sábado, 31 de março de 2012

REPORTAGEM DO ESTADO DE SÃO PAULO. GRANDE LAGRASTA!!!


O ESTADO DE SÃO PAULO.

Juiz do TJ-SP pede divulgação de nomes de quem recebeu pagamento antecipado

Desembargador Lagrasta Neto diz que 'segredo de polichinelo' coloca todos os juízes sob suspeita

30 de março de 2012 | 22h 30


Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Aos 68 anos, desde 1975 a toga é sua vida. Caetano Lagrasta Neto é um homem angustiado. Nos arredores da Sé, no 18.º andar, o desembargador contempla o retrato dos filhos e netos, sobre o armário do gabinete no Tribunal de Justiça de São Paulo. “É um final de carreira melancólico o meu, apontado na rua, no clube, em família.”

Márcio Fernandes/AE

Desembargador enviou e-mail ao presidente da corte, Ivan Sartori
Apontado, ele diz, como um dos milionários da corte, aquinhoado com pagamento antecipado de grande soma, o que não é verdade. A infâmia o desconforta, por isso clama pela publicação da lista dos bem-pagos. “Escuto toda hora: ‘Você recebeu?’ Eu nem falo mais que sou desembargador.”

Caetano Lagrasta Neto é uma tradição na maior corte do País. Sua palavra, atestam os pares, tem o peso de uma sentença. “Amanhã meus netos vão comentar: ‘Olha o que aconteceu no tribunal e o nosso avô estava lá’. Eu não queria isso. Depois de uma vida inteira sem uma única reclamação, uma vida limpa, é este o prêmio que recebo.”

São 211 os juízes e desembargadores que receberam pagamentos antecipados. Não significa que tenham praticado conduta ilícita ou desfalcado o erário, já que o dinheiro era devido por férias e licenças-prêmio não tiradas no tempo certo.

São 29 os que embolsaram acima de R$ 100 mil e estão sob investigação. Dois ex-presidentes - Roberto Vallim Bellocchi e Antonio Carlos Vianna Santos - somam R$ 2,65 milhões. O dinheiro foi pago durante suas próprias gestões. Outros três, que integravam a Comissão de Orçamento e Finanças, ganharam mais de R$ 600 mil cada. A corte sangra, dia após dia. Será assim até o Órgão Especial decidir o que fazer: punição ou gaveta.

Mensagem. Lagrasta, da 8.ª Câmara de Direito Privado, não está em lista nenhuma. Nem ele nem outros desembargadores que também vivem dias de aflição e o apoiam na cruzada para a corte tornar público o rol de magistrados que podem ter violado o princípio da impessoalidade.

Não é de hoje que Lagrasta defende a divulgação dos nomes protegidos pelo manto do sigilo e do corporativismo. Em 21 de dezembro, ele enviou e-mail ao atual presidente, Ivan Sartori, de quem é amigo. “Prezado Ivan. Este segredo de polichinelo prejudica a todos, colocando-nos sob suspeita, ao mesmo tempo em que preserva os que se aproveitaram da amizade ou do conluio para desobedecer a preceitos legais.”

Ele retomou a pauta em fevereiro, quando o TJ informou que não eram 29 os beneficiários, mas 300. Enviou novo e-mail, agora para o Conselho Superior da Magistratura. “Quer parecer o lançamento de uma cortina de fumaça, capaz de confundir a verdade e o tamanho da afronta cometida”, escreveu. “Qual a origem desses 300? Uma coisa é receber o que a administração disponibiliza ou disponibilizou em holerite, sem que ninguém tivesse requerido. Outra, bem diferente, é requerer a si próprio, como membro da cúpula ou da Comissão de Vencimentos, e a si próprio deferir.”

Em 8 de março, Sartori comunicou a Lagrasta e a toda a classe que o Conselho Superior indeferiu pedido de divulgação dos nomes que receberam “antecipações excepcionais de créditos devidos, por estar a matéria pendente de decisão do Órgão Especial, respeitado o princípio da presunção de inocência”. Lagrasta defende a cautela do presidente. “Se o Ivan (Sartori) fosse impulsivo, teria mostrado a lista. Por que crucificar o presidente? Mas a divulgação da lista é importante”, reforça.

Lagrasta fala de um poder acuado. “Por que chegamos a este ponto? A partir do momento em que deixamos de julgar governador, hoje responsabilidade do Superior Tribunal de Justiça”, opina. “O Judiciário está de chapéu na mão. Não podemos ficar reféns do Executivo.”

A menos de dois anos da aposentadoria, o desembargador não quer homenagens, nem placa com seu nome gravado. Apenas que se restaure a honra maculada da toga.

quinta-feira, 29 de março de 2012

RESUMO. INFORMATIVO 493 DO STJ.

CAPITALIZAÇÃO ANUAL DE JUROS. ENCARGOS MENSAIS. IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO.
A Seção entendeu que, para os contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), até a entrada em vigor da Lei n. 11.977/2009, não havia regra especial a propósito da capitalização de juros, de modo que incidia a restrição da Lei de Usura (art. 4º do Dec. n. 22.626/1933). Para tais contratos, não é válida a capitalização de juros vencidos e não pagos em intervalo inferior a um ano, permitida a capitalização anual, regra geral que independe de pactuação expressa. Ressalva do ponto de vista da Min. Relatora no sentido da aplicabilidade no SFH do art. 5º da MP n. 2.170-36, permissivo da capitalização mensal, desde que expressamente pactuada. Assim, no SFH os pagamentos mensais devem ser imputados primeiramente aos juros e depois ao principal nos termos do disposto no art. 354 do CC/2002 (art. 993 do CC/1916). Esse entendimento foi consagrado no julgamento pela Corte Especial do REsp 1.194.402-RS, submetido ao rito do art. 543-C. E, caso o pagamento mensal não seja suficiente para a quitação sequer dos juros, cumpre-se determinar o lançamento dos juros vencidos e não pagos em conta separada, sujeita apenas à correção monetária, com o fim exclusivo de evitar a prática de anatocismo. REsp 1.095.852-PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 14/3/2012.

PRECLUSÃO. CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL. CAPITALIZAÇÃO. JUROS.
Na espécie, ante a demora do banco ora recorrido em apresentar a documentação necessária à realização de perícia contábil, o juízo a quo determinou que eventuais custas remanescentes fossem quitadas e os autos, a ele conclusos para sentença. Intimados dessa decisão, não se opuseram os recorrentes, depositando as quantias devidas à escrivania, o que levou à conclusão irrefutável de desistência tácita da produção de provas então oportunizada. Embora os recorrentes aleguem jamais ter desistido da prova pericial, não informam por que não agravaram da decisão que determinou o julgamento antecipado do processo, tampouco por que recolheram o devido preparo. Assim, improcedente a alegação de cerceamento de defesa, quer por ausência de recurso conveniente se contrapondo ao julgamento antecipado (preclusão temporal), quer por pagamento das custas processuais imprescindíveis ao julgamento (preclusão lógica), ou seja, a prática de ato incompatível com a mencionada alegação, uma vez que transcorreu in albis o momento para os recorrentes se insurgirem contra a dispensa da realização da prova pericial. Quanto à oposição dos recorrentes à capitalização mensal dos juros, é assente o entendimento do STJ de que essa capitalização nas cédulas de crédito comercial, como no caso, é permitida desde que emitidas a partir da publicação da MP n. 1.963-17/2000 e pactuada a capitalização. Ocorre que, nessa demanda, o próprio recorrido admite que a cédula de crédito comercial foi emitida em 24/8/1998, não podendo ser ela alcançada pelos efeitos da supradita MP, publicada em 31/3/2000. Portanto, a capitalização dos juros, na hipótese, será semestral nos termos do art. 5º do DL n. 413/1969, cujas disposições são aplicáveis às cédulas de crédito comercial por força da Lei n. 6.840/1980. Com essas razões, a Turma conheceu parcialmente do recurso e, nessa parte, deu-lhe parcial provimento apenas para limitar a capitalização dos juros à periodicidade semestral. Precedentes citados: AgRg no REsp 645.990-RS, DJe 9/6/2011; AgRg nos EDcl no Ag 1.106.028-MT, DJe 9/12/2011, e AgRg no REsp 911.100-MS, DJe 6/9/2011. REsp 1.134.955-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/3/2012.

ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. VALIDADE. REGISTRO. DESENHO INDUSTRIAL.
A discussão gira em torno da possibilidade de o juiz ou o tribunal estadual, ao apreciar um pedido de antecipação de tutela, negar a proteção a uma marca, patente ou desenho industrial registrados, ainda que diante de notória semelhança, com fundamento apenas na aparente invalidade do registro não declarada pela Justiça Federal. Embora a LPI preveja, em seu art. 56, § 1º, a possibilidade de alegação de nulidade do registro como matéria de defesa, a melhor interpretação desse dispositivo indica que ele deve estar inserido numa ação que discuta, na Justiça Federal, a nulidade do registro. Isso porque não seria razoável que, para o reconhecimento da nulidade pela via principal, seja prevista uma regra especial de competência e a indispensável participação do INPI, mas, para o mero reconhecimento incidental da invalidade do registro, não se imponha cautela alguma. Isso conferiria ao registro no INPI uma eficácia meramente formal e administrativa. Autorizar que o produto seja comercializado e, apenas depois, em matéria de defesa numa ação de abstenção, seja alegada a nulidade pelo suposto contrafator implica inverter a ordem das coisas. O peso de demonstrar os requisitos da medida liminar recairia sobre o titular da marca e cria-se, em favor do suposto contrafator, um poderoso fato consumado: eventualmente o prejuízo que ele experimentaria com a interrupção de um ato que sequer deveria ter se iniciado pode impedir a concessão da medida liminar em favor do titular do direito. Assim, a validade de um registro de marca, patente ou desenho industrial, nos moldes da lei supradita, tem de ser travada administrativamente ou, caso a parte opte por recorrer ao Judiciário, deve ser proposta ação de nulidade na Justiça Federal, com a participação do INPI na demanda. Sem isso, os registros emitidos por esse órgão devem ser reputados válidos e produtores de todos os efeitos de direito. Dessarte, ao reconhecer a invalidade de um registro incidentalmente, o tribunal de origem violou a regra do art. 57 da LPI. Precedentes citados: REsp 325.158-SP, DJ 9/10/2006; REsp 242.083-RJ, DJ 5/2/2001, REsp 57.556-RS, DJ 22/4/1997, REsp 11.767-SP, DJ 24/8/1992 e, REsp 36.898-SP, DJ 28/3/1994. REsp 1.132.449-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/3/2012.

IMÓVEL. INADIMPLEMENTO. LEILÃO. SUSPENSÃO. CREDOR. REINTEGRAÇÃO. POSSE.
A quaestio juris está em estabelecer se há pretensão possessória em favor do credor por contrato de financiamento de imóvel com pacto de alienação fiduciária em garantia, na hipótese em que tal pretensão é exercida depois da consolidação da propriedade do imóvel, mas antes dos leilões a que se refere o art. 27 da Lei n. 9.514/1997. Na espécie, cuidou-se de ação de reintegração de posse por construtora (recorrida) referente a imóvel por ela vendido mediante alienação fiduciária em garantia, tendo em vista a inadimplência dos recorrentes. Para a retomada do bem, a recorrida constituiu-os em mora mediante notificação e, sem pagamento, consolidou o imóvel em sua propriedade (art. 26, § 7º, da Lei n. 9.514/1997). Em seguida, estabeleceu datas para a realização de dois leilões extrajudiciais do bem. Entretanto, antes da possessória ajuizada pela recorrida, o leilão foi suspenso por decisão judicial, em decorrência de ação ajuizada por um dos recorrentes devido à irregularidade de intimação quanto ao procedimento, sendo precedido de outro processo do outro recorrente com o mesmo objeto. Ocorre que, independentemente da realização do leilão que estava suspenso, a recorrida solicitou a reintegração da posse do imóvel. Nesse panorama, a Min. Relatora destacou que a disputa possessória se dá quando se está diante da afirmação de duas posses, cada uma com o seu respectivo fundamento de fato e de direito. No caso dos autos, a posse dos recorrentes sobre o imóvel foi adquirida por ato inter vivos consubstanciado em contrato de compra e venda com alienação fiduciária em garantia. Desse modo, os recorrentes exerceram seu poder de fato sobre o imóvel, sendo, portanto, a aquisição da posse, derivada. Porém, com a inadimplência, o credor, ora recorrido, inaugurou os procedimentos para a retomada do bem e, ao fazê-lo, resolveu o contrato que fundamentara a posse do imóvel pelos recorrentes, de modo que o fundamento jurídico dessa posse se esvaiu. Assim, uma vez resolvido o contrato do qual emergia o fundamento da posse derivada, esta retorna ao seu antigo titular, podendo-se interpretar como um ato de esbulho a permanência do antigo possuidor no bem. Dessa forma, a consolidação da propriedade do bem no nome do credor fiduciante confere-lhe o direito à posse do imóvel. Negá-lo implicaria autorizar que o devedor fiduciário permanecesse em bem que não lhe pertence sem pagamento de contraprestação, na medida em que a Lei n. 9.514/1997 estabelece, em seu art. 37-A, o pagamento de taxa de ocupação apenas depois da realização dos leilões extrajudiciais. Se os leilões são suspensos, como ocorreu na hipótese, a lacuna legislativa não pode implicar imposição ao credor fiduciante de um prejuízo a que não deu causa. Dessarte, o destino que deve ser dado ao imóvel entre o prazo da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciante e a data dos leilões judiciais deve ser o de atender à natural destinação econômica do bem, sendo que a permanência daquele que promoveu esbulho do imóvel não atende a essa destinação. REsp 1.155.716-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 13/3/2012.

RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOGADO. EXERCÍCIO DA PROFISSÃO.
A Turma manteve a condenação de advogado ora recorrente ao pagamento de indenização por danos morais ao cliente no valor de R$ 15 mil, em decorrência de sua conduta maliciosa no exercício da profissão. No caso em comento, o recorrente foi contratado para propor ação ordinária contra o Estado do Paraná, pleiteando diferenças salariais e gratificações. Procurado diversas vezes pelo recorrido, ele negou o recebimento de procuração outorgada em seu favor, bem como o ajuizamento de qualquer demanda judicial em seu nome. Tal fato foi, inclusive, apurado em representação instaurada na OAB, que resultou em arquivamento diante da negativa do recorrente. Transcorridos quase vinte anos, após pesquisa realizada pela nova advogada contratada, descobriu-se que a ação havia sido efetivamente proposta pelo recorrente, até mesmo com recursos especiais para os tribunais superiores, tendo sido julgada improcedente. Em preliminar, afastou-se a alegada prescrição. Segundo observou o Min. Relator, na ação de reparação de danos em apreço, fundada no direito comum, e de acordo com as regras de transição do CC/ 2002 (art. 2.028), há de ser aplicado o novo prazo prescricional de três anos, consoante o disposto no art. 206, § 3º, IV, do referido diploma legal, contado o prazo da data da entrada em vigor do novo Código, e não da data do fato gerador do direito. No mérito, sustentou-se a inaplicabilidade do CDC nas relações contratuais entre clientes e advogados, que, de fato, são regidas pelo EOAB e pelo direito comum. Ao final, considerando o patente padecimento moral do recorrido diante das inverdades perpetradas pelo recorrente e da angústia de não saber o resultado da demanda, ainda que fosse negativa, manteve-se a responsabilização do advogado. REsp 1.228.104-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 15/3/2012.


DANOS MORAIS. MATÉRIA JORNALÍSTICA. PUBLICAÇÃO DE FOTO SEM AUTORIZAÇÃO.
A Turma negou provimento ao especial e manteve a indenização em favor do recorrido na importância de R$ 50 mil, pelo uso indevido de sua imagem em matéria jornalística. Trata-se, na espécie, de ação de reparação de danos morais proposta contra editora em razão da publicação da fotografia e nome do recorrido sem sua autorização, em reportagem na qual consta como testemunha de homicídio – estava na companhia do jovem agredido e morto – ocorrido na Praça da República, na capital paulista, por motivos homofóbicos. O Min. Relator destacou que o direito à imagem, qualificado como direito personalíssimo, assegura a qualquer pessoa a oposição da divulgação da sua imagem, em circunstâncias concernentes a sua vida privada e intimidade. Observou, contudo, que a veiculação de fotografia sem autorização não gera, por si só, o dever de indenizar, sendo necessária a análise específica de cada situação. No presente caso, reputou-se que a matéria jornalística teve como foco a intimidade do recorrido, expondo, de forma direta e clara, sua opção sexual. Dessa forma, a publicação da fotografia com o destaque “sobrevivente” não poderia ter sido feita sem autorização expressa; pois, sem dúvida, submeteu o recorrido, no mínimo, ao desconforto social de divulgação pública de sua intimidade. Assim, conclui-se ser indenizável o dano à imagem do recorrido. REsp 1.235.926-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 15/3/2012.

INDENIZAÇÃO. MATÉRIA JORNALÍSTICA. DIREITO DE INFORMAR. LIBERDADE DE IMPRENSA.
A Turma, por maioria, deu provimento ao recurso para afastar a responsabilização da empresa jornalística ora recorrente pelo pagamento de indenização à recorrida sob o entendimento de que, no caso, não existiria ilícito civil, pois a recorrente teria atuado nos limites do exercício de informar e do princípio da liberdade da imprensa. Na espécie, a defesa alegava ofensa à honra da recorrida; pois, em matéria publicada no referido jornal, ela teria sido confundida com uma evangélica fanática que, após quebrar o bloqueio da segurança presidencial, teria se aproximado do então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva para fazer um discurso favorável à pessoa de Fernandinho Beira-Mar. Inicialmente, observou o Min. Relator que, em se tratando de matéria veiculada pela imprensa, a responsabilidade civil por danos morais emerge quando a reportagem for divulgada com a intenção de injuriar, difamar ou caluniar. Nessas hipóteses, a responsabilidade das empresas jornalísticas seria de natureza subjetiva, dependendo da aferição de culpa, sob pena de ofensa à liberdade de imprensa. Assentou, ainda, que, se o fato divulgado for verídico e estiver presente o interesse público na informação, não há que falar em abuso na veiculação da notícia, caso em que, por consectário, inexiste o dever de indenizar, sendo essa a hipótese dos autos. Segundo destacou, a matéria publicada não tinha como objetivo ofender a honra da recorrida, mas sim noticiar a possível falha na segurança da então Presidência da República, que permitiu a aproximação de uma cidadã não identificada, sem autorização, da autoridade máxima do país, assunto, portanto, de interesse nacional. Consignou, ademais, que a matéria escorou-se em fatos objetivos e de notória relevância, o que afasta a ilicitude da divulgação, sendo que, em momento algum, foi publicada a fotografia ou o nome completo da recorrida. Pelo contrário, a reportagem trouxe a imagem da verdadeira autora do discurso, identificando-a pelo seu próprio nome. Dessa forma, ainda que tenham nomes similares, não seria crível ter havido confusão entre aquela e a ora recorrida. REsp 1.268.233-DF, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 15/3/2012.

PRESCRIÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. DANOS CONTÍNUOS E PERMANENTES.
A quaestio juris está em determinar, à luz do CC/1916, o prazo prescricional para que o beneficiário de seguro habitacional exerça a pretensão de receber indenização decorrente da existência de danos contínuos e permanentes no imóvel. O juiz de primeiro grau reconheceu a existência de danos contínuos e permanentes, salientando que esses vícios não são imputados a um único evento, sobrevindo de causas paulatinas, tais como a invasão de águas pluviais e dos efeitos da maré, além de defeitos decorrentes da execução da obra, motivo pelo qual não há como exigir comunicação específica de sinistro. Por outro lado, o tribunal de origem acolheu a alegação de prescrição, fazendo incidir à espécie o art. 178, § 6º, II, do CC/1916. Consignou ter o contrato sido celebrado em 1º/11/1983, e a ação, promovida mais de 20 anos depois (13/4/2004), sem que o proprietário indicasse a data em que os danos no imóvel surgiram ou se agravaram, obstando a fixação do dies a quo para contagem do prazo prescricional. A Min. relatora ressaltou que, dada a natureza sucessiva e gradual do dano, sua progressão dá azo a inúmeros sinistros sujeitos à cobertura securitária, renovando sucessivamente a pretensão do beneficiário do seguro e, por conseguinte, o marco inicial do prazo prescricional. A jurisprudência, em situações como essa, tem considerado que a pretensão do beneficiário do seguro emerge no momento em que, comunicado o fato à seguradora, esta se recusa a indenizar. No entanto, na hipótese, não houve recusa formal da seguradora de indenizar, sobretudo, uma data que servisse de base para a contagem do prazo prescricional. Inclusive, o STJ entende que, reconhecendo o acórdão recorrido que o dano foi contínuo, sem possibilidade de definir data para a sua ocorrência e possível conhecimento de sua extensão pelo segurado, não tem como revisar o julgado na via especial, para escolher o dies a quo do prazo prescricional. Assim, é impossível reconhecer a prescrição da pretensão do recorrente de ser indenizado pela seguradora dos danos descritos na exordial. Além do mais, o próprio STJ já consolidou o entendimento de que terceiro beneficiário do seguro não se sujeita ao prazo do art. 178, § 6º, II, do CC/1916, pois não se pode confundi-lo com a figura do segurado. Com essas e outras considerações, a Turma deu provimento ao recurso para afastar a prescrição reconhecida pelo acórdão recorrido, determinando o retorno dos autos à origem para que o Tribunal estadual prossiga o julgamento das apelações, na esteira do devido processo legal. Precedentes citados: REsp 247.347-MG, DJ 24/9/2001, e REsp 401.101-SP, DJ 17/2/2003. REsp 1.143.962-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/3/2012.

CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. REDE CONVENIADA. ALTERAÇÃO. INFORMAÇÃO.
Tendo em vista a importância que a rede conveniada assume para a continuidade do contrato, a operadora de plano de saúde somente cumprirá o dever de informar se comunicar individualmente a cada associado o descredenciamento de médicos e hospitais. Isso porque o direito à informação visa assegurar ao consumidor uma escolha consciente, permitindo que suas expectativas em relação ao produto ou serviço sejam de fato atingidas, manifestando o que vem sendo denominado de consentimento informado ou vontade qualificada. Diante disso, o comando do art. 6º, III, do CDC somente será efetivamente cumprido quando a informação for prestada ao consumidor de forma adequada, assim entendida como aquela que se apresenta simultaneamente completa, gratuita e útil, vedada, no último caso, a diluição da comunicação efetivamente relevante pelo uso de informações soltas, redundantes ou destituídas de qualquer serventia para o consumidor. Precedentes citados: REsp 418.572-SP, DJe 30/3/2009, e REsp 586.316-MG, DJe 19/3/2009. REsp 1.144.840-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/3/2012.

SEGURO DE SAÚDE. CARÊNCIA. ATENDIMENTO EMERGENCIAL. SITUAÇÃO-LIMITE.
A questão consiste em saber se, em seguro de assistência à saúde, é possível a seguradora invocar prazo de carência contratual para restringir o custeio dos procedimentos de emergência de que depende o beneficiário do seguro ao período concernente às doze primeiras horas de atendimento médico-hospitalar, a contar da internação. No caso, o recorrente ajuizou ação de obrigação de fazer em face da seguradora ora recorrida, sustentando ser beneficiário do seguro de assistência à saúde firmado com a recorrida. Aduz que, ao ser atendido no hospital, foi diagnosticada a existência de tumor cerebral maligno, com quadro médico grave e risco de morte, razão pela qual foi imediatamente internado para posterior intervenção neurocirúrgica. Apesar do caráter emergencial do exame de ressonância magnética nuclear, foi negada, pela recorrida, a sua cobertura ao argumento de que o contrato do recorrente estaria sujeito ao prazo de carência de 180 dias a partir da adesão ao seguro. E que, diante dessa situação, foi sua genitora quem custeou os exames. O juiz a quo julgou procedentes os pedidos formulados na inicial, obrigando a recorrida a custear todos os procedimentos necessários até a cessação e extirpação da moléstia, sob pena de arcar com multa diária de R$ 1 mil, determinando, também, o reembolso dos valores despendidos. Interposta apelação, o tribunal de justiça deu parcial provimento ao recurso da recorrida para limitar o período da cobertura. O recorrente interpôs recurso especial, que foi admitido. A Turma entendeu que, diante do disposto no art. 12 da Lei n. 9.656/1998, é possível a estipulação contratual de prazo de carência, todavia o inciso V, "c", do mesmo dispositivo estabelece o prazo máximo de 24 horas para cobertura dos casos de urgência e emergência. Os contratos de seguro e assistência à saúde são pactos de cooperação e solidariedade, cativos e de longa duração, informados pelos princípios consumeristas da boa-fé objetiva e função social, tendo o objetivo precípuo de assegurar ao consumidor, no que tange aos riscos inerentes à saúde, tratamento e segurança para amparo necessário de seu parceiro contratual. Os artigos 18, § 6º, III, e 20, § 2º, do CDC preveem a necessidade da adequação dos produtos e serviços à legítima expectativa do consumidor de, em caso de pactuação de contrato oneroso de seguro de assistência à saúde, não ficar desamparado no que tange a procedimento médico premente e essencial à preservação de sua vida. Como se trata de situação limite em que há nítida possibilidade de violação de direito fundamental à vida, não é possível a seguradora invocar prazo de carência contratual para restringir o custeio dos procedimentos de emergência relativos ao tratamento de tumor cerebral que aflige o beneficiário do seguro. Precedente citado do STF: RE 201819, DJ 27/10/2006; do STJ: REsp 590.336-SC, DJ 21/2/2005, e REsp 466.667-SP, DJ 17/12/2007. REsp 962.980-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/3/2012.

