RESPONSABILIDADE CIVIL. BANCO. CHEQUES. ENDOSSO.
De acordo com o TJ, a empresa realizou quatro operações bancárias de aplicação financeira: duas mediante cheques TB (transferência bancária de valores) e duas mediante cheques administrativos, mas depois não pôde resgatar as aplicações. Os prejuízos suportados pela recorrida foram expressamente mencionados no acórdão recorrido a partir das provas dos autos, totalizando o desfalque no valor de R$1.500.000 desviados pelos bancos recorrentes para a conta de terceiro. A subtração deu-se em endossos apostos nos cheques, sacados em dois dos bancos envolvidos e depositados em um terceiro banco, tendo sido devidamente compensados. Também ficou claro que, apesar da suposta participação na fraude de prepostos, de ambas as partes, a causa principal do evento danoso foi a desídia dos bancos no desconto e na compensação dos cheques, aliada à informação, prestada por um dos bancos envolvidos, de que os valores tinham sido aplicados, impedindo a recorrida de evitar o desvio do numerário. Nessa específica hipótese, os serviços prestados pelos bancos recorrentes e utilizados pela recorrida denotam claramente a existência de relação de consumo, sendo aplicável ao caso o CDC, nos termos da Súm. n. 297-STJ. No que diz respeito à hipossuficiência, como se trata de empresa de equipamentos de informática, sua condição não tem posição de igualdade em relação aos bancos. Além disso, encontra-se pacificado, neste Superior Tribunal, o entendimento de que o art. 2º do CDC abarca expressamente a possibilidade de as pessoas jurídicas figurarem como consumidores, sendo relevante saber se a pessoa, física ou jurídica, é destinatária final do produto ou serviço. Assim, a responsabilidade objetiva prevista no art. 14 do CDC é perfeitamente aplicável à hipótese dos autos. Também é indiscutível que o desvio de valores envolveu a prestação defeituosa de serviços bancários, obrigando os fornecedores a responder, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados ao consumidor. Logo, a responsabilidade deve ser apurada a partir da existência de atos comissivos ou omissivos legítimos das partes que tenham concorrido, ainda que indiretamente, para o desfalque, nos termos do art. 159 do CC/1916. Destarte, o endosso dos cheques que deram suporte ao desvio dos valores não pode ser tido como ato legítimo da recorrida. Nesse aspecto, o tribunal a quo registrou o cuidado adotado pela recorrida para que os cheques por ela emitidos fossem subscritos por duas pessoas, o que foi informado aos bancos recorrentes. No entanto, eles não demonstraram igual cautela, tendo conferido a seus prepostos poderes suficientes para praticar atos que resultaram em prejuízo para sua correntista. Dessa forma, não se pode cogitar a ilegitimidade nos atos praticados pelos bancos, por intermédio de seus prepostos, visto que eles agiram dentro dos limites dos poderes que lhes foram outorgados, caracterizando, na realidade, culpa por fato de terceiro, prevista no art. 1.521 do CC/1916, que consagra as culpas in eligendo e in vigilando. Em razão de a recorrida confiar o depósito de dinheiro aos cuidados desses bancos, formalizaram-se contratos equiparados aos de mútuo, nos quais, de acordo com o art. 1.257 do CC/1916, transfere-se o domínio da coisa emprestada ao mutuário, por cuja conta correm todos os riscos desde a tradição. Daí decorre a concorrência de culpas, que na verdade consubstancia concorrência de causas para o evento danoso, mas que só deve ser admitida em casos excepcionais. Quanto aos cheques TB, eles não admitem endosso, de modo que somente podiam ser depositados em conta bancária de titularidade do próprio emitente, no caso a recorrida. Já quanto à verificação dos endossos, o entendimento consolidado neste Superior Tribunal é que o banco apresentante do cheque à câmara de compensação tem o dever de verificar a regularidade da sucessão dos endossos. Deve, pois, tomar a cautela de exigir provas da legitimidade do endossante, como, por exemplo, cópia do contrato social da empresa, quando o título for nominal à pessoa jurídica. Dessarte, ainda que pelos atos culposos, os três bancos recorrentes deverão responder solidariamente pela indenização, nos termos da lei. Diante do exposto, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 814.060-RJ, DJe 13/4/2010; REsp 1.080.719-MG, DJe 17/8/2009; REsp 1.084.291-RS, DJe 4/8/2009; REsp 206.039-RJ, DJ 15/8/2005; REsp 1.092.720-PR, DJe 13/11/2009, e REsp 874.372-RR, DJe 30/11/2009. REsp 1.007.692-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, em 17/8/2010.
