sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

TJ/SC. CONCORRÊNCIAS DE CULPAS.

Acórdão. FONTE. WWW.CC2002.COM.BR.
Apelação Cível n. 03.003820-5, de São José. Relator: Des. José Volpato de Souza. Data da decisão: 20.08.2004.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO CUMULADA COM REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS - NOSOCÔMIO - FUGA DE PACIENTE - SUICÍDIO - PRELIMINAR DE IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ AFASTADA - RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL - CORREÇÃO DO TERMO FINAL DA PENSÃO - ALTERAÇÃO DO TERMO INICIAL PARA INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO - RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO - VALOR DOS DANOS MORAIS MAJORADO - RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO
A regra inserta no art. 132 do CPC encontra limites no princípio da investidura e deve ser ponderada com a realidade prática procedimental. Assim, não há impedimento legal para que um juiz substituto julgue o processo, ainda que não tenha presidido a audiência, se tiver sido nomeado para os atos da respectiva vara. É inadmissível que uma Instituição coloque como excludente de sua culpa a própria especialidade. Se sua função é dar tratamento e cuidados a pacientes portadores de deficiências mentais ou distúrbios psiquiátricos, não pode alegar tais fatos como sendo de força maior, para se eximir da responsabilidade. O valor da indenização do dano moral deve ser arbitrado pelo juiz de maneira a servir, por um lado, de lenitivo para a dor psíquica sofrida pelo lesado, sem importar-lhe enriquecimento sem causa; e, de outra parte, deve desempenhar uma função pedagógica e uma séria reprimenda ao ofensor, a fim de evitar a reiteração do ato.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n. 03.003820-5, da comarca de São José (2ª Vara Cível), em que são apelantes e apelados Instituto São José Ltda. - Clínica de Repouso e Tratamento de Doenças Mentais e Maria Cardoso Laurindo: ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Civil, por maioria, conhecer dos recursos para dar provimento ao da autora e parcial provimento ao do réu. Vencido o Des. Dionízio Jenczak, que votou no sentido de dar provimento parcial ao recurso do Instituto-requerido para reconhecer a culpa recíproca e reduzir a indenização pela metade e negar provimento ao recurso da autora. Custas na forma da lei.
I. RELATÓRIO:
Maria Cardoso Laurindo aforou ação indenizatória cumulada com reparação de danos morais contra Instituto São José Ltda. - Clínica de Repouso e Tratamento de Doenças Mentais, alegando que: seu marido fora internado na Clínica requerida, com o alerta de seu estado depressivo e com tendência ao suicídio; em menos de uma semana o paciente fugiu, devido à falta de vigilância e cuidados despendidos pela ré; diante da fuga, o Hospital nada fez para localizar o marido da autora, que cometeu suicídio, ainda nas proximidades da Instituição. Por fim, requereu a procedência do pedido de indenização, com o pagamento de prestação de alimentos pelo período de sete anos, no valor de seis salários mínimos, de indenização pelos danos morais, bem como das despesas oriundas do funeral, estas no montante de R$ 700,00 (setecentos reais) (fls. 2/9). Juntou documentos (fls. 10/51). Devidamente citado, o réu contestou o feito, aduzindo que: não há como persuadir um indivíduo com tendência suicida a não tolher sua própria vida, ainda que seja observado ininterruptamente; o falecido estava sendo vigiado e assistido até o momento em que foi notada a sua ausência; não houve negligência. In fine, pugnou pela improcedência da pretensão e, alternativamente, pela minoração da base de cálculo pleiteada (fls. 57/62). A autora impugnou a peça contestatória (fls. 66/68). Em sentença, o ilustre Magistrado julgou procedente o pedido, condenando o réu a pagar o valor de R$ 10.080,00 (dez mil e oitenta reais), por conta dos danos materiais pensionados à autora, assim como o equivalente a 20 (vinte) salários mínimos a título de indenização por danos morais e também a quantia de R$ 700,00 (setecentos reais) relativa às despesas do funeral, bem como, ainda, as custas e verba honorária, esta fixada em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (fls. 186/192).
Irresignado, o Instituto réu apelou asserindo, em preliminar, que houve contrariedade ao princípio da identidade física do juiz. No mérito, afirmou que: não tem culpa pelos eventos narrados nos autos; os fatos se deram por motivo de força maior; não poderia ter agido de forma diferente, tendo obrado com toda a diligência; tomou todas as providências que lhe eram possíveis e devidas; o paciente era suicida crônico; não houve prova de conduta descurada por parte dos empregados ou prepostos do Hospital; a vítima tem culpa concorrente, eis que agiu deliberadamente para ceifar a própria vida; a prestação de alimentos é indevida, eis que o esposo da autora há vários anos dependia dela financeiramente; o valor arbitrado excede a parte que caberia ao paciente na renda familiar; com o prazo concedido, a prestação ultrapassaria a data em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos; ocorreu dupla atualização, visto que a Juíza considerou o salário mínimo da data da sentença e lhe atribuiu correção desde o aforamento da inicial; as indenizações e as verbas sucumbenciais devem ser reduzidas à metade, em vista da culpa concorrente. Por derradeiro, reclamou a improcedência do pleito inicial, bem como a redução das indenizações e verbas honorárias sucumbenciais (fls. 197/223). Também inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, altercando que o montante arbitrado a título de indenização pelos danos morais não são condizentes com o caso em tela, nem refletem o entendimento do nosso Tribunal, requerendo, assim, a sua elevação (fls. 227/234). O réu apresentou contra-razões às fls. 239/246.
