quarta-feira, 12 de novembro de 2025

RESUMO. INFORMATIVO 870 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 870 DO STJ.


CORTE ESPECIAL


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Processo


APn 1.079-DF, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 15/10/2025, DJEN 23/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PENAL


Tema


Resolução CNJ n. 492/2023. Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. Violência doméstica cometida por Desembargador. Competência do Superior Tribunal de Justiça. Lesão corporal. Art. 129 do Código Penal. Autoria e materialidade. Prova pericial e oral. Suficiência. Palavra da vítima. Relevante valor probatório. Dano moral in re ipsa.


Destaque


1. O Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar Desembargadores em crimes sem relação com o cargo, de modo a garantir a imparcialidade do julgamento.


2. A palavra da vítima, corroborada por provas periciais e testemunhais, possui relevante valor probatório em crimes de violência doméstica.


3. A tese de autolesão e interesse patrimonial da vítima não encontra suporte nas provas e reforça estereótipos de gênero ultrapassados.


4. Natureza in re ipsa do dano moral decorrente de atos de violência doméstica e familiar contra a mulher.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se o Superior Tribunal de Justiça é competente para julgar Desembargador por crime não relacionado com o exercício do cargo; se o réu praticou o delito de lesão corporal contra cônjuge, prevalecendo-se das relações domésticas, conforme descrito na denúncia, e se haveria elementos suficientes para sua condenação, bem como se é cabível indenização por dano moral.


No que tange à competência, o STJ é competente para julgar os delitos praticados por desembargadores, ainda que os fatos não tenham relação com o exercício do cargo, considerando que o processamento e o julgamento do feito por magistrado de primeiro grau de jurisdição vinculado ao mesmo Tribunal poderiam afetar a independência e a imparcialidade que orientam a atividade jurisdiciona (APn n. 943/DF, relator Ministro Jorge Mussi, Corte Especial, julgado em 20/4/2022, DJe de 12/5/2022).


Ademais, o presente julgamento seguiu as diretrizes constantes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero (Resolução CNJ n. 492/2023) na análise dos crimes praticados no contexto de violência doméstica e familiar.


Em relação à lesão corporal, foi imputado ao desembargador de justiça o delito previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, com a redação dada pela Lei n. 11.340/2006, por lesão corporal contra cônjuge em contexto de violência doméstica, com pedido de indenização por danos morais e materiais à vítima.


A lesão física foi demonstrada por meio de boletim de ocorrência, perícia traumatológica, prova testemunhal produzida na fase da investigação (ratificada na fase da persecução penal) e declarações da vítima.


A lesão à saúde mental da vítima ficou comprovada nos Laudos Psicossociais elaborados por Equipe Multidisciplinar do Tribunal de Justiça, nos termos da orientação preceituada no Enunciado n. 74 do FONAVID (A configuração da materialidade do crime de lesão à saúde mental previsto no art. 129 do Código Penal dependerá de perícia psicológica ou psiquiátrica que deverá ser realizada com perspectiva de gênero).


A autoria também foi demonstrada de modo suficiente, conforme depoimentos de testemunhas e vítima. A palavra da vítima, em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, possui relevante valor probatório, especialmente em crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher.


Apesar das agressões à vítima terem se dado em um contexto de briga do casal, não houve demonstração de que o réu agiu em legítima defesa ou de que as agressões físicas foram recíprocas, tampouco de que o réu fez uso moderado de meios para afastar uma suposta agressão injusta proveniente da vítima. Também não merece prosperar a tese defensiva de que a vítima teria interesse patrimonial na relação e que, por isso, teria ferido a si mesma, registrando o boletim de ocorrência posteriormente sem justificar, em suas declarações, o hiato havido.


Tal tese, além de colocar sob suspeição o trabalho técnico do Instituto de Medicina Legal estadual - como se a médica legista que atendeu a vítima não tivesse a qualificação necessária para discernir uma autolesão de uma lesão provocada por terceiro -, aparentemente busca imputar à vítima a responsabilidade pela agressão sofrida, reforçando os ultrapassados estereótipos de gênero lamentavelmente presentes ainda hoje em nossa sociedade e no próprio sistema de justiça.


