DIREITO CIVIL.
TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA DE OBRIGAÇÃO POSITIVA, LÍQUIDA E COM TERMO
CERTO. Em ação monitória para a
cobrança de débito decorrente de obrigação positiva, líquida e com termo certo,
deve-se reconhecer que os juros de mora incidem desde o inadimplemento da
obrigação se não houver estipulação contratual ou legislação específica em
sentido diverso. De início,
os juros moratórios são os que, nas obrigações pecuniárias, compensam a mora,
para ressarcir o credor do dano sofrido em razão da impontualidade do
adimplemento. Por isso, sua disciplina legal está inexoravelmente ligada à
própria configuração da mora. É importante destacar que, por se tratar de
direito disponível, as partes podem convencionar o percentual dos juros de mora
e o seu termo inicial, hipótese em que se fala em juros de mora contratual.
Quando, porém, não há previsão contratual quanto a juros, ainda assim o devedor
estará obrigado ao pagamento de juros moratórios, mas na forma prevista em lei
(juros legais). Quanto ao aspecto legal, o CC estabelece, como regra geral, que
a simples estipulação contratual de prazo para o cumprimento da obrigação já
dispensa, uma vez descumprido esse prazo, qualquer ato do credor para
constituir o devedor em mora. Aplica-se, assim, o disposto no art. 397 do CC,
reconhecendo-se a mora a partir do inadimplemento no vencimento (dies
interpellat pro homine) e, por força de consequência, os juros de mora
devem incidir também a partir dessa data. Assim, nos casos de responsabilidade
contratual, não se pode afirmar que os juros de mora devem sempre correr a
partir da citação, porque nem sempre a mora terá sido constituída pela citação.
O art. 405 do CC (“contam-se os juros de mora desde a citação inicial"),
muitas vezes empregado com o objetivo de fixar o termo inicial dos juros
moratórios em qualquer hipótese de responsabilidade contratual, não se presta a
tal finalidade. Geograficamente localizado em Capítulo sob a rubrica "Das
Perdas e Danos", esse artigo disciplinaria apenas os juros de mora que se
vinculam à obrigação de pagar perdas e danos. Ora, as perdas e danos, de
ordinário, são fixadas apenas por decisão judicial. Nesse caso, a fixação do
termo inicial dos juros moratórios na data da citação se harmoniza com a regra implícita
no art. 397, caput, de que nas obrigações que não desfrutam de certeza
e liquidez, a mora é ex persona, ou seja, constitui-se mediante
interpelação do credor. Precedentes citados: REsp 1.257.846-RS, Terceira Turma,
DJe 30/4/2012; e REsp 762.799-RS, Quarta Turma, DJe 23/9/2010. EREsp
1.250.382-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 2/4/2014.
DIREITO CIVIL.
UTILIZAÇÃO DA TABELA DO CNSP NA DEFINIÇÃO DO VALOR DE INDENIZAÇÃO PAGA PELO
SEGURO DPVAT. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Em
caso de invalidez permanente parcial de beneficiário de Seguro DPVAT, é válida
a utilização de tabela do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) para se
estabelecer proporcionalidade entre a indenização a ser paga e o grau da
invalidez, na hipótese de sinistro anterior a 16/12/2008; o que não impede o
magistrado de, diante das peculiaridades do caso concreto, fixar indenização
segundo outros critérios. Inicialmente,
cumpre afirmar o entendimento – consolidado, inclusive, na Súmula 474 do STJ –
de que, em caso de invalidez permanente parcial do beneficiário, a indenização
do seguro DPVAT será paga de forma proporcional ao grau da invalidez (e não
integral). De fato, o art. 3º, “b”, da Lei 6.194/1974 – que dispõe sobre o
DPVAT – estabelecia, até a entrada em vigor da Lei 11.482/2007, um teto de
