Fonte: Migalhas.
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USP terá que devolver doação de
R$ 1 mi
feita pela família de Pedro Conde.
O juízo da 13ª vara de Fazenda
Pública de SP condenou a USP a devolver R$ 1 mi que a família do banqueiro Pedro Conde
doou à Faculdade de Direito do Largo S. Francisco. O pedido de devolução foi
feito pela família do banqueiro, após a Faculdade barrar as homenagens que
seriam feitas em troca da doação.
Em 2009, um contrato firmado por
João Grandino Rodas, quando era diretor da Faculdade de Direito do Largo S.
Francisco, vinculava a doação de verba para a construção de um auditório para
90 pessoas no prédio principal ao batismo da sala com o nome de Conde. Pela
tradição, as salas da São Francisco recebem nomes de professores e
ex-professores da casa. Após protestos de alunos, a Faculdade retirou o nome
dado a duas salas em homenagem ao banqueiro.
O juiz de Direito Jayme Martins
de Oliveira Neto considerou que a situação revelou o descumprimento do
compromisso firmado no contrato. Situação que, para ele, autoriza revogação da
doação.
A família também pediu
indenização por danos morais, mas o magistrado rejeitou o pedido. "Não
verifico que o descumprimento do contrato, ainda que com encargo sentimental,
traga aos autores sofrimento particular que mereça indenização especial",
afirmou.
Processo:
0011162-47.2011.8.26.0053
Veja abaixo a íntegra da decisão.
_______
VISTOS.
Cuida-se de Procedimento Ordinário movido
por Pedro Conde Filho em face de Universidade de São Paulo - USP alegando que
teria doado um auditório e um conjunto de sanitários a serem construídos na
Faculdade de Direito da USP, sendo que os únicos encargos da donatária seria o
de nomear o auditório como "Sala Pedro Conde" e o de manter, em suas
dependências, um quadro a óleo retratando o seu pai.
Afirma que houve descumprimento do contrato
de doação firmado quando foi revogada a homenagem. Pede indenização por danos
morais e o ressarcimento do valor despendido. Citada, Universidade de São Paulo
- USP contestou o feito, alegando, preliminarmente, a necessidade da citação da
Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito para integrar o pólo
passivo, tendo em vista sua participação na iniciativa de modernização da
Faculdade e em parte do valor doado.
No mérito, sustenta que, de acordo com o
contrato firmado, primeiro a obra seria executada e só depois seria submetida
aos órgãos colegiados a decisão sobre a atribuição do nome da sala, sem
obrigação de resultado assumida. Aduz que não se trata de bem restituível, e
que o encargo foi cumprido, ao ser encaminhada a questão para apreciação da
Congregação. Oportunizou-se réplica. Foi requerida, pela Universidade de São
Paulo a produção de prova testemunhal. Relatados.
FUNDAMENTO e DECIDO.
Afasto a preliminar que requeria a
intervenção de terceira, ainda que anuente ao contrato de doação, porque sua
participação se resume a colaborar anualmente com a manutenção do auditório e
conjunto sanitários, independente do nome a que dado ao local. Nessa senda, sua
participação dentro do objeto dos autos é absolutamente estranha à discussão do
encargo de doação. Trata-se de ação que visa a revogação de doação por
descumprimento de encargo.
Situo o tema.
A doação com encargo é um contrato em que
há convergência de vontades para a concessão de um bem mediante execução de um
ônus pelo beneficiário. Nas doações mediante encargo, se faz necessário que
haja o adimplemento do encargo para o completo aperfeiçoamento do contrato. Do
contrário, como se observa no art. 555 do Código Civil vigente, a revogação da
doação poderá ocorrer em razão de ingratidão do donatário ou por inexecução do
encargo.
No presente caso, observa-se que a
Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo firmou contrato de doação com
o autor o qual dispunha expressamente sobre a intenção de homenagear seu pai.
Aí moram o encargo e a discussão sobre a exigibilidade. Dentro do que narra a
defesa, a cláusula 2.2, analisada isoladamente supõe que a doação irá
posteriormente submeter o encargo à aprovação pela Congregação da Universidade,
o que revelaria ou limitaria o alcance da interpretação do encargo, tanto
quanto, sinalizaria que se trata de obrigação de meio.
Entretanto, não se interpreta o contrato
pela dicção de uma cláusulas, mas as cláusulas pelo teor do contrato. Essa é a
disposição que se orienta a partir do art. 112 do Código Civil, de forma que a
conclusão evidente dentro do que contratado pelas partes não supõe a
impossibilidade do cumprimento do encargo, ou quiçá a ressalva de
responsabilidade da donatária, cingindo-se o contratado apenas ao
encaminhamento da doação à Congregação da faculdade. O que se extrai
efetivamente, permeável do início ao pé do contrato, é a exigibilidade do
encargo, razão fundamental da doação, decorrente da honra e dos laços que
cercam os doadores.
