domingo, 25 de agosto de 2013

ARTIGO DE ALDO DE CAMPOS COSTA SOBRE AS JORNADAS DE DIREITO CIVIL. SÉRIE PUBLICADA NO CONJUR. PARTE 1. .

Verbetes das Jornadas de Direito Civil (parte 1)

Aldo de Campos Costa. 

Fonte: Conjur. Publicado com a a autorização do autor. 

Por retratarem o pensamento médio de magistrados, professores, representantes das diversas carreiras jurídicas e estudiosos do direito civil brasileiro, os verbetes das Jornadas do Conselho da Justiça Federal vêm sendo cobrados com regularidade em processos seletivos e concursos públicos de todo o Brasil. A leitura dos enunciados, contudo, não raro é prejudicada pela forma como os textos são apresentados — por referência ou remissão aos preceitos do Código Civil. Daí a ideia de dedicar-se seis edições desta coluna à consolidação dos termos em que expostos os mencionados entendimentos. Iniciaremos hoje a organização daqueles alusivos à Parte Geral.

Enunciados 1 e 2
Nos termos do artigo 2º do Código Civil, a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. A proteção deferida ao nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome, imagem e sepultura. O dispositivo, entretanto, não é sede adequada para questões emergentes da reprogenética humana, que devem ser objeto de um estatuto próprio.

Enunciado 138
Segundo dispõe o artigo 3º, os maiores de 16 e os menores de 18 anos são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Sua vontade, contudo, é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto.

Enunciado 3
A menoridade cessa aos 18 anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. A redução do limite etário para a definição da capacidade civil aos dezoito anos não altera o disposto no artigo 16, inciso I, da Lei 8.213/1991, segundo o qual são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependente do segurado, os menores de 21 anos, porquanto regula específica situação de dependência econômica para fins previdenciários e outras situações similares de proteção, previstas em legislação especial.

Enunciados 397 e 530
A incapacidade cessará, para os menores  pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 anos completos. A emancipação sujeita-se à desconstituição por vício de vontade e, por si só, não elide a incidência do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Enunciados 272 e 273
Não é admitida em nosso ordenamento jurídico a adoção por ato extrajudicial, sendo indispensável a atuação jurisdicional, inclusive para a adoção de maiores de dezoito anos. Na adoção bilateral e na adoção unilateral, quando não se preserva o vínculo com qualquer dos genitores originários, deverá ser averbado o cancelamento do registro originário de nascimento do adotado, lavrando-se novo registro. Sendo unilateral a adoção, e sempre que se preserve o vínculo originário com um dos genitores, deverá ser averbada a substituição do nome do pai ou mãe naturais pelo nome do pai ou mãe adotivos.

Enunciado 4 e 139
Excetuados os casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária. Ressalva-se a que não seja permanente nem geral, mesmo não especificamente prevista em lei.

Enunciado 139
Os direitos da personalidade não podem ser exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes.

Enunciados 144, 274 e 531
Os direitos da personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da dignidade da pessoa humana, contida no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, que, na sociedade da informação, inclui o direito ao esquecimento. Em caso de colisão entre os direitos da personalidade, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação.

Enunciados 6, 276, 401 e 532
Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. A expressão “exigência médica” refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente, autorizando as cirurgias de transgenitalização, em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, e a conseqüente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil. É permitida, ainda, a disposição gratuita do próprio corpo com objetivos exclusivamente científicos e para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial. A cessão gratuita de direitos de uso de material biológico para fins de pesquisa científica não contraria os bons costumes quando a manifestação de vontade for livre, esclarecida e puder ser revogada a qualquer tempo, conforme as normas éticas que regem a pesquisa científica e o respeito aos direitos fundamentais.

Enunciados 5, 140, 275, 399 e 400
O cônjuge sobrevivente, o companheiro ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau, podem exigir, por direito próprio, de forma concorrente e autônoma, seja cessada a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Essa possibilidade refere-se às técnicas de tutela específica, aplicáveis de ofício, enunciadas no artigo 461 do Código de Processo Civil, devendo ser interpretada com resultado extensivo. Tem caráter geral e pode ser aplicada subsidiariamente, com relação ao cônjuge sobrevivente, o companheiro ou qualquer parente em linha reta, à divulgação de escritos, à transmissão da palavra, ou à publicação, à exposição ou à utilização da imagem de uma pessoa se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais, salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública. Essas disposições, instituídas no artigo 20 do Código Civil, têm a finalidade específica de regrar a projeção dos bens personalíssimos nas situações nele mencionadas. Os poderes conferidos aos legitimados para a tutela post mortem dos direitos da personalidade não compreendem a faculdade de limitação voluntária.

Enunciado 277
O artigo 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do artigo 4º da Lei 9.434/1997, segundo o qual “a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à verificação da morte” ficou restrita à hipótese de silêncio do potencial doador.

