quinta-feira, 4 de agosto de 2016

RESUMO. INFORMATIVO 585 DO STJ



SÚMULA N. 573. Nas ações de indenização decorrente de seguro DPVAT, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, para fins de contagem do prazo prescricional, depende de laudo médico, exceto nos casos de invalidez permanente notória ou naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução. Segunda Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.

SÚMULA N. 574. Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem. Terceira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXEQUIBILIDADE DE SENTENÇAS NÃO CONDENATÓRIAS (ART. 475-N, I, DO CPC/1973). RECURSO REPETITIVO. TEMA 889. A sentença, qualquer que seja sua natureza, de procedência ou improcedência do pedido, constitui título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação de pagar quantia, de fazer, não fazer ou entregar coisa, admitida sua prévia liquidação e execução nos próprios autos. De início, destaca-se que o ponto nodal da controvérsia consiste em definir se há exequibilidade (ou não) em sentenças não condenatórias, notadamente após o acréscimo, pela Lei n. 11.232/2005, do art. 475-N, I, ao CPC/1973 ("Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I - a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia"), quer a decisão contenha julgamento de procedência, quer de improcedência, dada a natureza dúplice do elemento declaratório presente em toda decisão judicial. Inclusive, a Lei n. 13.105/2015 (CPC/2015) reproduz essa norma: "Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: I - as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa". Daí a atualidade da matéria. De fato, a execução forçada não se destina ao ajustamento ou à definição do direito do exequente, de modo que sua instauração demanda necessariamente que a situação jurídica do titular do direito tenha sido completa e previamente reconhecida em título executivo, assim entendido, por doutrina, como "o documento que contém um ato de acertamento do direito que o credor pretende executar". É o que se dessume da interpretação conjunta dos arts. 580 e 586 do CPC/1973, reproduzidos respectivamente pelos arts. 786 e 783 do CPC/2015. Com efeito, a decisão de cunho condenatório sempre foi considerada o título executivo judicial por excelência, à evidência da norma inserta no revogado art. 584, I, do CPC/1973 ("Art. 584. São títulos executivos judiciais: I - a sentença condenatória proferida no processo civil"). A grande carga de executividade dessa espécie de decisão decorre do fato de que seu comando consubstancia efetiva manifestação judicial acerca da existência e validade da relação jurídica controvertida e da exigibilidade da pretensão que dela deriva, revestindo-a com o grau de certeza exigido pela lei quanto à obrigação inadimplida, em virtude da identificação de todos os elementos dessa relação jurídica. Às decisões de natureza declaratória, contudo, antes da vigência da Lei n. 11.232/2005, era negada a eficácia executiva, ainda que secundária, ao argumento de que elas se limitavam à declaração de certeza acerca da existência ou da inexistência de relação jurídica (art. 4º do CPC/1973) - o que constituiria o cerne da pretensão exercitada -, não se estendendo ao reconhecimento da existência de prestação a cargo do vencido. Diante disso, para fins de aferição da exequibilidade do provimento judicial, a utilização do critério da natureza da decisão não parece ser o melhor caminho, porquanto enseja polêmicas intermináveis e inócuas, que não oferecem contribuição no campo prático. Na verdade, o exame do conteúdo da decisão mostra-se método mais adequado à discriminação das sentenças passíveis de serem consideradas como título executivo, bastando, de acordo com doutrina, que ela contenha "a identificação integral de uma norma jurídica concreta, com prestação exigível de dar, fazer, não fazer ou pagar quantia". Nesse ponto, é relevante salientar que os referidos dispositivos legais não atribuem eficácia executiva a todas as sentenças declaratórias indiscriminadamente, mas apenas àquelas que, reconhecendo a existência da obrigação, contenham, em seu bojo, os pressupostos de certeza e exigibilidade (art. 586 do CPC/1973), sendo certo que, na ausência de liquidez, é admitida a prévia liquidação, tal qual ocorre com o provimento condenatório. Afinal, há de se considerar os princípios da efetividade jurisdicional e da economia processual como freios ao formalismo excessivo presente na imposição ao titular do direito já reconhecido em sentença declaratória da exigibilidade da obrigação de ajuizamento de demanda condenatória inútil, porquanto até mesmo a ampla análise da pretensão deduzida em juízo estaria impedida pela coisa julgada formada no processo anterior. Precedentes citados: REsp 1.422.401-PR, Primeira Turma, DJe 30/5/2014; AgRg no AREsp 720.870-SP, Segunda Turma, DJe 27/8/2015; AgRg no REsp 1.460.032-RN, Segunda Turma, DJe 14/9/2015; AgRg no REsp 1.018.250-RS, Segunda Turma, DJe 25/9/2014; AgRg no REsp 1.384.913-ES, Terceira Turma, DJe 24/8/2015; e REsp 1.508.910-SP, Terceira Turma, DJe 26/5/2015. REsp 1.324.152-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 4/5/2016, DJe 15/6/2016.

