RESUMO. INFORMATIVO 547 DO STJ.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESE DE PENHORABILIDADE DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE
INDENIZAÇÃO TRABALHISTA. A regra de impenhorabilidade prevista no
inciso IV do art. 649 do CPC não alcança a quantia aplicada por longo período
em fundo de investimento, a qual não foi utilizada para suprimento de
necessidades básicas do devedor e sua família, ainda que originária de
indenização trabalhista. Conferindo-se
interpretação restritiva ao inciso IV do art. 649 do CPC, é cabível afirmar que
a remuneração a que se refere esse inciso é a última percebida pelo devedor,
perdendo a sobra respectiva, após o recebimento do salário ou vencimento
seguinte, a natureza impenhorável. Dessa forma, as sobras, após o recebimento
do salário do período seguinte, não mais desfrutam da natureza de
impenhorabilidade decorrente do inciso IV, quer permaneçam na conta corrente
destinada ao recebimento da remuneração, quer sejam investidas em caderneta de
poupança ou outro tipo de aplicação financeira. Na hipótese, não se trata
propriamente de sobras de salários não utilizadas no mês em que recebidas pelo
empregado. De fato, as verbas rescisórias alcançadas após a solução de litígio
perante a Justiça do Trabalho constituem poupança forçada de parcelas salariais
das quais o empregado se viu privado em seu dia a dia por ato ilícito do
empregador. Despesas necessárias, como as relacionadas à saúde, podem ter sido
adiadas; arcadas por familiares ou pagas à custa de endividamento. Todavia,
posta a quantia à disposição do empregado/reclamante, satisfeitas suas
necessidades imediatas, e as dívidas contraídas para sua sobrevivência durante
o período de litígio e privação, a quantia porventura restante, depositada em
conta corrente, caderneta de poupança ou outro tipo de aplicação financeira,
não está compreendida na hipótese de impenhorabilidade descrita no inciso IV do
art. 649 do CPC. REsp 1.230.060-PR, Rel. Min. Maria
Isabel Gallotti, julgado em 13/8/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. IMPENHORABILIDADE DE QUANTIA DEPOSITADA EM FUNDO DE
INVESTIMENTO ATÉ O LIMITE DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. Sendo
a única aplicação financeira do devedor e não havendo indícios de má-fé, abuso,
fraude, ocultação de valores ou sinais exteriores de riqueza, é absolutamente
impenhorável, até o
limite de 40 salários mínimos, a quantia depositada em fundo de investimento. A
regra de impenhorabilidade estatuída no inciso X do art. 649 do CPC merece
interpretação extensiva para alcançar pequenas reservas de capital poupadas, e
não apenas os depósitos em caderneta de poupança. Diante do texto legal em
vigor, e considerado o seu escopo, não há sentido em restringir o alcance da
regra apenas às cadernetas de poupança assim rotuladas, sobretudo no contexto
atual em que diversas outras opções de aplicação financeira se abrem ao pequeno
investidor, eventualmente mais lucrativas, e contando com facilidades como o
resgate automático. O escopo do inciso X do art. 649 não é estimular a
aquisição de reservas em caderneta de poupança em detrimento do pagamento de
dívidas, mas proteger devedores de execuções que comprometam o mínimo
necessário para a sua subsistência e de sua família, finalidade para qual não
tem influência alguma que a reserva esteja acumulada em papel moeda,
conta-corrente, caderneta de poupança propriamente dita ou outro tipo de
aplicação financeira, com ou sem garantia do Fundo Garantidor de Créditos
(FGC). REsp 1.230.060-PR, Rel. Min. Maria Isabel
Gallotti, julgado em 13/8/2014.
DIREITO
CIVIL. INTERPRETAÇÃO DO ART. 53 DA LEI DE LOCAÇÕES. Pode
haver denúncia vazia de contrato de locação de imóvel não residencial ocupado
por instituição de saúde apenas para o desempenho de atividades administrativas,
como marcação de consultas e captação de clientes, não se aplicando o benefício
legal previsto no art. 53 da Lei de Locações. O objetivo do legislador
ao editar o referido artigo fora retirar do âmbito de discricionariedade do
locador o despejo do locatário que preste efetivos serviços de saúde no local
objeto do contrato de locação, estabelecendo determinadas situações especiais
em que o contrato poderia vir a ser denunciado motivadamente. Buscou-se
privilegiar o interesse social patente no desempenho das atividades fins
ligadas à saúde, visto que não podem sofrer dissolução de continuidade ao mero
alvedrio do locador. Posto isso, há de ressaltar que, conforme a jurisprudência
do STJ, esse dispositivo merece exegese restritiva, não estendendo as suas
normas, restritivas por natureza do direito do locador, à locação de espaço
voltado ao trato administrativo de estabelecimento de saúde. REsp 1.310.960-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado
em 4/9/2014.