II. VOTO: Trata-se de apelação cível em ação indenizatória cumulada com reparação de danos, na qual o Hospital demandado restou condenado a pagar indenização à família de cliente que cometera suicídio, por desídia da Instituição. Enceta o recurso com preliminar, alegando que houve ofensa ao princípio da identidade física do juiz. Realmente, o prolator do decisum não coincide com aquele que instruiu o feito; porém, isto não leva à nulidade do processo. É que a regra inserta no art. 132 do CPC, além de não ter o valor absoluto atribuído pelo apelante, encontra limites no princípio da investidura e deve ser ponderada com a realidade prática procedimental, conforme aliás, já julgado por esta Corte, em acórdão da lavra do Des. Orli Rodrigues, no Conflito de Competência n. 96.012091-2, da Capital. No presente caso, a sentença foi prolatada pela MMa. Juíza Lílian Telles de Sá Vieira que, na ocasião, substituía o magistrado que estava no gozo de suas férias.
A ilustre Magistrada foi investida na unidade jurisdicional em que tramitou a presente demanda à época da lavratura da decisão definitiva. Ora, aludido dispositivo processual dispõe que, não se encontrando mais na Vara o juiz que presidiu a audiência, seja por aposentadoria, promoção, licença, convocação ou afastamento, cessa a vinculação dele ao julgamento da lide. Assim, não há impedimento legal para que um juiz substituto julgue o processo, ainda que não tenha presenciado a audiência, se tiver sido nomeado para os atos da respectiva Vara.
No mérito, o apelante argumenta que não houve culpa do Hospital pela fuga nem pelo suicídio do paciente. Contudo, a vítima foi internada no nosocômio com o aviso de sua tendência suicida, como este mesmo admite. Pretende o recorrente, em seu pleito, afastar sua culpa, alegando que é impossível se manter um controle ininterrupto sobre o paciente e que, se este tiver a intenção de ceifar a própria vida, não haveria como se evitar. Ora, é inadmissível que uma instituição coloque como excludente de sua culpa a própria especialidade. Se sua função é dar tratamento e cuidados a pacientes portadores de deficiências mentais ou distúrbios psiquiátricos, não pode invocar tais fatos como sendo de força maior, para se eximir da responsabilidade. Parece ainda mais inapropriada a assertiva de culpa concorrente, ante a prévia advertência da tendência suicida. Significaria dizer que se aceita um paciente para dele cuidar, prestando-lhe assistência médica, com o objetivo maior de que seu distúrbio não lhe prejudique, e que, quando ocorre o mal que se procurava evitar, se lhe imputa a culpa por padecer de tal distúrbio. Óbvio que a vítima colaborou com o fato, por assim dizer, com suas ações. Poder-se-ia dizer que agiu sozinha no intuito de se matar, não fosse a responsabilidade assumida pela Instituição de evitar que a vontade daquela se concretizasse. Nesse ponto, certo é que o ônus da prova quanto à diligência nos serviços prestados cabia ao réu/apelante, visto que a autora/apelada provou a razão constitutiva de seu direito, fazendo prova não impugnada da internação, bem como de seus motivos e do óbito de seu marido. A partir disso, caberia ao apelante fazer prova de que as atitudes do paciente excederam em muito o esperado, mesmo de um indivíduo com distúrbios, restando impossível evitar o resultado mórbido. No entanto, o Hospital cinge-se a alegar que é impossível cumprir totalmente o encargo que aceitou no momento da internação, e que agiu, posteriormente à fuga, de forma célere no intuito de evitar prejuízo maior. Pouco importam essas argüições na caracterização da culpa, eis que seu encargo era o de manter o paciente protegido e dentro de suas instalações. Na seqüência do recurso, o apelante aduz que a prestação de alimentos é indevida, eis que o esposo da autora há vários anos dependia dela financeiramente. Por vedação legal expressa, exime-se esta Corte da análise deste argumento, eis que inaugurado em sede de recurso, não tendo sido a questão debatida quando do oferecimento da contestação. Não há dúvida de que a finalidade da contestação é impugnar os fundamentos trazidos na exordial, razão pela qual se aplica o princípio da eventualidade, conforme se observa dos ensinamentos de Sérgio Bermudes, que assim aponta: "Saliente logo na primeira proposição do art. 300, onde se preceitua competir ao réu alegar toda a matéria de defesa. Chama-se da eventualidade o princípio porque ao réu incumbe reunir, na contestação, todas as suas defesas" (Direito Processual Civil - Estudos e Pareces, 2ª série, Saraiva, p. 25).
No mesmo desiderato, a doutrina de Moacyr Amaral Santos: "Com a contestação 'dá-se a preclusão das alegações que o réu poderia oferecer em sua defesa. Quer dizer que o Código adotou o princípio da concentração da defesa na contestação'. Acentua que essa denominação foi dada por José Alberto dos Reis, '.. é o mesmo princípio da eventualidade em relação ao réu: todas as defesas devem ser formuladas de uma só vez, como medida de previsão - adventum - para o caso de que a primeira oferecida seja rejeitada'" (Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, Saraiva, 14ª ed., vol. 02, p. 207).
