DIREITO
PROCESSUAL CIVIL E INTERNACIONAL PRIVADO. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
QUE DETERMINE A SUBMISSÃO DE CONFLITO À ARBITRAGEM. Pode
ser homologada no Brasil a sentença judicial de estado estrangeiro que,
considerando válida cláusula compromissória constante de contrato firmado sob a
expressa regência da lei estrangeira, determine – em face do anterior pedido de
arbitragem realizado por uma das partes – a submissão à justiça arbitral de
conflito existente entre os contratantes, ainda que decisão proferida por juízo
estatal brasileiro tenha, em momento posterior ao trânsito em julgado da
sentença a ser homologada, reconhecido a nulidade da cláusula com fundamento em
exigências formais típicas da legislação brasileira pertinentes ao contrato de
adesão. É necessário ressaltar que estamos diante de um caso típico de
competência concorrente. Assim, a primeira decisão que transita em julgado
prejudica a outra. É da essência do sistema que, se transitar em julgado
primeiro a sentença estrangeira, fica prejudicada a brasileira e vice-versa.
Assim, a aparente exclusão da sentença estrangeira pelo fato do trânsito em
julgado do julgamento brasileiro, sob invocação da soberania nacional, não se
segue, porque se está diante de clara competência concorrente. Ademais, o
ingresso do pedido de arbitragem anteriormente a todas as várias ocorrências
judiciais deve pesar em prol da opção pela homologação da sentença estrangeira
que prestigia a opção voluntária das partes pela arbitragem. O Juízo arbitral é
que era competente, no início de tudo, para examinar a cláusula arbitral devido
ao princípio Kompetenz-Kompetenz, e foi isso que a sentença estrangeira
assegurou. Esse princípio, que remonta à voluntariedade da opção arbitral e
realça a autonomia contratual, revela o poder do árbitro para analisar e
decidir sobre sua própria competência, no que tange à validade e eficácia do
pacto arbitral, que lhe outorgou a referida função julgadora. Assim, o tribunal
arbitral tem competência para decidir sobre a validade da cláusula
compromissória, ou seja, sobre sua própria competência. A propósito, o
Protocolo de Genebra de 24/9/1923, subscrito e ratificado com reservas pelo
Brasil em 5/2/1932, estabelece a prioridade do Juízo Arbitral sobre a
Jurisdição Estatal, estabelecendo uma presunção de competência em favor do
Tribunal Arbitral. De outro modo, a negação de homologação de sentença arbitral
proferida há tempos em Estado estrangeiro sob o fundamento de ocorrência da
anulação da cláusula arbitral por sentença proferida no Brasil significaria a
abertura de largo caminho para a procrastinação da arbitragem avençada por
parte de contratantes nacionais no exterior. Atente-se que, para bloquear tal
arbitragem, bastaria ao contratante brasileiro, após o pedido de instauração da
arbitragem no exterior, ingressar com processo anulatório da cláusula arbitral
no Brasil para, invocando peculiaridades da legislação brasileira, como as
especiais exigências nacionais da cláusula de adesão (sobretudo diante do
Código de Defesa do Consumidor, com inversão de ônus de prova e outros
consectários do direito consumerista nacional), paralisar a arbitragem e
judicializar toda a matéria contra a jurisdição estatal no Brasil. Cabe
ressaltar que não há empecilho no julgamento brasileiro à homologação porque
fundados o julgamento estrangeiro e o nacional em motivos técnico-jurídicos
diversos, ou seja, o primeiro, na validade da cláusula arbitral ante os termos
da legislação estrangeira, para contrato celebrado no estrangeiro, sem a
consideração de restrições existentes no sistema jurídico brasileiro, e o
segundo fundado em exigências formais de cláusula em contrato de adesão,
típicas da legislação nacional. Inexiste, assim, impedimento à homologação das
sentenças estrangeiras em virtude de coisa julgada nacional posterior. Pois,
ajuizado o pedido de arbitragem, no Brasil ou no exterior, ao juízo arbitral
competia julgar todas as matérias suscitadas pelas partes, inclusive a
invalidade da cláusula arbitral, não se autorizando a prematura judicialização
perante a atividade jurisdicional estatal. SEC 854-US, Rel. originário Min.
Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Sidnei Beneti, julgado em 16/10/2013.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E
VENDA DE IMÓVEL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ). Em
contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao CDC, é abusiva a
cláusula contratual que determine, no caso de resolução, a restituição dos
valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada,
independentemente de qual das partes tenha dado causa ao fim do negócio. De
fato, a despeito da inexistência literal de dispositivo que imponha a devolução
imediata do que é devido pelo promitente vendedor de imóvel, inegável que o CDC
optou por fórmulas abertas para a nunciação das chamadas "práticas
abusivas" e "cláusulas abusivas", lançando mão de um rol
meramente exemplificativo para descrevê-las (arts. 39 e 51). Nessa linha, a
jurisprudência do STJ vem proclamando serem abusivas situações como a ora em
análise, por ofensa ao art. 51, II e IV, do CDC, haja vista que poderá o
promitente vendedor, uma vez mais, revender o imóvel a terceiros e, a um só
tempo, auferir vantagem com os valores retidos, além da própria valorização do
imóvel, como normalmente acontece. Se bem analisada, a referida cláusula parece
abusiva mesmo no âmbito do direito comum, porquanto, desde o CC/1916 – que foi
reafirmado pelo CC/2002 –, são ilícitas as cláusulas puramente potestativas,
assim entendidas aquelas que sujeitam a pactuação "ao puro arbítrio de uma
das partes" (art. 115 do CC/1916 e art. 122 do CC/2002). Ademais, em
hipóteses como esta, revela-se evidente potestatividade, o que é considerado
abusivo tanto pelo art. 51, IX, do CDC quanto pelo art. 122 do CC/2002. A
questão relativa à culpa pelo desfazimento da pactuação resolve-se na calibragem
do valor a ser restituído ao comprador, não pela forma ou prazo de devolução.
Tese firmada para fins do art. 543-C do CPC: “Em contratos submetidos ao Código
de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual que determina a
restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma
parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda
de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a
imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador –
integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou
parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
Precedentes citados: AgRg no Ag 866.542-SC, Terceira Turma, DJe 11/12/2012;
REsp 633.793-SC, Terceira Turma, DJ 27/6/2005; e AgRg no REsp 997.956-SC, Quarta Turma, DJe 02/8/2012.
REsp 1.300.418-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 13/11/2013.
DIREITO
CIVIL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA NO ÂMBITO DE AÇÃO DE INTERDIÇÃO. É
possível determinar, no âmbito de ação de interdição, a internação compulsória
de quem tenha acabado de cumprir medida socioeducativa de internação, desde que
comprovado o preenchimento dos requisitos para a aplicação da medida mediante
laudo médico circunstanciado, diante da efetiva demonstração da insuficiência
dos recursos extra-hospitalares. De fato, admite-se, com fundamento na Lei
10.216/2001, a internação psiquiátrica compulsória no âmbito de ação de
interdição, mas apenas se houver laudo médico circunstanciado que comprove a
necessidade da medida (art. 6º). Nesse contexto, não há como sustentar que a
internação compulsória não possa ser decretada no processo de interdição apenas
por conta de sua natureza civil, porquanto o referido art. 6º tem aplicação
tanto no processo civil quanto no processo penal indistintamente. Isso porque,
se a medida da internação psiquiátrica compulsória pode ser aplicada a qualquer
pessoa cujas condições mentais a determinem, inclusive em liberdade, não se vê
razão para extrair interpretação no sentido da inaplicabilidade ao infrator em
idênticas condições, o que significaria criar um privilégio decorrente da
prática de ato infracional e, mais, verdadeiro salvo-conduto contra medida
legal adequada a enfermidade constatada por perícia especializada. Além disso,
a anterior submissão à medida socioeducativa restritiva da liberdade não obsta
a determinação de internação psiquiátrica compulsória, não implicando, por vias
indiretas e ilícitas, restabelecimento do sistema do Duplo Binário, já extinto
no Direito Penal, uma vez que a referida determinação de internação não
representa aplicação de medida de segurança, mas simplesmente de uma ordem de
internação expedida com fundamento no art. 6º, parágrafo único, III, da Lei
10.216/2001. Ademais, conforme julgamento realizado no mesmo sentido pela
Quarta Turma do STJ (HC 169.172-SP, DJe 5/2/2014), além de a internação
compulsória somente poder ocorrer quando “os recursos extra-hospitalares se
mostrarem insuficientes” (art. 4º da Lei 10.216/2001), não se pretende, com
essa medida, aplicar sanção ao interditado seja na espécie de pena seja na
forma de medida de segurança, haja vista que a internação compulsória em sede
de ação de interdição não tem caráter penal, não devendo, portanto, ser
comparada à medida de segurança ou à medida socioeducativa. HC 135.271-SP, Rel.
