quarta-feira, 12 de junho de 2024

RESUMO. INFORMATIVO 815 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 815 DO STJ.

Informativo nº 815 11 de junho de 2024.

RECURSOS REPETITIVOS

Processo

REsp 1.954.382-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por maioria, julgado em 5/6/2024. (Tema 1153).

REsp 1.954.380-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, por maioria, julgado em 5/6/2024 (Tema 1153).

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Verbas remuneratórias. Impenhorabilidade. Art. 833, IV, do CPC. Honorários advocatícios. Execução. Verba de natureza alimentar e prestação alimentícia. Distinção. Art. 833, § 2º, do CPC. Exceção não configurada. Tema 1153.

DESTAQUE

A verba honorária sucumbencial, a despeito da sua natureza alimentar, não se enquadra na exceção prevista no § 2º do art. 833 do CPC/2015 (penhora para pagamento de prestação alimentícia).

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A análise do tema perpassa, necessariamente, pela interpretação dos arts. 85, § 14, e 833 do Código de Processo Civil de 2015, à luz das hipóteses legais das quais exsurge o dever de prestar alimentos.

O ordenamento processual civil em vigor, ao tempo em que estabelece a impenhorabilidade das verbas remuneratórias, trata de especificar as exceções a essa regra, assim disciplinando a matéria: "Art. 833. São impenhoráveis: [...] § 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º".

A solução da controvérsia está em reconhecer a existência de sutil, mas crucial, distinção entre as expressões "natureza alimentar" e "prestação alimentícia", a que se referem os arts. 85, § 14, e 833, § 2º, do Código de Processo Civil de 2015, estando elas de fato interligadas por uma relação de gênero e espécie, como já defendido em alguns julgados desta Corte Superior, no entanto em sentido inverso, ou seja, a "prestação alimentícia" é que ressai como espécie do gênero "verba de natureza alimentar", e não o contrário.

Nessa linha de pensamento, os honorários advocatícios, apesar da sua inquestionável natureza alimentar, não se confundem com a prestação de alimentos, sendo esta última obrigação periódica, de caráter ético-social, normalmente lastreada no princípio da solidariedade entre os membros do mesmo grupo familiar, embora também possa resultar de condenações por ato ilícito e de atos de vontade.

Como bem salientou a Ministra Nancy Andrighi em seu voto apresentado no julgamento do REsp n. 1.815.055/SP, "(...) uma verba tem natureza alimentar quando é destinada para a subsistência de quem a recebe e de sua família, mas só é prestação alimentícia aquela devida por quem possui a obrigação de prestar alimentos familiares, indenizatórios ou voluntários em favor de uma pessoa que deles efetivamente necessita".

Essa, segundo se entende, é a interpretação que mais se harmoniza com o ordenamento jurídico como um todo, de modo a conferir o privilégio legal somente a quem dele necessita para garantir sua própria sobrevivência e de seus dependentes a curtíssimo prazo.

Estender tal prerrogativa aos honorários advocatícios, e em consequência aos honorários devidos a todos os profissionais liberais, implicaria que toda e qualquer verba que guardasse alguma relação com o trabalho do credor ou com qualquer outra fonte de renda destinada ao seu sustento e de sua família também deveria ser reconhecida como tal, tornando regra a exceção que o legislador reservou apenas para situações extremas.

Tal compreensão não retira a possibilidade de penhora de parte das verbas remuneratórias elencadas no art. 833, IV, do CPC/2015, desde que seja preservado percentual capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família, conforme entendimento firmado em precedentes da Corte Especial.

Em qualquer hipótese, portanto, independentemente da natureza jurídica do crédito executado e da pessoa do credor, será possível, em tese, a penhora tanto de parte das verbas de caráter remuneratório quanto de valores depositados em caderneta de poupança (e de outros a eles equiparados), especificadas nos incisos IV e X do art. 833 CPC/2015, caso se verifique, a partir da análise do caso concretamente examinado, que o ato de constrição judicial não retira do devedor a capacidade de manutenção de um mínimo existencial e de um padrão de vida digno em favor dele próprio e de seus dependentes.