Assim, não tendo a matéria sido alegada quando do oferecimento da contestação pelo recorrente e sobre ela não tendo ocorrido manifestação na primeira instância, não há como se pretender, sob pena de supressão de um grau de jurisdição, o seu exame em nível recursal. Até porque, o artigo 515, parágrafo 1º, do Estatuto Processual Civil, é bastante claro quando, traçando o âmbito da apreciação e do julgamento recursal, restringe-o a "todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro." Esse é o entendimento deste egrégio Tribunal de Justiça:
“RECURSO CÍVEL - APELAÇÃO - MATÉRIA NÃO SUSCITADA NEM DISCUTIDA NO PRIMEIRO GRAU - PRINCÍPIO TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APPELLATUM - APLICAÇÃO DO ART. 515, CAPUT, DO CPC - NÃO CONHECIMENTO Na apelação não é autorizada mudança da matéria discutida e decidida em primeiro grau, ainda mais com alegação de novo fundamento aditivo à própria inicial." 'A norma contida no § 1º do art. 515 do CPC não autoriza o Tribunal a inobservar o princípio do duplo grau de jurisdição' (STJ, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira)" (AC n. 99.008955-0, de Blumenau. Relator: Des. Nilton Macedo Machado). No que tange ao valor concedido, afirma o Hospital que ele excede a parte que caberia ao paciente na renda familiar, divergindo também no que se refere ao período de 79 (setenta e nove) meses, no lugar de 84 (oitenta e quatro) ou sete anos, para o cálculo da pensão, asserindo que tal período ultrapassaria a data em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos. O valor de um salário mínimo para efeito de indenização deve ser mantido, conforme já decidido na sentença monocrática, até porque o falecido não tinha renda fixa. No entanto, em relação aos meses, é devido tão-somente 79 (setenta e nove), pois, tomando sete anos em sua totalidade, como inicialmente feito, excederia cinco meses. Levado em consideração que o óbito se deu no mês de dezembro e a idade seria atingida no mês de julho, seis anos a frente, mister se fazer a correção para a quantia de meses igual a 79 (setenta e nove). Quanto ao critério de atualização, merece guarida a objurgação feita, pois realmente, adotar o valor do salário mínimo vigente e atualizá-lo desde o ajuizamento da ação seria exagero. Para evitar o excesso na sua dupla atualização, deve ser considerado para as indenizações o valor do salário mínimo da época da sentença, com correção a partir daquela data. Nesse prisma, encontramos apoio no Supremo Tribunal de Justiça, mutatis mutandis: “A correção monetária da indenização do dano moral inicia a partir da data do respectivo arbitramento; a retroação à data do ajuizamento da demanda implicaria corrigir o que já está atualizado" (EDREsp n. 194625, Terceira Turma, Min. Ari Pargendler). E: “O termo inicial da correção monetária do valor do dano moral é a data em que for fixado" (Resp. n. 376.900/SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito).
Quanto ao pedido de minoração das indenizações e verbas sucumbenciais, não se dá provimento, eis que foi baseado na culpa concorrente, posição, como já colocado, que não se coaduna com o entendimento desta Corte. Também não satisfeita com a decisão de primeiro grau, a autora interpôs recurso, afirmando que o montante arbitrado a título de indenização pelos danos morais não é condizente com o caso em tela nem reflete o entendimento do nosso Tribunal, reclamando, assim, a sua elevação. Sua insurgência merece guarida. A aludida elevação pleiteada pela recorrente é devida, em análise aos critérios da capacidade econômica das partes bem como da intensidade da culpa e da repercussão do dano. Dos autos se depreende que a perda foi muito grande. Faz-se mister observar que, em uma semana, a esposa fez a internação do chefe da família, que possuía distúrbios mentais e conhecida propensão ao suicídio e, na semana seguinte, recebeu a notícia de que a Instituição para a qual confiou seu esposo não foi capaz de evitar que ele tirasse a própria vida. Importa frisar que o valor da indenização do dano moral deve ser arbitrado pelo juiz de maneira a servir, por um lado, de lenitivo para a dor psíquica sofrida pelo lesado, sem importar-lhe enriquecimento sem causa; e, de outra parte, deve desempenhar uma função pedagógica e uma séria reprimenda ao ofensor, a fim de evitar a reiteração do ato. Desse modo, colocar um montante inferior a 50 (cinqüenta) salários mínimos não atenderia ao fim da condenação, não se fazendo justiça. É da jurisprudência: “O valor da indenização por dano moral deve ser razoavelmente expressivo, não meramente simbólico. Deve pesar sobre o bolso do ofensor, como um fator de desestímulo, a fim de que não reincida na ofensa" (TJSP, 4ª Câmara de Direito Privado, Ap. n. 15.530-4, Rel. Des. Cunha Cintra) (grifo nosso). Destarte, procedente é o pedido recursal da autora, aumentando-se o quantum a título de indenização pelos danos morais para 50 (cinqüenta) salários mínimos. Pelo exposto, é medida de justiça conhecer dos dois recursos, para dar provimento à apelação da autora e parcial provimento à do réu, para modificar as bases de cálculo da pensão, bem como alterar os termos iniciais para incidência da correção.
III. DECISÃO:
Nos termos do voto do relator, por maioria, conheceram dos recursos para dar provimento ao da autora e parcial provimento ao do réu. Vencido o Des. Dionízio Jenczak, que votou no sentido de dar provimento parcial ao recurso do Instituto-requerido para reconhecer a culpa recíproca e reduzir a indenização pela metade e negar provimento ao recurso da autora. P
articiparam do julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Wilson Augusto do Nascimento e Dionízio Jenczak.