DIREITO
CIVIL. INDENIZAÇÃO REFERENTE AO SEGURO DPVAT EM DECORRÊNCIA DE MORTE DE
NASCITURO. A
beneficiária legal de seguro DPVAT que teve a sua gestação interrompida em
razão de acidente de trânsito tem direito ao recebimento da indenização
prevista no art. 3º, I, da Lei 6.194/1974, devida no caso de morte. O
art. 2º do CC, ao afirmar que a “personalidade civil da pessoa começa com o
nascimento”, logicamente abraça uma premissa insofismável: a de que
“personalidade civil” e “pessoa” não caminham umbilicalmente juntas. Isso
porque, pela construção legal, é apenas em um dado momento da existência da
pessoa que se tem por iniciada sua personalidade jurídica, qual seja, o
nascimento. Conclui-se, dessa maneira, que, antes disso, embora não se possa
falar em personalidade jurídica – segundo o rigor da literalidade do preceito
legal –, é possível, sim, falar-se em pessoa. Caso contrário, não se
vislumbraria qualquer sentido lógico na fórmula “a personalidade civil da
pessoa começa”, se ambas – pessoa e personalidade civil – tivessem como começo
o mesmo acontecimento. Com efeito, quando a lei pretendeu estabelecer a
“existência da pessoa”, o fez expressamente. É o caso do art. 6º do CC, o qual
afirma que a “existência da pessoa natural termina com a morte”, e do art. 45, caput,
da mesma lei, segundo o qual “Começa a existência legal das pessoas jurídicas
de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro”.
Essa circunstância torna eloquente o silêncio da lei quanto à “existência da
pessoa natural”. Se, por um lado, não há uma afirmação expressa sobre quando
ela se inicia, por outro lado, não se pode considerá-la iniciada tão somente
com o nascimento com vida. Ademais, do direito penal é que a condição de pessoa
viva do nascituro – embora não nascida – é afirmada sem a menor cerimônia. É
que o crime de aborto (arts. 124 a 127 do CP) sempre esteve alocado no título
referente a “crimes contra a pessoa” e especificamente no capítulo “dos crimes
contra a vida”. Assim, o ordenamento jurídico como um todo (e não apenas o CC)
alinhou-se mais à teoria concepcionista – para a qual a personalidade jurídica
se inicia com a concepção, muito embora alguns direitos só possam ser
plenamente exercitáveis com o nascimento, haja vista que o nascituro é pessoa
e, portanto, sujeito de direitos – para a construção da situação jurídica do
nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina
contemporânea. Além disso, apesar de existir concepção mais restritiva sobre os
direitos do nascituro, amparada pelas teorias natalista e da personalidade
condicional, atualmente há de se reconhecer a titularidade de direitos da
personalidade ao nascituro, dos quais o direito à vida é o mais importante, uma
vez que, garantir ao nascituro expectativas de direitos, ou mesmo direitos
condicionados ao nascimento, só faz sentido se lhe for garantido também o
direito de nascer, o direito à vida, que é direito pressuposto a todos os
demais. Portanto, o aborto causado pelo acidente de trânsito subsume-se ao
comando normativo do art. 3º da Lei 6.194/1974, haja vista que outra coisa não
ocorreu, senão a morte do nascituro, ou o perecimento de uma vida intrauterina.
REsp 1.415.727-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
4/9/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. TUTELA DE INTERESSES INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS,
COLETIVOS E DIFUSOS POR UMA MESMA AÇÃO COLETIVA. Em uma mesma ação coletiva, podem ser
discutidos os interesses dos consumidores que possam ter tido tratamento de
saúde embaraçado com base em determinada cláusula de contrato de plano de
saúde, a ilegalidade em abstrato dessa cláusula e a necessidade de sua
alteração em consideração a futuros consumidores do plano de saúde. O
CDC expõe as diversas categorias de direitos tuteláveis pela via coletiva. Com
efeito, as tutelas pleiteadas em ações civis públicas não são necessariamente
puras e estanques – ou seja, não é preciso que se peça, de cada vez, uma tutela
referente a direito individual homogêneo, em outra ação, uma tutela de direitos
coletivos em sentido estrito e, em outra, uma tutela de direitos difusos,
notadamente em ação manejada pelo Ministério Público, que detém legitimidade
ampla no processo coletivo. Sendo verdadeiro que um determinado direito não
pertence, a um só tempo, a mais de uma categoria, isso não implica afirmar que,
no mesmo cenário fático ou jurídico conflituoso, violações simultâneas de
direitos de mais de uma espécie não possam ocorrer. Nesse sentido, tanto em
relação aos direitos individuais homogêneos quanto aos coletivos, há – ou, no
mínimo, pode haver – uma relação jurídica comum subjacente. Nos direitos
coletivos, todavia, a violação do direito do grupo decorre diretamente dessa
relação jurídica base, ao passo que nos individuais homogêneos a relação
jurídica comum é somente o cenário remoto da violação a direitos, a qual
resulta de uma situação fática apenas conexa com a relação jurídica base antes
estabelecida. Assim, eventual negativa indevida do plano de saúde pode gerar
danos individuais, concretamente identificáveis em posterior liquidação. Mas
essa recusa é antecedida por uma relação jurídica comum a todos os
contratantes, que podem ou não vir a sofrer danos pela prática abusiva. A
mencionada relação jurídica base consiste exatamente no contrato de prestação
de serviços de saúde firmado entre uma coletividade de consumidores e a
administradora do plano, razão pela qual se pode vislumbrar o direito coletivo,
e não exclusivamente um direito individual homogêneo. Vale dizer, portanto, que
há uma obrigação nova de indenizar eventuais danos individuais resultantes da
recusa indevida em custear tratamentos médicos (direitos individuais
homogêneos), mas também há outra, de abstrata ilegalidade da cláusula
contratual padrão, e que atinge o grupo de contratantes de forma idêntica e,
portanto, indivisível (direitos coletivos em sentido estrito). Por outra ótica,
eventual ajuste da cláusula ilegal refere-se a interesses de uma coletividade
de pessoas indeterminadas e indetermináveis, traço apto a identificar a
pretensão como uma tutela de interesses difusos. REsp 1.293.606-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
2/9/2014.
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