Dessa forma, fixa-se a seguinte tese repetitiva: A verba honorária sucumbencial, a despeito da sua natureza alimentar, não se enquadra na exceção prevista no § 2º do art. 833 do CPC/2015 (penhora para pagamento de prestação alimentícia).

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil (CPC), arts. 85, § 14, e 833

TERCEIRA TURMA

Processo

REsp 2.136.190-RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 4/6/2024, DJe 6/6/2024.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Ação de produção antecipada de prova. Local da realização da perícia diverso do local de sede da empresa ré e de eleição. Foro do objeto a ser periciado. Questão de praticidade da instrução. Inexistência de prejuízo.

DESTAQUE

A produção antecipada de prova pericial pode ser processada no foro onde situado o objeto a ser periciado ao invés do foro de sede da empresa ré, que coincide com o foro eleito em contrato.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Ressalta-se de início que a norma de competência (i) do juízo do foro onde a prova deva ser produzida ou (ii) do juízo do foro de domicílio do réu, para fins de apreciar ação de produção antecipada de provas (art. 381, § 2º, do CPC/2015), não possui norma equivalente no CPC/1973.

O CPC/1973 tinha como regra geral para fixar a competência do juízo cautelar como sendo a mesma do juízo da ação principal (art. 800 do referido código). Esta Corte, contudo, já permitia a relativização da competência do juízo da ação principal em relação aos procedimentos cautelares, especialmente em se tratando de produção cautelar de provas na forma antecipada.

Nesse sentido, o STJ entendia que "poderá haver a mitigação da competência prevista no art. 800 do CPC/1973 quando se tratar de ação cautelar de produção antecipada de provas, podendo ser reconhecida a competência do foro em que se encontra o objeto da lide, por questões práticas e processuais, notadamente para viabilizar a realização de diligências e perícias" (AgInt no AREsp n. 1.321.717/SP, Terceira Turma, DJe de 19/10/2018).

A relativização da competência estava igualmente fundamentada na facilitação de inspeção judicial "possibilitando maior celeridade à prestação jurisdicional" em hipótese de ação cautelar de produção antecipada de provas (AgRg no Ag n. 1.137.193/GO, Quarta Turma, DJe de 16/11/2009).

Nesse sentido, a facilitação da realização da perícia prevalece sobre a regra geral do ajuizamento no foro do réu por envolver uma questão de ordem prática tendo em vista a necessidade de exame no local onde está situado o objeto a ser periciado.

Diferentemente do código anterior, o CPC/2015 expressamente dispõe que o foro de exame prévio de prova não torna ele prevento para a futura eventual ação principal (art. 381, § 3º, do CPC/2015).

Dessa forma, inexiste prejuízo presumido neste procedimento prévio, pois - a depender do resultado da perícia - a ação principal sequer poderá ser ajuizada, ou, caso seja ajuizada, o foro de eleição - que coincide com o foro do local de sede da empresa ré - poderá prevalecer.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 381, §§ 2º e 3º

Código de Processo Civil (CPC/1973), art. 800

QUARTA TURMA

Processo

Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 16/5/2024, DJe 21/5/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Divórcio post mortem. Emenda constitucional n. 66/2010. Autonomia privada dos cônjuges. Manifestação de vontade do titular. Óbito do cônjuge durante a tramitação do processo. Dissolução do casamento. Direito potestativo. Exercício. Direito a uma modificação jurídica. Declaração de vontade do cônjuge. Reconhecimento e validação. Ação judicial de divórcio. Pretensão reconvencional. Herdeiros do cônjuge falecido. Legitimidade.

DESTAQUE

É possível a decretação do divórcio na hipótese em que um dos cônjuges falece após a propositura da respectiva ação, notadamente quando manifestou-se indubitavelmente no sentido de aquiescer ao pedido que fora formulado em seu desfavor.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia em verificar a possibilidade de decretação de divórcio na hipótese de falecimento de um dos cônjuges após a propositura da respectiva ação.