Florianópolis, 20 de agosto de 2004. Wilson Augusto do Nascimento PRESIDENTE COM VOTO José Volpato de Souza RELATOR
DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO DO DES. DIONÍZIO JENCZAK:
Ousei divergir da douta maioria pelos seguintes fundamentos:
1. FUGA DO PACIENTE Inicialmente, analisa-se sobre a culpa do Instituto São José, na fuga do paciente. É incontroverso que no dia 06 de dezembro de 1994, Pedro Laurindo foi internado na Clínica, ora recorrente, para tratamento de depressão com tendências suicidas. E que, no dia 10 do mesmo mês e ano, o paciente evadiu-se do local, culminando com o suicídio mencionado. A família de Pedro Laurindo internou-o na Clínica, sabedora da competência da mesma, e crente que ele permaneceria incólume nas dependências do Instituto São José. Entretanto, na manhã do dia 10/12, quando interagia com outros pacientes no pátio, sem a presença de qualquer funcionário do Hospital Psiquiátrico, empreendeu a fuga da Instituição e, em conseqüência pôs em prática seus objetivos, ou seja, exterminou a própria vida. José de Aguiar Dias, comentando sobre a responsabilidade dos hospitais, ressalta que "quanto à responsabilidade dos donos de casas de saúde e hospitais, não há dúvida que inclui um dever de incolumidade, que, naturalmente, não vai ao ponto de garantir o impossível de restituir a vida ou assegurar a cura, mas que se fixa, curialmente, na obrigação de resguardar o paciente de quaisquer consequências que um bom serviço poderia evitar". (Da responsabilidade civil, 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense, v. 1., n. 116, p. 293 - nota 524). Ora, é dever do recorrente em proceder um sistema de segurança que impeça a fuga de seus pacientes, ainda mais quando são internados sob depressão com tendências suicidas, nos quais a observação tem que ser redobrada. O médico que o atendia prescreveu, inicialmente, que o paciente deveria ser observado e vigiado, sendo que no dia 08 de dezembro, após nova consulta, consignou que o mesmo deveria permanecer "em observação". No dia dos fatos, constata-se que havia uma funcionária no pátio, junto com o grupo, no entanto, a mesma ausentou-se para buscar uma lista, ou seja, naquele instante o grupo de pacientes, entre eles Pedro Laurindo, ficaram sem qualquer observação, facilitando que se evadisse do Instituto, culminando com o ato que ceifou a sua vida. "Indenização. Responsabilidade civil. Ato ilícito. Hospital psiquiátrico. Morte do paciente durante tentativa de fuga. Ineficácia de cláusula excludente de responsabilidade, estatuída no regulamento do sanatório. Dever jurídico de vigilância contraído ipso facto no ato de hospedar independente de seu caráter gratuito ou oneroso". (RJTSP 126/159). "É irrelevante contrato assinado entre a clínica e o curador liberando-a de qualquer responsabilidade por possíveis atos do internado, em caso de fuga, uma vez que a delegação de vigilância do demente transfere a responsabilidade por seus atos se feita a estabelecimento específico mediante paga". (RT 560/201) Assim, mostra-se que o Instituto São José teve participação indireta na desgraça, pois agiu com negligência no caso.
2. SUICÍDIO “Desgraça ou ruína procurada de livre vontade ou por falta de discernimento" (Dicionário Aurélio eletrônico) "Supressão livre e consciente da própria vida". (Dicionário de Medicina Legal) "Para Durkheim, 'chama-se suicídio todo caso de morte que resulte direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo, realizado pela própria vítima, a qual sabia dever produzir este resultado'. Altavilla é mais sintético na sua definição: 'é suicida todo aquele que ocasione voluntariamente a própria morte’. (Flamínio Favero, Medicina Legal, 10ª ed., Belo Horizonte: Itatiaia, 1976, p. 250). Portanto, como se vê o suicídio é um ato da livre vontade da parte ceifando a sua própria vida. Como fruto da observação de Enrico Altavilla, as causas que levam à morte, o suicídio pode ser classificado como: a) por tendência; b) por deficiência dos instintos; c) pela deficiência mental; d) por questões passionais; e) por causas ocasionais. A tendência suicida poderia ser a herança hereditária recebida. As causas ocasionais, como a difícil situação econômica ou um grande desgosto, levam a pessoa a perder o amor pela vida e encontrar no suicídio a única saída" (Gama, Ricardo Rodrigues, Suicídio e Direito, in RT 796/501). In casu, Pedro Laurindo atravessava uma grave crise financeira, o que ocasionou a depressão e os pensamentos suicidas, sendo que não ocorreu qualquer instigação ou induzimento, dos prepostos da clínica, para a ocorrência do ato. Observa-se que o tratamento despendido ao paciente mostrou-se correto e adequado, pois o quadro clínico do mesmo apresentou melhoras aparentes, em somente dois dias, sendo que inclusive o grau de cuidados especiais com Pedro foi amenizado, face ao progresso que aparentava. Poderia ser o Instituto São José penalizado civilmente se restasse demonstrado que o respectivo tratamento fosse completamente inadequado. Novamente, traz-se à colação ensinamento de Ricardo Rodrigues Gama: "Responsabilidade do profissional em saúde mental. Muitas das vezes, o tratamento pode reforçar a fragilidade do paciente e ele praticar o suicídio em virtude de entender que a ajuda vem em sentido contrário à vida. Por isso, o profissional em saúde mental deve ser bem preparado como qualquer outro profissional, com sensibilidade redobrada, evitando lesão de tal monta e irreparável. O consultório do profissional não deve ser visto como sala de conversas amistosas, correntes entre aqueles mais despreparados para lidar com a vida de outrem. Se isso se der, indubitavelmente, o profissional deve ser acionado para responder em juízo pelos prejuízos causados. Nesse sentido, o profissional pode ser responsabilizado também quando agir em desconformidade com as técnicas de tratamento apropriadas para o caso". (Op. cit., p. 505) O Tribunal de Justiça de São Paulo já manifestou-se nos casos de suicídio ocorrido em clínicas psiquiátricas. "Indenização. Danos materiais e morais. Paciente internada em hospital psiquiátrico em estado de depressão grave. Intenção suicida consumada. Aplicação do tratamento adequado a essa situação. Culpa da ré não demonstrada. Ação improcedente. Recurso da ré provido e prejudicado o dos autores. Os autores internaram a filha no hospital da ré para evitar que ela consumasse uma intenção suicida manifestada. A obrigação da ré, sendo de meio, era o de ministrar o tratamento adequado para evitar que ocorresse esse resultado, e não o de evitar a ocorrência do fato, pois que, conforme a literatura médica, a observação constante por enfermeiros especiais e contenções físicas não evitarão um suicida determinado. Não ficou demonstrado que pelo estado de saúde da paciente a ré, através de seus prepostos, ministrou tratamento inadequado ou deixou de aplicar os cuidados e diligências necessárias de vigilância que as circunstâncias exigiam". (JTJ - LEX 235/111) Portanto, perfeitamente caracterizado que o Instituto São José não teve qualquer culpa em relação ao ato de suicídio perpetrado pelo paciente.