SEGURO DE VIDA. COMPLEMENTAÇÃO SECURITÁRIA. CIRURGIA DE REDUÇÃO DO ESTÔMAGO.
A discussão central do recurso reside em definir se, para fins securitários, é considerado morte natural ou morte acidental o óbito provocado por infecção generalizada decorrente de acidente durante cirurgia de gastroplastia ou bariátrica, popularmente conhecida por “cirurgia de redução de estômago”. No caso, a segurada, portadora de obesidade mórbida, submeteu-se à cirurgia de gastroplastia. Durante a operação, seu baço foi lesionado, o que a fez passar por uma intervenção para retirá-lo. Após receber alta hospitalar, teve de ser novamente hospitalizada em razão de sérias complicações pós-operatórias, devido ao grave quadro de infecção generalizada. Em decorrência dessas complicações, a segurada veio a óbito vinte dias após a cirurgia. Em razão do falecimento da segurada, os beneficiários do seguro de vida pleitearam administrativamente o prêmio, recebendo a indenização da cobertura básica por morte natural. Insatisfeitos, ajuizaram ação contra a seguradora para obter a diferença da indenização por morte acidental, estimada em R$ 33 mil. O juízo de direito acolheu o pedido, modificado pelo tribunal a quo, que entendeu ter ocorrido “morte natural”. A Min. Relatora, inicialmente, asseverou que, ainda que o conceito de acidente pessoal encontre previsão no contrato de seguro, não se aplicam à espécie os enunciados das súmulas de número 5 e 7 do STJ. Discute-se, em realidade, a qualificação jurídica do evento que resultou na morte da segurada, caracterizando por acidente ou por fato natural o desenrolar do procedimento cirúrgico que a vitimara. A Turma entendeu que a infecção generalizada resultante de imprevista lesão no baço da paciente não se manteve na linha natural do desdobramento cirúrgico. Tal acontecimento, no contexto de procedimentos médicos da mesma natureza, representou, em realidade, evento não esperado e pouco provável; fator externo e involuntário ao ato cirúrgico de "redução de estômago", ou seja, a lesão no baço acidentalmente ocorrida durante a cirurgia. Daí por que, para quaisquer fins, inclusive securitários, a infecção causadora da morte da vítima foi provocada pela lesão acidental, o que afasta a alegação de morte natural e autoriza a complementação do prêmio por morte acidental. Diante dessa e de outras considerações, a Turma deu parcial provimento ao recurso especial para julgar procedente o pedido de complementação da cobertura securitária. REsp 1.184.189-MS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 15/3/2012.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA NÃO ANOTADA NO CERTIFICADO DE REGISTRO DO VEÍCULO. DENUNCIAÇÃO À LIDE. CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL.
A Turma reiterou o entendimento do enunciado da Súm. n. 92/STJ, segundo o qual “a terceiro de boa-fé não é oponível a alienação fiduciária não anotada no certificado de registro do veículo automotor”. No caso, a recorrida, terceira adquirente de boa-fé, opôs embargos de terceiro à ação de busca e apreensão promovida pela instituição financeira, ao argumento de que, ao adquirir o automóvel, não havia registro de reserva de domínio no documento do veículo e de que foi surpreendida pelo pedido de registro do gravame quando o carro já estava em seu nome. O Min. Relator entendeu que, nesse contexto, a recorrida não pode ser atingida pela ação de busca e apreensão promovida pela recorrente. Outro ponto questionado pela instituição financeira foi a impossibilidade de extinção da ação de busca e apreensão em face da necessidade de denunciação da lide ao antigo proprietário do carro, que, de fato, tomou empréstimo do banco. O Min. Relator, acompanhando a jurisprudência dominante do STJ, consignou que a denunciação pauta-se nos princípios da celeridade e da economia processual. Na hipótese em apreço, caso a denunciação fosse deferida, isso atrasaria a tramitação do feito, o que é contrário ao espírito da denunciação à lide. Para não haver maior prejuízo às partes, o Min. Relator ressalvou, também, a possibilidade de conversão da busca e apreensão em depósito. Precedentes citados: REsp 687.087/SP, DJe 13/05/2011; REsp 100.667/SC, DJ 10/10/2005; REsp 933.857/GO, DJe 11/05/2009, e REsp 170681/RJ, DJe 15/04/2008. REsp 916.107-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/3/2012.

IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA.
A exceção prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1991, que deve ser interpretada restritivamente, somente atinge os bens que foram dados em garantia de dívidas contraídas em benefício da própria família. No caso, a hipoteca foi constituída em garantia de dívida de terceiro, o que não afasta a proteção dada ao imóvel pela lei que rege os bens de família. Precedentes citados:REsp 268.690-SP, DJ 12/3/2001; REsp 1.022.735-RS, DJe 18/2/2010, e AgRg no AgRg no Ag 1.094.203-SP, DJe 10/5/2011. REsp 997.261-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/3/2012.

DANO MORAL. PARLAMENTAR.
De acordo com a jurisprudência pacífica do STJ, a fixação do valor de indenização por danos morais só pode ser revisada pelo tribunal se o montante for irrisório ou exagerado, em flagrante inobservância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. No caso, um parlamentar foi alvo de críticas sarcásticas em matéria publicada em revista de circulação nacional. Considerando-se que o ofendido era membro de uma das casas do Congresso Nacional, portanto pessoa exposta a abordagens críticas mais ácidas, a Turma entendeu que a reportagem não se afastou muito dos limites tolerados em qualquer democracia. Dessa forma, entendeu-se razoável a fixação por dano moral em R$ 5 mil. Precedentes citados: AgRg no REsp 971.113-SP, DJe 8/3/2010; AgRg no REsp 675.950-SC, DJe 3/11/2008, e REsp 1.082.878-RJ, DJe 18/11/2008. REsp 685.933-DF, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 15/3/2012.

DANO MORAL. DIREITO DE INFORMAR E DIREITO À IMAGEM.
O direito de informar deve ser analisado com a proteção dada ao direito de imagem. O Min. Relator, com base na doutrina, consignou que, para verificação da gravidade do dano sofrido pela pessoa cuja imagem é utilizada sem autorização prévia, devem ser analisados: (i) o grau de consciência do retratado em relação à possibilidade de captação da sua imagem no contexto da imagem do qual foi extraída; (ii) o grau de identificação do retratado na imagem veiculada; (iii) a amplitude da exposição do retratado; e (iv) a natureza e o grau de repercussão do meio pelo qual se dá a divulgação. De outra parte, o direito de informar deve ser garantido, observando os seguintes parâmetros: (i) o grau de utilidade para o público do fato informado por meio da imagem; (ii) o grau de atualidade da imagem; (iii) o grau de necessidade da veiculação da imagem para informar o fato; e (iv) o grau de preservação do contexto originário do qual a imagem foi colhida. No caso analisado, emissora de TV captou imagens, sem autorização, de funcionário de empresa de assistência técnica durante visita para realização de orçamento para conserto de uma televisão que, segundo a emissora de TV, estava apenas com um fusível queimado. O orçamento realizado englobou outros serviços, além da troca do fusível. A imagem do funcionário foi bem focalizada, permitindo sua individualização, bem como da empresa em que trabalhava. Não houve oportunidade de contraditório para que o envolvido pudesse provar que o aparelho tinha outros defeitos, além daquele informado pela rede de TV. Assim, restou configurado dano moral por utilização indevida da imagem do funcionário. Noutro aspecto analisado, o Min. Relator destacou a pacífica jurisprudência do STJ que possibilita a revisão do montante devido a título de dano moral, quando o valor for exorbitante ou irrisório, observados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Nesse contexto, a Turma entendeu desproporcional a fixação da verba indenizatória em R$ 100 mil, reduzindo-a a R$ 30 mil. Precedentes citados: REsp 267.529-RJ, DJ de 18/12/2000; REsp 1.219.197-RS, DJe de 17/10/2011; REsp 1.005.278-SE, DJe de 11/11/2010; REsp 569.812-SC, DJ de 1º/8/2005. REsp 794.586-RJ, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 15/3/2012.


LEI DE IMPRESA. CONHECIMENTO. RESP.
Não se conhece do REsp em que o recorrente pleiteia a aplicação da Lei de Imprensa contra acórdão do tribunal a quo que não a aplicou, salvo alguma excepcionalidade a ser examinada em cada processo. O STF, ao julgar a ADPF n. 130/DF, declarou a não recepção pela CF da Lei de Imprensa em sua totalidade. Não sendo possível a modulação de efeitos das decisões que declaram a não recepção, tem-se que a Lei de Imprensa é inválida desde a promulgação da CF. Precedentes citados: REsp 990.079/DF, DJe 1/7/2011; REsp 942.587/ES, DJe 22/8/2011, e REsp 945.461/MT, DJe 26/5/2011. REsp 997.647-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/3/2012.

domingo, 25 de março de 2012

SEMINÁRIO NACIONAL DE DIREITO. LFG. SÃO JOSÉ DO RIO PRETO.

Informações em http://www.senadi.com.br.

Palestrantes

Luiz Flávio Gomes
André Luiz Paes de Almeida
Flávio Murilo Tartuce Silva
Fernanda Marinela de Sousa Santos
Renato Brasileiro de Lima
Alexandre Cotrim Gialluca
Renato Montans

Programação
13 DE ABRIL DE 2012
11h30 às 13h30 CREDENCIAMENTO
13h30 às 14h10 Fernanda Marinela Direito Administrativo. Nova Lei da Copa
14h10 às 14h50 Renato Brasileiro Direito Penal. Nova Lei de Prisões
14h50 às 15h30 André Luis Paes de Almeida Direito do Trabalho. Nova Lei do Aviso Prévio
15h30 às 16h00 COFFEE BREAK C/ AUTÓGRAFOS
16h00 às 16h40 Alexandre Gialluca Direito Empresarial. EIRELI (Nova Empresa Individual)
16h40 às 17h20 Flávio Tartuce Direito Civil. Transformações do Direito de Família
17h20 às 18h00 Renato Montans Direito Processual Civil. Reforma do CPC
18h00 às 19h00 Luis Flávio Gomes Direito Penal.
ENCERRAMENTO E AUTÓGRAFOS

LOCAL: IPÊ PARK HOTEL. RODOVIA WASHINGTON LUIZ, KM 428.

Demais informações: http://www.senadi.com.br/

sexta-feira, 23 de março de 2012

PALESTRA. FACULDADE DE DIREITO DE FRANCA.

DIREITO AGRÁRIO. CESSÃO DE TERRAS PÚBLICAS. PUBLICAÇÃO NO INFORMATIVO 658 DO STF.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 1. Ante a peculiaridade do caso, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação cível originária, proposta pela União, em 1959, na qual se pretendia a declaração de nulidade de contratos em que o antigo Estado do Mato Grosso outorgara a diversas empresas colonizadoras a concessão de terras públicas com área superior ao limite previsto na Constituição de 1946 (“Art 156 ... § 2º - Sem prévia autorização do Senado Federal, não se fará qualquer alienação ou concessão de terras públicas com área superior a dez mil hectares”). Prevaleceu o voto do Min. Cezar Peluso, relator, que, ao sopesar os valores envolvidos no feito, declarou a subsistência e a validade dos contratos em comento perante a norma constitucional invocada. Consignou que não se estaria a manifestar essa validez perante outros vícios, como o eventual alcance de terras indígenas, latifúndios improdutivos. Nesse particular, expressou que, para ambas as hipóteses, a União possuiria instrumentos adequados sequer aventados neste processo. Ao apontar a existência de pelo menos três ações cíveis, nesta Corte, que diriam com o tema, sublinhou que o presente desfecho em nada interferiria na apreciação daquelas. Fixou, ainda, que cada parte arcasse com os honorários dos respectivos patronos. ACO 79/MT, rel. Min. Cezar Peluso, 15.3.2012.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 2. Inicialmente, discorreu que a regra da limitação de áreas, para efeito de alienação e concessão de terras públicas, vigoraria desde a Constituição de 1934 (“Art 130 - Nenhuma concessão de terras de superfície, superior a dez mil hectares poderá ser feita sem que, para cada caso, preceda autorização do Senado Federal”). A de 1937, no art. 155, conservara esse limite, bem assim a de 1946, no § 2º do art. 156. A limitação em si fora mantida nos estatutos ulteriores, porém a área de terra que poderia ser alienada ou concedida, sem prévia autorização do Senado, fora reduzida para até três mil hectares na Constituição de 1967 (art. 164, parágrafo único) e, na CF/88, para dois mil e quinhentos (art. 49, XVII), quando o controle político passara do Senado para o Congresso Nacional. Em seguida, assentou que as provas documentais bastariam para firmar a convicção de que se teria vulnerado o disposto no art. 156, § 2º. Extraiu dos autos que, sem autorização do Senado: a) terras com áreas superiores ao limite imposto pela Constituição foram concedidas a alguns particulares; e b) contratos de colonização de áreas de duzentos mil hectares foram celebrados com o ente federativo e por intermédio destes cada empresa ficava “autorizada pelo Estado a promover a colonização, mediante povoamento das terras e venda de lotes a colonos”, e, ao menos em um deles, até ceder “os lotes aos seus colonos”. Em contrapartida, as colonizadoras deveriam prover infraestrutura básica nas terras. Também havia a previsão de o Estado do Mato Grosso receber certa parcela do preço, segundo tabela da data da celebração do contrato de venda ou de promessa de compra e venda para colonos, a título de compensação pela concessão dominial de suas terras devolutas. Advertiu que essas obrigações assumidas pelas empresas não se confundiriam com a contraprestação específica e própria do negócio jurídico de compra e venda. Evidenciou que, sob a denominação de contratos de colonização, o Estado-membro avençara com as empresas contratos administrativos de concessão de domínio, os quais reclamariam observância do preceito constitucional. Salientou que, diversamente de outras espécies da mesma classe das chamadas concessões administrativas — a exemplo das concessões de uso e de direito real de uso — a de domínio seria forma de alienação de terras públicas com origem nas concessões de sesmarias da Coroa, hoje somente utilizada nas concessões de terras devolutas da União, dos Estados e dos Municípios (CF/88, art. 188, § 1º). Mencionou que, da leitura das cláusulas contratuais, patentearam-se duas coisas: a) as terras objeto das concessões caracterizar-se-iam como devolutas, porque todos os contratos de colonização teriam sido precedidos de decretos estaduais de reserva de terras devolutas, os quais lhes serviriam de fundamento; e b) as companhias obrigar-se-iam, como contraprestação, a realizar, nas áreas concedidas, diversos serviços de utilidade pública que à unidade federativa, sozinha, não seria possível empreender. Enfatizou que a Constituição compreenderia as terras devolutas nas terras públicas aludidas. Observou que, embora louvável a iniciativa de povoar suas terras, o erro teria sido conceder a particulares, sem prévio consentimento do Senado, o domínio de áreas superiores a dez mil hectares. Certificou que não constaria dos autos alegação nem prova de autorização do Senado para as concessões, donde configurada manifesta e incontroversa violação ao mandamento contido na norma especificada. ACO 79/MT, rel. Min. Cezar Peluso, 15.3.2012. (ACO-79)