quarenta salários mínimos para a indenização por invalidez permanente parcial,
mas não definia a forma de cálculo dessa indenização proporcional nesse caso,
havendo, no art. 12 da Lei 6.194/1974, apenas remissão genérica à existência de
normas do CNSP. Nessa conjuntura, houve controvérsia na jurisprudência em
relação à possiblidade de utilização de normas do CNSP, já que as tabelas do
CNSP não possuem status de lei ordinária. Posteriormente, a Lei
8.441/1992 incluiu o § 5º no art. 5º da Lei 6.194/1974, de modo que, a partir
de então, a proporcionalidade da indenização seria calculada “de acordo com os
percentuais da tabela das condições gerais de seguro de acidente suplementada”
e, “nas restrições e omissões desta, pela tabela de acidentes do trabalho e da
classificação internacional das doenças”. Ocorre que, como essas tabelas também
não estavam previstas em lei, a alteração legislativa não foi suficiente para
encerrar a controvérsia estabelecida na jurisprudência. Apenas em 16/12/2008,
entrou em vigor a MP 451/2008 (posteriormente convertida na Lei 11.945/2009),
que inseriu no texto da Lei 6.194/1974, em anexo, uma tabela acerca do cálculo
da indenização em análise. Além disso, incluiu-se no art. 3º da Lei 6.194/1974
o § 1º, segundo o qual “No caso da cobertura de que trata o inciso II do caput
deste artigo [ou seja, no caso de invalidez permanente parcial], deverão
ser enquadradas na tabela anexa a esta Lei as lesões diretamente decorrentes de
acidente e que não sejam suscetíveis de amenização proporcionada por qualquer
medida terapêutica [...]”. Dessa forma, com a inclusão da aludida tabela na
própria Lei 6.194/1974, encerrou-se a polêmica acerca dos critérios para o
cálculo da indenização proporcional em relação aos acidentes de trânsito
ocorridos posteriormente à entrada em vigor da MP 451/2008 (posteriormente
convertida na Lei 11.945/2009). Entretanto, no tocante aos acidentes de
trânsito ocorridos anteriormente à MP 451/2008, persistiu a controvérsia
jurisprudencial. Nesse contexto, no tocante à possibilidade de utilização de
tabela do CNSP para se estabelecer proporcionalidade entre a indenização a ser
paga pelo seguro e o grau da invalidez na hipótese de sinistro anterior a
16/12/2008 (data da entrada em vigor da Medida Provisória 451/2008), observa-se
que a declaração de invalidade da tabela não é a melhor solução para a
controvérsia, pois a ausência de percentuais previamente estabelecidos para o
cálculo da indenização causaria grande insegurança jurídica, uma vez que o
valor da indenização passaria a depender exclusivamente de um juízo subjetivo do
magistrado. Além disso, os valores estabelecidos pela tabela para a indenização
proporcional pautam-se por um critério de razoabilidade em conformidade com a
gravidade das lesões corporais sofridas pela vítima do acidente de trânsito. De
mais a mais, o CNSP, em razão do art. 7º do Decreto-Lei 73/1966 – segundo o
qual “Compete privativamente ao Governo Federal formular a política de seguros
privados, legislar sobre suas normas gerais e fiscalizar as operações no
mercado nacional” –, ainda detém competência normativa, que, aliás, foi
recepcionada pela CF/1988. Tese firmada para fins do art. 543-C do CPC:
“Validade da utilização de tabela do CNSP para se estabelecer a
proporcionalidade da indenização ao grau de invalidez, na hipótese de sinistro
anterior a 16/12/2008, data da entrada em vigor da Medida Provisória 451/08”.
Precedentes citados: REsp 1.101.572-RS, Terceira Turma, DJe 25/11/2010; e AgRg
no REsp 1.298.551-MS, Quarta Turma, DJe 6/3/2012. REsp
1.303.038-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 12/3/2014.