DIREITO CIVIL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO DE RETENÇÃO POR BENFEITORIAS REALIZADAS ANTES DE ADJUDICAÇÃO DE IMÓVEL VINCULADO AO SFH. O ex-mutuário de imóvel dado em garantia hipotecária em financiamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) não tem direito à retenção pelas benfeitorias realizadas no bem antes da adjudicação. De fato, sob a ótica do princípio da gravitação jurídica (accessorium sequitur principale - o acessório segue o principal), observa-se que as benfeitorias, por serem bens acessórios, incorporam-se ao imóvel (bem principal), ficando também sujeitas à garantia hipotecária. No CC/2002, há previsão específica nesse sentido, conforme se verifica no enunciado normativo do art. 1.474, segundo o qual "A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo imóvel". Inclusive, esse dispositivo mantém a mesma redação do art. 811 do CC/1916. Ademais, há entendimento doutrinário que aborda essa questão como um dos efeitos da hipoteca: "Efeito ainda da hipoteca em relação ao bem gravado é sua extensão a benfeitorias, acréscimos ou acessões trazidas ao bem hipotecado, seja em virtude da obra humana, seja por ação dos fatos naturais (aluvião, avulsão etc.)." Assim, a adjudicação de imóvel realizada no curso de execução extrajudicial de garantia hipotecária, com base no art. 32 do Decreto-Lei n. 70/1966 c/c o art. 7º da Lei n. 5.741/1971, transfere ao adjudicatário a propriedade do bem com todas as benfeitorias, por força do disposto no art. 1.474 do CC/2002. Desse modo, não há falar em direito de retenção ou indenização contra adjudicatário, pois benfeitorias são abarcadas por hipoteca. Esclareça-se, ainda, que não se vislumbra enriquecimento sem causa de credor hipotecário ou de terceiro adquirente, pois o preço de adjudicação é utilizado para extinguir saldo devedor (art. 7º da Lei n. 5.741/1971), em benefício de ex-mutuário. Sob outra ótica, considerando as especificidades das normas do SFH, ex-mutuário também não faz jus ao direito de retenção, pois existe norma específica excluindo esse direito (art. 32, § 2º, in fine, do Decreto-Lei n. 70/1966). Portanto, por esse fundamento, também se afasta a possibilidade de ex-mutuário exercer direito de retenção quanto a benfeitorias realizadas antes da adjudicação. REsp 1.399.143-MS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/6/2016, DJe 13/6/2016.

DIREITO CIVIL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA EM PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO DO SEGURO DPVAT. É válido o pagamento de indenização do Seguro DPVAT aos pais - e não ao filho - do de cujus no caso em que os genitores, apresentando-se como únicos herdeiros, entregaram os documentos exigidos pela Lei n. 6.194/1974 para o aludido pagamento (art. 5º, § 1º), dentre os quais certidão de óbito a qual afirmava que o falecido era solteiro e não tinha filhos. De antemão, esclareça-se que, de acordo com o art. 5º, § 1º, a, da Lei n. 6.194/1974, que dispõe sobre seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, o segurador deverá efetuar o pagamento de indenização mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, após a entrega dos seguintes documentos: certidão de óbito, registro da ocorrência policial e prova da qualidade de beneficiário. O art. 309 do CC, por sua vez, estabelece que o pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, mesmo que provado depois que não era ele credor. Nesse sentido, pela aplicação da teoria da aparência, é válido o pagamento realizado de boa-fé a credor putativo. De fato, para que o erro no pagamento seja escusável, é necessária a existência de elementos suficientes para induzir e convencer o devedor diligente de que o recebente é o verdadeiro credor. No caso aqui analisado, verifica-se que a indenização do Seguro DPVAT foi paga de boa-fé aos credores putativos. Além disso, não há previsão de obrigação da seguradora em averiguar a existência de outros beneficiários da vítima. REsp 1.601.533-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016, DJe 16/6/2016.

DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE CONVALIDAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO MEDIANTE A FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA DE SÓCIO. Não são convalidáveis os negócios jurídicos celebrados com o intuito de alterar o quadro societário de sociedade empresária por meio da falsificação de assinatura de sócio, ainda que o próprio sócio prejudicado pelo falso tenha, por escritura pública, concedido ampla, geral e irrevogável quitação, a fim de ratificar os negócios jurídicos. Com efeito, a questão posta em discussão não trata de nulidade relativa, mas, sim, de evidente nulidade absoluta, pois o art. 166, II, do CC, proclama ser nulo o negócio quando for ilícito o seu objeto, valendo ressaltar que essa ilicitude não é apenas do bem da vida em discussão, mas, também, da própria operação jurídica realizada. Na hipótese em análise, por exemplo, embora não haja qualquer vício no objeto propriamente dito do negócio jurídico (cessão das cotas sociais de sociedade empresária), a operação realizada para esse fim revela-se manifestamente ilícita (falsificação da assinatura de um dos sócios), configurando, inclusive, crime previsto no CP. Ademais, a falsificação da assinatura de uma das partes ofende não só o interesse particular dos envolvidos, mas, sim, viola todo o ordenamento jurídico e, por consequência, o interesse público. Há verdadeiro repúdio social intenso a qualquer forma criminosa em que se realize determinado negócio jurídico. Como consequência, os arts. 168, parágrafo único, e 169, ambos do CC, os quais, dentre outros, consubstanciam a chamada teoria das nulidades, proclamam que o negócio jurídico nulo é insuscetível de confirmação, não sendo permitido nem mesmo ao Juiz suprimir a nulidade, ainda que haja expresso requerimento das partes. É preciso pontuar, no entanto, a diferença entre convalidação (ratificação) e renovação (repetição) do negócio jurídico. Isso porque, conquanto não seja possível a convalidação do negócio jurídico nulo, revela-se perfeitamente admissível a renovação do ato, sem os vícios que o macularam anteriormente. Tratando-se de renovação de ato, não há efeito retroativo (ex tunc) em relação à data do negócio jurídico nulo celebrado. Trata-se de um novo negócio, completamente autônomo em relação ao primeiro (nulo), tendo validade, portanto, a partir da data em que for celebrado, desprezando-se completamente o tempo transcorrido entre o negócio jurídico nulo e o novo negócio realizado. Nesse contexto, a escritura pública posteriormente celebrada pelo sócio prejudicado não pode ratificar (convalidar) o negócio jurídico nulo, correspondente à alteração, mediante a falsificação de assinatura, do quadro societário da sociedade empresária. Se as partes signatárias da escritura pública tinham interesse em manter a transferência das cotas da sociedade empresária, deveriam renovar (repetir) o negócio jurídico, sem a falsificação da assinatura de quaisquer dos envolvidos, ocasião em que os efeitos seriam válidos a partir de então, isto é, a alteração do quadro societário somente se daria no momento do novo negócio. Não se desconhece entendimento de doutrina que defende que "se, por si só, a renovação do negócio nulo não retroage, nada impede que, pela autonomia da vontade, os contratantes deem ao negócio novo uma eficácia convencional com vigência a partir do tempo do negócio anterior (nulo)". Entretanto, no caso em análise, não é possível considerar a escritura pública celebrada como renovação do negócio jurídico nulo, muito menos com efeito retroativo convencionado pelas partes. Ora, por se tratar de alteração de quadro societário, a renovação do negócio jurídico somente seria possível se as partes procedessem ao devido arquivamento dos atos perante o órgão registrador, qual seja, a respectiva Junta Comercial. Assim, a referida escritura pública não se presta para o fim de convalidar o negócio jurídico em questão, por ser o mesmo nulo de pleno de direito, tampouco é possível considerá-la como renovação do ato, tendo em vista a ausência de arquivamento na Junta Comercial. Vale registrar, ainda, que não se aplica ao caso o art. 170 do CC, o qual dispõe que: "Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade." De fato, somente é possível converter substancialmente o negócio jurídico nulo em outro válido, isto é, dar-lhe nova roupagem jurídica, se preenchidos dois requisitos legais, um objetivo e outro subjetivo. O primeiro, refere-se à necessidade de que o negócio jurídico nulo contenha os mesmos requisitos do negócio que será convertido (validado). O segundo, de natureza subjetiva, consiste na vontade presumida das partes em realizar aquele outro negócio jurídico, caso houvessem previsto a nulidade. Na presente hipótese, contudo, não houve manifestação de vontade de uma das partes acerca da realização do negócio jurídico em comento, isto é, da alteração societária da sociedade empresária, pois houve a falsificação da assinatura do sócio prejudicado, o que ensejou na transferência do controle societário sem o seu conhecimento. Logo, o sócio prejudicado não participou do ato nem teve ciência da transferência de suas cotas para terceiros, inexistindo, portanto, qualquer manifestação de vontade por ocasião da celebração do negócio jurídico, razão pela qual inexiste o requisito subjetivo previsto no aludido dispositivo legal para poder viabilizar o instituto da conversão. Além disso, não se revela possível buscar a suposta manifestação de vontade do sócio prejudicado formulada na escritura pública celebrada posteriormente para tentar justificar a manutenção da alteração societária. A análise do requisito subjetivo deve ser aferida no próprio negócio declarado nulo, sob pena de se fazer letra morta o dispositivo do art. 169 do CC, que determina a impossibilidade de convalidação do negócio jurídico nulo. Ainda que assim não fosse, a conversão, na hipótese em foco, seria manifestamente inadmissível, porquanto a falsificação da assinatura de uma das partes corresponde a um ato ilícito, configurando, inclusive, crime previsto no CP, o que impossibilita a produção de qualquer efeito pelo ordenamento jurídico vigente. Da mesma forma, também não há que se falar em aplicação do art. 167 do CC: "É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma." Com efeito, o § 1º deste dispositivo legal disciplina que "Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados." Ora, no caso em apreço, não se está diante de nenhum dos requisitos elencados acima que caracterizam a simulação. A simulação pressupõe um acordo entre os declarantes para a realização de um determinado negócio jurídico a fim de infringir a lei ou prejudicar terceiros de forma deliberada. Isto é, há verdadeiro conluio entre os contraentes do negócio jurídico celebrado, o que não ocorreu na espécie. Ora, se não houve a participação (manifestação de vontade) de um dos envolvidos no negócio jurídico, visto que sua assinatura foi falsificada, não há como se falar em existência de conluio entre as partes para fraudar terceiros. No caso, o sócio prejudicado não participou do negócio referente à cessão das cotas da sociedade empresária a terceiros, só tendo ciência da falsificação de sua assinatura muito tempo depois, razão pela qual se revela equivocado aplicar o art. 167 do CC. Diante do exposto, verifica-se a ocorrência de nulidade absoluta, consubstanciada na alteração contratual da sociedade empresária mediante a falsificação da assinatura do sócio prejudicado, sendo impossível a convalidação do ato pelas partes mediante escritura pública, tampouco reconhecer que houve renovação do negócio jurídico de forma válida, além de não ser a hipótese de conversão substancial (art. 170 do CC), nem de subsistência de negócio dissimulado (art. 167 do CC). REsp 1.368.960-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016, DJe 10/6/2016.