Após a edição da Emenda Constitucional n. 66/2010, permite-se a dissolução do casamento pelo divórcio independentemente de condições e exigências de ordem temporal previstas na Constituição ou por ela autorizadas, passando a constituir direito potestativo dos cônjuges, cujo exercício decorre exclusivamente da manifestação de vontade de seu titular.

Com a alteração constitucional, há preservação da esfera de autonomia privada dos cônjuges, bastando o exercício do direito ao divórcio para que produza seus efeitos de maneira direta, não mais se perquirindo acerca da culpa, motivo ou prévia separação judicial do casal. Origina-se, pois, do princípio da intervenção mínima do Estado em questões afetas às relações familiares.

A caracterização do divórcio como um direito potestativo ou formativo, compreendido como o direito a uma modificação jurídica, implica reconhecer que o seu exercício ocorre de maneira unilateral pela manifestação de vontade de um dos cônjuges, gerando um estado de sujeição do outro cônjuge.

Na hipótese em que a esposa, embora não tenha sido autora da ação de divórcio, manifestou-se indubitavelmente no sentido de aquiescer ao pedido que fora formulado em seu desfavor e formulou pedido reconvencional, requerendo o julgamento antecipado e parcial do mérito quanto ao divórcio, é possível o reconhecimento e validação da sua vontade, mesmo após sua morte, conferindo especial atenção ao desejo de ver dissolvido o casamento.

Ademais, os herdeiros do cônjuge falecido possuem legitimidade para prosseguirem no processo e buscarem a decretação do divórcio post mortem, não se tratando de transmissibilidade do direito potestativo ao divórcio; o direito já foi exercido e cuida-se, tão somente, de preservar os efeitos que lhe foram atribuídos pela lei e pela declaração de vontade do cônjuge falecido.

Processo

REsp 2.067.458-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 4/6/2024.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Liquidação de sentença. Reconhecimento parcial da dívida. Parte líquida. Execução imediata. Perícia judicial. Honorários. Responsabilidade do devedor sucumbente. Recurso Especial repetitivo n. 1.274.466/SC. Tema 871.

DESTAQUE

Na liquidação de sentença, a quantia que o devedor reconhece e expressamente declara como devida representa a parte líquida da condenação e como tal pode ser exigida desde logo, cabendo ao devedor arcar com os honorários periciais.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A recorrente foi condenada ao pagamento de indenização, cujo valor deveria ser apurado por meio de liquidação de sentença, conforme determinou o título judicial. A credora deu início à fase liquidatória, reivindicando fosse reconhecido o quantum debeatur no valor total de R$ 264 milhões. A conta foi impugnada pelas devedoras, que declararam como correta a dívida de R$ 15 milhões. O juiz de primeiro grau fixou como incontroverso o valor declarado pela devedora, autorizando fosse desde logo iniciado o cumprimento de sentença sobre a quantia definida, prosseguindo-se a liquidação em relação ao saldo remanescente. A decisão foi mantida pelo Tribunal local.

Nesse contexto, o valor líquido pode ser desde logo exigido, como autoriza o art. 509, § 1º do CPC/2015.

Sob outro enfoque, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais foram atribuídas às devedoras em razão de ter sucumbido na fase de conhecimento, conclusão que se alinha ao entendimento firmado no julgamento do Recurso Especial repetitivo n. 1.274.466/SC (Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 14/5/2014, DJe de 21/5/2014), segundo a qual, "na fase autônoma de liquidação de sentença (por arbitramento ou por artigos), incumbe ao devedor a antecipação dos honorários periciais".

Além disso, as devedoras pleitearam a realização de perícia para a apuração do valor devido, de modo que o responsável pelo pagamento dos respectivos honorários periciais, na forma do art. 95, caput, do CPC/2015, é de quem requereu a prova técnica.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil (CPC), arts. 95509, § 1º e 526

PRECEDENTES QUALIFICADOS

Tema 671/STJ

RESUMO. INFORMATIVO 814 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 814 DO STJ.

TERCEIRA TURMA

Processo

REsp 2.121.056-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/5/2024, DJe 24/5/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Erro médico. Falecimento de recém-nascido. Pensionamento. Cabimento. Termos inicial e final.