DIREITO
EMPRESARIAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EM CONTRATOS DE CRÉDITO RURAL. RECURSO
REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008 DO STJ). A legislação sobre
cédulas de crédito rural admite o pacto de capitalização de juros em
periodicidade inferior à semestral. Diante da pacificação do tema, publicou-se a Súmula 93 do STJ, segundo
a qual “a legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial
admite o pacto de capitalização de juros". Assim, nas cédulas de crédito
rural, industrial e comercial, a capitalização semestral dos juros possui
autorização ex lege, não dependendo de pactuação expressa, a qual, por
sua vez, é necessária para a incidência de juros em intervalo inferior ao
semestral. Essa disciplina não foi alterada pela MP 1.963-17, de 31/3/2000. Com
efeito, há muito é pacífico no STJ o entendimento de que, na autorização
contida no art. 5º do Decreto-Lei 167⁄1967, inclui-se a permissão para a
capitalização dos juros nas cédulas de crédito rural, ainda que em
periodicidade mensal, desde que pactuada no contrato (“as importâncias
fornecidas pelo financiador vencerão juros às taxas que o Conselho Monetário
Nacional fixar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de dezembro ou no
vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes; no vencimento do
título e na liquidação, por outra forma que vier a ser determinada por aquele
Conselho, podendo o financiador, nas datas previstas, capitalizar tais encargos
na conta vinculada a operação”). A autorização legal está presente desde a
concepção do título de crédito rural pela norma específica, que no particular
prevalece sobre o art. 4º do Decreto 22.626⁄1933 (Lei de Usura), e não sofreu
qualquer influência com a edição da MP 1.963-17⁄2000 (2.170-36⁄2001). REsp 1.333.977-MT, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em
26/2/2014.
DIREITO DO
CONSUMIDOR. DANO MORAL DECORRENTE DA PRESENÇA DE CORPO ESTRANHO EM ALIMENTO. A
aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo
estranho, expondo o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e
segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à
compensação por dano moral. A
lei consumerista protege o consumidor contra produtos que coloquem em risco sua
segurança e, por conseguinte, sua saúde, integridade física, psíquica, etc.
Segundo o art. 8º do CDC, “os produtos e serviços colocados no mercado de
consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores”. Tem-se,
assim, a existência de um dever legal, imposto ao fornecedor, de evitar que a
saúde ou segurança do consumidor sejam colocadas sob risco. Vale dizer, o CDC
tutela o dano ainda em sua potencialidade, buscando prevenir sua ocorrência
efetiva (o art. 8º diz “não acarretarão riscos”, não diz necessariamente
“danos”). Desse dever imposto pela lei, decorre a responsabilidade do
fornecedor de “reparar o dano causado ao consumidor por defeitos decorrentes de
[...] fabricação [...] de seus produtos” (art. 12 do CDC). Ainda segundo o art.
12, § 1º, II, do CDC, “o produto é defeituoso quando não oferece a segurança
que dele legitimamente se espera [...], levando-se em consideração [...] o uso
e os riscos” razoavelmente esperados. Em outras palavras, há defeito – e,
portanto, fato do produto – quando oferecido risco dele não esperado, segundo o
senso comum e sua própria finalidade. Assim, na hipótese em análise,
caracterizado está o defeito do produto (art. 12 do CDC), o qual expõe o
consumidor a risco concreto de dano à sua saúde e segurança, em clara
infringência ao dever legal dirigido ao fornecedor, previsto no art. 8º do CDC.
Diante disso, o dano indenizável decorre do risco a que fora exposto o
consumidor. Ainda que, na espécie, a potencialidade lesiva do dano não se equipare
à hipótese de ingestão do produto contaminado (diferença que necessariamente
repercutirá no valor da indenização), é certo que, mesmo reduzida, também se
faz presente na hipótese de não ter havido ingestão do produto contaminado.
