Na última semana,
a comunidade jurídica brasileira viu chegar ao STJ reflexos dos novos
valores trazidos pela tecnologia. Migalhas noticiou dois diferentes
julgamentos na Corte Superior (REsp 1.335.153/RJ e REsp 1.334.097/RJ)
que abordaram o chamado direito ao esquecimento.
Novidade nos
tribunais, o instituto foi discutido na VI Jornada de Direito Civil,
realizada em março deste ano pelo CJE/CJF - Centro de Estudos do
Judiciário do Conselho da Justiça Federal, tendo dado origem ao enunciado 531, segundo o qual "A tutela da dignidade da pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento".
Trata-se,
portanto, de desdobramento do direito constitucional à intimidade e à
proteção da imagem, e embora os dois casos recentes refiram-se a
matérias jornalísticas televisivas, o instituto vem ganhando contornos
em razão da facilidade de circulação e de manutenção de informação pela
internet, capaz de proporcionar superexposição de boatos, fatos e
notícias a qualquer momento, mesmo que decorrido extenso lapso temporal
dos atos que lhes deram origem.
Conforme
amplamente discutido pelos magistrados Federais por ocasião da VI
Jornada, pelo ordenamento jurídico brasileiro até mesmo o condenado
criminal faz jus ao esquecimento – o art. 93 do CP
prevê o direito à reabilitação do condenado dois anos após o
cumprimento da pena ou a extinção da punibilidade, desde que preenchidas
algumas condições, e o art. 748 do CPP
assenta que depois de quatro ou cinco anos o registro da condenação
será visível apenas quando solicitada por juízo criminal, para efeitos
de reincidência.
E mais: se a pena
criminal não pode ultrapassar a pessoa do condenado, o que dizer da
perpetuação dos reflexos de um crime sobre a vítima e seus familiares? A
cada reportagem, alegam, suas feridas se abrem e as dores e angústias
são revividas.
Sob esse prisma à imprensa não caberia o direito de voltar a conferir publicidade a casos antigos, já cobertos pelo tempo.
Conteúdo ofensivo em provedores de internet
Se até mesmo
condenações criminais podem ser "esquecidas", atos da vida privada,
fotos indiscretas, comentários infelizes, pequenos erros, gafes ou
similares, não devem seguir perseguindo os autores eternamente.
Assentados no art. 5°, incisos V e X, da CF/88 e no art. 12 do CC/02,
diversos acórdãos de tribunais estaduais e do próprio STJ têm
determinado a provedores de internet a retirada de conteúdo ofensivo de
seus acervos, que poderiam ser acessados a qualquer momento,
reproduzindo eternamente os danos e ofensas.
Liberdade de informação
Igualmente
ancoradas na CF/88, no mesmo art. 5°, incisos IV, IX e XIV, as
liberdades de pensamento, de expressão e de informação não podem ser
eclipsadas sob o pretexto de ofensa à vida privada.
Trata-se, sem
dúvida, de hipótese de colisão de direitos fundamentais, princípios de
mesma hierarquia, para cuja solução será necessário empreender uma
ponderação de valores caso a caso, pelos tribunais, "de modo a preservar
o máximo de cada um dos valores em conflito, realizando escolhas acerca
de qual interesse deverá circunstancialmente prevalecer", na lição de
Luís Roberto Barroso em artigo neste informativo.
E por tratar-se de decisões casuísticas, continua o professor, deverão
ser exaustivamente fundamentadas, a fim de que sejam afastadas quaisquer
possibilidades de arbitrariedades.
Censura, o fantasma sempre à espreita
Nas palavras do
ministro Luis Felipe Salomão, relator dos dois recentes acórdãos em
destaque, o acolhimento do direito ao esquecimento não pode significar
"desproporcional corte à liberdade de imprensa", sob pena de tornar
impraticável a atividade jornalística, em prejuízo de toda a sociedade.
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