DESTAQUE

É cabível pensionamento na hipótese de falecimento de recém-nascido, cujo termo inicial será a data em que a vítima completaria 14 (quatorze) anos, e o termo final será a data em que a vítima completaria a idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, a mãe da vítima, que estava grávida na ocasião, procurou atendimento médico devido a dores nas costas e foi encaminhada ao hospital. No local, foi submetida à cesariana e deu à luz uma menina, a qual, todavia, veio a falecer dias depois, tendo sido constatado que o falecimento foi decorrente de erro médico, porque não foram realizados os exames necessários previamente ao parto. Nesse contexto, a controvérsia consiste em definir se é cabível pensionamento pelo falecimento de recém-nascido.

O pensionamento tem por finalidade suprir o amparo financeiro que era prestado pelo falecido. Ainda que a morte seja de filho menor, a pensão será devida, tendo em vista que há uma presunção de auxílio econômico futuro.

Se a família for de baixa renda, há presunção relativa da dependência econômica entre os seus membros e, nas demais situações, é necessária a comprovação da dependência.

Nessa situação, todavia, o termo inicial da pensão será a data em que a vítima completaria 14 (quatorze) anos, idade a partir da qual é admitida a celebração de contrato de trabalho, e o termo final será a data em que a vítima completaria a idade correspondente à expectativa média de vida do brasileiro, segundo a Tabela do IBGE, ou o momento do falecimento do beneficiário, o que ocorrer primeiro. Ademais, a pensão corresponderá à 2/3 do salário mínimo vigente à data do óbito e será reduzida para 1/3 após a data em que ele completaria 25 anos.

Essa é a orientação consolidada na Súmula 491 do STF, segundo a qual "é indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado".

É possível presumir que se o recém-nascido não tivesse vindo a óbito em decorrência de ato ilícito praticado por terceiro, ele passaria a contribuir para as despesas familiares quando atingisse 14 (quatorze) anos de idade.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

SÚMULAS

Súmula n. 491/STF

Processo

REsp 2.121.056-PR, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/5/2024, DJe 24/5/2024.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Erro médico. Perícia. Perito não especialista na área de conhecimento. Validade. Elementos concretos que não comprometerá a idoneidade da prova.

DESTAQUE

A perícia elaborada por perito médico não especialista na área de conhecimento da perícia não acarreta a nulidade do laudo pericial, desde que os elementos concretos revelem que essa circunstância não comprometerá a idoneidade da prova.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na hipótese, o hospital sustentou a nulidade do laudo pericial porque o perito não é especialista em ginecologia e obstetrícia, mas sim clínico geral.

Com efeito, a função do perito, enquanto auxiliar da Justiça, é analisar e emitir opinião técnica ou científica sobre dados objetivos, quando o julgador não possuir o conhecimento necessário para fazê-lo por si mesmo ou a partir de outras provas. Em razão disso, o art. 465, caput, do CPC prevê que "o juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo".

Exige-se que o perito seja um profissional com conhecimento especializado exigido para a realização da perícia. Segundo a doutrina, esse profissional pode ser um autônomo legalmente habilitado (pessoa natural) ou pode ser integrante do quadro de profissionais de uma pessoa jurídica ou de um órgão técnico ou científico especializado.

Sucede que nem sempre o objeto da perícia reclamará o exame por profissional com especialidade em determinada área do conhecimento.

Atento a isso, o STJ já flexibilizou essa exigência para decidir que a formação do perito - seu grau de instrução e/ou sua especialidade - deve ser compatível com a natureza e a complexidade da perícia.

Há precedentes desta Corte no sentido de que a pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial, de modo que que incumbe ao perito médico nomeado se escusar do encargo se não se considerar apto à realização da perícia (REsp n. 1.514.268/SP, Segunda Turma, DJe 27/11/2015; REsp n. 1.758.180/RJ, Segunda Turma, DJe 21/11/2018). Também há julgado dispensando a comprovação da especialização do perito em hipótese na qual a prova pericial realizada atingiu a sua finalidade (AgRg no REsp n. 1.230.624/PR, Quarta Turma, DJe de 21/10/2015).

Se o propósito do legislador é garantir credibilidade e segurança na produção da prova pericial, basta que o perito nomeado tenha conhecimento técnico ou científico bastante para contribuir com a elucidação dos fatos controvertidos no processo, e que se manifeste de forma suficientemente clara, objetiva e confiável, de tal modo que permita às partes compreender e eventualmente contraditar o seu laudo e ao julgador interpretá-lo e valorá-lo juridicamente, formando o seu convencimento.

Sendo assim, nos processos em que é necessária a realização de prova pericial para fins de apurar a ocorrência ou não de erro médico, é possível que a perícia seja realizada por um médico não especialista na área de conhecimento do profissional cuja atuação se busca apurar, desde que os elementos concretos revelem que essa circunstância não comprometerá a idoneidade da prova.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil (CPC), art. 465.

Processo

REsp 2.101.659-RJ, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 21/5/2024, DJe 24/5/2024.

Ramo do Direito

DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Contrato de locação. Shopping center. Instalação de lojista do mesmo ramo. Não configuração de atividade predatória nem ofensa ao tenant mix.

DESTAQUE

A instalação de lojas do mesmo ramo em shopping center não configura, por si só, atividade predatória nem ofensa ao tenant mix, desde que que essa opção não implique desrespeito aos contratos firmados com os lojistas.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O contrato de locação em shopping center tem índole marcadamente empresarial. Os sujeitos da relação obrigacional são empresários (pressuposto subjetivo) e seu objeto decorre da atividade empresarial por eles exercida (pressuposto objetivo).

Essa constatação atinge diretamente a forma como o contrato deve ser interpretado, pois a atividade empresarial é caracterizada pelo risco e regulada pela lógica da livre concorrência, devendo prevalecer nesses ajustes, salvo situação excepcional, a autonomia da vontade e o princípio do pacta sunt servanda.

tenant mix, por sua vez, refere-se à organização do espaço e é uma das principais características de um shopping center. Nesse contexto, cabe ao empreendedor a escolha das lojas que comporão o empreendimento, a instalação de áreas de lazer e a realização de propaganda e promoções. Essas estratégias servem para atrair o maior número de consumidores ao empreendimento e alcançar a melhor lucratividade, finalidade que atende aos interesses dos lojistas e do próprio shopping, que faz jus ao recebimento de aluguel calculado sobre o faturamento.

Apesar de, em um primeiro momento, parecer que a concorrência entre lojas no mesmo shopping center não é a melhor estratégia, o fato é que em empreendimentos maiores é comum a presença de lojas do mesmo segmento concorrendo entre si, instaladas lado a lado, ou frente a frente, como no caso das lanchonetes de fast food, lojas de sapato e roupas, trazendo atratividade para o shopping, beneficiando os consumidores e, portanto, os demais lojistas.

Sob essa perspectiva, não está vedado ao empreendedor do shopping, caso entenda que a concorrência trará benefícios para a organização das lojas (tenant mix), optar pela instalação de lojas concorrentes, desde que essa opção não implique desrespeito aos contratos firmados com os lojistas. De fato, cabe ao lojista avaliar se os custos para participar daquele empreendimento, no qual pode enfrentar alguma concorrência, compensam.

Não é possível, porém, garantir que o aumento do número de clientes e das vendas resultará no incremento dos lucros dos lojistas, pois várias causas concorrem para esse fim, a exemplo do presente caso em que o faturamento do estabelecimento já estava em declínio antes mesmo da instalação do segundo lojista de mesmo ramo de atividade.

No caso, o contrato previa expressamente a possibilidade de ampliação e revisão do tenant mix e haviam sido inaugurados diversos centros de compras na região ao redor do shopping ora recorrente, de modo que a alteração e ampliação do tenant mix não pode ser considerada uma conduta desarrazoada, violadora da boa-fé objetiva. Ainda, foi constatado que o faturamento do estabelecimento já vinha em declínio antes mesmo da instalação do segundo lojista de mesmo ramo de atividade, não tendo sido efetivamente constatada a violação do contrato firmado entre as partes ou do tenant mix, diante da necessidade de enfrentamento das novas situações de mercado.