3. CULPA CONCORRENTE. Sobre o tema preconiza SILVIO RODRIGUES, em seu Direito Civil: Responsabilidade Civil, 16. ed., Saraiva, 1998, pp. 165-166: "O evento danoso pode derivar de culpa exclusiva ou concorrente da vítima; no primeiro caso desaparece a relação de causa e efeito entre o ato do agente causador do dano e o prejuízo experimentado pela vítima; no segundo, sua responsabilidade se atenua, pois o evento danoso deflui tanto de sua culpa, quanto da culpa da vítima". E mais adiante prossegue o civilista: "Casos há, entretanto, em que existe culpa da vítima, paralelamente à culpa concorrente do agente causador do dano. Nestas hipóteses o evento danoso decorreu tanto do comportamento culposo daquela, quanto do comportamento culposo deste. Por conseguinte, se houver algo a indenizar, a indenização será repartida entre os dois responsáveis, na proporção que for justa". O atual Código Civil dispõe sobre a culpa concorrente, em seu art. 945: "Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada, tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano". Rui Stoco ao comentar sobre o mencionado artigo dispõe que "a questão se resume em verificar a causa eficiente do fato danoso e se resolve apenas e tão-somente no plano da causalidade material, de modo que, ainda que a vítima tenha agido com culpa, dever-se-á verificar se a sua atuação interferiu no resultado e quanto contribuiu para a sua ocorrência. Inexistindo esse liame, a causa eficiente do resultado danoso terá sido outra e outro o responsável único pela reparação. Existindo a interferência, indagar-se-á em que medida ou proporção influenciou no resultado, passando a projetar reflexos no quantum da reparação, seja diminuindo o montante a ser indenizado de um, seja isentando parcialmente a obrigação de dar do outro. Parece-nos, portanto, que a grande virtude da disposição legal está em que a concorrência de culpas entre autor e vítima fará com que a repartição do prejuízo seja proporcional, de modo que não se submeta a critério de divisão em partes iguais, que se mostrava injusto e, às vezes, odioso". "Tratado de Responsabilidade Civil, 6ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 139).
Conforme, supra analisado, o Instituto São José teve participação indireta no ato do suicídio, ante a imprudência de seus prepostos que permitiram a fuga do paciente, entretanto, no ato em si, o mesmo não teve qualquer participação, por ser de livre e espontânea vontade do agente. Sendo que medicina é ação de meio, e não de resultado, não podendo culpar o médico ou a clínica, por não ter o paciente reagido conforme o tratamento adequadamente ministrado. Assim, restou caracterizado que a Clínica agiu com culpa somente no tocante a fuga do paciente, contribuindo, desta maneira, a priori, em parte, para a realização do ato de suicídio. Pelo exposto, posicionei-me pela culpa concorrente dos agentes, e em conseqüência, a redução pela metade da condenação imposta, atribuindo a culpa em 50% (cinqüenta por cento) para cada causador. Diante dos argumentos supramencionados, divergi do entendimento dos doutos Desembargadores integrantes desta Colenda Câmara.
DIONÍZIO JENCZAK

ENQUANTO ISSO.. NA ITÁLIA...

Juiz italiano se recusa a julgar em sala com crucifixo
O tribunal da cidade de Áquila, na Itália, condenou o juiz Luigi Tosti a um ano de prisão. Motivo: ele suspendeu três audiências porque havia um crucifixo na sala do tribunal. Depois de cumprir a pena, ele ficará ainda um ano fora da magistratura. O advogado do juiz, Dario Visconti, disse que irá apelar da decisão. Ele afirmou que Tosti não prevaricou, pois julgou o processo depois da retirada do crucifixo. As informações são da agência Lusa.
Durante as audiências em 2006, Tosti, de 59 anos, afirmou que havia um conflito entre Estado e Igreja. O juiz determinou a suspensão da sessão para que o crucifixo fosse retirado. Para ele, só deste modo o caráter laico do Estado seria restaurado. “Não se pretende ofender os cristãos. Retirar o crucifixo significa eliminar um privilégio que permita que as salas dos tribunais se convertam em verdadeiros locais laicos e neutros”, explicou o advogado.
Não é a primeira vez que Tosti sofre uma condenação por causa de suas idéias. Em fevereiro de 2006, a Suprema Corte dos Magistrados (uma espécie de Conselho Nacional de Justiça da Itália) fez o juiz mudar de cidade e cortou o seu salário por causa de seu “comportamento culposo”. O juiz propôs, em 2004, a colocação de símbolos de sua religião, o judaísmo, como a Menorá. Ele mudou de idéia posteriormente.
A colocação de crucifixos em escolas e tribunais foi determinada na década de 1920 durante o regime fascista de Benito Mussolini. Eles não são obrigatórios, mas já se tornaram hábito e tiveram sua presença ratifica pelo Tribunal Constitucional em 2004. Apesar de o Vaticano estar incrustado na Itália, o catolicismo não é religião oficial do país.
Países católicos
No Brasil, nenhum juiz chegou a ser preso por querer tirar os símbolos religiosos do tribunal. No entanto, o assunto já foi discutido no Conselho Nacional de Justiça. Em maio do ano passado, os conselheiros julgaram que o uso de símbolos religiosos em órgãos da Justiça não fere o princípio de laicidade do Estado.
O conselheiro Paulo Lobo, relator da questão, chegou a sugerir uma consulta pública, pela internet, pelo período de dois meses. No entanto, foi vencido pela maioria dos conselheiros. Oscar Argollo, que abriu divergência, argumentou que o uso de tais símbolos constitui um traço cultural da sociedade brasileira e “em nada agridem a liberdade da sociedade, ao contrário, só a afirmam”.