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 3. Ato contínuo, ressaltou serem extremamente consideráveis os seguintes aspectos fáticos: a) os contratos em questão foram pactuados há 59 anos; b) a cadeia dominial a partir daí perder-se-ia no tempo, abrangendo extensa área que equivaleria, aproximadamente, a 40.000 km² (corresponderia ao dobro da área do Estado de Sergipe); c) as concessões de domínio foram realizadas por ente federativo, o que, presumir-se-ia, haver despertado nos adquirentes fundada convicção da legalidade dos negócios. Aduziu que, assim como no direito estrangeiro, o ordenamento brasileiro reverenciaria os princípios ou subprincípios conexos da segurança jurídica e da proteção da confiança, sob a compreensão de que nem sempre se assentariam, exclusivamente, na legalidade. Isto significaria que situações de fato, ao perdurar significativamente no tempo — sobretudo se oriundas de atos administrativos, que guardariam presunção e aparência de legitimidade —, deveriam ser estimadas com cautela quanto à regularidade jurídica, até porque, enquanto a segurança seria fundamento quase axiomático, perceptível do ângulo geral e abstrato, a confiança, que diz com a subjetividade, apenas seria passível de avaliação perante a concretude das circunstâncias. Certificou que a fonte do princípio da proteção da confiança estaria na boa-fé do particular, como norma de conduta e, em consequência, na ratio da coibição do venire contra factum proprium, o que acarretaria a vinculação jurídica da Administração Pública às suas próprias práticas e ações. O Estado de Direito seria sobremodo Estado de confiança. Explicou que a boa-fé e a confiança dariam novo alcance e significado ao princípio tradicional da segurança jurídica — em contexto que, faz muito, abrangeria, em especial, as posturas e os atos administrativos, como advertiria a doutrina — destacando a importância decisiva da ponderação dos valores da legalidade e da segurança, como critério epistemológico e hermenêutico destinado a realizar, historicamente, a ideia suprema da justiça. Versou sobre o princípio da segurança jurídica e, inclusive, reportou-se a normas textuais de leis que disporiam vários aspectos de convalidação de atos praticados pela Administração Pública.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 4. Ao tecer comentários sobre a convalidação de atos administrativos, acenou que esta, consoante a doutrina, não conflitaria com o princípio da legalidade. Ressurtiu que, na hipótese de a decretação de nulidade ser feita tardiamente — quando da inércia da administração teriam sido constituídas situações de fato revestidas de forte aparência de legalidade, a ponto de fazer gerar a convicção de sua legitimidade — seria deveras absurdo que, a pretexto da eminência do Estado, se concedesse às autoridades um poder-dever indefinido de autotutela. Além disso, citou precedentes em que o STF reafirmaria a supremacia jurídico-constitucional dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima sobre a legalidade estrita, diante de prolongadas situações factuais geradas pelo comportamento da Administração Pública. Noticiou que alguns juristas distinguiriam, na matéria, entre convalidação e estabilização de atos administrativos, por entenderem que só poderiam ser convalidados os atos que admitissem repetição sem vício. Dessa feita, os atos inválidos, insuscetíveis de aperfeiçoamento no presente, seriam, para efeito de regularização, tão-só estabilizados ou consolidados. Elucidou que, a despeito de uma ou outra nomenclatura, esta Corte viria decidindo que, por vezes, o princípio da possibilidade ou da necessidade de anulamento seria substituído pelo da impossibilidade, em homenagem à segurança jurídica, à boa-fé e à confiança legítima. Avaliou ser esta a resposta jurídica que conviria à espécie. Expressou não ver como nem onde pronunciar — meio século depois, a nulidade das concessões de domínio feitas pela indicada unidade da Federação a pessoas jurídicas, empresas de colonização, e físicas, colonos — sem grave ofensa aos princípios constitucionais e transtornos a relações de vida extremamente importantes. Expôs que cidades formaram-se nessas áreas concedidas, com milhares de famílias; comércio e lavoura expandiram-se significativamente; acessões e benfeitorias públicas e privadas foram erguidas; o Estado dera origem a outro, em 1979, seccionando sua área; múltiplas transmissões de domínio sucederam-se, sob convicção de regularidade.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 5. Além disso, estimou ser inegável que as concessões teriam cumprido seus propósitos político-sociais, sem que se pudesse pensar em desvio de finalidade, porquanto a colonização fora implantada no âmbito do programa governamental de Vargas, a denominada “Marcha para o Oeste”. O Brasil central era, ao tempo, composto de grandes vazios por ocupar e desbravar, e União e Estados-membros não detinham condições materiais de, sozinhos, realizar essa tarefa. Inferiu que os colonos, destinatários últimos dos lotes, confiaram no Poder Público, duplamente: no Governo Federal, que empreendia a política de ocupação territorial sob o modelo das concessões de domínio, intermediadas e, em boa parte, financiadas por empresas colonizadoras; e no então Estado do Mato Grosso, que era o concedente. Acentuou que, nas décadas de 60 e 70, ações governamentais, sob igual ânimo e propósito, foram aviadas no centro-oeste e no norte do Brasil. Por fim, nada fazia supor, objetivamente, que os títulos de propriedade concedidos não valessem. Atentou que efeitos indesejáveis de colonizações ocorreriam não apenas naquele ente político.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 6. Com o registro de que esta decisão não refletiria em ação sob sua relatoria, a Min. Rosa Weber acompanhou o Presidente. O Min. Luiz Fux lembrou que haveria norma in procedendo do art. 462 do CPC a determinar que o juiz, ao decidir, levasse em conta o estado de fato da lide. Destacou ser a situação absolutamente irreversível e frisou ser esta uma ação de cognição submetida ao STF. Explicitou que o exame do relator, em prol da estabilidade social, influiria, também, na dignidade humana daqueles povoados que já estariam ali há mais de sessenta anos. Pela circunstância excepcionalíssima da causa, o Min. Dias Toffoli seguiu o relator, considerando ser o objeto da proposição inicial única e exclusivamente o descumprimento do § 2º do art. 156 da CF/46. Adotou, ainda, as razões apresentadas pela União, que aduzia: a) não haver discussão a respeito de seu domínio sobre parcela das terras objeto dos contratos combatidos; b) não constituir fundamento desta ação grave esbulho ocorrido em terra indígena; c) diferir o pedido veiculado nestes autos daqueles das demais ações cíveis; d) inexistir relação de prejudicialidade entre os feitos; e) não resultar — eventual julgamento de improcedência, baseado exclusivamente na regularidade dos contratos como causa de pedir — na certificação de titularidade da unidade federativa sobre a vasta área do Xingu; f) não afetar o desfecho da demanda o julgamento de ações em curso nesta Corte, bem como qualquer outra concernente a terras indígenas, ou área ambiental, no Estado do Mato Grosso. Agregou a isso manifestação de não servir a situação de paradigma ou de precedente para nenhum evento, atestando que as concessões realizar-se-iam em afronta ao preceito indicado. Discorreu a respeito do princípio da segurança jurídica, do longo decurso e das razões de equidade, estas em virtude de resultado havido em outra ação cível originária em que a União e o Estado do Mato Grosso discutiam a titularidade de terras. Aventou possibilidade de se suspender a tramitação dos autos para que o Congresso Nacional viesse a placitar a não autorização ocorrida e a ratificar os atos praticados. A Min. Cármen Lúcia, ao salientar a restrição das áreas indígenas e da consequência para o julgamento da ação relatada pela Min. Rosa Weber, subscreveu às inteiras o voto condutor.

Concessão de terras públicas e segurança jurídica – 7. Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski, Ayres Britto e Marco Aurélio, que acolhiam o pedido. O primeiro reputava haver vício de origem absolutamente insanável. Considerava a extensão da área e a ausência de dados fáticos, para melhor avaliar a espécie. Ponderava que a União e os Estados do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul saberiam definir os casos concretos. O segundo aduzia que a causa estaria envolta em ambiência de nebulosidade quanto: a) aos reais beneficiários das terras públicas, se verdadeiros colonos, se empresas, se ONGs; e b) à natureza jurídica dos atos formalmente celebrados. O último abordava a possibilidade de se repetir hodiernamente a situação jurídica, visto que essa regra da Constituição de 1946 teria sido reproduzida em textos constitucionais subsequentes. Inferia que decidir pela improcedência do pleito, ante a passagem do tempo, seria dar ao fato consumado envergadura a sobrepor-se, inclusive, à Constituição. Salientava que a ilegalidade originara, à época, a instauração de comissão parlamentar de inquérito. Consignava que fato consumado, para merecer agasalho, haveria de estar em harmonia com a Lei Maior. Rememorava que, em vista da importância da matéria, na Carta de 1988 ter-se-ia passado a exigir a autorização do Congresso Nacional e diminuído o número de hectares. Observava tratar-se de concessão inicial que seria serviço público. Discernia que o ente político transferira domínio de áreas de forma muito extravagante, haja vista que abarcarcaria terras indígenas. Vislumbrava que negar a procedência do vício estimularia o desrespeito à ordem jurídica constitucional. Sublinhou que desdobramentos no campo social ficariam na esfera de uma política a ser implementada pelo Estado.

segunda-feira, 19 de março de 2012

STF RECONHECE REPERCUSSÃO GERAL SOBRE UNIÕES ESTÁVEIS PLÚRIMAS.

Sexta-feira, 16 de março de 2012
Fonte: www.stf.jus.br.

Processo sobre união homoafetiva concomitante com união estável tem repercussão geral


O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência de repercussão geral na questão constitucional alusiva à possibilidade de reconhecimento jurídico de uniões estáveis concomitantes (sendo uma delas de natureza homoafetiva e outra, de natureza heteroafetiva), com o consequente rateio de pensão por morte. O processo é um Agravo em Recurso Extraordinário (ARE 656298) contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe (TJ-SE), que negou seguimento a recurso extraordinário de uma das partes.

Ao decidir apelação cível, o TJ-SE decidiu pela impossibilidade de reconhecimento da relação homoafetiva diante da existência de declaração judicial de união estável entre o falecido e uma mulher em período concomitante. Segundo o acórdão (decisão colegiada) da corte sergipana, o ordenamento jurídico pátrio “não admite a coexistência de duas entidades familiares, com características de publicidade, continuidade e durabilidade visando à constituição de família”, situação considerada análoga à bigamia.

Ao interpor o agravo, a parte suscita a presença de repercussão geral da questão e, no mérito, alega que a decisão do TJ-SE violou o inciso III do artigo 1º da Constituição da República e os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade.

O relator do agravo, ministro Ayres Britto, considerou que a matéria constitucional discutida no caso se encaixa positivamente no disposto no parágrafo 1º do artigo 543-A do Código de Processo Civil, que fixa como requisito para a repercussão geral a existência de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos da causa. Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso.

CF/AD//GAB


Processos relacionados
ARE 656298

DOIS TEXTOS INTERESSANTES SOBRE A LAICIDADE E O DIREITO.

Zero Hora - 12 de março de 2012 | N° 17006

ARTIGOS

Tempos apocalípticos, por Paulo Brossard*

Minha filha Magda me advertiu de que estamos a viver tempos do Apocalipse sem nos darmos conta; semana passada, certifiquei-me do acerto da sua observação, ao ler a notícia de que o douto Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado, atendendo postulação de ONG representante de opção sexual minoritária, em decisão administrativa, unânime, resolvera determinar a retirada de crucifixos porventura existentes em prédios do Poder Judiciário estadual, decisão essa que seria homologada pelo Tribunal. Seria este “o caminho que responde aos princípios constitucionais republicanos de Estado laico” e da separação entre Igreja e Estado.

Tenho para mim tratar-se de um equívoco, pois desde a adoção da República o Estado é laico e a separação entre Igreja e Estado não é novidade da Constituição de 1988, data de 7 de janeiro de 1890, Decreto 119-A, da lavra do ministro Rui Barbosa, que, de longa data, se batia pela liberdade dos cultos. Desde então, sem solução de continuidade, todas as Constituições, inclusive as bastardas, têm reiterado o princípio hoje centenário, o que não impediu que o histórico defensor da liberdade dos cultos e da separação entre Igreja e Estado sustentasse que “a nossa lei constitucional não é antirreligiosa, nem irreligiosa”.

É hora de voltar ao assunto. Disse há pouco que estava a ocorrer um engano. A meu juízo, os crucifixos existentes nas salas de julgamento do Tribunal lá não se encontram em reverência a uma das pessoas da Santíssima Trindade, segundo a teologia cristã, mas a alguém que foi acusado, processado, julgado, condenado e executado, enfim justiçado até sua crucificação, com ofensa às regras legais históricas, e, por fim, ainda vítima de pusilanimidade de Pilatos, que tendo consciência da inocência do perseguido, preferiu lavar as mãos, e com isso passar à História.

Em todas as salas onde existe a figura de Cristo, é sempre como o injustiçado que aparece, e nunca em outra postura, fosse nas bodas de Caná, entre os sacerdotes no templo, ou com seus discípulos na ceia que Leonardo Da Vinci imortalizou. No seu artigo “O justo e a justiça política”, publicado na Sexta-feira Santa de 1899, Rui Barbosa salienta que “por seis julgamentos passou Cristo, três às mãos dos judeus, três às dos romanos, e em nenhum teve um juiz”... e, adiante, “não há tribunais, que bastem, para abrigar o direito, quando o dever se ausenta da consciência dos magistrados”. Em todas as fases do processo, ocorreu sempre a preterição das formalidades legais. Em outras palavras, o processo, do início ao fim, infringiu o que em linguagem atual se denomina o devido processo legal. O crucifixo está nos tribunais não porque Jesus fosse uma divindade, mas porque foi vítima da maior das falsidades de justiça pervertida.

Não é tudo. Pilatos ficou na história como o protótipo do juiz covarde. É deste modo que, há mais de cem anos, Rui concluiu seu artigo, “como quer te chames, prevaricação judiciária, não escaparás ao ferrete de Pilatos! O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz covarde”.