Ademais, a priorização do ser humano pelo ordenamento jurídico nacional exige
que todo o Direito deva convergir para sua máxima tutela e proteção. Desse
modo, exige-se o pronto repúdio a quaisquer violações dirigidas à dignidade da
pessoa, bem como a responsabilidade civil quando já perpetrados os danos morais
ou extrapatrimoniais. Nessa linha de raciocínio, tem-se que a proteção da
segurança e da saúde do consumidor tem, inegavelmente, cunho constitucional e
de direito fundamental, na medida em que esses valores decorrem da especial
proteção conferida à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). Cabe
ressaltar que o dano moral não mais se restringe à dor, à tristeza e ao
sofrimento, estendendo sua tutela a todos os bens personalíssimos. Em outras
palavras, não é a dor, ainda que se tome esse termo no sentido mais amplo, mas
sua origem advinda de um dano injusto que comprova a existência de um prejuízo
moral ou imaterial indenizável. Logo, uma vez verificada a ocorrência de
defeito no produto, a afastar a incidência exclusiva do art. 18 do CDC à
espécie (o qual permite a reparação do prejuízo material experimentado), é
dever do fornecedor de reparar também o dano extrapatrimonial causado ao
consumidor, fruto da exposição de sua saúde e segurança a risco concreto e da
ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da
dignidade da pessoa humana. REsp 1.424.304-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em
11/3/2014.
DIREITO DO
CONSUMIDOR. PRAZO DE PRESCRIÇÃO EM CASO DE DANO PESSOAL DECORRENTE DE DANO
AMBIENTAL. Conta-se da data do conhecimento do dano e de sua autoria –
e não da data em que expedida simples notificação pública a respeito da
existência do dano ecológico – o prazo prescricional da pretensão indenizatória
de quem sofreu danos pessoais decorrentes de contaminação de solo e de lençol
freático ocasionada por produtos utilizados no tratamento de madeira destinada
à fabricação de postes de luz. Apesar
da natural ênfase conferida aos vários aspectos do dano ambiental, trata-se,
também, de um acidente de consumo, que se enquadra simultaneamente nos arts. 12
(fato do produto) e 14 do CDC (fato do serviço). Com efeito, os postes de luz
constituem um insumo fundamental para a distribuição de energia elétrica aos
seus consumidores, sendo que a contaminação ambiental decorreu exatamente dos
produtos utilizados no tratamento desses postes. Se o dano sofrido pelos
consumidores finais tivesse sido um choque provocado por uma descarga elétrica,
não haveria dúvida acerca da incidência do CDC. Ocorre que a regra do art. 17
do CDC, ampliando o conceito básico de consumidor do art. 2º, determina a
aplicação do microssistema normativo do consumidor a todas as vítimas do evento
danoso, protegendo os chamados bystandars, que são as vítimas
inocentes de acidentes de consumo. Esse fato, de um lado, constitui fato do
produto (art. 12), em face das substâncias químicas utilizadas, e, de outro
lado, apresenta-se também como fato do serviço (art. 14), pois o tratamento dos
postes de luz liga-se ao serviço de distribuição de energia elétrica.
Consequentemente, a prescrição é regulada pela norma do art. 27 do CDC, que
estabelece um prazo de cinco anos, flexibilizando o seu termo inicial.
Precedente citado: REsp 1.346.489-RS, Terceira Turma, DJe 26/8/2013. AgRg
no REsp
1.365.277-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 20/2/2014.
DIREITO CIVIL.