No Rio Grande do Sul, em outubro de 2005, os juízes estaduais decidiram em um congresso que os crucifixos poderiam continuar adornando as paredes das salas de audiências gaúchas. A decisão foi apertada: 25 votos pela manutenção e 24 contra.
Na ocasião, os juízes entenderam que a ostentação do crucifixo “está em consonância com a fé da grande maioria da população brasileira” e que “não há registro de usuário da Justiça que tenha acusado constrangimento em razão da presença do símbolo religioso em uma sala de audiência”.
No Supremo Tribunal Federal, dois ministros já se manifestaram contra a manutenção do crucifixo localizado no plenário: Celso de Mello e Marco Aurélio. Embora respeitem a Igreja Católica, os ministros entendem que, desde que Igreja e Estado se separaram, não faz sentido projetar a idéia de que um tribunal que se pretende neutro em relação aos movimentos e manifestações sociais do país projete a noção de que se subordina a algum deles.
No Pará, ficou entendido que até missas podem ser feitas nos tribunais. A ONG Brasil para Todos entrou na Justiça Federal para suspender o movimento “Reverência do Judiciário à Virgem de Nazaré”, promovido pelo juiz federal Daniel Santos Rocha Sobral.
Nas comemorações, o Tribunal de Justiça do estado recebe visitas da imagem peregrina da santa. Em cada local, uma missa é rezada. A representação foi rejeitada pelo desembargador Jirair Aram Meguerian, corregedor-geral da Justiça Federal da 1ª Região. Para ele, não se pode ignorar a manifestação cultural da religião nas tradições brasileiras.
Revista Consultor Jurídico, 23 de fevereiro de 2008

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

ARTIGO DE ZENO VELOSO.


JORNAL O LIBERAL. BELÉM DO PARÁ. 16.02.2008

QUEM MATA NÃO HERDA

ZENO VELOSO


Segunda-feira passada, proferi a aula inaugural do curso de pós-graduação em Direito de Família e das Sucessões na Escola Paulista de Direito, instituição modelar, que me deixou muito impressionado. Além dos alunos, estiveram presentes, o que muito me honrou – e preocupou, pois são dois representantes do que há de mais ilustre entre os jovens professores brasileiros – José Fernando Simão e Flávio Tartuce, autores, já, de consagradas obras. Aliás, como falou um antigo e saudoso mestre, Haroldo Valladão: “quem se declara jurista sem ter publicado livros, jurista, na verdade, não é”.
A aula se estendeu de 19 às 22:30h. Houve muitas perguntas e debates, considerando que os alunos já são graduados e, todos, tornaram-se bacharéis em Direito com notas excelentes. Em dado momento, abordei o tema dos excluídos da sucessão, ou seja, dos indignos de suceder por terem praticado atos ofensivos à pessoa ou honra do titular da herança, ou conduta atentatória contra sua liberdade de testar. As causas que determinam a exclusão de herdeiros e legatários estão taxativamente expostas no art. 1.814 do Código Civil. E a exclusão não se dá automaticamente, dependendo de uma ação própria e de sentença final, transitada em julgado, embora não se exija – ao contrário do que se dá no direito francês e no belga – a prévia condenação criminal. Registre-se, ainda, que são pessoais os efeitos da exclusão, previstos no Código Civil, cujo art. 1.816 menciona que os descendentes do herdeiro excluído sucedem, como se ele morto fosse.
O caso mais grave que possibilita a exclusão do herdeiro ou do legatário vem previsto no inciso I do Art. 1.814 do Código Civil, que aponta os “que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente”.
Inevitavelmente, foi relembrado o bárbaro assassinato do casal Manfred e Marísia von Richthofen, ocorrido em São Paulo no dia 31 de outubro de 2002. Suzane, a filha do casal, seu namorado, Daniel, e o irmão dele, Christian Cravinhos, tiraram as vidas de Manfred e Marísia enquanto eles dormiam, aplicando-lhes violentos golpes na cabeça, com barras de ferro. O Ministério Público denunciou-os por crime de duplo homicídio triplamente qualificado por motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima; e fraude processual, por terem alterado a cena do crime. O julgamento da trinca ocorreu em julho de 2006, e todos foram condenados: Suzane e Daniel pegaram 39 anos, e Christian 38 anos de cadeia.
Por sua vez, na área cível, o irmão de Suzane, Andréas Albert von Richthofen, ingressou com ação declaratória para excluir a homicida da herança de seus pais, ou seja, das pessoas que assassinou. Por incrível que pareça, até o presente momento, tantos anos passados do bárbaro crime, o processo não chegou ao fim e ainda não se proferiu uma decisão a respeito da exclusão de Suzane da herança de Manfred e Marísia.
Um advogado me contou que aqui, no Pará, ocorreu caso interessante, pedindo minha opinião. Gilmar e Carolina eram casados sob o regime da comunhão universal. O casal tinha uma filha, Amanda, e o marido tinha outro filho, Luís, de relacionamento anterior. Carolina praticou contra Gilmar crime de homicídio doloso e, depois, suicidou-se. Mesmo que fosse possível a propositura e prosseguimento da ação após a morte do indigno (Maria Helena Diniz e Carlos Roberto Gonçalves afirmam que não; Francisco Cahali e Giselda Hironaka dizem que sim), no caso, a autora do homicídio, Carolina, era meeira, em razão do regime de bens do casamento, e este fato não fica alterado por ter a esposa matado o marido, uma vez que meação não é herança. Quem é declarado indigno perde o direito de herdar, todavia, mantém sua meação, que tem outra razão jurídica e não depende da morte. A herança de Gilmar será dividida, em partes iguais, entre seus dois filhos. Entretanto, a meação de Carolina irá, exclusivamente, para sua filha, Amanda.