CIRURGIA ESTÉTICA. INDENIZAÇÃO. QUELOIDES.
Trata-se, na origem, de ação de indenização por danos morais e estéticos, ajuizada pela ora recorrente contra o recorrido, na qual alega que foi submetida a uma cirurgia estética (mamoplastia de aumento e lipoaspiração), que resultou em grandes lesões proliferativas – formadas por tecidos de cicatrização – nos locais em que ocorreram os cortes da operação. Ora, o fato de a obrigação ser de resultado, como o caso de cirurgia plástica de cunho exclusivamente embelezador, não torna objetiva a responsabilidade do médico, ao contrário do que alega a recorrente. Permanece subjetiva a responsabilidade do profissional de Medicina, mas se transfere para o médico o ônus de demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores alheios à sua atuação durante a cirurgia. Assim, conforme o acórdão recorrido, o laudo pericial é suficientemente seguro para afirmar a ausência de qualquer negligência do cirurgião. Ele não poderia prever ou evitar as intercorrências registradas no processo de cicatrização da recorrente. Assim, não é possível pretender imputar ao recorrido a responsabilidade pelo surgimento de um evento absolutamente casual, para o qual não contribuiu. A formação do chamado queloide decorreu de característica pessoal da recorrente, e não da má atuação do recorrido. Ademais, ao obter da recorrente, por escrito, o termo de consentimento, no qual explica todo o procedimento, informando-lhe sobre os possíveis riscos e complicações pós-cirúrgicos, o recorrido agiu com honestidade, cautela e segurança. Logo, a Turma negou provimento ao recurso. REsp 1.180.815-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/8/2010.
INDENIZAÇÃO. PERDA. CHANCE. ELEIÇÃO.
O tribunal a quo deu parcial provimento à apelação interposta pelos ora recorrentes para reduzir o valor da indenização imposta pela sentença, que os condenou ao pagamento de danos morais e materiais ao recorrido, por, às vésperas do dia da eleição municipal, haver veiculado falsa notícia referente à sua candidatura ao cargo de vereador, não tendo sido eleito por apenas oito votos. Assim, a Turma negou provimento ao recurso, reiterando o entendimento de que é possível a indenização pelo benefício cuja chance a parte prejudicada tenha perdido a oportunidade de concretizar, segundo um critério de probabilidade. Não se trata de reparar a perda de uma simples esperança subjetiva, em conferir ao lesado a integralidade do que esperava caso obtivesse êxito ao usufruir plenamente sua chance. É necessário que tenha ocorrido um ato ilícito e, daí, decorresse a perda da chance de obter o resultado que beneficiaria o lesado. Precedentes citados: REsp 1.104.665-RS, DJe 4/8/2009; REsp 965.758-RS, DJe 3/9/2008; REsp 1.079.185-MG, DJe 4/8/2009, e REsp 788.459-BA, DJ 13/3/2006. REsp 821.004-MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 19/8/2010.
PENHORA. USUFRUTO. IMÓVEL. RESIDÊNCIA.
O tribunal a quo reconheceu a possibilidade da penhora do direito ao exercício de usufruto vitalício da ora recorrente. Porém, o usufruto é um direito real transitório que concede a seu titular o gozo de bem pertencente a terceiro durante certo tempo, sob certa condição ou vitaliciamente. O nu-proprietário do imóvel, por sua vez, exerce o domínio limitado à substância da coisa. Na redação do art. 717 do CC/1916, vigente à época dos fatos, deduz-se que o direito de usufruto é inalienável, salvo quanto ao proprietário da coisa. Seu exercício, contudo, pode ser cedido a título oneroso ou gratuito. Resulta daí a jurisprudência admitir que os frutos decorrentes dessa cessão podem ser penhorados, desde que tenham expressão econômica imediata. No caso, o imóvel é ocupado pela própria devedora, que nele reside, não produzindo qualquer fruto que possa ser penhorado. Assim, não é cabível a penhora do exercício do direito ao usufruto do imóvel ocupado pelo recorrente, por ausência de amparo legal. Logo, a Turma deu provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 925.687-DF, DJ 17/9/2007; REsp 242.031-SP, DJ 29/3/2004, e AgRg no Ag 851.994-PR, DJ 1º/10/2007. REsp 883.085-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 19/8/2010.