Min. Sidnei Beneti, julgado em 17/12/2013.
DIREITO
CIVIL. INCOMUNICABILIDADE DA VALORIZAÇÃO DE COTAS SOCIAIS NO ÂMBITO DE
DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. Na hipótese de dissolução de união
estável subordinada ao regime da comunhão parcial de bens, não deve integrar o
patrimônio comum, a ser partilhado entre os companheiros, a valorização
patrimonial das cotas sociais de sociedade limitada adquiridas antes do início
do período de convivência do casal. Inicialmente, cumpre ressaltar que o regime
da comunhão parcial de bens — aplicável, em regra, à união estável (art. 1.725
do CC/2002) — determina que não são comunicáveis os bens e direitos que cada um
dos companheiros possuir antes do início da união (como, na hipótese, as cotas
sociais de sociedade limitada), bem como os adquiridos na sua constância a
título gratuito (por doação, sucessão, os sub-rogados em seu lugar etc.).
Ademais, para que um bem integre o patrimônio comum do casal, além de a
aquisição ocorrer durante o período de convivência, é necessária a presença de
um segundo requisito: o crescimento patrimonial deve advir de esforço comum,
ainda que presumidamente. Nesse contexto, a valorização de cota social, pelo
contrário, é decorrência de um fenômeno econômico, dispensando o esforço
laboral da pessoa do sócio detentor, de modo que não se faz presente, mesmo que
de forma presumida, o segundo requisito orientador da comunhão parcial de bens
(o esforço comum). REsp 1.173.931-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
julgado em 22/10/2013.
DIREITO
CIVIL. BASE DE CÁLCULO DA PENSÃO ALIMENTÍCIA. As verbas
auxílio-acidente, vale-cesta e vale-alimentação não integram a base de cálculo
para fins de desconto de pensão alimentícia. Isso porque os alimentos incidem
sobre verbas pagas em caráter habitual, não se aplicando a quaisquer daquelas
que não ostentem caráter usual ou que sejam equiparadas a verbas de
indenização. Portanto, a verba alimentar apenas incide sobre vencimentos,
salários ou proventos, valores auferidos pelo devedor no desempenho de suas
funções ou de suas atividades empregatícias, decorrentes dos rendimentos
ordinários do devedor, motivo pelo qual se excluem as verbas indenizatórias e
os descontos obrigatórios (previdenciário e imposto de renda) da sua base de
cálculo. O auxílio-acidente encontra previsão no art. 201 da CF, no art. 86 da
Lei 8.213/1991 e no art. 104 do Dec. 3.048/1999, os quais prevêem taxativamente
sua natureza indenizatória. Por sua vez, a natureza indenizatória das verbas
denominadas auxílio cesta-alimentação e vale-alimentação está prevista no art. 6º
do Dec. 5/1991, que, ao regulamentar o Programa de Alimentação do Trabalhador –
PAT (Lei 6.321/1976), assenta: "a parcela paga in natura pela empresa não
tem natureza salarial, não se incorpora à remuneração para qualquer efeitos,
não constitui base de incidência
de contribuição previdenciária ou
do Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço e nem se configura como rendimento
tributável do trabalhador". REsp
1.159.408-PB, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 7/11/2013.