Ressalta-se ainda que o fato de a vítima - após o registro do boletim de ocorrência e o deferimento das medidas protetivas - ter realizado ligações para o réu, enviando mensagens pedindo que o relacionamento fosse reatado, não basta para obliterar as provas constantes dos autos, sendo também um comportamento usual nos casos de violência doméstica e familiar, especialmente quando há dependência econômico-financeira. Nesse contexto, o receio de não conseguir sustentar a si ou a sua família, assinalado pela vítima, que a motivou a procurar o réu mesmo na vigência das medidas protetivas, não constitui episódio isolado no denominado ciclo de violência.


Quanto ao pedido de indenização, o dano moral suportado pela vítima é inconteste, derivado do próprio ato ofensivo, que, no caso presente, é tipificado como crime previsto no art. 129, § 9º, do Código Penal, sua natureza é de dano presumido (damnum in re ipsa), de tal modo que, provado o fato gerador da dor, do abalo emocional, do sofrimento, está demonstrado o dano moral, numa presunção natural, que decorre das regras de experiência comum.


Sob esse enfoque e considerando a demonstração de nexo entre o delito apurado nos presentes autos e os danos psicológicos e emocionais atestados nos laudos psicossociais elaborados pela equipe multidisciplinar do Tribunal estadual, com a presença de efeitos ainda na vida atual da vítima, e considerando a culpabilidade elevada do réu, assim como sua renda líquida declarada, deve ser fixado valor indenizatório, a título de danos morais, corrigidos monetariamente a partir do arbitramento e com juros de mora contados da data do evento.


Informações Adicionais


Legislação


Código Penal (CP), art. 129, § 9º


Processo


EDcl no AgInt no CC 196.645-SP, Rel. Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 14/10/2025, DJEN 17/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Carta precatória. Oitiva de testemunhas. Possibilidade de realização do ato processual por videoconferência. Resolução 105/2010 - CNJ.


Destaque


Nos locais em que existente sala passiva, a deprecação há de limitar-se à disponibilização desta em data e hora previamente agendada, intimação de quem necessário e demais atos preparatórios de modo que o magistrado efetivamente competente cumpra, sequencialmente, seu dever de oitiva das partes e testemunhas.


Informações do Inteiro Teor


Este conflito de competência busca discutir a viabilidade da carta precatória expedida pelo juiz federal ao juiz de direito, destinada à oitiva de testemunhas, em ação previdenciária na qual a segurada postula a concessão da aposentadoria rural por idade em face do Instituto Nacional do Seguro Social.


Em casos análogos ao presente, o STJ vinha adotando o entendimento de que "a prática de atos processuais por videoconferência é uma faculdade do juízo deprecante, não competindo ao juízo deprecado a determinação de forma diversa da realização de audiência" (CC 165.381/MG, relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe de 14/6/2019).


Ocorre que, a Primeira Seção considerou que, neste caso específico, estaria havendo uma subversão da aplicação da norma prevista no art. 267 do CPC, de modo a autorizar a realização de distinguishing em relação à jurisprudência consolidada.


Com efeito, o princípio da cooperação nacional previsto no art. 67 do CPC impõe aos órgãos do Poder Judiciário o dever de cooperar entre si para a prestação de uma tutela jurisdicional mais célere e efetiva, viabilizando a obtenção de resultados máximos, com menor dispêndio de tempo e custos. Nos termos do inc. II do § 2º do art. 69 do CPC, os atos dos juízes cooperantes poderão consistir no estabelecimento de procedimento para a obtenção e apresentação de provas e a coleta de depoimentos.


Na mesma linha, a Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de Justiça - alterada pela Resolução 326/2020 - dispõe em seu art. 3º que "quando a testemunha arrolada não residir na sede do juízo em que tramita o processo, deve-se dar preferência, em decorrência do princípio da identidade física do juiz, à expedição da carta precatória para a inquirição pelo sistema de videoconferência". Ainda, no § 2º do referido dispositivo, consta que "a direção da inquirição de testemunha realizada por sistema de videoconferência será do juiz deprecante".