Faz mais de 60 anos que frequento o Tribunal gaúcho, dele recebi a distinção de fazer-me uma vez seu advogado perante o STF, e em seu seio encontrei juízes notáveis. Um deles chamava-se Isaac Soibelman Melzer. Não era cristão e, ao que sei, o crucifixo não o impediu de ser o modelar juiz que foi e que me apraz lembrar em homenagem à sua memória. Outrossim, não sei se a retirada do crucifixo vai melhorar o quilate de algum dos menos bons.

Por derradeiro, confesso que me surpreende a circunstância de ter sido uma ONG de lésbicas que tenha obtido a escarninha medida em causa. A propósito, alguém lembrou se a mesma entidade não iria propor a retirada de “Deus” do preâmbulo da Constituição nem a demolição do Cristo que domina os céus do Rio de Janeiro durante os dias e todas as noites.

*Jurista, ministro aposentado do STF

08 de março de 2012 | N° 17002.

ARTIGOS

República e laicidade, por Eduardo K. M. Carrion*

A autonomia do Estado, da esfera pública, em face da religião, o princípio da laicidade, constituem um princípio republicano. Assegurado por nossa Constituição não apenas no seu Artigo 19, I. Já o Artigo 1º do Texto Fundamental, ao referir-se, em seu “caput”, a República Federativa do Brasil e a Estado democrático de direito, por si só afirma e reafirma o princípio da laicidade.

A mistura entre religião e política pode ser intensa ou leve, mas, de qualquer forma, confundir religião e política pode seguramente levar a desatinos. Tenham-se em conta os fundamentalismos religiosos, de qualquer espécie, de ontem e de hoje. Aliás, não era Albert Camus, prêmio Nobel da Literatura de 1957, que nos alertava que “a política não é a religião, ou, então, ela é inquisição” (O Homem Revoltado, 1951)? Outra coisa, as religiões, assim como a filosofia, as artes e outras expressões do gênio humano, inspirarem e alimentarem a atividade pública.

A separação entre Estado e Igreja, a utilização de signos e símbolos religiosos no espaço público, sempre foi objeto de debate e de controvérsia. Recentemente, este debate avivou-se em países da União Europeia. As soluções nem sempre são uniformes. De forma sumária e simplificada, temos, por um lado, o paradigma francês, cuja tendência é pela proibição, no espaço público, inclusive do uso individual de signos e símbolos religiosos demasiadamente ostensivos; por outro, a experiência inglesa, cuja tendência é pela garantia do uso individual de signos e símbolos religiosos. A solução francesa parece transformar o princípio da laicidade, princípio republicano como se disse, em laicismo, aqui no sentido de visão militante e radicalizada do princípio da laicidade; a solução inglesa, por sua vez, parece melhor equilibrar o princípio da laicidade com a liberdade de crença e a liberdade de culto.

A liberdade de crença e a liberdade de culto encontram-se asseguradas por nossa Constituição em diversos dispositivos, mais diretamente no Artigo 5º, VI, VII e VIII. Trata-se de direito fundamental, que deve não só ser afirmado como também garantido em qualquer sociedade democrática e pluralista. Mas daí a concluir que no espaço público, por iniciativa do próprio poder público ou por decisão de agentes públicos, sejam veiculados signos e símbolos religiosos, muitas vezes monopolizados por uma das crenças, vai uma longa distância.

*Professor titular de Direito Constitucional da UFRGS e da FMP

domingo, 18 de março de 2012

CURSO. REDE LFG. RETA FINAL PARA DEFENSORIAS PÚBLICAS DE SP E PR. INÍCIO EM 19.03


CURSO LFG.
RETA FINAL DEFENSORIA PÚBLICA

SÃO PAULO e PARANÁ


Público Alvo


Preparação aos candidatos para o V Concurso Público de Provas e Títulos ao ingresso na carreira de Defensor Público do Estado de São Paulo.

Este curso preparará também os alunos que tem interesse no concurso que foi autorizado para Defensoria do Estado do Paraná.

Objetivo do Curso

Aprofundamento nos principais temas das disciplinas cobradas no referido edital.

Início
19/03/2012

Término
16/05/2012

Horários
Turma ao vivo no sistema satelitário, com aulas de segunda a quarta-feira, das 08h às 11h45 + Aulas online.
Turma streaming, 03 aulas semanais + Aulas online. (Início 24/03)

- 25 encontros telepresenciais/streaming (87h30) + 09 aulas online (31h30)

Informações sobre o concurso
V Concurso Público de Provas e Títulos ao Ingresso na Carreira de Defensor Público do Estado de São Paulo.

- Inscrições: 07 de março a 11 de abril de 2012;

- Taxa de Inscrição: R$ 215,00;

- Número de Vagas: 02 + Cadastro de Reserva;

- Fases: 20/05/2012 Aplicação da Primeira Prova Escrita.
24/06/2012 Aplicação da Segunda Prova Escrita.
01/07/2012 Aplicação da Terceira Prova Escrita.
05/10/2012 Aplicação da Prova Oral e entrega dos Títulos.

- Requisitos: ser bacharel em direito, contar, na data da posse, 2 (dois) anos, no mínimo, de prática profissional na área jurídica.

- Organizadora: Fundação Carlos Chagas.

Carga horária total
119h

Disciplinas e Docentes

Direito Constitucional André Fígaro
Direito Administrativo Fernanda Marinela
Direito Tributário Roberto Caparroz
Direito Penal Arthur Trigueiros
Direito Processual Penal Nestor Távora
Direito Civil Flávio Tartuce / André Barros
Direito Comercial Alexandre Gialluca
Direito Processual Civil Fernando Gajardoni / Rodrigo da Cunha Lima Freire Direito Difusos e Coletivos Fernando Gajardoni /Fabiano Melo /Fabrício Bolzan Direito da Criança e do Adolescente Luciano Alves
Direito Humanos Emerson Malheiro
Princípios e atribuições institucionais da Defensoria Pública do Estado Luis Coelho
Filosofia do Direito André Gualtieri
Sociologia do Direito Ricardo Maurício

Carga horária 119h 34 aulas
(25 aulas telepresenciais + 09 aulas online)

Demais informações: www.lfg.com.br

sexta-feira, 16 de março de 2012

DIREITO AGRÁRIO. POLÊMICA DECISÃO DO STF SOBRE DOAÇÃO DE TERRAS DEVOLUTAS.

Notícias STF
Quinta-feira, 15 de março de 2012

Fonte: Site do STF.

STF julga causa mais antiga na Corte e mantém validade de alienação de terras em MT


Por votação majoritária, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente, nesta quinta-feira (15), a ação mais antiga que estava em tramitação na Corte, protocolada em 17 de junho de 1959. Trata-se da Ação Cível Originária (ACO) 79, em que o Tribunal convalidou a concessão do domínio de uma área de 200 mil hectares pelo Estado de Mato Grosso a 20 empresas colonizadoras.

A Corte aplicou o princípio da segurança jurídica para manter a validade da operação, em caráter excepcionalíssimo, pois reconheceu que a operação foi ilegal, por ofender o parágrafo 2º do artigo 156 da Constituição Federal (CF) de 1946, então vigente, que condicionava à prévia autorização do Senado a alienação ou concessão de terras públicas com mais de 10 mil hectares. Pelo artigo 188, parágrafo 1º, da Constituição Federal de 1988, a área sujeita a prévia autorização foi reduzida para 2,5 mil hectares, porém também a Câmara, além do Senado, deve pronunciar-se.

Situação de fato

Na decisão de hoje, prevaleceu o voto do relator, ministro Cezar Peluso. Embora ele concluísse pela inconstitucionalidade da alienação das terras, pela via de concessão de domínio, sem prévia autorização legislativa, ele ponderou que a situação de fato da área se tornou irreversível. Observou que, hoje, ela é ocupada por cidades, casas, estradas, propriedades rurais, indústrias, estabelecimentos comerciais e de serviços, abrigando dezenas de milhares de pessoas. Por isso, propôs a convalidação da operação, invocando o princípio da segurança jurídica, até mesmo porque as terras foram repassadas pelo estado a colonos, na presunção da boa-fé.

Na decisão ficou claro que ela não implica a legalização da posse de terras localizadas em área indígena, pois essas são de propriedade da União, nem em área de preservação ambiental. Portanto, a decisão de hoje não afeta pleitos formulados nas Ações Cíveis Originárias (ACOs) 362, 365 e 366, que envolvem terras indígenas. Esta preocupação foi manifestada pela ministra Rosa Weber, relatora da ACO 365, que, diante desse esclarecimento prestado pelo relator, ministro Cezar Peluso, acompanhou o voto dele, pela improcedência da ACO.

A ação

A ação foi ajuizada pela União contra a Empresa Colonizadora Rio Ferro Ltda., a Construções e Comércio Camargo Corrêa S.A. e outras colonizadoras, bem como contra o Estado de Mato Grosso. Pleiteava a nulidade de contratos de concessão de terras públicas, feitos com diversas empresas de colonização, com área superior ao limite então previsto no artigo 156, parágrafo 2º, da Constituição Federal de 1946.

Na ação, a União se reportou ao relatório final de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado Federal, de 2/7/1955, destinada a apurar as alienações ou concessões de terras devolutas pelo Estado de Mato Grosso, que confirmou ter havido concessão de largas porções de terras públicas, com área superior ao limite constitucional, sem prévia autorização do Senado.

O Estado de Mato Grosso contestou as alegações. Sustentou que a cessão das terras estava inserida num projeto de colonização da área, mediante introdução de 300 famílias de pecuaristas e agricultores, além da população do núcleo, cabendo às empresas colonizadoras apenas a execução de trabalhos ou benfeitorias necessárias à vida humana e ao desenvolvimento do lugar.

No julgamento de hoje, o advogado que se manifestou em nome da Construções e Comércio Camargo Corrêa disse que não se tratava de alienação de área superior a 10 mil hectares, pois as concessões teriam sido feitas diretamente pelo governo estadual aos agricultores, e os lotes nunca teriam sido superiores a 1.000 hectares. Ainda segundo ele, as colonizadoras apenas atuaram como intermediárias, não havendo contratos de cessão de terras firmadas entre elas e os agricultores.

Extinção

Em petição datada de 1986, a própria União, autora da ACO, chegou a pedir a extinção da ação, sem julgamento, alegando não mais existirem os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido. Entretanto, em 1987, requereu a desistência do pedido de extinção do processo, em razão de “fatos supervenientes e conexão de causas”, bem como que o Estado de Mato Grosso fornecesse o nome dos adquirentes de glebas ou lotes localizados nos imóveis questionados. E, ainda em fevereiro deste ano, elaborou memorial reiterando pedido de anulação dos contratos objeto da ação.

Por seu turno, o Estado de Mato Grosso requereu a extinção do processo. Alegou impossibilidade prática de reverter a situação fundiária da área; que não foram cedidos lotes além do limite legal e, portanto, o pedido da União seria inepto, uma vez que a causa de pedir não teria relação direta com a situação dos lotes alienados.

O caso

A ocupação da área ocorreu na esteira da “Marcha para o Oeste”, desencadeada pelo então governo Getúlio Vargas para ocupar o interior do país, cuja população se concentrava, em sua maioria, próxima do litoral. As empresas colonizadoras foram contratadas pelo governo mato-grossense para ocupar a área e efetuar obras e serviços, como a construção de estradas, casas, escolas e demais estabelecimentos para servir as novas comunidades que vinham nascendo, bem como para nelas prestar serviços.
E tais obras, segundo entendimento da maioria dos ministros, não poderiam mais ser revertidas, sendo necessário aplicar o princípio da segurança jurídica para manter a paz e tranquilidade social na área.

Divergência

O ministro Ricardo Lewandowski abriu a divergência, advertindo que uma decisão pela improcedência da ação representaria a legalização de latifúndios além das dimensões permitidas.

Ele disse que a área em questão envolve 40 mil quilômetros quadrados, equivalente a duas vezes a extensão do Estado de Sergipe. Lembrou que Mato Grosso tem problemas fundiários (mais de 8 mil latifúndios ocupando 69% da área agricultável do estado), problemas ambientais e de fronteiras. O ministro fez considerações acerca da dimensão da área ilegalmente alienada, apesar da situação lá consolidada, e observou que caberia aos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (surgido após o início deste processo) resolver a situação decorrente de uma eventual anulação dos atos de alienação.

Também os ministros Marco Aurélio e Ayres Britto divergiram da maioria. O primeiro manifestou sua estranheza por considerar que a Constituição Federal não reflete um documento rígido, mas flexível, que deva ser colocada em plano secundário ante uma situação de fato, em detrimento de princípios constitucionais.

No mesmo sentido se manifestou o ministro Ayres Britto, por considerar que a causa está “envolta em nebulosidade sobre a ambiência dessas terras públicas”, ocupadas por grandes empresas, estrangeiros e ONGs. Ele também considerou obscura a própria natureza jurídica dos atos celebrados.
O ministro Cezar Peluso observou, em resposta, que, para os latifúndios improdutivos, da mesma forma que para a área indígena, existe legislação própria de que o governo poderá valer-se em tais casos, e que a decisão de hoje não interfere neles.

quarta-feira, 14 de março de 2012

RESUMO. INFORMATIVO 492 DO STJ.

NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICAL. CARTÓRIO SITUADO EM COMARCA DIVERSA DO DOMICÍLIO DO DEVEDOR.
A Seção entendeu que é válida a notificação extrajudicial exigida para a comprovação da mora do devedor/fiduciante nos contratos de financiamento com garantia de alienação fiduciária realizada por via postal, no endereço do devedor, ainda que o título tenha sido apresentado em cartório de títulos e documentos situado em comarca diversa daquela do domicílio do devedor. Isso considerando a ausência de norma que disponha em contrário e tendo em vista o pleno alcance de sua finalidade (dar conhecimento da mora ao devedor a quem é endereçada a notificação). Precedente citado: REsp. 1.237.699-SC, DJe 18/5/2011. REsp 1.283.834-BA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 29/2/2012.

INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO.
A Seção, por maioria, decidiu que a inversão do ônus da prova de que trata o art. 6º, VIII, do CDC é regra de instrução, devendo a decisão judicial que determiná-la ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurar à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade para manifestar-se nos autos. EREsp 422.778-SP, Rel. originário Min. João Otávio de Noronha, Rel. para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti (art. 52, IV, b, do RISTJ), julgados em 29/2/2012.


DANO MORAL. PUBLICAÇÃO. REVISTA.
Trata-se, na origem, de ação indenizatória ajuizada por ex-presidente da República, recorrente, contra grupo editorial, recorrido, em razão de matéria publicada em revista de propriedade da última. Segundo o recorrente, a reportagem agrediu-o com uma série de calúnias, injúrias e difamações. O juízo a quo julgou improcedente o pedido. O tribunal de origem reformou a sentença, fixando a indenização em R$ 60 mil. O recorrente interpôs recurso especial alegando, em síntese, que o valor da indenização foi arbitrado com excessiva parcimônia, violando o art. 944 do CC, não tendo sido levada em consideração a qualificação das partes envolvidas, a repercussão do dano causado e o lucro auferido pela recorrida com a publicação da reportagem injuriosa. A Turma, por maioria, deu provimento ao recurso por entender que a lei não fixa valores ou critérios para a quantificação do valor do dano moral. Ademais, essa Corte tem-se pronunciado no sentido de que o valor de reparação do dano deve ser fixado em montante que desestimule o ofensor a repetir a falta, sem constituir, de outro lado, enriquecimento indevido. No caso, o desestímulo ao tipo de ofensa, juridicamente catalogada como injúria, deve ser enfatizado. Não importa quem seja o ofendido, o sistema jurídico reprova sejam-lhe dirigidos qualificativos pessoais ofensivos à honra e à dignidade. A linguagem oferece larga margem de variantes para externar a crítica sem o uso de palavras e expressões ofensivas. O desestímulo ao escrito injurioso em grande e respeitado veículo de comunicação autoriza a fixação da indenização mais elevada, à moda do punitive dammage do direito anglo-americano, revivendo lembranças de suas consequências para a generalidade da comunicação de que o respeito à dignidade pessoal se impõe a todos. Por outro lado, não se pode deixar de atentar aos fundamentos da qualidade da ofensa pessoal considerados pela douta maioria no julgamento, salientando que o recorrente, absolvido, mesmo que por motivos formais, da acusação da prática do crime de corrupção e ainda que sancionado com o julgamento político do impeachment, veio a cumprir o período legal de exclusão da atividade política e, posteriormente, eleito senador da República, chancelado pelo respeitável fato da vontade popular. Diante dessa e de outras considerações, definiu-se o valor de R$ 500 mil, fixado à dosagem equitativa em consideração às circunstâncias objetivas e subjetivas da ofensa, ligadas ao fato e suas consequências, bem como à capacidade econômica dos ofensores e à pessoa do ofendido. Vencidos em parte o Min. Relator e o Min. Paulo de Tarso Sanseverino, que proviam em menor extensão ao fixar a indenização em R$ 150 mil. REsp 1.120.971-RJ. Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 28/2/2012.

DANO MORAL. EXAME CLÍNICO. HIV.
Trata-se, na origem, de ação de compensação por danos morais ajuizada pela recorrente contra o hospital ora recorrido pelo fato de o nosocômio ter emitido três exames de HIV com o resultado positivo equivocado. A Min. Relatora ressaltou que o defeito no fornecimento do serviço, com exame repetido e confirmado, ainda que com a ressalva do médico de que poderia ser necessário exame complementar, causa sofrimento à paciente, visto que o recorrido assumiu a obrigação de realizar exame com resultado veraz, o que não ocorreu. Nesse contexto, a Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso, para condenar o recorrido a pagar a quantia de R$ 15 mil a título de danos morais. REsp 1.291.576-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 28/2/2012.

ONEROSIDADE EXCESSIVA. CONTRATO DE SAFRA FUTURA DE SOJA. FERRUGEM ASIÁTICA.
Reiterando seu entendimento, a Turma decidiu que, nos contratos de compra e venda futura de soja, as variações de preço, por si só, não motivam a resolução contratual com base na teoria da imprevisão. Ocorre que, para a aplicação dessa teoria, é imprescindível que as circunstâncias que envolveram a formação do contrato de execução diferida não sejam as mesmas no momento da execução da obrigação, tornando o contrato extremamente oneroso para uma parte em benefício da outra. E, ainda, que as alterações que ensejaram o referido prejuízo resultem de um fato extraordinário e impossível de ser previsto pelas partes. No caso, o agricultor argumenta ter havido uma exagerada elevação no preço da soja, justificada pela baixa produtividade da safra americana e da brasileira, motivada, entre outros fatores, pela ferrugem asiática e pela alta do dólar. Porém, as oscilações no preço da soja são previsíveis no momento da assinatura do contrato, visto que se trata de produto de produção comercializado na bolsa de valores e sujeito às demandas de compra e venda internacional. A ferrugem asiática também é previsível, pois é uma doença que atinge as lavouras do Brasil desde 2001 e, conforme estudos da Embrapa, não há previsão de sua erradicação, mas é possível seu controle pelo agricultor. Sendo assim, os imprevistos alegados são inerentes ao negócio firmado, bem como o risco assumido pelo agricultor que também é beneficiado nesses contratos, pois fica resguardado da queda de preço e fica garantido um lucro razoável. Precedentes citados: REsp 910.537-GO, DJe 7/6/2010; REsp 977.007-GO, DJe 2/12/2009; REsp 858.785-GO, DJe 3/8/2010; REsp 849.228-GO, DJe 12/8/2010; AgRg no REsp 775.124-GO, DJe 18/6/2010, e AgRg no REsp 884.066-GO, DJ 18/12/2007. REsp 945.166-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 28/2/2012.

COMPETÊNCIA. CONSUMIDOR E ASSOCIAÇÃO DE POUPANÇA E EMPRÉSTIMO.
É da competência da Justiça estadual o julgamento de ação de consignação em pagamento ajuizada por mutuário contra a Associação de Poupança e Empréstimo Poupex. O entendimento baseia-se no fato de a referida associação ser entidade de direito privado (sociedade simples) e, na hipótese, não está em questão qualquer interesse da União, entidade autárquica ou empresa pública federal. Sabe-se que a Poupex é supervisionada por fundação pública (Fundação Habitacional do Exército – FHE), mas esta não participa da lide como ré, assistente ou oponente, razão pela qual não atrai o disposto no art. 109, I, da CF. Ademais, a lide não envolve discussão sobre o Fundo de Compensação de Variações Salariais – FCVS, o que também justifica a fixação da competência da Justiça estadual para apreciar o feito. Precedentes citados: REsp 481.965-DF, DJ 23/6/2003; CC 18.916-DF, DJ 28/4/1997, e CC 34.614-SP, DJ 2/9/2002. REsp 948.482-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/3/2012.

LITISCONSÓRCIO. HOMEM CASADO E ESPOSA. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL.
A Turma reconheceu exceção ao entendimento anteriormente firmado de formação de litisconsórcio passivo necessário entre homem casado e esposa em ação de reconhecimento e dissolução de união estável com partilha de bens. No caso, a companheira manejou oposição na ação de divórcio, o que já permite tanto a ela quanto à esposa a defesa de seus interesses. O Min. Relator consignou que, no caso de oposição, autor e réu da ação principal (divórcio) tornam-se litisconsortes em face da oponente. Ademais, a ação de reconhecimento e dissolução de união estável tramita juntamente com a ação de divórcio, o que garante que não ocorrerão decisões contraditórias nos dois feitos. Precedentes citados: REsp 885.951-RN, DJe 11/5/2009, e REsp 331.634-MG, DJ 12/12/2005. REsp 1.018.392-SE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/3/2012.

BANCÁRIO. PERMANÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA.
O cerne da quaestio é saber se o recorrido (ex-empregado bancário) faz jus ao direito de permanecer no plano de saúde que possuía no momento da demissão sem justa causa com as mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência de seu contrato laboral, bem como se há delimitação de tempo para essa permanência. O art. 30 da Lei n. 9.656/1998 confere tal direito após o término do vínculo empregatício, desde que o empregado assuma o pagamento integral da contribuição. In casu, o recorrido despenderia pelo pagamento integral o valor total de R$ 276,68. Mas, com a alteração unilateral do plano pela recorrente (caixa de assistência dos funcionários do banco) e o argumento de que, nos termos do seu estatuto, só é possível a manutenção no Plano Associado enquanto perdurar o vínculo empregatício do titular com o banco, o recorrido foi obrigado a aderir a plano mais oneroso (no valor de R$ 592,92) e menos benéfico, com limitações ao atendimento de seus dependentes. Assim, a recorrente faltou com os deveres anexos, instrumentais, secundários ou acessórios que se revelam como uma das faces de operatividade do princípio da boa-fé objetiva, notadamente os de lealdade, de não agravar a situação do parceiro contratual, esclarecimento, informação e consideração para com os legítimos interesses dele. Além do mais, a legislação (arts. 6º, III, IV, V, 46, 51, I, IV, XV, §§ 1º e 2º, do CDC e 16, IX, da Lei n. 9.656/1998) impõe o reconhecimento do direito do recorrido de permanecer no plano de saúde em que se enquadrava com iguais condições e cobertura assistencial, no período subsequente ao rompimento de seu vínculo empregatício com o banco. Porém, como o § 1º do art. 30 da Lei n. 9.656/1998 impõe a manutenção do ex-empregado como beneficiário do plano de saúde contanto que assuma o pagamento integral, pelo período máximo de 24 meses e, no caso, por força de antecipação dos efeitos da tutela, o recorrido permaneceu no Plano Associado desde 2003, não pode mais ser imposto à recorrente a manutenção do recorrido naquele plano. Prosseguindo o julgamento, com essas e outras fundamentações, a Turma deu parcial provimento ao recurso apenas para reconhecer que a manutenção do recorrido naquele plano não pode ser imposta à recorrente, pois vencido o prazo fixado em lei. Quanto aos demais pontos, manteve o acórdão a quo, inclusive os ônus sucumbenciais. Precedentes citados: REsp 820.379-DF, DJ 6/8/2007, e REsp 1.078.991-DF, DJe 16/6/2009. REsp 925.313-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 6/3/2012.

RESPONSABILIDADE. INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. CONSTRUÇÃO.
O incorporador, como impulsionador do empreendimento imobiliário em condomínio, atrai para si a responsabilidade pelos danos que possam advir da inexecução ou da má execução do contrato de incorporação, abarcando-se os danos resultantes de construção defeituosa (art. 31, §§ 2º e 3º, da Lei n. 4.591/1964). Ainda que o incorporador não seja o executor direto da construção do empreendimento imobiliário, mas contrate construtor, permanece responsável juntamente com ele pela solidez e segurança da edificação (art. 618 do CC). In casu, trata-se de obrigação de garantia assumida solidariamente com o construtor. Por conseguinte, o incorporador é o principal garantidor do empreendimento no seu todo, solidariamente responsável com outros envolvidos nas diversas etapas da incorporação. Essa solidariedade decorre da natureza da relação jurídica estabelecida entre o incorporador e o adquirente de unidades autônomas e também de previsão legal, não podendo ser presumida (art. 942, caput, do CC; art. 25, § 1º, do CDC e arts. 31 e 43 da Lei n. 4.591/1964). Conclui-se, assim, que o incorporador e o construtor são solidariamente responsáveis por eventuais vícios e defeitos de construção surgidos no empreendimento imobiliário, sendo que o incorporador responde mesmo que não tenha assumido diretamente a execução da obra. REsp 884.367-DF, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 6/3/2012.

LFG. ENCONTRO DE GIGANTES.

quinta-feira, 8 de março de 2012

LANÇAMENTO. DIÁLOGO DAS FONTES. EDITORA RT.


Informo o lançamento da obra Diálogo das Fontes, pela Editora Revista dos Tribunais, coordenada pela jurista Cláudia Lima Marques.

Participo da obra escrevendo sobre o tratamento dos contratos de adesão no Código Civil de 2002 e a teoria do diálogo das fontes.

A obra já está disponível para compra nas livrarias e sites especializados.

Seguem outras informações sobre o livro.

Abraços.

Professor Flávio Tartuce

"A complexidade do ordenamento jurídico, nacional e internacional, a multiplicação de leis regulando amplos setores da vida em sociedade, e as próprias transformações da vida cotidiana, das relações econômicas e interpessoais nestes tempos que Erik Jayme denomina “pós-modernos” são desafios constantes à permanente atualidade das leis e, por outro lado, da adequada coordenação na interpretação e aplicação destas fontes.

É esta busca de coerência no sistema de direito que inspirou o grande mestre de Heidelberg, Erik Jayme, a desenvolver, no direito internacional privado, a teoria do diálogo das fontes, em seu magnífico curso de Haia, de 1995. Trata-se de uma teoria, sem dúvida, visionária. Afirma a superação da noção de conflito entre leis, substituída pela de coordenação. E a possibilidade de coordenação e aplicação de diferentes leis sobre um mesmo caso, de forma orientada, justamente, pela proteção dos direitos fundamentais e da proteção da pessoa humana.

No direito brasileiro, o diálogo das fontes foi recebido com grande entusiasmo, especialmente, desde 2003, para o exame das relações entre o Código de Defesa do Consumidor, de 1990, e o Código Civil de 2002. O entusiasmo da jurisprudência com a tese fez com que rapidamente fosse aplicada para soluções de conflitos aparentes em outras áreas do direito, tornando-se um útil instrumento de coordenação das várias leis e solução de possíveis antinomias. Orienta-se, igualmente, pela efetivação dos direitos e valores fundamentais expressos na Constituição Federal, e nesse sentido revela-se como método de interpretação e aplicação do direito segundo os vetores constitucionalmente estabelecidos."