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DADO EM HIPOTECA NÃO REGISTRADA. A ausência de registro da hipoteca em cartório de registro de imóveis não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990, a qual autoriza a penhora de bem de família dado em garantia hipotecária na hipótese de dívida constituída em favor de entidade familiar. A hipoteca é um direito real de garantia (art. 1.225, IX, do CC) incidente, em regra, sobre bens imóveis e que dá ao credor o poder de excutir o bem, alienando-o judicialmente e dando-lhe primazia sobre o produto da arrematação para satisfazer sua dívida. Por um lado, a constituição da hipoteca pode dar-se por meio de contrato (convencional), pela lei (legal) ou por sentença (judicial) e, desde então, já tem validade inter partes como um direito pessoal. Por outro lado, nos termos do art. 1.227 do CC, só se dá a constituição de um direito real após a sua inscrição no cartório de registro de imóveis da circunscrição imobiliária competente. Assim é que essa inscrição confere à hipoteca a eficácia de direito real oponível erga omnes. Nesse sentido, há entendimento doutrinário de acordo com o qual "Somente com o registro da hipoteca nasce o direito real. Antes dessa providência o aludido gravame não passará de um crédito pessoal, por subsistente apenas inter partes; depois do registro, vale erga omnes". Se a ausência de registro da hipoteca não a torna inexistente, mas apenas válida inter partes como crédito pessoal, a ausência de registro da hipoteca não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990. REsp 1.455.554-RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016, DJe 16/6/2016.