Assim sendo, o STJ passou a adotar o entendimento de que, "nos locais em que existente sala passiva, a deprecação há de limitar-se à disponibilização desta em data e hora previamente agendada, intimação de quem necessário e demais atos preparatórios de modo que o magistrado efetivamente competente cumpra, sequencialmente, seu dever de oitiva das partes e testemunhas".


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 67; art. 69, § 2º, II; e art. 267.


Resolução 105/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), art. 3º, caput e § 2º


SEGUNDA SEÇÃO


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Processo


CC 214.451-SP, Rel. Ministra Daniela Teixeira, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 19/9/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Obrigação de fazer e indenização por danos materiais e morais. Pedido de reativação de conta em plataforma digital de delivery. Bloqueio. Relação jurídica de natureza civil. Competência da Justiça Comum Estadual. Justiça do Trabalho. Incompetente.


Destaque


Compete à Justiça Comum Estadual (e não à Justiça do Trabalho) o julgamento da demanda relativa a bloqueio de conta em plataforma digital de delivery, se não houver pedido de reconhecimento de vínculo trabalhista ou verbas típicas da relação de trabalho.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em definir se a demanda, relativa a pedido de reativação de conta bloqueada em plataforma digital de delivery, sem pedido de reconhecimento de vínculo trabalhista ou verbas típicas da relação de trabalho, deve ser processada e julgada pela Justiça do Trabalho ou pela Justiça Comum Estadual.


A competência da Justiça Comum ou da Justiça do Trabalho é definida a partir da causa de pedir e dos pedidos formulados, em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.


Não havendo pedido de reconhecimento de vínculo de emprego nem verbas de natureza trabalhista, a controvérsia decorre de contrato de natureza civil firmado com a plataforma digital de delivery, sendo compete a Justiça Comum Estadual em detrimento da Justiça do Trabalho, portanto.


Ademais, a jurisprudência do STJ entende que a competência para julgar pretensões relacionadas ao bloqueio ou exclusão de contas e indenizações correspondentes pertença à justiça comum.


TERCEIRA TURMA


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Processo


REsp 2.204.888-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Contrato de seguro de vida. Morte do segurado. Discussão sobre o suicídio ou agravamento de risco. Embriaguez. Afastamento da aplicação do art. 768 do CC. Perda do direito à garantia pelo agravamento intencional do risco. Indenização securitária devida.


Destaque


A conduta da "roleta-russa", embora temerária, quando comprovadamente realizada sem a intenção suicida e sob o efeito de embriaguez, não é causa para a perda de indenização do seguro de vida.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em decidir se resta configurado o agravamento intencional de risco quando o segurado, em estado de embriaguez, vai a óbito depois de atirar contra si com uma arma que acreditava não funcionar.


O art. 768 do CC disciplina que "o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato".


Somente uma conduta imputada ao segurado, que, por dolo ou culpa grave, incremente o risco contratado, dá azo à perda da indenização securitária.


A presunção de boa-fé somente será afastada se existirem provas da má-fé do segurado que intencionalmente agravou o risco do contrato.


No contrato de seguro de vida, consolidou-se, a orientação mais benéfica ao consumidor, no sentido de afastar o pagamento da apólice tão somente quando ocorrer suicídio dentro dos dois primeiros anos de contrato. Nas demais situações, ocorrendo o sinistro morte do segurado e inexistente a má-fé dele, a indenização securitária deve ser paga ao beneficiário, visto que a cobertura do seguro de vida é ampla.


No seguro de vida, é vedada a exclusão de cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas.


A conduta de atirar em si mesmo só poderia ser classificada como suicídio se a pessoa tivesse a intenção de morrer. A percepção sobre a realidade é o que transforma o ato de um potencial suicídio em uma fatalidade culposa. Ademais, porque, nos termos da jurisprudência supracitada, os acidentes que levam à morte, se foram decorrentes de embriaguez, em regra, não justificam a perda da garantia do seguro de vida.


Nesse sentido, a Súmula 620/STJ dispõe: "a embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida".


A conduta da "roleta-russa", embora temerária, quando comprovadamente realizada sem a intenção suicida e sob o efeito de embriaguez, não é causa para a perda de indenização do seguro de vida.


