domingo, 22 de agosto de 2010

ARTIGO DO MAGISTRADO DÉCIO LUIZ RODRIGUES (SP) SOBRE A EMENDA DO DIVÓRCIO.

DIVÓRCIO - EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010 - PRIMEIRAS TENTATIVAS DE INTERPRETAÇÃO

Segundo a Emenda Constitucional 66/2010 , o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio , não mais havendo referência à necessidade de separação judicial prévia ao divórcio e nem a decurso de tempo algum para se chegar ao divórcio.

Assim , levando-se em conta a “mens legis” e a “mens legislatoris”, haja vista que nos pareceres/exposição de motivos da Emenda Constitucional indigitada mencionou-se , “apertis verbis” , que o instituto da separação judicial deixaria de existir , entendemos que foi extinta a separação , judicial e extrajudicial , quer por aqueles motivos acima referidos , quer pela irrazoabilidade/não-recepção Constitucional de sua manutenção.

Portanto , extinta , a separação judicial , do mundo jurídico , inclusive no âmbito extrajudicial , o que antes era possível fazê-lo , “ex vi” da Lei n. 11. 441 de 2007 , cabe o pedido de divórcio pelas partes em comum acordo ( o que podemos chamar de divórcio consensual ) ou por um cônjuge em face do outro , pois este não queria o divórcio ( o que podemos chamar de divórcio litigioso ) e sem requisito algum de tempo , muito menos de tempo de separação judicial ou de fato , não se podendo , ainda , indagar-se a respeito de culpa “stricto sensu” na decretação do divórcio , pois independe de qualquer condição ou fato , inclusive independe da vontade do outro cônjuge.

Como corolário , ainda , deste sentir conclui-se que tanto o vínculo conjugal como a sociedade conjugal , que permanecem como institutos distintos, serão extintos , concomitantemente , pelo divórcio , assim como também pela morte e pelas causas de invalidade ( nulidade e anulação ) do casamento.

E se houver necessidade de discussão da culpa , nesta incluído o descumprimento dos deveres do casamento , para se decidir sobre alimentos , guarda de filho , uso do nome do cônjuge a ser divorciado ( hipóteses , por analogia , da perda do uso do patronímico na vetusta separação judicial ) e até sobre danos morais ocorridos na relação entre os cônjuges ?

Entendemos que tais discussões devem ser travadas em ação própria e entre os então ex-casados , pois , mesmo havendo culpa do cônjuge , é impossível não se decretar o divórcio por isso , nem cabendo defesa/contestação alguma do outro cônjuge quanto ao divórcio , pois a Constituição não vincula mais nada à possibilidade de decretação do divórcio do casal e , quanto aos danos morais indigitados , temos que a competência passa a ser , sem sobra de dúvidas , de Vara Cível , dada a independência total da decretação do divórcio , sem requisito algum , em relação aos danos morais advindos da relação entre as partes casadas.

Outrossim , entendemos que , nas ações de separação judicial em curso , as partes devem ser instadas a adaptarem a ação ao pedido de divórcio , sob pena de extinção da ação de separação por falta de interesse de agir e/ou impossibilidade jurídica do pedido supervenientes e em havendo , após a Emenda , novos ajuizamentos de ação de separação , devem ser extintas por impossibilidade jurídica do pedido , caso não sejam emendadas as iniciais para o pedido de divórcio.

Nem se diga que a emenda violaria o artigo 264 e seu parágrafo único do CPC (“feita a citação, é defeso ao autor modificar o pedido ou a causa de pedir, sem o consentimento do réu, mantendo-se as mesmas partes, salvo as substituições permitidas por lei. Parágrafo único. A alteração do pedido ou da causa de pedir em nenhuma hipótese será permitida após o saneamento do processo” ) , pois se trata , “hic et nunc” , de adaptação necessária da Lei ordinária ( CPC ) a norma de caráter Constitucional “stricto sensu”, com prevalência desta e de seus princípios àquela.

Mas , sem a separação antecedente que levava ao divórcio , não foi subtraído dos cônjuges o necessário prazo para refletirem sobre o que estão fazendo ?

Não , pois se trata de partes capazes juridicamente para o matrimônio e para a solução que encontraram e , na “praxis” forense , muitos casos há em que , mesmo após o prazo de separação , há o divórcio e , mais tarde , casam , os dois , de novo , não havendo , pois , regra de ciência exata no relacionamento humano/amoroso.

Passa a ser incabível a ação cautelar de separação de corpos?

Entendemos que ainda é cabível tal ação nas hipóteses em que a permanência da pessoa casada no seio do lar trouxer risco/perigo à segurança e/ou à saúde do outro cônjuge ou da prole , sempre se atentando ao Poder Geral de Cautela do Juiz , haja vista que não mais há razão para se ajuizar a cautelar referida somente para se garantir a um dos cônjuges , autor da ação , que ele possa abandonar o lar sem perigo de estar descumprindo o dever de coabitação , pois não mais se discute culpa “stricto sensu” no divórcio , devendo , o autor , em trinta dias do cumprimento da liminar , ajuizar a ação principal de divórcio , não mais de separação judicial.

Também consignamos que não mais terá valia a cautelar de separação de corpos criada pela Jurisprudência nos casos em que o casal ainda não estava casado por um ano , não queria mais ficar casado desde agora e ajuizava a cautelar para não viverem mais sob o mesmo teto , sem risco de infringirem o dever de coabitação , aguardando , separados , o transcurso do prazo de um ano de casamento para poderem pedir a separação consensual , haja vista que este instituto não mais existe e que não mais necessitam de prazo algum para pedirem o divórcio , “in casu” consensual.

Nos casos de separação judicial ou extrajudicial já consolidadas antes da Emenda , é possível a ação de conversão da separação em divórcio?

Parece-nos que é possível , inclusive pela via extrajudicial , conforme artigo 52 da Resolução 35 do CNJ , mas já “no mesmo dia” , sem necessidade de se aguardar o antigo prazo de um ano de separação para se pedir a conversão e esta , na prática , vai corresponder a um próprio pedido autônomo de divórcio e amparado na mudança Constitucional , sem requisito algum , nem se cogitando de culpa.

DÉCIO LUIZ JOSÉ RODRIGUES
JUIZ DE DIREITO TITULAR DA SEXTA VARA CÍVEL DO FORO REGIONAL DE SANTO AMARO - SP - CAPITAL

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