DIREITO
CIVIL. PROVA EM AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. Em ação negatória de
paternidade, não é possível ao juiz declarar a nulidade do registro de
nascimento com base, exclusivamente, na alegação de dúvida acerca do vínculo
biológico do pai com o registrado, sem provas robustas da ocorrência de erro
escusável quando do reconhecimento voluntário da paternidade. O art. 1.604 do
CC dispõe que “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do
registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.” Desse
modo, o registro de nascimento tem valor absoluto, independentemente de a
filiação ter se verificado no âmbito do casamento ou fora dele, não se
permitindo negar a paternidade, salvo se consistentes as provas do erro ou
falsidade. Devido ao valor absoluto do registro, o erro apto a caracterizar o
vício de consentimento deve ser escusável, não se admitindo, para esse fim, que
o erro decorra de simples negligência de quem registrou. Assim, em processos
relacionados ao direito de filiação, é necessário que o julgador aprecie as
controvérsias com prudência para que o Poder Judiciário não venha a prejudicar
a criança pelo mero capricho de um adulto que, livremente, a tenha reconhecido
como filho em ato público e, posteriormente, por motivo vil, pretenda
“livrar-se do peso da paternidade”. Portanto, o mero arrependimento não pode
aniquilar o vínculo de filiação estabelecido, e a presunção de veracidade e
autenticidade do registro de nascimento não pode ceder diante da falta de
provas insofismáveis do vício de consentimento para a desconstituição do reconhecimento
voluntário da paternidade. REsp 1.272.691-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado
em 5/11/2013.
DIREITO
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EFEITOS DO NÃO COMPARECIMENTO DO FILHO MENOR DE IDADE
PARA SUBMETER-SE A EXAME DE DNA. Em ação negatória de paternidade,
o não comparecimento do filho menor de idade para submeter-se ao exame de DNA
não induz presunção de inexistência de paternidade. De fato, é crucial que haja
uma ponderação mínima para que se evite o uso imoderado de ações judiciais que
têm aptidão para expor a intimidade das pessoas envolvidas e causar danos
irreparáveis nas relações interpessoais. Nesse contexto, não é ético admitir
que essas ações sejam propostas de maneira impensada ou por motivos espúrios,
como as movidas por sentimentos de revanchismo, por relacionamentos
extraconjugais ou outras espécies de vinganças processuais injustificadas.
Portanto, impende cotejar, de um lado, o direito à identidade, como direito da
personalidade, e, do outro, o direito à honra e à intimidade das pessoas
afetadas, todos alçados à condição de direitos fundamentais. Além disso, o
sistema de provas no processo civil brasileiro permite que sejam utilizados
todos os meios legais e moralmente legítimos para comprovar a verdade dos
fatos. Assim, o exame genético, embora de grande proveito, não pode ser
considerado o único meio de prova da paternidade, em um verdadeiro processo de
sacralização do DNA. Com efeito, no intuito de mitigar esse status de prova
única, a Lei 12.004/2009, acrescentando o art. 2º-A da Lei 8.560/1992,
positivou o entendimento constante da Súmula 301 do STJ, segundo a qual, em
“ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA
induz presunção juris tantum de paternidade”, posicionamento aplicável também
ao não comparecimento injustificado daquele para a realização do exame. Nesses
casos, a recusa, por si só, não pode resultar na procedência do pedido
formulado em investigação ou negação de paternidade, pois a prova genética não
gera presunção absoluta, cabendo ao autor comprovar a possibilidade de
procedência do pedido por meio de outras provas. Nesse contexto, a
interpretação a contrario sensu da Súmula 301 do STJ, de forma a desconstituir
a paternidade devido ao não comparecimento do menor ao exame genético, atenta contra
a diretriz constitucional e preceitos do CC e do ECA, tendo em vista que o
ordenamento jurídico brasileiro protege, com absoluta prioridade, a dignidade e
a liberdade da criança e do adolescente, instituindo o princípio do melhor
interesse do menor e seu direito à identidade e desenvolvimento da
personalidade. Vale ressaltar, ainda, que o não comparecimento do menor ao
exame há de ser atribuído à mãe, visto que é ela a responsável pelos atos do
filho. REsp 1.272.691-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 5/11/2013.