No caso analisado, embora o segurado tenha atirado contra si, o fato de esse ato ter sido decorrente de embriaguez e sem a intenção deliberada de tirar a própria vida afasta a aplicação do art. 768 do Código Civil.


Informações Adicionais


Legislação


Código Civil (CC), art. 768.


Processo


REsp 2.204.902-RJ, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL, DIREITO DA SAÚDE


Tema


Plano de saúde. Criança diagnosticada com alergia à proteína do leite de vaca. Prescrição de fórmula à base de aminoácidos. Configuração medicamentosa. Irrelevância. Tecnologia em saúde recomendada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) e incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS). Tratamento até dois anos de idade. Cobertura pela operadora. Obrigatoriedade.


Destaque


A operadora do plano de saúde é obrigada a cobrir a fórmula à base de aminoácidos (Neocate) para o tratamento de crianças com alergia à proteína do leite de vaca, conforme recomendação da Conitec e incorporação da tecnologia ao SUS, limitada até os dois anos de idade.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia a saber se a operadora do plano de saúde tem a obrigação de cobertura de fórmula à base de aminoácidos prescrita para o tratamento da beneficiária diagnosticada com alergia à proteína do leite de vaca.


No caso, a criança beneficiária do plano foi diagnosticada com "enterocolite, reflexo gastroenofogico e angroedema em decorrência de alergia à proteína do leite de vaca (CID R63-8), necessitando utilizar leite de aminoácidos (Neocate) 10 (dez) latas por mês, conforme laudo médico". A operadora do plano de saúde indeferiu o pedido de cobertura por ausência de previsão no contrato e no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).


Com efeito, a fórmula à base de aminoácido - Neocate - é registrada na Anvisa na categoria de alimentos infantis.


No entanto, de acordo com os registros da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), a fórmula nutricional à base de aminoácidos foi incorporada ao Sistema Único de Saúde (SUS), por meio da Portaria n. 67/2018 do Ministério da Saúde, como tecnologia em saúde para tratamento de crianças de 0 a 24 meses diagnosticadas com alergia à proteína do leite de vaca (APLV).


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Infere-se, portanto, que, embora, de fato, não se trate de um medicamento, a fórmula à base de aminoácidos constitui, em circunstâncias como a analisada, tecnologia em saúde reconhecida pela Conitec como diretriz terapêutica para crianças de 0 a 24 meses, diagnosticadas com APLV, considerando, sobretudo, o alerta do Ministério da Saúde acerca da importância do aleitamento para a saúde e o bom desenvolvimento das crianças menores de 2 anos de idade, com a orientação, inclusive, de que até os 6 meses nenhum outro tipo de alimento, senão o leite, lhes seja oferecido.


Nessa toada, a despeito de não constar do rol da ANS, considerando a recomendação positiva da Conitec e a incorporação da tecnologia em saúde ao SUS, desde 2018, deve ser mantido a obrigação de cobertura da fórmula à base de aminoácidos - Neocate -, observada, todavia, a limitação do tratamento até os 2 (dois) anos de idade.


Informações Adicionais


Legislação


Portaria n. 67/2018 do Ministério da Saúde


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Processo


REsp 2.091.358-DF, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 16/9/2025, DJEN 19/9/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Despejo por falta de pagamento. Cobrança. Aluguéis. Encargos. Prestações Sucessivas. Vencidas e vincendas. Inclusão na condenação. Petição inicial. Interpretação lógico-sistemática. Art. 323 do CPC. Aplicabilidade. Pedido pormenorizado na inicial ou curso do processo. Desnecessidade.


Destaque


As prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos após o ingresso em juízo até a efetiva desocupação do imóvel devem ser incluídas na condenação, independentemente de pedido pormenorizado do autor na inicial ou no curso da demanda.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em definir se é possível incluir na condenação todos os encargos locatícios vencidos e vincendos até a efetiva desocupação do imóvel, mesmo aqueles não discriminados de forma pormenorizada na petição inicial.