Enunciado 402
Fundado no consentimento informado, o artigo 14, parágrafo único, do Código Civil, segundo o qual “o ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo”, não dispensa o consentimento dos adolescentes para a doação de medula óssea prevista no art. 9º, § 6º, da Lei 9.434/1997, que dispõe não poder o indivíduo juridicamente incapaz, com compatibilidade imunológica comprovada, fazer doação nos casos de transplante de medula óssea, salvo quando houver consentimento de ambos os pais ou seus responsáveis legais e autorização judicial e o ato não oferecer risco para a sua saúde, por aplicação analógica dos artigos 28, § 2º (“Tratando-se de maior de doze anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência”) e 45, § 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (“Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento”).

Enunciado 403
O direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observada a capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo representante ou assistente; a manifestação de vontade livre, consciente e informada; e a oposição que diga respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante.

Enunciado 533
O paciente plenamente capaz poderá deliberar sobre todos os aspectos concernentes a tratamento médico que possa lhe causar risco de vida, seja imediato ou mediato, salvo as situações de emergência ou no curso de procedimentos médicos cirúrgicos que não possam ser interrompidos.

Enunciado 278
Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial. A publicidade que divulgar, sem autorização, qualidades inerentes a determinada pessoa, ainda que sem mencionar seu nome, mas sendo capaz de identificá-la, constitui violação a direito da personalidade.

Enunciado 279
Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais. A proteção à imagem deve ser ponderada com outros interesses constitucionalmente tutelados, especialmente em face do direito de amplo acesso à informação e da liberdade de imprensa. Em caso de colisão, levar-se-á em conta a notoriedade do retratado e dos fatos abordados, bem como a veracidade destes e, ainda, as características de sua utilização (comercial, informativa, biográfica), privilegiando-se medidas que não restrinjam a divulgação de informações.

Enunciados 404 e 405
A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma. A tutela da privacidade da pessoa humana compreende os controles espacial, contextual e temporal dos próprios dados, sendo necessário seu expresso consentimento para tratamento de informações que versem especialmente o estado de saúde, a condição sexual, a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, filosóficas e políticas. As informações genéticas também são parte da vida privada e não podem ser utilizadas para fins diversos daqueles que motivaram seu armazenamento, registro ou uso, salvo com autorização do titular.

Enunciado 141
Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, isto é, as fundações públicas e os entes de fiscalização do exercício profissional, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas do Código Civil.

Enunciado 142
Os partidos políticos, os sindicatos e as associações religiosas possuem natureza associativa, aplicando-se-lhes o Código Civil.

Enunciado 143
O fato de ser livre o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento, não afasta o controle de legalidade e legitimidade constitucional de seu registro, nem a possibilidade de reexame, pelo Judiciário, da compatibilidade de seus atos com a lei e com seus estatutos.

Enunciado 144
São pessoas jurídicas de direito privado: as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas, os partidos políticos e as empresas individuais de responsabilidade limitada. Essa relação não é exaustiva.

Enunciado 280
Os artigos 57 (“A exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e de recurso, nos termos previstos no estatuto”) e 60 (“A convocação dos órgãos deliberativos far-se-á na forma do estatuto, garantido a um quinto dos associados o direito de promovê-la”), aplicam-se subsidiariamente às sociedades empresárias, exceto às limitadas, nos seguintes termos: i) em havendo previsão contratual, é possível aos sócios deliberar a exclusão de sócio por justa causa, pela via extrajudicial, cabendo ao contrato disciplinar o procedimento de exclusão, assegurado o direito de defesa, por aplicação analógica do artigo 1.085 (“Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa”) e ii) as deliberações sociais poderão ser convocadas por iniciativa de sócios que representem um quinto do capital social, na omissão do contrato. A mesma regra aplica-se na hipótese de criação, pelo contrato, de outros órgãos de deliberação colegiada.

Enunciado 145
Não afasta a aplicação da teoria da aparência o fato de os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo, obrigarem a pessoa jurídica.

Enunciados 7, 281, 285, 406 e 407
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, descrita no artigo 50 do Código Civil (“Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica”): a) só se aplica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócios que nela hajam incorrido; b) prescinde da demonstração de insolvência da pessoa jurídica; c) pode ser invocada pela pessoa jurídica, em seu favor; d) pode alcançar os grupos de sociedade quando estiverem presentes os pressupostos do preceito e houver prejuízo para os credores até o limite transferido entre as sociedades; e) pode alcançar as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos.

Enunciado 283
É cabível a desconsideração da personalidade jurídica denominada “inversa” para alcançar bens de sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoais, com prejuízo a terceiros.

Enunciado 282
O encerramento irregular das atividades da pessoa jurídica, por si só, não basta para caracterizar abuso da personalidade jurídica.

Enunciado 146
Nas relações civis, interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica previstos no artigo 50 do Código Civil: o desvio de finalidade social ou confusão patrimonial.

A segunda parte da consolidação dos verbetes das Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho de Justiça Federal alusivos à Parte Geral do Código será publicada na próxima quinta-feira (29/8).

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