DIREITO
CIVIL E DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA PENAL EM CONTRATO DE PACOTE
TURÍSTICO. É abusiva a cláusula penal de contrato de pacote turístico
que estabeleça, para a hipótese de desistência do consumidor, a perda integral
dos valores pagos antecipadamente. De fato, não é possível falar em perda total
dos valores pagos antecipadamente por pacote turístico, sob pena de se criar
uma situação que, além de vantajosa para a empresa de turismo (fornecedora de
serviços), mostra-se excessivamente desvantajosa para o consumidor, o que
implica incidência do art. 413 do CC/2002, segundo o qual a penalidade deve
obrigatoriamente (e não facultativamente) ser reduzida equitativamente pelo
juiz se o seu montante for manifestamente excessivo. Ademais, o STJ tem o
entendimento de que, em situação semelhante (nos contratos de promessa de
compra e venda de imóvel), é cabível ao magistrado reduzir o percentual da
cláusula penal com o objetivo de evitar o enriquecimento sem causa por qualquer
uma das partes. Além disso, no que diz respeito à relação de consumo,
evidencia-se, na hipótese, violação do art. 51, II e IV, do CDC, de acordo com
o qual são nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao
fornecimento de produtos e serviços que subtraiam ao consumidor a opção de
reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código, ou que
estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o
consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a
equidade. Nesse contexto, cabe ressaltar o disposto no art. 51, § 1º, III, do
CDC: presume-se exagerada a vantagem que “se mostra excessivamente onerosa para
o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse
das partes e outras circunstâncias peculiares do caso”. Por fim, cabe afirmar,
também, que o cancelamento de pacote turístico contratado constitui risco do
empreendimento desenvolvido por qualquer agência de turismo, não podendo esta
pretender a transferência integral do ônus decorrente de sua atividade
empresarial a eventuais consumidores. REsp 1.321.655-MG, Rel. Min. Paulo de
Tarso Sanseverino, julgado em 22/10/2013.
DIREITO
CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA PARA REQUERER DESCONSIDERAÇÃO. INVERSA DE
PERSONALIDADE JURÍDICA. Se o sócio controlador de sociedade
empresária transferir parte de seus bens à pessoa jurídica controlada com o
intuito de fraudar partilha em dissolução de união estável, a companheira
prejudicada, ainda que integre a sociedade empresária na condição de sócia
minoritária, terá legitimidade para requerer a desconsideração inversa da
personalidade jurídica de modo a resguardar sua meação. Inicialmente, ressalte-se
que a Terceira Turma do STJ já decidiu pela possibilidade de desconsideração
inversa da personalidade jurídica – que se caracteriza pelo afastamento da
autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na
desconsideração da personalidade jurídica propriamente dita, atingir o ente
coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica
por obrigações do sócio –, em razão de uma interpretação teleológica do art. 50
do CC/2002 (REsp 948.117-MS, DJe 3/8/2010). Quanto à legitimidade para atuar
como parte no processo, por possuir, em regra, vinculação com o direito
material, é conferida, na maioria das vezes, somente aos titulares da relação
de direito material. Dessa forma, a legitimidade para requerer a desconsideração
é atribuída, em regra, ao familiar que tenha sido lesado, titular do direito
material perseguido, consoante a regra segundo a qual “Ninguém poderá pleitear,
em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei” (art. 6º do
CPC). Nota-se, nesse contexto, que a legitimidade para requerer a
desconsideração inversa da personalidade jurídica da sociedade não decorre da
condição de sócia, mas sim da condição de companheira do sócio controlador
acusado de cometer abuso de direito com o intuito de fraudar a partilha. Além
do mais, embora a companheira que se considera lesada também seja sócia, seria
muito difícil a ela, quando não impossível, investigar os bens da empresa e