Na origem, trata-se de ação de despejo por falta de pagamento cumulada com cobrança de aluguéis e acessórios da locação. O Tribunal a quo indeferiu pedido de inclusão, na condenação, das prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos no curso da demanda, sob o fundamento de que tal providência exigiria pedido pormenorizado na inicial ou no curso da demanda.


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que a pretensão exposta na petição inicial deve ser analisada a partir de uma interpretação lógico-sistemática, que leva em conta todo o conteúdo da exordial, e não apenas o capítulo destinado à formulação dos pedidos.


O art. 323 do CPC estabelece que, nas ações que tiverem por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, estas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor. Por conseguinte, tal dispositivo é aplicável às prestações periódicas relativas aos encargos locatícios, de modo que deve ser considerado implícito o pedido de condenação às parcelas vencidas no curso da demanda.


Conclui-se que as prestações periódicas relativas aos encargos locatícios vencidos após o ingresso em juízo até a efetiva desocupação do imóvel devem ser incluídas na condenação, independentemente de pedido pormenorizado do autor na inicial ou no curso da demanda.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 323.


QUARTA TURMA


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Processo


REsp 2.060.852-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Ação civil pública. Dano moral coletivo. Trote universitário. Contexto jocoso. Grupo restrito de estudantes. Amplificação digital por terceiros. Ausência dos requisitos configuradores.


Destaque


As declarações proferidas durante trote universitário, dirigidas a grupo específico e posteriormente divulgadas em redes sociais, não configuram dano moral coletivo.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia restringe-se a determinar se as declarações proferidas por veterano durante trote universitário, dirigidas a grupo de calouros e posteriormente divulgadas em redes sociais por terceiros, podem configurar dano moral coletivo.


Na ocasião, sob o pretexto de apresentar o hino da instituição, calouros do curso de medicina foram conduzidos por um ex-aluno do mesmo curso, convidado para participar do trote universitário, a entoar juramento com palavreado vulgar de conteúdo misógino, sexista e pornográfico.


Em razão de tal fato, o Ministério Público ajuizou ação civil pública para condenação do ex-aluno ao pagamento de indenização por danos morais coletivos.


O dano moral coletivo constitui instituto jurídico de aplicação excepcional, que demanda demonstração rigorosa de efetiva lesão aos valores fundamentais compartilhados pela coletividade, não se confundindo com mera reprovação moral de determinada conduta.


Para a caracterização do dano moral coletivo, impõe-se a presença cumulativa dos seguintes elementos: (i) conduta antijurídica; (ii) lesão a interesse transindividual; (iii) nexo de causalidade; e (iv) gravidade objetiva da lesão.


A mera capacidade de mobilização da opinião pública digital não constitui parâmetro juridicamente idôneo para aferir a gravidade objetiva da lesão exigida para caracterização do dano coletivo, sob pena de banalização do instituto.


O segundo elemento (lesão a interesse transindividual) exige demonstração de ofensa a valores fundamentais compartilhados pela coletividade, com potencial de abalar a ordem social ou atingir direitos de grupos determinados.


No caso sob análise, as manifestações foram dirigidas a grupo específico e restrito de estudantes universitários, em evento privado, sem intenção inicial de divulgação ampla. A posterior repercussão em redes sociais decorreu de ação de terceiros, circunstância não provocada diretamente pelo ex-aluno.


É fundamental reconhecer que os efeitos das declarações na esfera pessoal devem ser analisados casuisticamente, em relação a cada um dos participantes do evento. Nem todos necessariamente sofreram o mesmo impacto, devendo-se considerar: a percepção individual do contexto; o grau de constrangimento efetivamente experimentado; a capacidade de discernimento sobre a natureza das manifestações; e a participação voluntária no evento.


Assim, embora o conteúdo das declarações seja moralmente reprovável e mereça censura social, os fatos descritos - contexto jocoso, participação voluntária dos envolvidos, ausência de reação negativa imediata e direcionamento a grupo específico e restrito - evidenciam que a tutela jurídica adequada se situa no plano da responsabilidade individual, não configurando lesão a interesse transidividual apta a ensejar reparação coletiva.