HIPOTECA. TERRENO. EDIFICAÇÃO.
Na espécie a recorrida, empresa de engenharia, não resgatou, perante instituição financeira, dívida no prazo de seu vencimento, e o terreno no qual foi edificado o imóvel, como toda construção dessa natureza, foi dado em garantia hipotecária para assegurar o recebimento de dívida perante o banco credor. Vencida a dívida, o banco tratou de executá-la, tendo como garantia o imóvel do recorrente e de outros condôminos. Assim, diante da ameaça de ser privado do bem, o recorrente deixou de pagar as parcelas ao recorrido, alegando exceção do contrato não cumprido, pois a construtora não liberou a hipoteca perante o banco credor, sendo essa uma obrigação assumida por ela, o que a motivou a efetivar inúmeros protestos contra o recorrente. Logo, a Turma entendeu que a legislação pertinente à espécie (art. 22 da Lei n. 4.864/1965) ampara o adquirente de unidade hipotecada em relação ao inadimplemento da construtora diante do financiador. Daí decorre que o recorrente não possui legitimidade para, unilateralmente, suspender o cumprimento de sua obrigação, sob o argumento de que a construtora está descumprindo a sua perante o banco financiador e, consequentemente, atingindo o recorrente. Se tal receio existe, a ação de consignação é o meio adequado, e não a via eleita pelo autor. Logo, no caso, não há que se falar em exceção do contrato não cumprido. REsp 867.772-ES, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 19/8/2010.
RESPONSABILIDADE. CONCESSIONÁRIA. TRENS.
Trata-se de ação de indenização decorrente da morte do filho e irmão das recorridas, colhido por composição ferroviária. Sucede que a sociedade empresária que originalmente efetuava o transporte ferroviário no município e que foi condenada ao ressarcimento deixou de explorar a maior parte do serviço. Então, a recorrente, mediante licitação, recebeu a concessão para o transporte. Assim, vê-se que aquela sociedade coexistiu com a recorrente por um bom tempo, antes que houvesse sua cisão em duas outras. Não há falar, também, em sucessão empresarial entre elas, visto que a recorrente utilizou-se de investidura originária (licitação) para assumir a concessão do serviço público, de modo que, exceto por previsão contratual, não lhe caberia responder por danos ocasionados pela antiga exploradora. Anote-se que a sociedade foi criada pelo Governo, daí se cuidar de responsabilidade objetiva, respondendo o Estado subsidiariamente pelas obrigações não honradas. Por isso tudo, é temeroso atribuir o cumprimento da condenação à recorrente, que nem concorreu para o evento danoso, apenas porque ostenta a condição de nova prestadora dos serviços públicos em questão ou porque assumiu parte do patrimônio da antiga prestadora (trens e trilhos), tal como defendido pelo acórdão recorrido. Esse entendimento foi acolhido por maioria pela Turma. O Min. Aldir Passarinho Junior, em seu voto vencido, entendia necessário anular o acórdão com lastro no art. 535 do CPC. REsp 1.095.447-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 17/8/2010.
TÍTULO. RECONHECIMENTO. NULIDADE. OFÍCIO.