Assim sendo, considerando que nomear
auditório com o nome de pessoa ligada aos doadores constitui inegável honra
concedida, de rigor lembrar que o Código Civil é direto em prever que "O
donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do
doador (...)", a teor do art. 553. Logo, pela vontade do contrato e pela
Lei, há aqui indiscutível encargo exigível, quase obrigação principal.
Registre-se, de resultado.
Dentro dessa perspectiva, sobretudo pela
redação dada às cláusulas, e mesmo na ótica da cláusula específica 2.2 do
contrato de doação com encargo, no sentir do Juízo, não há como presumir a
limitação de responsabilidade como mero esforço de nomeação do auditório.
Ainda que tal obstáculo administrativo
exista por óbvia organização interna da Universidade, ou mesmo que se discuta a
irresponsabilidade da ré em contratar obrigação de ato de terceiro - leia-se
Congregação da Universidade - sugerindo-se que essas premissas constituem
indiscutível ilegitimidade direta a ato próprio da donatária, caracterizando
ato alheio e empecilho ao encargo, tal é tema que se manteve apenas no íntimo
da Faculdade, não sendo em qualquer momento do contrato de doação esclarecida
aos doadores.
A justificativa de que o ato de nomeação
dependeria de aval da Congregação da Universidade jamais se apresentou na
superfície do contrato, permitindo-se inferir aos doadores que se tratava de
hipótese aparentemente formal, sem maior profundidade.
Ocorre que como se verificou, era questão
de absoluta suma importância, dada a perspectiva e autonomia da Congregação,
que na hipótese exerceu sua independência, e em recurso administrativo, não
confirmou a nomeação pretendida pelos contratantes. Em face disso, no sentir do
Juízo, a reserva mental levada a efeito, independente se ao tempo da doação
houvesse diálogo entre a Faculdade e a Congregação, tanto quanto alheio às
conveniências da Universidade, configura hipótese prevista no art. 110 do
Código Civil atual, pelo qual, o que deve prevalecer é a manifestação da
vontade das partes contratantes, exceção feita tão somente se o doador possuir
conhecimento sobre a reserva mental. Não o caso. Logo, a vontade é de doar
mediante encargo. Preserve-se, aqui, a vontade.
Portanto, toda essa dinâmica revela
indisfarçável descumprimento do encargo. Situação direta que autoriza revogação
da doação. Percebido o inadimplemento do encargo pela donatária, Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, acolho as razões do autor para que haja a
revogação da doação onerosa.
Contudo, tão somente dos danos materiais,
referentes aos valores dispendidos com a realização das obras e investimento em
móveis, equipamentos, honorários profissionais, ressalvado do advogado que
patrocina o feito, conforme peça inicial e documentos, que não mereceram da
contestação, resistência puntual e específica. No que tocam os danos morais,
este Juízo não tem admitido o dano moral contratual, conforme farta
jurisprudência em mesmo sentido.
De outro lado, ainda que fosse possível,
não verifico que o descumprimento do contrato, ainda que com encargo sentimental,
traga aos autores sofrimento particular que mereça indenização especial. Para
não passar à margem, especificamente em relação aos honorários do advogado que
patrocina o feito, tratam-se de evidente despesa do autor para recompor seu
patrimônio jurídico que supõe violado, de maneira que configura parte do dano
emergente indenizável. Contudo, não há procedência integral, porque não
admitido o dano moral pretendido.
Nessa senda, a responsabilidade pelos
custos de advogado são concorrentes, na medida em que o autor contratou
profissional para pedir mais do que tinha realmente direito. Assim por
equidade, fixo o valor, à luz do que vencido, em R$ 40.000,00.
Ante o exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE a
ação, com supedâneo no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil para
condenar a Ré: 1) à restituição de 1.073.012,70, corrigidos e com juros desde a
citação, observada a redação em cada bloco de tempo da Lei Federal 9.494/97; 2)
ao pagamento da importância de R$ 40.000,00, contratados como pró-labore ao
procurador do autor, para a propositura da demanda, corrigidos e com juros
desde a citação, observada a redação em cada bloco de tempo da Lei Federal
9.494/97.
Custas e despesas ex lege. Por força do
princípio da causalidade, cada parte arcará com os honorários a que deram
causa.
P.R.I.C.
Em caso de eventual recurso, haverá custas
de preparo no valor de R$ 24142,52.
Porte de remessa e retorno no valor de R$
25,00 por volume (os autos encontram-se com 2 volumes)
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