DIREITO EMPRESARIAL. LEGALIDADE DE CLÁUSULA DE RAIO EM CONTRATO DE LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER. Em tese, não é abusiva a previsão, em normas gerais de empreendimento de shopping center ("estatuto"), da denominada "cláusula de raio", segundo a qual o locatário de um espaço comercial se obriga - perante o locador - a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância contado a partir de certo ponto do terreno do shopping centerPara o sucesso e viabilização econômica/administrativa do shopping center, os comerciantes vinculam-se a uma modalidade específica de contratação. Entre as diversas cláusulas extravagantes insertas no contrato de shopping center - a despeito da existência de severa discussão doutrinária a respeito da natureza jurídica do ajuste, podendo ser considerado sociedade, locação, contrato coligado, misto, atípico, de adesão, entre outros -, há efetivo consenso de que todas servem para justificar e garantir o fim econômico almejado pelas partes. Nessa conjuntura, é possível citar, dentre essas disposições contratuais: res sperata, aluguel mínimo, aluguel percentual, aluguel dobrado no mês de dezembro, fiscalização da contabilidade, imutabilidade do ramo de negócio, impossibilidade de cessão ou sublocação e, também, a denominada "cláusula de raio", objeto do caso aqui analisado. De acordo com a "cláusula de raio", o locatário de um espaço comercial se obriga, perante o locador, a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância daquele imóvel. Em que pese a existência de um shopping center não seja considerado elemento essencial para a aplicação dessa cláusula, é inquestionável que ela se mostra especialmente apropriada no contexto de tais centros comerciais, notadamente em razão da preservação dos interesses comuns à generalidade dos locatários e empreendedores dos shoppings. Além disso, a "cláusula de raio" não prejudica os consumidores. Ao contrário, os beneficia, ainda que indiretamente. O simples fato de consumidor não encontrar em todos os shopping centers que frequenta determinadas lojas não implica efetivo prejuízo a ele, pois a instalação dos lojistas em tais ou quais empreendimentos depende, categoricamente, de inúmeros fatores. De fato, a lógica por detrás do empreendimento se sobrepõe à pretensão comum do cidadão de objetivar encontrar, no mesmo espaço, todas as facilidades e variedades pelo menor preço e distância. Ademais, nos termos do ordenamento jurídico pátrio, ao proprietário de qualquer bem móvel ou imóvel - e aqui se inclui o(s) dono(s) de shopping center - é assegurado o direito de usar, gozar e dispor de seus bens e, ainda, de reavê-los do poder de quem injustamente os possua. Denota-se que, para o exercício desses atributos inerentes à propriedade, principalmente a permissão do uso por terceiros, pode o proprietário impor limites e delimitar o modo pelo qual essa utilização deverá ser realizada. Assim, diversas são as restrições que pode o dono impor aos usuários do estabelecimento (vestimentas, ingresso com animais, horário de funcionamento, entre outros) e, como já mencionado antecedentemente, inúmeras são as cláusulas contratuais passíveis de inserção nos contratos de locação atinentes aos centros comerciais híbridos, sem que se possa afirmar, genérica e categoricamente, sejam elas abusivas ou ilegais, uma vez que, em última análise, visam garantir a própria viabilidade do uso, a implementação do empreendimento e, pois, o alcance e incremento real da função social da propriedade. Além do mais, o fato de shopping center exercer posição relevante no perímetro estabelecido pela "cláusula de raio" não significa que esteja infringindo os princípios da ordem econômica estampados na CF, visto que inserções de "cláusulas de raio" em determinados contratos de locação são realizadas com o propósito de servir à logística do empreendimento. Aliás, a conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza ilícito, tanto que prevista como excludente de infração da ordem econômica (§ 1º do art. 36 da Lei n. 12.529/2011). Por fim, não se diga que o STF analisou a constitucionalidade da "cláusula de raio" por ofensa ao princípio da livre concorrência. Afinal, a Súmula n. 646 do STF, a qual prevê que "Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área", não diz respeito às cláusulas contratuais estabelecidas em pactos firmados entre locador e locatário, mas sim a imposições de política pública municipal, ou seja, a situações em que o próprio poder público impede e inviabiliza a implementação do princípio da livre concorrência.REsp 1.535.727-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/5/2016, DJe 20/6/2016.


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