Nos embargos à arrematação, é lícito ao juiz ou ao tribunal conhecer de ofício da nulidade absoluta (no caso, falta de exequibilidade do título), mesmo que não haja pronunciamento anterior. O vício constante do título de crédito deve ser apontado pelo juízo em qualquer tempo ou grau de jurisdição, apesar da discussão doutrinária quanto a ser ele condição da ação de execução ou pressuposto processual. O aparente conflito entre o § 3º do art. 267, o § 4º do art. 301 e o art. 618 do CPC, normas que autorizam o conhecimento de ofício das nulidades processuais a qualquer tempo, e a primeva redação do art. 746 do CPC, que restringe essas nulidades arguíveis às aperfeiçoadas após a penhora, cede à interpretação de que a dita “superveniência da penhora” adstringe-se ao “pagamento, novação, transação ou prescrição” ou às nulidades não apreciáveis de ofício pelo Judiciário. Precedentes citados: AgRg no REsp 194.546-PR, DJ 13/10/2003; REsp 450.248-DF, DJ 16/12/2002, e REsp 488.380-DF, DJ 1º/3/2007. REsp 776.272-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/8/2010.
COBRANÇA INDEVIDA. DEVOLUÇÃO. DOBRO.
A aplicação do art. 1.531 do CC/1916 (devolução em dobro por demanda de dívida já paga), que hoje corresponde ao art. 940 do CC/2002, independe de ação autônoma ou reconvenção. No caso, a má-fé do condomínio na cobrança das quotas condominiais (vide Súm. n. 159-STF) foi tida por incontroversa pelo tribunal a quo, a permitir ao condômino demandado pleitear a incidência do referido artigo por qualquer via processual que escolha. Assim, a interpretação dada pelo tribunal a quo quanto ao dispositivo, de que ele dependeria de reconvenção ou ação, não traduz a real interpretação do legislador e nem se coaduna com os princípios da boa-fé e da finalidade econômica e/ou social do direito, além de permitir a prática do abuso de direito e o indevido uso do aparato judicial. Precedentes citados: REsp 788.700-PB, DJe 30/11/2009; Ag 796.295-RJ, DJ 7/7/2007, e REsp 608.887-ES, DJ 13/3/2006. REsp 661.945-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/8/2010.
RESPONSABILIDADE. ROUBO. CARGA. FORÇA MAIOR.
A Turma reformou acórdão do tribunal a quo para excluir o dever de indenizar da transportadora recorrente, contra a qual foi ajuizada, na origem, ação regressiva de ressarcimento de danos pela empresa de seguros recorrida. Na espécie, ficou consignado, nas instâncias ordinárias, que a mercadoria transportada não chegou a seu destino em decorrência de roubo com arma de fogo ocorrido durante o trajeto. Conforme entendimento assente deste Superior Tribunal, tal fato configura hipótese de força maior, capaz de excluir a responsabilidade da empresa de transportes. Nesse contexto, salientou-se que as referidas empresas são obrigadas apenas a contratar o seguro de responsabilidade civil disposto no art. 10 do Dec. n. 61.867/1967, não o que contemple eventuais perdas decorrentes de caso fortuito ou força maior, ao contrário do alegado pelo decisum recorrido. Precedentes citados: REsp 130.696-SP, DJ 29/6/1998; AgRg no Ag 721.581-RJ, DJe 29/3/2010; REsp 329.931-SP, DJ 17/2/2003; REsp 164.155-RJ, DJ 3/5/1999; REsp 904.733-MG, DJ 27/8/2007; REsp 416.353-SP, DJ 12/8/2003; REsp 222.821-SP, DJ 1º/7/2004; REsp 109.966-RS, DJ 18/12/1998, e AgRg no REsp 753.404-SC, DJe 19/10/2009. REsp 663.356-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/8/2010.
USUCAPIÃO. HERDEIRO. POSSE EXCLUSIVA.
A Turma deu provimento ao recurso especial para, dentre outras questões, reconhecer a legitimidade dos recorrentes para a propositura, em nome próprio, de ação de usucapião relativamente a imóvel de cujo adquirente um dos autores é herdeiro. Consoante acentuado pelo Min. Relator, a jurisprudência entende pela possibilidade de o condômino usucapir bem sobre o qual exerça a posse exclusiva, desde que haja efetivo animus domini e estejam preenchidos os requisitos impostos pela lei, sem oposição dos demais herdeiros. Precedente citado: AgRg no Ag 731.971-MS, DJe 20/10/2008. REsp 668.131-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19/8/2010.
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