sucessão híbrida, deve ser feita a reserva da quarta parte ao cônjuge, tratando-se todos os descendentes como comuns, como pensam Francisco José Cahali, José Fernando Simão e Sílvio de Salvo Venosa. Essa corrente está baseada em uma interpretação literal do art. 1.832, pois a reserva da quarta parte deve ocorrer em havendo descendentes de ambos, não sendo relevante para afastar tal subsunção a presença também de filhos exclusivos somente do falecido.
Tentando resolver esse dilema, em 2019 surgiu o antes citado precedente da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que menciona obra de minha autoria, especialmente o debate doutrinário aqui exposto. Seguindo a primeira corrente, o aresto conclui que não deve ocorrer a reserva da quarta parte em havendo a sucessão ou concorrência híbrida. Pontue-se que o caso dizia respeito a união estável, e não a casamento, fazendo incidir a equalização sucessória entre as entidades familiares, conforme a tão citada decisão do STF. Como consta da primeira parte da sua ementa, "o Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do e. Min. Luís Roberto Barroso, quando do julgamento do RE 878.694/MG, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CCB tendo em vista a marcante e inconstitucional diferenciação entre os regimes sucessórios do casamento e da união estável" (STJ, REsp 1.617.501/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/06/2019, REPDJe 06/09/2019, DJe 01/07/2019).
Na sequência é enfrentado o dilema relativo à concorrência do companheiro com os descendentes no regime da comunhão parcial de bens, sendo citado o julgado a respeito da consolidação de pensamento que se deu no âmbito da Segunda Seção da Corte, no sentido de que, "nos termos do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente, casado no regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens particulares. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus" (STJ, REsp 1.368.123/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Rel. p/ Acórdão Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/04/2015, DJe 08/06/2015).
E, por fim, enfrentando o tema principal deste texto − e com base nos entendimentos doutrinários de Paulo Lôbo, Carlos Roberto Gonçalves, Mario Luiz Delgado e Mairan Maia −, deduziu-se que "a interpretação mais razoável do enunciado normativo do art. 1.832 do Código Civil é a de que a reserva de 1/4 da herança restringe-se à hipótese em que o cônjuge ou companheiro concorrem com os descendentes comuns. Enunciado 527 da Jornada de Direito Civil. A interpretação restritiva dessa disposição legal assegura a igualdade entre os filhos, que dimana do Código Civil (art. 1.834 do CCB) e da própria Constituição Federal (art. 227, § 6º, da CF), bem como o direito dos descendentes exclusivos não verem seu patrimônio injustificadamente reduzido mediante interpretação extensiva de norma" (STJ, REsp 1.617,501/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe 01/07/2019).
Como se pode perceber, o acórdão traz em seu conteúdo respostas a muitas questões que eram pendentes no passado sobre o Direito das Sucessões Brasileiro e resolve mais um dilema, qual seja a não reserva da quarta parte da herança em favor do cônjuge ou companheiro em havendo a sucessão híbrida.
Espero que outros julgados estaduais e mesmo da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça sigam esse entendimento, que traduz a mais correta e prevalecente interpretação doutrinária do vigente sistema sucessório brasileiro. Sobre essa temática, como se pode perceber, doutrina majoritária e jurisprudência estão em sintonia, o que é sempre louvável na realidade contemporânea, para trazer estabilidade às relações privadas.

[1] Coluna do Migalhas de fevereiro de 2020.
[2] Pós-Doutorando e Doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUCSP. Professor Titular permanente e coordenador do mestrado da Escola Paulista de Direito (EPD). Professor e coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensu em Direito Privado da EPD. Professor do G7 Jurídico. Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito Contratual (IBDCONT). Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família em São Paulo (IBDFAM/SP). Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico.