RESUMO. INFORMATIVO 871 DO STJ.
Processo
REsp 2.133.602-RJ, Rel. Ministro Teodoro Silva Santos, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/11/2025, DJEN 12/11/2025 (IAC 20).
Ramo do Direito
DIREITOS HUMANOS, DIREITO DOS GRUPOS VULNERÁVEIS, DIREITO ADMINISTRATIVO MILITAR
Tema
Militares transgêneros das Forças Armadas. Alteração de nome e gênero no registro civil. Retificação dos registros funcionais. Uso do nome social. Direito fundamental à identidade de gênero como expressão da dignidade da pessoa humana. Vedação de reforma compulsória fundada exclusivamente na condição de transgênero. Princípio da legalidade e separação dos poderes. Inexistência de violação. Ausência de incapacidade decorrente da transexualidade. Despatologização (CID-11). Controle de convencionalidade. IAC 20.
Destaque
No âmbito das Forças Armadas: (a) é devido o uso do nome social e a atualização dos assentamentos funcionais e de todas as comunicações e atos administrativos para refletir a identidade de gênero do militar; (b) é vedada a reforma ou qualquer forma de desligamento fundada exclusivamente no fato de o militar transgênero ter ingressado por vaga originalmente destinada ao sexo/gênero oposto; (c) A condição de transgênero ou a transição de gênero não configura, por si só, incapacidade ou doença para fins de serviço militar, sendo vedada a instauração de processo de reforma compulsória ou o licenciamento ex officio fundamentados exclusivamente na identidade de gênero do militar.
Informações do Inteiro Teor
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, admitiu o recurso como Incidente de Assunção de Competência (IAC), fixando como objeto de deliberação a seguinte tese: "Definir, a partir da alteração do prenome e da classificação de gênero no registro civil de militares transgêneros, os efeitos jurídicos no âmbito das Forças Armadas - em especial o direito à permanência na ativa e à vedação da reforma compulsória fundamentada exclusivamente nessa condição".
É imperativo reconhecer o contexto social no qual a questão jurídica se insere. A população transgênera no Brasil enfrenta um cenário de discriminação estrutural, estigmatização e violência endêmica. Conforme o Dossiê 2025 da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA), em 2024 foram identificados 122 assassinatos de pessoas trans no Brasil. Em dados internacionais compilados pela TGEU/TMM, o Brasil permaneceu, pelo 16º ano consecutivo, como o país que mais assassina pessoas trans no mundo.
Esse contexto estrutural não é alheio ao ambiente castrense. A despeito dos avanços, a própria origem deste IAC demonstra a resistência institucional em reconhecer a identidade de gênero de seus membros, culminando em processos de reforma compulsória. É, pois, à luz desse cenário, e não como uma questão abstrata de direito administrativo militar, que se deve decidir a presente controvérsia, com vista à efetivação de direitos humanos fundamentais e à proteção da dignidade de um grupo historicamente vulnerabilizado.
A identidade de gênero constitui expressão direta da dignidade da pessoa humana, atributo protegido pela Constituição Federal (art. 1º, III, e art. 3º, IV). Portanto, à luz dos princípios da dignidade e da isonomia, os militares transgêneros que retificaram seu prenome e gênero no registro civil fazem jus à correspondente atualização de todos os seus assentamentos funcionais no âmbito das Forças Armadas, passando a constar neles seu gênero autopercebido e o respectivo nome social. Por sua vez, o Decreto Federal n. 8.727/2016, que regulamenta o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero na Administração Pública Federal, confere suporte normativo a tal providência, impondo a todas as autoridades administrativas o dever de adequar cadastros e documentos oficiais segundo a identidade de gênero declarada.
No contexto castrense, não existem critérios ou justificativas válidas que permitam restringir o uso do nome ou do gênero adotado por militares transgêneros; ao revés, impõe-se tratamento igualitário a essas pessoas em comparação com os demais militares do mesmo gênero identitário, eliminando distinções discriminatórias no ambiente funcional.
A interpretação das normas internas deve estar em consonância com os tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é parte (controle de convencionalidade). No tocante aos direitos de pessoas trans, destaca-se a obrigação estatal de harmonizar a atuação administrativa e judicial com os parâmetros fixados pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos e pela jurisprudência da Corte Interamericana. A Opinião Consultiva n. 24/2017 da Corte IDH, ao versar sobre identidade de gênero, nome e direitos das pessoas trans, delineia balizas que vinculam todas as autoridades brasileiras, reforçando a vedação de atos estatais que atentem contra a dignidade, a privacidade e a igualdade das pessoas transgênero. Nesse mesmo sentido, os Princípios de Yogyakarta funcionam como diretriz interpretativa qualificada, enfatizando a necessidade de inclusão e respeito às pessoas LGBTI+ em todas as esferas, inclusive no serviço militar. Desse conjunto normativo-convencional extrai-se uma conclusão: é incompatível com a Convenção Americana (e, portanto, inconvencional e ilegal) qualquer medida governamental que estigmatize, exclua ou limite o militar exclusivamente em razão de sua identidade de gênero.
Assim, é ilegal e inconvencional a reforma compulsória de militares com fundamento exclusivo em sua condição de transgênero. Uma vez reconhecida oficialmente a identidade de gênero do militar, assegura-se seu direito de permanecer no serviço ativo, vedada a transferência compulsória para a inatividade baseada unicamente em incongruência de gênero.
Rechaça-se, portanto, a tese de que a condição de transexualidade acarreta, por definição, inaptidão para as atividades castrenses. A mera identificação do militar como pessoa trans não constitui, por si, causa de incapacidade física ou mental hábil a ensejar sua reforma ex officio. A Lei n. 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), ao elencar as moléstias e condições que podem justificar a reforma por invalidez, não inclui a transexualidade entre os motivos de afastamento, e não há base fática objetiva para equipará-la a qualquer patologia incapacitante. Ademais, a suposição de que todo militar trans necessitaria de tratamento de saúde incompatível com a carreira é infundada e estereotípica.
A classificação internacional de doenças da Organização Mundial da Saúde (CID-11) deixou de categorizar a transexualidade como transtorno mental, passando a considerá-la sob o prisma da saúde sexual, o que consagra a despatologização da identidade transgênero. Esse avanço científico-normativo afasta o antigo paradigma da CID-10 (que rotulava a transexualidade como "transexualismo") e impede que diagnósticos médicos ultrapassados sejam utilizados para justificar a reforma de militares trans.
Pelo exposto, não cabe a invocação da separação dos poderes. Ao vedar reformas e desligamentos discriminatórios e ordenar a adequação de assentamentos e rotinas ao gênero identitário, o Judiciário não legisla: aplica diretamente a Constituição e a CADH diante de práticas administrativas incompatíveis com direitos fundamentais.
Em conclusão, todas as linhas do Recurso Especial (vinculação ao edital/ingresso, legalidade estrita/art. 142, § 3º, X, necessidade de lei específica, separação dos poderes, presunção de incapacidade e alegados constrangimentos logísticos) colidem com: (a) a Constituição tal como interpretada pelo STF (ADI 4.275; Tema n. 761/STF); (b) a OC 24/17 e o controle de convencionalidade; (c) os Princípios de Yogyakarta (igualdade no emprego público, inclusive em forças militares); (d) a incompatibilidade de reformas/desligamentos fundados exclusivamente na identidade trans e a inexistência de ofensa à isonomia.
Destarte, acórdão submetido ao rito do art. 1.036 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC/2015), fixando-se, a teor do disposto nos arts. 947, § 3º, do CPC/2015, e 104-A, III, do Regimento Interno do STJ (RISTJ), as seguintes teses: No âmbito das Forças Armadas: (a) é devido o uso do nome social e a atualização dos assentamentos funcionais e de todas as comunicações e atos administrativos para refletir a identidade de gênero do militar; (b) é vedada a reforma ou qualquer forma de desligamento fundada exclusivamente no fato de o militar transgênero ter ingressado por vaga originalmente destinada ao sexo/gênero oposto; (c) A condição de transgênero ou a transição de gênero não configura, por si só, incapacidade ou doença para fins de serviço militar, sendo vedada a instauração de processo de reforma compulsória ou o licenciamento ex officio fundamentados exclusivamente na identidade de gênero do militar.
Informações Adicionais
Legislação
Constituição Federal (CF), art. 1º, III; e art. 3º, IV.
Decreto n. 8.727/2016.
Lei n. 6.880/1980 (Estatuto dos Militares).
Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 947, § 3º; e art. 1.036 e seguintes.
Regimento Interno do STJ (RISTJ), 104-A, III.
Convenção Americana de Direitos Humanos
TERCEIRA TURMA
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Processo
REsp 2.222.428-MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Cônjuge supérsistite. Direito real de habitação. Último imóvel do casal antes do óbito. Exceção. Situações devidamente comprovadas. Tempo de habitação no imóvel. Irrelevância.
Destaque
O direito real de habitação do cônjuge supérstite deve recair sobre o último imóvel em que o casal foi domiciliado antes do óbito, salvo situações excepcionais devidamente comprovadas.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em saber se o direito real de habitação da cônjuge supérstite deve recair sobre o último imóvel em que o casal foi domiciliado antes do óbito ou sobre o imóvel em que habitaram por mais tempo.
O direito real de habitação, conforme o art. 1.831 do Código Civil, assegura ao cônjuge supérstite o direito de permanecer no imóvel destinado à residência da família.
A Terceira Turma do STJ firmou entendimento de que, como regra, o imóvel objeto do direito real de moradia deve ser aquele em que o casal tenha habitado por último.
No caso em julgamento, não se verificou a existência de exceções que justifiquem a relativização do direito real de habitação, como a percepção de pensão vitalícia pela cônjuge supérstite ou a posse de outros bens imóveis pelos herdeiros.
Conclui-se que deve ser reconhecido o direito real de moradia da cônjuge supérstite em relação ao último imóvel em que o casal habitava.
Informações Adicionais
Legislação
Código Civil (CC), art. 1.831.
Processo
REsp 2.155.235-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 11/11/2025.
Ramo do Direito
DIREITO DO CONSUMIDOR
Tema
Responsabilidade civil objetiva. Hotel. Área de recreação. Acidente de consumo. Queda de extintor. Falha na Fixação. Criança hospedada no estabelecimento. Fato do serviço. Risco da Atividade. Danos materiais, morais e estéticos configurados.
Destaque
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Há responsabilidade civil de estabelecimento hoteleiro que, em razão da fixação inadequada de extintor de incêndio de grande porte em suas dependências, causa acidente que resulta em graves danos à saúde de menor de idade.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em verificar se há responsabilidade civil de hotel em acidente sofrido por menor de idade à época, hospedado no estabelecimento, e, consequentemente, se é devida indenização por danos morais, estéticos e materiais em virtude do evento danoso.
No caso, criança com 05 (cinco) anos de idade à época do fato, enquanto brincava na área de recreação infantil, foi atingida por extintor de incêndio de grande porte que caiu sobre ela, causando-lhe graves lesões em seis costelas, além do rompimento do fígado, o que ensejou pedido de reparação por danos materiais, morais e estéticos.
O Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço, na hipótese de defeito na sua prestação, e, desde que demonstrado o nexo causal entre o defeito do serviço e o acidente de consumo ou fato do serviço.
A culpa in vigilando dos pais da criança estaria configurada se os responsáveis não tivessem exercido, como deveriam, o dever de vigiar, de fiscalizar e de promover a segurança do menor, que, dada sua pouca idade, poderia não ter a plena capacidade de discernimento acerca de uma situação de risco. É certo que a avó se encontrava no quiosque acompanhando a criança, mas sua simples presença não seria, por si só, suficiente para impedir a ocorrência do acidente.
Com efeito, o homem médio - parâmetro representativo de um indivíduo dotado de prudência e inteligência comuns - jamais poderia prever que um extintor estivesse afixado inadequadamente, em condições de se soltar e, mesmo, de tombar sobre alguém.
Em ambientes de recreação, os pais e responsáveis presumem que as instalações tenham sido projetadas e devidamente preparadas para receber crianças, as quais não possuem discernimento suficiente para identificar eventuais riscos.
Ao disponibilizar área destinada ao público infantil, gera-se nos usuários a legítima e inafastável expectativa de que o ambiente seja integralmente seguro, concebido com especial atenção ao reduzido discernimento das crianças, seres em pleno estágio de formação e, portanto, especialmente vulneráveis.
O risco inerente à atividade não pode ser transferido aos consumidores, que nem sequer possuíam conhecimento prévio acerca das instalações. Admitir o contrário implicaria verdadeiro contrassenso diante dos deveres legais que recaem sobre o fornecedor, nos termos do Código de Defesa do Consumidor.
Conclui-se que, em tal hipótese, deve ser reconhecida a responsabilidade civil do hotel, impondo-lhe o dever de reparar integralmente os danos sofridos, em estrita observância ao regime protetivo do consumidor e ao princípio da confiança legítima que norteia as relações de consumo.
Processo
REsp 2.104.647-SP, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Rel. para acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, por maioria, julgado em 11/11/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Permuta entre magistrados. Violação ao princípio do juiz natural. Ausência. Art. 43 do CPC (Perpetuação da jurisdição). Nulidade inexistente.
Destaque
O princípio da perpetuação da jurisdição pode ser excepcionado em decorrência de acordo celebrado entre os juízos permutantes, para que cada qual sentencie os processos nos quais colhida diretamente a prova oral antes da substituição.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia em definir se o princípio da perpetuação da jurisdição pode ser excepcionado em decorrência de acordo celebrado entre os juízos permutantes, para que cada qual sentencie os processos nos quais colhida diretamente a prova oral antes da substituição.
Segundo o artigo 43 do CPC, a competência é fixada no momento do registro ou distribuição da ação, sendo vedado ao magistrado de juízo diverso sentenciar o feito sem autorização prévia, sob pena de violação ao princípio do juiz natural, que impõe a tipicidade e a indisponibilidade da competência jurisdicional.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite exceções ao princípio do juiz natural quando presentes causas objetivas e previamente autorizadas pela administração do tribunal, como mutirões ou redistribuições para equalização de acervos.
No caso, a sentença foi proferida por juiz que não mais exercia jurisdição em Vara Cível de São Paulo, com base em acordo de cooperação celebrado com o juízo permutante, que visava preservar o princípio da identidade física do juiz. Os juízos pactuaram, antes da permuta, que cada qual permaneceria responsável por sentenciar os processos em que presidiu a colheita da prova oral.
O Tribunal de origem ressaltou que a Presidência do TJSP autorizou a atuação de magistrada na Vara Cível, conforme ato formal devidamente publicado no Diário da Justiça Eletrônico.
De fato, em consulta ao Diário da Justiça Eletrônico do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do dia 23/6/2022, é possível verificar que a Presidência daquela Corte designou a magistrada sentenciante para que auxiliasse a Vara Cível do Foro Central, sem prejuízo da sua vara, inclusive na data da prolação sentença (12/5/2022).
Ou seja, embora a publicação tenha ocorrido no DJe em data posterior (23/6/2022), a designação foi feita com efeito retroativo, alcançando expressamente a data em que proferida a sentença, inexistindo nulidade processual, portanto.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Civil (CPC), art. 43.
QUARTA TURMA
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Processo
REsp 2.221.650-SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.
Ramo do Direito
DIREITO CIVIL
Tema
Disponibilização de dados pessoais não sensíveis. Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Lei do Cadastro Positivo. Ausência de consentimento prévio. Ausência de dano moral presumido (in re ipsa).
Destaque
A disponibilização de dados pessoais, por si só, não configura dano moral presumido, sendo imprescindível a comprovação de que a conduta do gestor de banco de dados resultou em abalo significativo aos direitos de personalidade do titular.
Informações do Inteiro Teor
Cinge-se a controvérsia a saber se a simples disponibilização de dados pessoais de consumidores, sem sua prévia comunicação e consentimento, a consulentes que desejam utilizar esse banco de dados, dá ensejo à indenização por danos morais.
A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei n. 13.709/2018) remete à legislação específica a delimitação das situações em que o tratamento de dados pessoais se enquadra em atividades voltadas à proteção do crédito. Nesse sentido, a Lei do Cadastro Positivo (Lei n. 12.414/2011), que trata especificamente do sistema de credit scoring, não confere autorização para que os gestores compartilhem livremente dados pessoais de terceiros com eventuais consulentes.
A Lei do Cadastro Positivo prescreve expressamente que o gestor está autorizado a compartilhar as informações cadastrais e de adimplemento armazenadas com outros bancos de dados, bem como disponibilizar a consulentes apenas a nota de crédito, não contemplando a possibilidade de repasse a terceiros de outros dados ou histórico de crédito sem a anuência expressa do titular, o que reforça o caráter restritivo e protetivo da norma.
Conclui-se, então, que, embora os gestores de bancos de dados para proteção de crédito possam realizar o tratamento de dados pessoais de terceiros e, inclusive, abrir cadastro sem prévio consentimento do cadastrado, em regra, não estão autorizados a disponibilizar tais dados a terceiros sem o consentimento prévio de seus titulares.
Contudo, a disponibilização de dados pessoais de terceiros, por si só, ainda que não autorizada, não gera direito à indenização por dano moral. Com efeito, diferentemente dos dados sensíveis, cuja proteção é reforçada em razão de seu potencial discriminatório, os dados pessoais correspondem às informações ordinárias, frequentemente fornecidas em cadastros diversos, inclusive em plataformas digitais de uso cotidiano, não estando, via de regra, submetidos a regime jurídico de sigilo.
Assim, para que se configure dano moral nesses casos, é necessário que o titular comprove efetivamente que os seus dados pessoais foram ilegalmente disponibilizados, compartilhados ou comercializados pelos gestores de bancos de dados para proteção de crédito e que esse fato resultou em abalo significativo aos seus direitos de personalidade. Nesse sentido, a Segunda Turma do STJ também já decidiu no AREsp 2.130.619/SP, julgado em 7/3/2023, que o vazamento de informações pessoais de terceiros, por si só, não gera danos morais presumidos (in re ipsa).
Informações Adicionais
Legislação
Lei n. 13.709/2018
Lei n. 12.414/2011
Processo
REsp 2.205.708-PR, Rel. Ministra, Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.
Ramo do Direito
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tema
Execução de título extrajudicial. Cédula de crédito bancário assinada eletronicamente. Plataforma não vinculada ao ICP-Brasil. Validade da assinatura eletrônica.
Destaque
Os documentos eletrônicos podem ter sua autoria e integridade comprovada, ainda que utilizados certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.
Informações do Inteiro Teor
A controvérsia reside em saber se o magistrado pode, de ofício, afastar a eficácia de um título executivo extrajudicial sob o argumento de que as assinaturas eletrônicas nele apostas não possuem certificação emitida pelo sistema da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil.
Tendo o título de crédito sido assinado pelo executado, o que indica tenha ele aceito a utilização do meio de assinatura empregado, não cabe ao magistrado, de ofício, afastar sua validade para impedir a citação da parte devedora, a quem caberá efetuar o pagamento ou opor as defesas que entender cabíveis.
A Corte estadual entendeu que não se pode confirmar a autenticidade das assinaturas existentes no suposto título executivo extrajudicial, pois "as assinaturas das partes contratantes foram realizadas digitalmente, por meio da plataforma "Sisbr". Ao assim decidir, o acórdão violou o disposto no art. 10, § 2º, da MP n. 2.200-2.
Ademais, a jurisprudência do STJ reconheceu que a Lei n. 14.620/2023, ao acrescentar o § 4º ao art. 784 do CPC, passou a admitir - na constituição e ateste de títulos executivos extrajudiciais em meio eletrônico - qualquer modalidade de assinatura eletrônica desde que sua integridade seja conferida pela entidade provedora desse serviço, evidenciando a ausência de exclusividade da certificação digital do sistema ICP-Brasil.
A exigência de certificação exclusiva pela ICP-Brasil, nas relações privadas pré-processuais, representa excesso de formalismo e contraria a intenção legislativa de conferir validade jurídica a assinaturas eletrônicas em geral, observada a autonomia das partes e os níveis de autenticação adotados.
Assim, não é possível ao magistrado afastar, de ofício, a validade jurídica de título de crédito com assinatura eletrônica, apenas pelo fato de a autenticação da assinatura ter sido feita por uma entidade sem credenciamento no sistema ICP-Brasil.
Informações Adicionais
Legislação
Código de Processo Civil (CPC), art. 784, § 4º
MP n. 2.200-2, art. 10, § 2º
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