RESUMO. INFORMATIVO 813 DO STJ.

 RESUMO. INFORMATIVO 813 DO STJ.

RECURSOS REPETITIVOS

Processo

REsp 2.029.809-MG, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/5/2024. (Tema 1200).

REsp 2.034.650-SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 22/5/2024 (Tema 1200).

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Termo inicial do prazo prescricional de petição de herança. Pretenso filho. Pedido de reconhecimento de paternidade post mortem. Data da abertura da sucessão. Tema 1200.

DESTAQUE

O prazo prescricional para propor ação de petição de herança conta-se da abertura da sucessão, cuja fluência não é impedida, suspensa ou interrompida pelo ajuizamento de ação de reconhecimento de filiação, independentemente do seu trânsito em julgado.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia posta no recurso especial repetitivo centra-se em definir o termo inicial do prazo prescricional da ação de petição de herança, promovida por pretenso filho, cumulativamente com ação de reconhecimento de paternidade post mortem - se seria a partir da abertura da sucessão ou se seria após o trânsito em julgado da ação relativa ao estado de filiação.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos EAREsp n. 1.260.418/MG (Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira, julgado em 26/10/2022, DJe 24/11/2022), dissipou a intensa divergência então existente entre as suas Turmas de Direito Privado, para compreender que o prazo prescricional para propor ação de petição de herança conta-se da abertura da sucessão, aplicada a vertente objetiva do princípio da actio nata, adotada como regra no ordenamento jurídico nacional (arts. 177 do CC/1916 e 189 do CC/2002).

Compreendeu-se, em resumo, que a teoria da actio nata em sua vertente subjetiva tem aplicação em situações absolutamente excepcionais, apresentando-se, pois, descabida sua adoção no caso da pretensão de petição de herança, em atenção, notadamente, às regras sucessórias postas.

De acordo com o art. 1.784 do Código Civil, que internaliza o princípio da saisine, "aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários", independentemente do reconhecimento oficial desta condição. Por sua vez, o art. 1.784 do Código Civil preceitua que: "legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão".

Dessa maneira, conforme consignado no voto condutor, o pretenso herdeiro poderá, desde logo e independentemente do reconhecimento oficial desta condição (a de herdeiro), postular seus direitos hereditários, nos seguintes moldes: "i) propor ação de investigação de paternidade cumulada com petição de herança; ii) propor concomitantemente, mas em processos distintos, ação de investigação de paternidade e ação de petição de herança, caso em que ambas poderão tramitar simultaneamente, ou se poderá suspender a petição de herança até o julgamento da investigatória; e iii) propor ação de petição de herança, na qual deverão se discutidas, na esfera das causas de pedir, a efetiva paternidade do falecido e a violação do direito hereditário".

Reputa-se, assim, absolutamente insubsistente a alegação de que a pretensão de reivindicar os direitos sucessórios apenas surgiria a partir da decisão judicial que reconhece a qualidade de herdeiro.

A imprescritibilidade da pretensão atinente ao reconhecimento do estado de filiação - concebida como uma ação declaratória (pura), na qual se pretende, tão somente, a obtenção de uma certeza jurídica, atribuindo-se a ela, em verdade, o caráter de perpetuidade, já que não relacionada nem à reparação/proteção de um direito subjetivo violado, nem ao exercício de um direito potestativo - não poderia conferir ao pretenso filho/herdeiro a prerrogativa de escolher, ao seu exclusivo alvedrio, o momento em que postularia, em juízo, a pretensão da petição de herança, a redundar, indevidamente (considerada a sua natureza ressarcitória), também na imprescritibilidade desta, o que não se pode conceber.