Saiba mais:


· Informativo de Jurisprudência n. 832


· Informativo de Jurisprudência n. 815


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025, DJEN 23/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO CIVIL


Tema


Execução de alimentos. Morte do menor exequente. Alimentos vencidos. Obrigação já constituída. Transmissibilidade de crédito. Sub-rogação. Não ocorrência. Sucessão cabível.


Destaque


Os alimentos vencidos e não pagos no curso da execução configuram crédito concreto do alimentado, incorporando-se ao seu patrimônio, sendo, portanto, transmissíveis aos seus herdeiros.


Informações do Inteiro Teor


O direito à prestação alimentar é personalíssimo do alimentando, o que enseja a impossibilidade de outrem reclamar a continuidade da obrigação, quando falecido o alimentando.


No caso, no entanto, não se cuida de pretensão de suceder o alimentando no direito de ser alimentado, de forma a receber as prestações que se venceriam após a sua morte, mas de sucessão em decorrência de falecimento do credor dos alimentos, no que tange às parcelas vencidas.


Com efeito, os alimentos vencidos e não pagos no curso da execução configuram crédito do alimentado, incorporando-se ao seu patrimônio, sendo, portanto, transmissível aos seus herdeiros.


O fundamento para essa compreensão reside no reconhecimento de que a prestação alimentar vencida já representa um direito consolidado do credor, não mais dependendo de vínculo de dependência, afetivo ou familiar, com o devedor. Negar essa possibilidade significaria reduzir a obrigação alimentar a um vínculo meramente moral, desprovido de eficácia patrimonial, o que contraria não apenas a função social da obrigação alimentar, mas também a lógica do sistema jurídico que reconhece como crédito transmissível qualquer valor vencido e não quitado.


Ou seja, constituindo crédito de cunho patrimonial, os alimentos vencidos perdem o caráter personalíssimo, sendo cabível a transmissão, à luz dos dispositivos que regem a sucessão processual.


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Processo


REsp 2.206.445-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 14/10/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Tema


Embargos à execução. Protocolização. Simples petição. Autos da ação executiva. Vício procedimental sanável. Princípio da instrumentalidade das formas. Tempestividade da manifestação defensiva. Regularização posterior. Ausência de prejuízo. Primazia da solução do mérito.


Destaque


Em observância ao princípio da instrumentalidade das formas, a protocolização de embargos à execução nos autos da ação executiva, em desconformidade com o art. 914, § 1º, do CPC, configura vício sanável, desde que o ato alcance sua finalidade essencial e seja posteriormente regularizado em prazo razoável, sem prejuízo ao contraditório.


Informações do Inteiro Teor


A controvérsia busca definir se a protocolização de embargos à execução nos próprios autos da ação executiva, em desconformidade com o art. 914, § 1º, do CPC, configura erro grosseiro insuscetível de correção pelo princípio da instrumentalidade das formas, ou se tal vício procedimental pode ser sanado quando o ato, embora formalmente irregular, alcança sua finalidade essencial e é posteriormente regularizado dentro de prazo razoável.


Os embargos à execução, disciplinados nos arts. 914 e seguintes do Código de Processo Civil, constituem ação incidental autônoma, mediante a qual o executado pode se opor à execução forçada de título extrajudicial. Sua natureza jurídica de ação impõe, em princípio, o cumprimento rigoroso do procedimento estabelecido em lei, notadamente a distribuição por dependência prevista no § 1º do art. 914.


No caso, embora o embargado tenha adotado procedimento formalmente irregular ao protocolar simples petição nos autos da execução, em vez de distribuir ação autônoma, manifestou inequivocamente sua intenção de embargar a execução dentro do prazo legal de quinze dias estabelecido pelo art. 915 do CPC. Ainda, a petição inicial cumpriu integralmente sua função essencial de comunicar aos exequentes a oposição tempestiva e de interromper o curso da execução.


Considerando que a parte utilizou o instrumento processual adequado para impugnar a execução e o fez tempestivamente, mostra-se apropriada a aplicação dos princípios da instrumentalidade e da economia processual, permitindo-se a regularização mediante posterior distribuição por dependência. A essência da manifestação defensiva foi preservada, não havendo comprometimento dos direitos fundamentais envolvidos.