p.s. quinta-feira, à noite, recebi telefonema do amigo Mário Delgado e ele me disse que estava com um grupo, no restaurante Itamarati, em São Paulo, festejando o resultado do disputadíssimo concurso de professor doutor da tradicional Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da USP. José Fernando Simão, citado na coluna de hoje, obteve o segundo lugar. Viva o Simão!

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

CASO ZECA PAGODINHO. SENTENÇA QUE FALTAVA. BRAHMA X NOVA SCHIN. TUTELA EXTERNA DO CRÉDITO E FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO.

VISTOS.
PRIMO SCHINCARIOL INDÚSTRIA DE CERVEJAS E REFRIGERANTES S/A, empresa qualificada na inicial, ajuizou a presente ação de indenização por danos morais e materiais, pelo procedimento ordinário, em face da COMPANHIA DE BEBIDAS DAS AMÉRICAS – AMBEV e COMPANHIA BRASILEIRA DE BEBIDAS S/A – CBB, igualmente qualificada nos autos. Alega, em resumo, que é empresa que atua no ramo de industrialização e comercialização de bebidas e celebrou contrato de prestação de serviços e uso de imagem com o conhecido cantor Zeca Pagodinho, para veiculação, com exclusividade, de seu produto a cerveja Nova Schin. Entretanto, ainda na vigência do contrato, as requeridas ilicitamente aliciaram o cantor e utilizaram sua imagem e voz em campanha publicitária da cerveja Brahma, veiculando propaganda comparativa e aviltante à cerveja comercializada pela autora. Acrescenta que outras ações foram ajuizadas para impedir a veiculação da propaganda e, uma vez que tal conduta ilícita das rés feriu princípios éticos, constitucionais e legais, causando prejuízos à autora, pede a procedência do pedido para que seja condenada ao pagamento de indenização por danos materiais, consistente no ressarcimento de todos os investimentos com as campanhas do produto Nova Schin que envolveram a participação do cantor – a serem apurados em liquidação de sentença – além de morais pela indevida e maliciosa exposição do produto e imagem da empresa requerente. Juntou os documentos de fls. 38/979. Determinada a emenda à inicial (fls. 980), a requerente aditou o pedido para postular a condenação das rés ao pagamento de cem milhões de reais por danos materiais e outros cem milhões de reais a título de danos morais (fls. 981/983). Recebida a emenda à inicial, as rés foram regularmente citadas (fls. 1000/1001) e apresentaram a contestação de fls. 1.050/1.087. Inicialmente informam que a co-ré CBB foi extinta e incorporada à Ambev e, no mérito, rebatem os argumentos expostos na inicial. Afirmam que eventual direito à indenização já foi objeto de demanda ajuizada pela autora perante o juízo da 36ª Vara Cível da Capital e julgada procedente, com a condenação do cantor Zeca Pagodinho ao pagamento de indenização que atingiu cerca de 2 milhões de reais, de sorte que não há como postular nova condenação da AmBev. Acrescentam que não participaram do contrato e, por isso, se não intervieram no acordo de vontade, os acontecimentos não podem atingi-las, pois apenas aqueles que participaram do contrato devem observar os seus termos. Finalizam a contestação com o argumento de que a concorrência foi lícita e, portanto, não existe dano material ou moral a ser indenizado, mesmo porque a própria inicial indica que a campanha foi um sucesso, o que torna desnecessário o ressarcimento dos gastos efetuados com ela. Juntaram os documentos de fls. 1.088/1.155. Réplica a fls. 1.160/1.172. As partes expressamente dispensaram a realização de audiência de conciliação, postulando o julgamento antecipado da lide (fls. 1.176/1.179).
É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO. Cuida-se de ação de indenização por danos morais e materiais, pelo procedimento ordinário, ajuizada por Primo Schincariol Indústria de Cervejas e Refrigerantes Ltda. em face da Companhia de Bebidas das Américas – AMBEV e Companhia Brasileira de Bebidas – CBB. Pretende a requerente a condenação das requeridas ao ressarcimento de tudo aquilo que gastou com a propaganda de lançamento da cerveja Nova Schin que contou com a participação do cantor conhecido como Zeca Pagodinho. O feito prescinde de outras provas, pois bastam aquelas existentes nos autos para a formação da convicção do julgador. Assim, remanescendo apenas questões de direito, passo ao julgamento da lide no estado em que se encontra o processo (art. 330, inciso I, do Código de Processo Civil). Não há preliminares ou irregularidades a serem enfrentadas, motivo pelo qual passo, desde logo, à análise do mérito do pedido. Em sua essência os fatos são incontroversos, eis que por todos admitidos. Aliás, a situação colocada nos autos é do conhecimento geral, já que todos tiveram acesso, inclusive através de matérias divulgadas pela imprensa, aos fatos que envolveram a campanha publicitária das duas grandes marcas de cerveja, ou seja, Schincariol e Brahma, pois ambas utilizaram o mesmo personagem em suas campanhas, o cantor Zeca Pagodinho. Também se tornou incontroverso – as requeridas jamais contestaram esse ponto – que o referido cantor, em um primeiro momento, celebrou contrato com a autora que realizou ampla e conhecida campanha publicitária informando a “mudança” de marca de cerveja, para depois de algum tempo, veicular campanha da concorrente – ora rés – informando aos consumidores que havia “voltado” para a cerveja que consumia antes. Isto considerado, segundo penso, é evidente que, a despeito da argumentação das requeridas sobre a necessidade de se observar os limites do contrato apenas entre os participantes, se a atuação de um terceiro estranho causa prejuízo a um dos contratantes surge o dever de indenizar pelo ato ilícito. Nos termos do art. 186, do Código Civil, todo aquele que por ação ou omissão voluntária viola direito de outrem e lhe causa prejuízo, comete ato ilícito passível de indenização. Afinal, “é sabido que os contratos interessam à sociedade. É inconcebível crer que, no momento atual, se possam plagiar os