garantir que eles não seriam indevidamente dissipados antes da conclusão da partilha,
haja vista a condição de sócia minoritária. REsp 1.236.916-RS, Rel. Min. Nancy
Andrighi, julgado em 22/10/2013.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. COMERCIALIZAÇÃO DE VEÍCULO REESTILIZADO. O
consumidor que, em determinado ano, adquire veículo cujo modelo seja do ano
ulterior não é vítima de prática comercial abusiva ou propaganda enganosa pelo
simples fato de, durante o ano correspondente ao modelo do seu veículo, ocorrer
nova reestilização para um modelo do ano subsequente. Em princípio, é lícito ao
fabricante de veículos antecipar o lançamento de um modelo meses antes da
virada do ano, prática usual no mercado de veículos. Realmente, de acordo com a
Terceira Turma do STJ (REsp 1.342.899-RS, DJe 9/9/2013), ocorre prática
comercial abusiva e propaganda enganosa na hipótese em que coexistam, em
relação ao mesmo veículo, dois modelos diferentes, mas datados com o mesmo ano.
Todavia, esse entendimento não tem aplicabilidade na hipótese em análise, visto
que se trata de situação distinta, na qual a nova reestilização do produto
alcança apenas veículos cujos modelos sejam datados com ano posterior à data do
modelo do veículo anteriormente comercializado. REsp 1.330.174-MG, Rel. Min.
Sidnei Beneti, julgado em 22/10/2013.
DIREITO
DO CONSUMIDOR. PRAZO PARA RECLAMAR DE VÍCIOS APARENTES OU DE FÁCIL CONSTATAÇÃO
PRESENTES EM VESTIDO DE NOIVA. Decai em noventa dias, a
contar do dia da entrega do produto, o direito do consumidor de reclamar pelos
vícios aparentes ou de fácil constatação presentes em vestido de noiva. Os
critérios legais para a fixação do prazo decadencial para reclamação de vícios
aparentes ou de fácil constatação leva em consideração a durabilidade ou não do
produto ou serviço. Assim, se o produto for durável, o prazo será de 90 dias,
caso contrário, se não durável, o prazo será de 30 dias (art. 26 do CDC).
Ressalte-se que vício aparente ou de fácil constatação é aquele que não exige
do consumidor médio nenhum conhecimento especializado ou apreciação técnica
(perícia), por decorrer de análise superficial do produto (simples visualização
ou uso), cuja constatação é verificável de plano, a partir de um simples exame
do bem ou serviço, por mera experimentação ou por “saltar aos olhos”
ostensivamente sua inadequação. Ademais, entende-se por produto durável aquele
que, como o próprio nome consigna, não se extingue pelo uso, levando certo
tempo para se desgastar, que variará conforme a qualidade da mercadoria, os
cuidados que lhe são emprestados pelo usuário, o grau de utilização e o meio
ambiente no qual inserido. Portanto, natural que um terno, um eletrodoméstico,
um automóvel ou até mesmo um livro, à evidência exemplos de produtos duráveis,
se desgastem com o tempo, já que a finitude, é de certo modo, inerente a todo
bem. Por outro lado, os produtos não duráveis, tais como alimentos, os remédios
e combustíveis, em regra in natura, findam com o mero uso, extinguindo-se em um
único ato de consumo. Assim, por consequência, nos produtos não duráveis o
desgaste é imediato. Diante disso, o vestido de noiva deve ser classificado
como um bem durável, pois não se extingue pelo mero uso, sendo notório que, por
seu valor sentimental, há quem o guarde para a posteridade, muitas vezes com a
finalidade de vê-lo reutilizado em cerimônias de casamento por familiares
(filhas, netas e bisnetas) de uma mesma estirpe. Há pessoas, inclusive, que
mantêm o vestido de noiva como lembrança da escolha de vida e da emoção
vivenciada no momento do enlace amoroso, enquanto há aquelas que o guardam para
uma possível reforma, seja por meio de aproveitamento do material (normalmente
valioso), do tingimento da roupa (cujo tecido, em regra, é de alta qualidade)
ou, ainda, para extrair lucro econômico, por meio de aluguel (negócio rentável
e comum atualmente). Assim, existindo vício aparente ou de fácil constatação em
vestido de noiva, incide o prazo de 90 dias, aplicável aos bens duráveis (art.