(Da Apresentação, de Bruno Miragem.)


Diálogo das fontes

Prefácio – Antonio Herman Benjamin

Apresentação – Bruno Miragem

Parte I. Diálogo das fontes como método de interpretação e aplicação das leis.

O “diálogo das fontes” como método da nova teoria geral do direito: um tributo à Erik Jayme. Claudia Lima Marques

Eppur si muove: diálogo das fontes como método de interpretação sistemática no direito brasileiro. Bruno Miragem

O “dialogo das fontes” como forma de passagem da teoria sistemático-moderna à teoria finalística ou pós-moderna do Direito. Andrea Marighetto

O transporte da teoria do diálogo das fontes para a teoria da Constituição. Marcelo Schenk Duque

Parte II. Desenvolvimento e aplicação do diálogo das fontes no direito brasileiro.

Dívida de cônjuges: diálogo processual com o direito civil. Primeiras reflexões. Jones Figueiredo Alves

Diálogo das fontes no Direito do Consumidor: a visão do Superior Tribunal de Justiça. Leonardo Roscoe Bessa

A teoria geral dos contratos de adesão no Código Civil. Visão a partir da teoria do diálogo das fontes. Flávio Tartuce

O solidarismo no direito contratual brasileiro. Daniel Ustárroz

A interpretação do conjunto contratual sob a perspectiva do diálogo das fontes.Marcos Cáprio Fonseca Soares

Os desequilíbrios gerados por vantagem e onerosidade excessivas no Direito do Consumidor e a possibilidade de aplicação do Diálogo das Fontes entre Código de Defesa do Consumidor e Código Civil de 2002. Fernando Costa de Azevedo

Contratos de “bens vivos”: uma realidade desafiadora e instigante, a provocar transformações sociais e jurídicas, e o diálogo das fontes. Evelise Leite Pâncaro da Silva

O diálogo das fontes nos contratos pela internet: do vínculo contratual ao conceito de estabelecimento empresarial virtual e a proteção do consumidor. Antonia Espíndola Longoni Klee

Diálogo das fontes e mandato com instruções: restrições à atuação do mandatário e seus reflexos jurídicos. André Fernandes Estevez

Fontes internacionais no Direito contratual brasileiro na era da desordem: uma possível solução dos conflitos pelo diálogo das fontes?. Brenda Luciana Maffei

O contrato de time sharing e o direito do consumidor: um necessário diálogo das fontes. Ardyllis Alves Soares

segunda-feira, 5 de março de 2012

ARTIGO DE RODRIGO DA CUNHA PEREIRA. VIOLÊNCIA, GÊNERO E PODER.

Violência, gênero e poder

Rodrigo da Cunha Pereira*

O potencial de agressividade e maldade humana está presente também no gênero feminino. Apesar desta obviedade, o que se vê na prática é que cerca de 90 a 95% da violência familiar o agressor é o homem. Essas diferenças entre os gêneros, na era da igualdade de direitos é que motivou a ação proposta no STF, pela Advocacia-Geral da União, questionando alguns aspectos da conhecida lei Maria da Penha (ADIN 4424 e ADC 19). E assim, em 9 de fevereiro de 2012 a Suprema Corte decidiu e reafirmou que a referida lei só aplica quando a vítima é mulher; que a denúncia contra o agressor pode ser feita independentemente da vontade da vítima; e não pode se fazer transação penal, isto é, não se pode substituir a condenação prisional por cestas básicas ou serviços prestados à comunidade, o que por muito tempo sustentou o jargão “é barato bater em mulher”.

Para muito além de uma questão meramente jurídica, tal julgamento remete-nos à reflexão sobre a importante, e ao mesmo tempo banalizada, questão da violência doméstica. E, na medida em que ela se publiciza, se politiza. Foi assim que se fez a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) e reclama-se por outros instrumentos jurídicos e políticos para coibir a violência intrafamiliar. Obviamente que a lei, por si só, e desacompanhada de políticas públicas e ações afirmativas podem virar letra morta.

À toda lei existe um desejo que se lhe contrapõe. Não cobiçar a mulher do próximo, não matar, não roubar etc, só se tornaram leis para barrar o desejo e o “gozo” da prática de tais atos. Ou seja, para quem não tem a lei interna ou internalizada, é que existe a lei jurídica. Daí a necessidade de se coibir juridicamente até mesmo algumas questões de ordem privada. É na intimidade do casal e da família que vive e se externa afeto, carinho e também agressividade. Amor e ódio constituem uma polaridade que temperam a vida humana. É, portanto, da intimidade do casal, dos desejos contidos, das inseguranças, do ódio e do amor que vem a explosão da violência. Pode-se até compreender tal complexidade, mas nada a justifica. Até mesmo a relação sadomasoquista que empreende um continuum ciclo de prazer e desprazer, pois se levado às últimas consequência, este “gozo”, pode significar a própria morte. Assim, na dicotomia entre público e privado, neste aspecto deve prevalecer a intervenção do Estado na intimidade do casal para colocar limites em quem não o tem e resgatar a dignidade do sujeito.

O fim das relações amorosas, nem sempre é tão pacífico e civilizado como deveria ser. É comum que os restos do amor se transformem em agressões, físicas e verbais. Discussão e até uma certa dose de agressividade podem integrar a cena familiar e do fim do amor. Mas a violência não. Uma das formas de ajudar a diminuir tal violência, além das ações jurídicas e políticas, é entendê-la como uma relação de dominação erótica de um gênero sobre o outro. Se não se domina por bem, usa-se o recurso da força física, por mais primário e primitivo que ele seja. As mulheres, talvez por saberem lidar melhor com o que lhes falta, elaboram melhor a perda e exercem o seu poder muito mais no campo da sedução e da palavra. O homem, pela relação histórica de dominação e de patriarcado é mais comum recorrer à força física. Apesar da igualização de direitos proclamada pela lei, há diferenças abissais: químicas (hormonais), físicas e biológicas. Daí a necessidade de se considerar diferentes os desiguais, para igualizá-los perante a lei. Daí a necessidade de considerar a diferença feminina na lei. Em alguns aspectos já se avançou: tempo de aposentadoria menor, licença maternidade etc. E agora, a reafirmação de que a lei Maria da Penha a vítima só pode ser a mulher.

É quase insuportável constatar que o outro não me ama ou não me quer mais. Ainda mais neste tempo do hiperconsumo onde posso tudo e o outro torna-se cada vez mais objeto e menos sujeito. Se a namorada ou minha mulher não quer me quer mais, tiro-lhe a vida e do caminho de qualquer outra pessoa. Essas relações de gênero trazem consigo e em seu âmago as maiores forças de sustentação da vida: o desejo de poder e o poder do desejo.

*Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), advogado, doutor (UFPR) e mestre (UFMG) em Direito Civil e autor de vários artigos e livros em Direito de Família e Psicanálise. www.ibdfam.org.br

DECISÃO DO TJSP. FOLHA DE SP X IGREJA UNIVERSAL. LIBERDADE DE IMPRENSA E ABUSO DE DIREITO.

FONTE: MIGALHAS DE 05.03.2011.

Folha não indenizará Igreja Universal por editorial

A 6ª câmara de Direito Privado do TJ/SP negou provimento ao recurso da Igreja Universal contra decisão do juiz de Direito Dimitrius Zarvos Varellis, da 11ª vara Cível da capital, que julgou improcedente ação de indenização movida pela Igreja contra a empresa Folha da Manhã, que edita o jornal "Folha de S.Paulo".

A igreja alegava que um editorial do jornal de 19 de fevereiro de 2008 abusava do direito de informar e "violava a honra" da Igreja ao utilizar expressões como "seita" "facção" "fundamentalismo comercial", "falsários" e "tartufos" para se referir a Universal.

O editorial fazia referência a uma série de ações movidas por fiéis da igreja contra o jornal, após a publicação de uma reportagem, em novembro de 2007, com o título "Universal chega aos 30 anos com império empresarial".

O desembargador Francisco Loureiro, relator, considerou o editorial duro e as críticas contundentes e "talvez não isentas", mas afirmou que "se referem a fatos de interesse público, amparados em fontes objetivas e com narrativa pertinente". E afirmou ser "impossível concluir pela prática de ato ilícito por parte da requerida a gerar dano moral indenizável à autora".

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Processo: 9090115-02.2009.8.26.0000

Veja abaixo a íntegra da decisão.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA

PODER JUDICIÁRIO

São Paulo

Registro: 2012.0000074531

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 9090115-02.2009.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é apelante IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS sendo apelado EMPRESA FOLHA DA MANHA S/A.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U. Sustentou oralmente a advogada Dra. Tais Gasparian.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FRANCISCO LOUREIRO (Presidente), ALEXANDRE LAZZARINI E PERCIVAL NOGUEIRA.

São Paulo, 1 de março de 2012

FRANCISCO LOUREIRO

RELATOR

Voto

INDENIZAÇÃO POR ATIVIDADE DE IMPRENSA Alegação de danos morais por veiculação de editorial supostamente ofensivo à autora em jornal da ré Publicação que não ultrapassou os limites da crítica objetiva Ausência de dever de imparcialidade Inexistência do alegado abuso do direito de informar Publicação com criticas severas e contundentes, mas respaldadas em excludente de ilicitude de estatura constitucional Ação improcedente Recurso não provido.

Cuida-se de recurso de apelação interposto contra a r. sentença de fls. 699/701 dos autos, que julgou improcedente ação indenizatória por danos morais ajuizada por IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS em face de EMPRESA FOLHA DA MANHÃ S/A.

Fê-lo a r. sentença, basicamente sob o fundamento de que a autora não logrou êxito em comprovar que editorial veiculado pelo jornal Folha de São Paulo, pertencente à ré, foi escrito com o intuito de denegrir sua imagem, causando-lhe prejuízos de ordem extrapatrimonial. Asseverou ainda o decisum que o editorialcontém, em geral, alusões aos integrantes da cúpula da Igreja, não a esta em si.

A recorrente alega, em síntese, que o jornal requerido abusou de seu direito de informar e violou sua honra ao utilizar determinadas expressões para tratar da instituição religiosa, quais sejam, “seita”, “facção”, “fundamentalismo comercial”, “falsários”, “tartufos”, entre outras.

Sustenta que o jornal da ré não agiu com a indispensável imparcialidade ao redigir o editorial ofensivo à sua imagem e honra, e que a liberdade de expressão não pode agasalhar condutas como a da requerida.

Em razão do exposto e pelo que mais argumenta às fls. 703/719, pede o provimento de seu recurso. O apelo foi contrariado (fls. 726/746).

É o relatório.

1. O recurso não comporta provimento. A inicial veio fundada na alegação de que o Jornal Folha de São Paulo teria denegrido a imagem da autora, ao publicar editorial a seu respeito com expressões ofensivas e preconceituosas.

Sustentou a demandante que o editorial não teve caráter informativo, pois objetivou, basicamente, revidar suposto incentivo da Igreja autora ao ajuizamento de ações judiciais por seus fiéis contra o jornal requerido.

A requerente nega ter incitado seus seguidores a promover demandas na Justiça contra o jornal da ré apenas porque este veiculou reportagens sobre o incremento da fortuna do bispo Edir Macedo, principal líder da Igreja Universal.

Afirma, em suma, a demandante, que o jornal da requerida abusou de seu direito de informar e, por ter violado sua honra, deve reparar os danos morais causados.

2. Não resta dúvida de que o editorial publicado pelo Jornal Folha de São Paulo, constante do documento de fls. 31-A dos autos, efetivamente apresenta chamadas fortes e críticas severas à Igreja Universal e a seus líderes.

Isoladamente consideradas, as assertivas até poderiam ser tidas como ofensivas à honra objetiva e subjetiva alheia, e qualificadas como atos ilícitos, passíveis de indenização.

Ocorre, porém, que a veiculação se encontra coberta por excludente de antijuridicidade de jaez constitucional, da liberdade de informação e de expressão.

Lembre-se que no recente julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental 130-7, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a Lei nº 5.250/67, por inteiro, não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1.988. Não deixa de ser curioso que tal conclusão tenha demorado mais de duas décadas de vigência da Carta Magna, quando milhares de decisões cíveis e penais passaram pelos crivos dos tribunais, inclusive da Excelsa Corte, sem despertar a percepção da falta de fundamento de validade da lei.

De qualquer modo, a citada argüição provocou conseqüências jurídicas relevantes. Desapareceram as eximentes de responsabilidade previstas no art. 27 da Lei de Imprensa, diante do reconhecimento de sua inconstitucionalidade.

Tais eximentes de responsabilidade, antes positivadas e detalhadas no artigo 27 da LI, não desapareceram, porém, do ordenamento jurídico. Apenas têm agora outras fontes, quais sejam, o artigo 5º da Constituição Federal e o Código Civil.

Disso decorre que a licitude da notícia ou editorial ainda que ofensiva à honra - que preencha determinados requisitos encontra amparo direto nos direitos fundamentais de liberdade de expressão e de comunicação, previstos no art. 5º da Constituição Federal e do abuso de direito, do art. 187 do novo Código Civil.

O ponto fundamental para o julgamento do recurso, assim, está em saber se as ofensas estão cobertas por excludente de antijuridicidade de estatura constitucional.

3. Embora a um primeiro exame impressione a alegação de campanha sistemática do órgão de imprensa contra a autora, em termos jurídicos a tese não tem maior relevância. Isso porque seria ingenuidade acreditar na isenção e na imparcialidade dos órgãos de imprensa ao analisarem fatos políticos, econômicos e sociais. Óbvios os graves interesses em jogo e a adoção de linhas editoriais mais ou menos conservadoras.