Esta linha interpretativa vai na direção da segurança jurídica e da almejada estabilização das relações jurídicas em lapso temporal condizente com a dinâmica natural das situações jurídicas daí decorrentes.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código Civil (CC/1916), art. 177

Código Civil (CC/2002), arts. 189 e 1.784

TERCEIRA TURMA

Processo

REsp 2.041.563-SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 21/5/2024, DJe 24/5/2024.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO TRIBUTÁRIO, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Execução fiscal. Créditos tributários. Habilitação junto à falência. Análise quanto a exigibilidade do crédito. Entrada em vigor da Lei n. 14.112/2020. Incidente de classificação de créditos públicos. Competência do juízo da execução fiscal.

DESTAQUE

Compete ao juízo da execução fiscal decidir sobre a prescrição intercorrente de crédito tributário que se busca habilitar perante o juízo da falência, quando a sentença que reconhece a prescrição parcial dos créditos é posterior à vigência da Lei n. 14.112/2020, que introduziu o art. 7º-A, §4º, II, à Lei n. 11.105/2005, instituindo o incidente de classificação de créditos públicos.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A questão da competência do juízo falimentar para decidir acerca da prescrição dos créditos tributários está diretamente relacionada com a tese fixada no Tema 1092 no regime de julgamento de recursos repetitivos. Na oportunidade, o Superior Tribunal de Justiça concluiu que "É possível a Fazenda Pública habilitar em processo de falência crédito objeto de execução fiscal em curso, mesmo antes da vigência da Lei n. 14.112/2020 e desde que não haja pedido de constrição no juízo executivo".

Firmado tal posicionamento, esta Corte Superior entendeu que, submetido o crédito a habilitação junto à falência, a competência do juízo universal para deliberar sobre sua exigibilidade estaria inaugurada. Isso porque, não sendo a habilitação dos créditos tributários procedimento obrigatório, uma vez trazida a matéria, cabia ao juízo universal analisar a viabilidade do crédito, de modo a determinar sua habilitação ou não de acordo com o regramento vigente até a entrada em vigor da Lei n. 14.112/2020.

Contudo, o novo regramento trazido pela Lei n. 14.112/2020, que introduziu o art. 7º-A à Lei n. 11.101/2005, instituiu o procedimento denominado incidente de classificação dos créditos público e, expressamente, definiu quais matérias se encontram submetidas à competência do juízo falimentar e do juízo da execução fiscal, fixando este juízo da execução fiscal como o competente para questões referentes à exigibilidade do crédito.

Assim, tratando-se a matéria prescricional de questão que dispõe a respeito da exigibilidade do crédito tributário, por expressa previsão do art. 7º-A, §4º, inciso II da Lei n. 11.101/2005, com redação dada pela Lei n. 14.112/2020, compete ao juízo da execução fiscal a análise da prescrição intercorrente.

Conforme disposto nos artigos 5º e 7º da Lei n. 14.112/2020, as novas disposições aplicam-se de imediato aos processos pendentes, entrando a lei em vigor 30 (trinta) dias após a sua publicação. Ademais, o conteúdo material do art. 7º-A, §4º, inciso II da Lei n. 11.101/2005, refere-se à fixação da competência em razão da matéria, portanto, norma de natureza processual consistente em alteração de competência absoluta, motivo pelo qual possui incidência imediata.

Especificamente no que concerne à competência, nada obstante o art. 43 do CPC, que consolida o princípio da estabilização da demanda, disponha que "a competência se fixa no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta", a jurisprudência do STJ e do STF, ao enfrentar a questão da aplicação de norma nova que altera a competência absoluta, limitou o alcance da alteração legislativa ao processos que ainda não possuíam sentença de mérito à época da entrada em vigor da nova lei.

No caso em discussão, a sentença que reconheceu a prescrição parcial dos créditos tributários que se pretende habilitar junto à falência é anterior à entrada em vigor da Lei n. 14.112/2020, motivo pelo qual é aplicável o entendimento anterior desta Corte.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 14.112/2020

Lei n. 11.101/2005, art. 7º-A, §4º, II

Código de Processo Civil (CPC/2015), art. 43

PRECEDENTES QUALIFICADOS

Tema 1092/STJ

Saiba mais:

· Informativo de Jurisprudência n. 812