DISPENSABILIDADE DA EMISSÃO DA APÓLICE PARA O APERFEIÇOAMENTO DO CONTRATO DE
SEGURO. A seguradora de veículos não pode, sob a justificativa de não
ter sido emitida a apólice de seguro, negar-se a indenizar sinistro ocorrido
após a contratação do seguro junto à corretora de seguros se não houve recusa
da proposta pela seguradora em um prazo razoável, mas apenas muito tempo depois
e exclusivamente em razão do sinistro. Isso porque o seguro é contrato consensual e
aperfeiçoa-se tão logo haja manifestação de vontade, independentemente da
emissão da apólice, que é ato unilateral da seguradora, de sorte que a
existência da relação contratual não poderia ficar a mercê exclusivamente da
vontade de um dos contratantes, sob pena de se ter uma conduta puramente
potestativa, o que é vedado pelo art. 122 do CC. Ademais, o art. 758 do CC não
confere à emissão da apólice a condição de requisito de existência do contrato
de seguro, tampouco eleva esse documento ao degrau de prova tarifada ou única
capaz de atestar a celebração da avença. Além disso, é fato notório que o
contrato de seguro é celebrado, na prática, entre corretora e segurado, de modo
que a seguradora não manifesta expressamente sua aceitação quanto à proposta,
apenas a recusa ou emite a apólice do seguro, enviando-a ao contratante
juntamente com as chamadas condições gerais do seguro. A propósito dessa praxe,
a própria SUSEP disciplinou que a ausência de manifestação por parte da
seguradora, no prazo de quinze dias, configura aceitação tácita da cobertura do
risco, conforme dispõe o art. 2º, caput e § 6º, da Circular SUSEP
251/2004. Com efeito, havendo essa prática no mercado de seguro, a qual,
inclusive, recebeu disciplina normativa pelo órgão regulador do setor, há de
ser aplicado o art. 432 do CC, segundo o qual, “se o negócio for daqueles em
que não seja costume a aceitação expressa, ou o proponente a tiver dispensado,
reputar-se-á concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa”. Na mesma
linha, o art. 111 do CC preceitua que “o silêncio importa anuência, quando as
circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de
vontade expressa”. Assim, na hipótese ora analisada, tendo o sinistro ocorrido
efetivamente após a contratação junto à corretora de seguros, se em um prazo
razoável não houver recusa da seguradora, há de se considerar aceita a proposta
e plenamente aperfeiçoado o contrato. De fato, é ofensivo à boa-fé contratual a
inércia da seguradora em aceitar expressamente a contratação, vindo a recusá-la
somente depois da notícia de ocorrência do sinistro. REsp
1.306.364-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/3/2014.
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. PRISÃO CIVIL DE ADVOGADO. O advogado que tenha contra
si decretada prisão civil por inadimplemento de obrigação alimentícia tem
direito a ser recolhido em prisão domiciliar na falta de sala de Estado Maior,
mesmo que Delegacia de Polícia possa acomodá-lo sozinho em cela separada. Na esfera penal, a jurisprudência é uníssona quanto a
ser garantida ao advogado a permanência em sala de Estado Maior e, na falta
dessa, o regime domiciliar. Se, quando é malferido um bem tutelado pelo direito
penal, permite-se ao advogado acusado o recolhimento em sala de Estado Maior, a
lógica adotada no ordenamento jurídico impõe seja estendido igual direito ao
advogado que infringe uma norma civil, porquanto, na linha do regramento
lógico, "quem pode o mais, pode o menos". Ainda que as prisões tenham
finalidades distintas, não se mostra razoável negar esse direito a infrator de
obrigação cível, por mais relevante que seja, uma vez que, na escala de bens
tutelados pelo Estado, os abrangidos pela lei penal são os mais relevantes à
sociedade. Em última análise, trata-se de direito a regime adequado de
cumprimento de mandado de segregação. Discute-se, pois, um corolário do direito
de locomoção integrante do núcleo imutável da Constituição, tema materialmente
constitucional a impor, portanto, interpretação que não restrinja o alcance da
norma. Assim, se o legislador, ao disciplinar os direitos do advogado, entendeu
incluir no rol o de "não ser recolhido preso, antes de sentença transitada
em julgado, senão em sala de Estado Maior com instalações e comodidades
condignas, assim reconhecidas pela OAB, e na sua falta, em prisão
domiciliar" (art. 7º, V, da Lei 8.906/1994), não cabe ao Poder
Judiciário restringi-lo somente aos processos penais. Uma "cela", por
sua própria estrutura física, não pode ser equiparada a "Sala de Estado
Maior" (STF, Rcl 4.535-ES, Tribunal Pleno, DJe 15/6/2007), e a prisão
domiciliar não deve ser entendida como colocação em liberdade, ainda que, na
prática, se possa verificar equiparação. Eventual deficiência no controle do
confinamento pelo Poder Público não pode servir de fundamento para afastar
a aplicação de qualquer direito, submetendo-se o titular a regime mais severo
de privação da liberdade por conta da omissão estatal. HC
271.256-MS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 11/2/2014.
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