O equívoco procedimental verificado configura vício de natureza sanável, especialmente quando examinado sob o prisma dos direitos constitucionais de defesa e do princípio da efetividade processual. Os exequentes obtiveram conhecimento imediato da resistência oferecida, sem experimentar prejuízo material algum decorrente da irregularidade formal, enquanto a subsequente correção do procedimento atendeu adequadamente às exigências legais sem afetar o contraditório.


O Tribunal de origem, ao caracterizar a conduta como "erro escusável" e aplicar o princípio da instrumentalidade das formas, demonstrou perfeita sintonia com os valores que informam o sistema processual vigente. A decisão revela equilíbrio adequado entre o respeito às formas legais - que não foi desprezado, mas apenas atenuado, diante das circunstâncias específicas do caso - e a necessidade de evitar formalismos excessivos que comprometam a efetividade do processo.


Ademais, a natureza do erro verificado não se enquadra na categoria de "erro grosseiro" invocada pela parte recorrente. Trata-se, antes, de equívoco procedimental compreensível, praticado por advogado no exercício regular de sua atividade profissional, sem nenhuma intenção de burlar as regras processuais ou causar prejuízo à parte contrária. A aplicação do art. 277 do CPC, longe de representar condescendência indevida com a irregularidade, constitui expressão legítima do princípio da instrumentalidade das formas em sua acepção mais depurada.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 277, art. 914, § 1º, e art. 915


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Processo


Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 27/10/2025, DJEN 3/11/2025.


Ramo do Direito


DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


Tema


Defensoria pública. Prazo em dobro. ECA. Alteração legislativa. Vedação apenas à Fazenda pública e ao Ministério Público. Silêncio eloquente. Defensoria pública. Prerrogativa mantida. Princípio da indeclinabilidade. Sobrecarga de trabalho. Isonomia material.


Destaque


A prerrogativa de prazo em dobro para a Defensoria Pública aplica-se aos procedimentos regulados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.


Informações do Inteiro Teor


Cinge-se a controvérsia em saber se o art. 152, § 2º, do ECA, afasta a prerrogativa da Defensoria Pública de contagem em dobro dos prazos processuais, conforme estabelecido nos arts. 128, I, da LC n. 80/1994 e 186, caput, do CPC.


Dispõe o art. 152, § 2º, do ECA que "Os prazos estabelecidos nesta Lei e aplicáveis aos seus procedimentos são contados em dias corridos, excluído o dia do começo e incluído o dia do vencimento, vedado o prazo em dobro para a Fazenda Pública e o Ministério Público".


Já o art. 128, I, da LC n. 80/1994 assevera que são prerrogativas dos membros da Defensoria Pública "receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos".


No mesmo sentido, o art. 186, caput, do CPC, sustenta que a Defensoria Pública "gozará de prazo em dobro para todas as suas manifestações processuais".


O legislador, ao editar a Lei n. 13.509/2017, que modificou o ECA, vedou expressamente o prazo em dobro apenas à Fazenda Pública e ao Ministério Público, excluindo a Defensoria Pública, o que configura escolha consciente, e não omissão legislativa.


A Defensoria Pública, diferentemente do Ministério Público e da Fazenda Pública, não dispõe da mesma estrutura institucional, recursos humanos e materiais, estando submetida ao princípio da indeclinabilidade, o que gera sobrecarga de trabalho desproporcional que justifica a concessão de prazos diferenciados.


O argumento de violação à isonomia entre as instituições baseia-se em concepção meramente formal de igualdade. A isonomia material exige tratar desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades, não configurando a prerrogativa do prazo em dobro privilégio injustificado, mas mecanismo de equalização destinado a garantir paridade real de armas no processo.


Assim, a celeridade dos procedimentos do ECA, embora constitucional e legalmente assegurada, não pode comprometer o direito fundamental ao acesso qualificado à justiça e à ampla defesa.


Informações Adicionais


Legislação


Código de Processo Civil (CPC), art. 186, caput;


Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), art. 152, § 2º;


LC n. 80/1994, art. 128, I;

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