26, II, do CDC). REsp 1.161.941-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva,
julgado em 5/11/2013.
DIREITO
CIVIL. INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA NO ÂMBITO DE AÇÃO DE INTERDIÇÃO. É
possível determinar, no âmbito de ação de interdição, a internação compulsória
de quem tenha acabado de cumprir medida socioeducativa de internação, desde que
comprovado o preenchimento dos requisitos para a aplicação da medida mediante
laudo médico circunstanciado, diante da efetiva demonstração da insuficiência
dos recursos extra-hospitalares. De fato, a interdição civil com internação
compulsória encontra fundamento jurídico tanto no Código Civil quanto na Lei
10.216/2001. Nesse contexto, o art. 1.777 do CC prescreve a possibilidade de os
interditados serem “recolhidos em estabelecimentos adequados, quando não se
adaptarem ao convívio doméstico”. Por sua vez, o art. 4º da Lei 10.216/2001
também estabelece a possibilidade de internação compulsória na hipótese em que
“os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”. Ante o exposto, é
claro o caráter excepcional da medida, exigindo-se, portanto, para sua
imposição, laudo médico circunstanciado que comprove a necessidade da medida
diante da efetiva demonstração de insuficiência dos recursos
extra-hospitalares. A internação compulsória deve, quando possível, ser
evitada, de modo que a sua adoção apenas poderá ocorrer como última opção, em
defesa do internado e, secundariamente, da própria sociedade. Nesse contexto,
resguarda-se, por meio da interdição civil com internação compulsória, a vida
do próprio interditando e, secundariamente, a segurança da sociedade. Além
disso, deve-se ressaltar que não se pretende, com essa medida, aplicar sanção
ao interditado seja na espécie de pena seja na forma de medida de segurança,
haja vista que a internação compulsória em ação de interdição não tem caráter
penal, não devendo, portanto, ser comparada à medida de segurança ou à medida
socioeducativa. HC 169.172-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
10/12/2013.
DIREITO
CIVIL. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. A companheira sobrevivente
faz jus ao direito real de habitação (art. 1.831 do CC) sobre o imóvel no qual
convivia com o companheiro falecido, ainda que tenha adquirido outro imóvel
residencial com o dinheiro recebido do seguro de vida do de cujus. De fato, o
art. 1.831 do CC reconhece ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime
de bens, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real
de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde
que seja o único daquela natureza a inventariar, silenciando quanto à extensão
desse direito ao companheiro sobrevivente. No entanto, a regra contida no art.
226, § 3º, da CF, que reconhece a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento, é norma
de inclusão, sendo contrária ao seu espírito a tentativa de lhe extrair efeitos
discriminatórios entre cônjuge e companheiro. Assim sendo, o direto real de
habitação contido no art. 1.831 do CC deve ser aplicado também ao companheiro
sobrevivente (REsp 821.660-DF, Terceira Turma, DJe 17/6/2011). Além do mais, o
fato de a companheira ter adquirido outro imóvel residencial com o dinheiro
recebido pelo seguro de vida do de cujus não resulta exclusão do direito real
de habitação referente ao imóvel em que residia com seu companheiro, ao tempo
da abertura da sucessão, uma vez que, segundo o art. 794 do CC, no seguro de
vida, para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeitos às dívidas
do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito. Dessa
forma, se o dinheiro do seguro não se insere no patrimônio do de cujus, não há
falar em restrição ao direito real de habitação, porquanto o imóvel adquirido
pela companheira sobrevivente não faz parte dos bens a inventariar. REsp
1.249.227-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/12/2013.
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