Basta ler alguns dos jornais de maior circulação no Estado de São Paulo para constatar as diferentes abordagens de um mesmo fato, e as críticas mais ou menos ferrenhas, ou elogios mais ou menos comedidos, a atos governamentais, a práticas empresariais e a condutas dos agentes sociais.

Há, sem dúvida, um direito difuso do público em geral à informação exata, desinteressada e transparente. Parece claro o cabimento de ações coletivas, inclusive de ação civil pública, para correção de distorções do direito de informação, ou para que o público destinatário não tome como isentas notícias e críticas tendenciosas (confira-se, a respeito, a excelente obra de Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, Liberdade de Informação e o direito difuso à informação verdadeira, Renovar, 1.994).

Nem por isso todas as matérias veiculadas em tais jornais, com assumida defesa de certa linha ideológica ou política, ou acirrada crítica à posição oposta, são por si só ilícitas.

Em outras palavras, a ilicitude da matéria jornalística, ao menos para efeito de responsabilidade civil, não se dá pela intenção ou isenção de quem a elabora ou divulga, mas sim pelo interesse público, veracidade e pertinência de seu conteúdo.

Não faz sentido, por isso, como se lê em certos julgados minoritários dos tribunais, da adoção de regime próximo actual malice, tão criticado no direito norte-americano. A Suprema Corte daquele país decidiu que homens públicos definição estendida em outros precedentes a pessoas notórias somente poderiam obter indenizações por matérias difamatórias se provassem com suficiente clareza que as acusações foram feitas com actual malice, ou seja, com conhecimento de sua falsidade, ou com notório desprezo ou desconsideração pela sua veracidade ou falsidade.

Parece claro que não é a malícia do jornalista ou do editor que torna a matéria ilícita, mas sim o seu conteúdo. Logo, ainda que as opiniões desfiladas pelo jornal requerido sejam parciais e tendenciosas, isto não basta para reconhecer a ilicitude de sua publicação.

O órgão de imprensa, no caso concreto, assumiu, em editorial, explícita crítica à Igreja Universal e à postura assumida pela cúpula da instituição frente aos órgãos de imprensa que, como o jornal da ré, veicularam reportagens sobre as atividades

desenvolvidas pelo bispo Edir Macedo, líder da Igreja, e, mais precisamente, sobre seu notório enriquecimento.

O editorial também criticou o que, a seu ver, constituiu uma incitação aos fiéis da Igreja para que propusessem ações judiciais contra os referidos meios de comunicação, como forma de represália pelas reportagens anteriormente publicadas sobre o líder religioso da instituição.

4. Resta, portanto, saber se o editorial publicado pelo Jornal Folha de São Paulo está, ou não, coberto por excludentes de responsabilidade civil, independentemente da intenção ou da posição ideológica revelada pela empresa de comunicação.

Inicialmente, deve-se ressaltar que não se trata exatamente de uma reportagem a publicação que, segundo a requerente, ofendeu sua honra.

Cuida-se de um editorial, que, por sua própria natureza, visa transmitir opiniões e comentários sobre determinados acontecimentos do que noticiá-los pura e simplesmente.

A emissão de juízos de valor pelos meios de comunicação é amplamente admitida nos dias atuais, mesmo porque, como visto, é ilusória a ideia de absoluta imparcialidade dos veículos de imprensa.

Sobre o assunto, Manuel da Costa Andrade observa que “o exercício do direito de crítica, intimamente associado à liberdade de imprensa, tende a provocar situações de conflito potencial com bens jurídicos como a honra e cuja relevância jurídicopenal está à partida excluída por razões de atipicidade” (Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Coimbra Editora, p. 232-233).

Entende-se, portanto, que a crítica deve ser objetiva para que possa ser admitida e prepondere sobre outros direitos e garantias fundamentais por ela em tese violáveis.

Ainda segundo Manuel da Costa Andrade, a atipicidade da crítica objetiva não depende do acerto, da adequação material ou da veracidade das apreciações formuladas, sendo ainda bastante tênues os limites quanto ao teor, à carga depreciativa e mesmo a violência das expressões utilizadas. Lembra ainda o autor português que não se exige do crítico o meio menos gravoso para tornar claro o seu ponto de vista, de modo que ele pode se utilizar de expressões mais agressivas e virulentas (op. cit., p. 236).

Em suma, reconhece-se amplamente o direito à crítica objetiva, não se admitindo apenas agressões puramente pessoais, desprovidas de qualquer fundamento ou conexão com a realidade, ou que visem apenas a atingir a honra ou a imagem da pessoa ou entidade objeto dos comentários.

No caso em tela, forçoso reconhecer que as considerações tecidas pelo editorial do jornal da ré contra a Igreja Universal não extrapolaram os limites da crítica objetiva, limites estes que, como visto, são bastante tênues e comportam até mesmo o uso de expressões ácidas e irônicas e adjetivos desabonadores.

Lembre-se ainda que as opiniões emitidas em editorial de veículo de informação são, por natureza, dotadas de relativismo que exime a respectiva crítica de um dever de veracidade e de adequação à realidade absolutos.

5. Ainda que assim não fosse, e que o editorial em análise fosse considerado mais do que mera exposição do posicionamento do jornal requerido, dada a narrativa de fatos nele contida, também seria possível concluir pela inexistência de conduta lesiva da ré à honra e à imagem da autora.

Na lição de Antonino Scalise, com base na jurisprudência italiana, a informação jornalística é legítima se preencher três requisitos cumulativos: a) o interesse social da notícia; b) a verdade do fato narrado e c) a continência da narração (apud Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, Direito de Informação e Liberdade de Expressão, Renovar, 1.999, p. 235/236). A lição ganha especial importância no momento atual, em que as eximentes de responsabilidade não mais se encontram em texto expresso de lei, mas sim calcadas em princípios constitucionais.

Passo a examinar os requisitos de legitimidade das matérias jornalísticas.

6. Há nítida prossecução de interesse público e social no editorial cuja cópia foi trazida aos autos.

A publicação, de acentuado viés crítico, objetivou, antes de tudo, informar os leitores dos fatos ocorridos envolvendo a Igreja Universal e determinados meios de comunicação, mais precisamente das providências adotadas pela entidade após a veiculação de notícias sobre o líder da instituição.

Da leitura do editorial, sobressai a reprovação do jornal ao que, no seu entender, constituiu uma campanha deflagrada pela Igreja Universal contra os veículos de imprensa que publicaram notícias desabonadoras ao bispo Edir Macedo. Também é nítida a censura aos interesses comerciais da instituição que, na opinião do jornal, preponderam sobre os ideais religiosos.

Pode-se discordar ou concordar com o texto, com o tom da matéria e a temperatura das críticas, mas inegavelmente o editorial se reveste de interesse público.

7. O segundo requisito de legitimidade da matéria/editorial é a veracidade dos fatos narrados. Não resta dúvida existir um dever geral de cuidado, exigível de qualquer atuação humana, mas que em relação ao exercício de atividade de imprensa implica a identificação de determinadas providências concretas; um dever de veracidade, pois não se reconhece o direito de mentir ou de deturpar a verdade, com correlatos deveres acessórios de objetividade e de exatidão; um dever de pertinência, de articulação lógica entre o conteúdo narrado e as conclusões, e a relevância ou transcendência do conteúdo objeto de divulgação, que justifique validamente sua exposição para o público (Bruno Miragem, Responsabilidade civil da imprensa por dano à honra, p. 244, Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2.005).

No caso concreto, os fatos noticiados no editorial tiveram lastro em dados objetivos e declarados. Há farta prova documental nos autos a demonstrar o ajuizamento de inúmeras ações indenizatórias por fiéis da Igreja Universal contra o Jornal Folha de São Paulo, por suposta ofensa decorrente da publicação de reportagens sobre o incremento patrimonial experimentado pelo bispo Edir Macedo. Também se encontram nos autos cópias de reportagens e editoriais de outros veículos de comunicação dando conta dos atos intimidatórios à imprensa praticados pela Igreja Universal.

Ou seja, no editorial em exame, o jornal requerido não fez meras conjecturas, desprovidas de qualquer fundamento, mas, ao contrário, calcou-se em fatos concretos para tecer considerações acerca da autora e das condutas por ela perpetradas.

7. O terceiro requisito da legitimidade da publicação jornalística é a pertinência, ou continência da narração. Na lição de Bruno Miragem, “em relação à pertinência jurídica, é certo que se associa não apenas com a necessidade de adequação entre a versão e o fato, senão que vai dizer respeito a quais fatos podem ser revelados e o modo como podem ser revelados (...) mesmo havendo a divulgação de um fato verdadeiro, a forma como se divulga o mesmo o distingue em relação a determinados aspectos, determinando, em muitos casos, a deturpação do significado apreendido pelo comum das pessoas, podendo gerar, sobretudo, ofensa à honra do protagonista da informação” (Responsabilidade Civil da Imprensa por Dano à Honra, Livraria do Advogado, p. 257-58).

Nesse diapasão, é exigido do jornalista não apenas o dever de veracidade dos fatos narrados, como também a sua relevância no contexto dos fatos que estão sendo noticiados. Reconheço que o editorial contém críticas ácidas à autora, algumas vezes usando da ironia, outras de termos depreciativos, ou de figuras de linguagem, para manter viva a atenção do leitor. As críticas e as expressões mais fortes usadas no editorial guardam inteira pertinência com os fatos de interesse público.

Nesse sentido a lição de Darcy Arruda Miranda, para quem “não é de se esquecer que ninguém está mais sujeito à crítica do que o homem público, e muitas vezes dele se poderá dizer coisas desagradáveis, sem incidir em crime contra a honra, coisas que não poderão ser ditas do cidadão comum sem contumélia” (Comentários à Lei de Imprensa, tomo II, 2ª Edição, p. 487).

Reconheço, pois, que o editorial em análise, após relatar fatos, vem recheado de críticas aos comportamentos reprováveis da demandante.

Na lição maior de Manuel da Costa Andrade (Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Coimbra Editora, p. 276), a crítica é indissociável da liberdade de informação, de sopesar e emitir um juízo de valor favorável ou desfavorável em relação a certo comportamento. A conduta do jornal da ré se encontra acobertada pela excludente de ilicitude da liberdade de expressão.

Não vejo, no caso concreto, após minucioso exame do editorial referido na inicial, ausência de interesse público, falta de veracidade dos fatos noticiados, ou ausência de pertinência entre os fatos e a narrativa.

8. Em tema de liberdade de expressão e de imprensa, a melhor doutrina é toda no sentido de que não há prevalência entre os direitos fundamentais de livre expressão, de um lado, e da honra, intimidade ou privacidade, de outro lado (Cláudio Luiz Bueno de Godoy, A Liberdade de Imprensa e os Direitos da Personalidade, Atlas, p. 65/85).

Disso decorre que para julgar o conflito entre direitos fundamentais deve ser feita uma ponderação de bens no caso concreto, levando em conta uma série de circunstâncias. A primeira delas é se a matéria almeja prossecução de interesses legítimos, ou se, ao invés, está voltada ao fim de causar escândalo, ou tirar proveito. A segunda é a veracidade da informação, em atenção ao dever de verdade, de noticiar sem criar distorções ou deturpar fatos.

Deve a matéria estar respaldada em evidências que levem à conclusão de sua seriedade e viabilidade (cfr. Gilberto Haddad Jabur, Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada, Revista dos Tribunais, p. 160;/188; Pedro Frederico Caldas, Vida Privada, Liberdade de Imprensa e Dano Moral, Saraiva, p. 82 e seguintes; Manuel da Costa Andrade, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Coimbra Editora, os. 317 e seguintes).

Isso porque, em contraposição aos direitos à honra e privacidade, há um direito do público em geral de obter informações de seu interesse, para formar opinião esclarecida. Na lição de Manuel da Costa Andrade, “a participação livre e esclarecida no debate público de idéias e valores e na formação da opinião púbica vale também como uma exigência diretamente decorrente da dignidade humana. Isto por ser manifesto que a dignidade humana é também decisão consciente e responsável entre alternativas" (Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, Coimbra Editora, 1.996, p. 43).

Não vejo no caso concreto razão pela qual o direito à honra objetiva da autora deva prevalecer diante do direito de liberdade de expressão e de informação do Jornal Folha de São Paulo, em face do patente do interesse público do editorial nele veiculado.

Recente precedente da Quarta Câmara de Direito Privado deste Egrégio Tribunal de Justiça, ao examinar caso semelhante ao ora em exame, no qual político reclamava de campanha ofensiva à honra movida pela Revista Veja, fixou que “a desonra não resulta da publicação de um fato ou de um crime, mas, sim, do próprio fato ou do crime cometido”. Arrematou o voto que “todas as notas e comentários foram lançados a partir de análise de episódios concretos e que mereciam ser lidos e conhecidos do grande público, independente de sacrifício de valores individuais daqueles que se viram, de alguma maneira, relacionados com os fatos. Não há ilicitude e sequer se poderá cogitar de dano indenizável (art. 5o, V e X, da CF)”. (APELAÇÃO N° 602.674-4/9, Rel. Des. Ênio Zuliani, j. 16 de julho de 2009).

De igual modo, no caso em exame o editorial é duro e as críticas contundentes e talvez não isentas, mas se referem a fatos de interesse público, amparados em fontes objetivas e com narrativa pertinente.

Em suma, quer se considere o editorial analisado mera crítica objetiva, quer se considere verdadeira matéria jornalística, impossível concluir pela prática de ato ilícito por parte da requerida a gerar dano moral indenizável à autora. Bem reconhecida, portanto, a improcedência da ação.

Diante do exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

FRANCISCO LOUREIRO

Relator