oitocentistas, alegando que a relação contratual é res inter alios acta (ou seja, que apenas concerne às partes, e não a terceiros). Os bons e maus contratos repercutem socialmente. Ambos os gêneros produzem efeito cascata sobre a economia. Os bons contratos promovem a confiança nas relações sociais. Já os contratos inquinados por cláusulas abusivas resultam em desprestigio aos fundamentos da boa-fé e quebra de solidariedade social. Daí a necessidade de oponibilidade externa dos contratos em desfavor dos interesses dos contratantes...Porém, da mesma forma que podem ser afetados por contratos alheios, terceiros também podem agir de forma a violar uma relação contratual em andamento...” e, em decorrência disso, serem condenados a responder pelos danos emergentes a partir da indevida influência na relação existente entre outras pessoas (Código Civil Comentado, Nelson Rosenvald e outros, Editora Manole, 2007, pág. 313). Nesse sentido já se dirigia a doutrina antes mesmo do advento do novo Código Civil, pois como ensina Antonio Junqueira Azevedo, “a responsabilidade do terceiro é, pois aquiliana. Efetivamente, se um contrato deve ser considerado como fato social, como temos insistido, então a sua real existência há de impor-se por si mesma, para poder ser invocada contra terceiros, e, às vezes, até para ser oposta por terceiros às próprias partes. Assim é que não só a violação de contrato por terceiro pode gerar responsabilidade civil desde (como quando terceiro destrói a coisa que devia ser prestada, ou na figura da indução ao inadimplemento do negócio jurídico alheio), como também terceiros podem opor-se ao contrato, quando sejam por ele prejudicados (o instituto da fraude contra terceiros é exemplo típico disto)” (Revista dos Tribunais nº 750, pág. 119, grifei). É exatamente esta a hipótese que se coloca nos autos, pois se as requeridas tivessem contribuído para que um dos contratantes descumprisse aquilo que havia sido acordado, seria indiscutível o dever de indenizar pelos prejuízos materiais decorrentes da indevida rescisão operada unilateralmente por um dos participantes do negócio jurídico. Entretanto, por outro motivo – também lembrado na contestação – o pedido deve ser julgado improcedente. É que a indenização pretendida pela autora em relação aos danos materiais se restringe ao ressarcimento das despesas que teve com a campanha publicitária, pois afirma que a conduta ilícita das rés causou inequívoco prejuízo, tornando imprestável o investimento nas campanhas da cerveja Nova Schin. Acontece que, neste ponto, seria mesmo imprescindível que viesse aos autos prova indiscutível de que a atuação das rés prejudicou de alguma forma a campanha publicitária a ponto de gerar o dever de ressarcir todos os investimentos realizados. Vale dizer, para aplicação da teoria consagrava no art. 421, do Código Civil – função social do contrato – a intervenção do terceiro estranho, capaz de influenciar o contrato, deveria ficar bem comprovada nos autos. Nos termos do art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil, incumbe ao autor o ônus de provar o fato constitutivo de seu direito. O não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de causa. A produção probatória, no tempo e na forma prescrita em lei, é ônus da condição de parte”. Isto porque “o juiz, na sentença, somente vai socorrer-se das regras relativas ao ônus da prova se houver non liquet quanto à prova, isto é, se o fato não se encontrar provado. Estando provado o fato, pelo princípio da aquisição processual, essa prova se incorpora ao processo, sendo irrelevante indagar-se sobre quem a produziu. Somente quando não houver a prova é que o juiz deve perquirir quem tinha o ônus de provar e dele não se desincumbiu” (Código de Processo Civil Comentado, Nelson Ney Junior e Rosa Maria Andrade Nery, 9ª Edição, Editora Revista dos Tribunais, 2006, pág. 531). Entretanto, essa prova não veio aos autos a ponto de justificar a pretensão inicial. Ao contrário, a própria inicial afirma o sucesso da campanha, que contou com a participação de outros artistas e gerou considerável aumento nas vendas do produto e também da participação da autora no segmento de cervejas. Nas suas próprias palavras “...o produto tornou-se um enorme sucesso...fenômeno poucas vezes presenciado em todo o mundo” (fls. 5). Assim, ainda que possa ser tida como indevida a intromissão das requeridas no contrato que havia entre a autora e o cantor para divulgação da cerveja, não se vê demonstrado nos autos o prejuízo alegado com a ruptura do contrato a ponto de justificar a condenação ao total ressarcimento de todo o investimento na campanha publicitária. Afinal, repita-se, a campanha foi um sucesso e, portanto, o investimento gerou o retorno esperado, trazendo evidente benefício para a autora – fato por ela própria confessada – de sorte que não vejo como reconhecer, neste particular, responsabilidade das rés por prejuízos decorrentes do investimento, se a campanha não fracassou, ao contrário, elevou as vendas do produto. Por isso, incabível a indenização pelos prejuízos materiais invocados na inicial. Também não vislumbro, outrossim, o direito à indenização pelos danos morais. Primeiro porque, neste ponto, o prejuízo moral já foi objeto de apuração e fixação em processo diverso, dirigido contra o apontado autor do ato – o cantor Zeca Pagodinho – este sim, que seria o responsável direto por eventuais prejuízos à imagem da autora. É que foi ele quem divulgou, em um primeiro instante, a mudança para a marca de cerveja distribuída pela autora para, depois, afirmar ao público em geral que preferia a concorrente. Como bem observou a decisão proferida pelo MM. Juiz da 36ª Vara Cível Central da Capital, nos autos do processo nº 109.435-2/04 e nº 27.913-8/04, “Aí fica clara a ocorrência dos danos morais, pois o comportamento deletério do Réu Jessé ofendeu a imagem da Autora, inicialmente do ponto de vista subjetivo e certamente também do ponto de vista objetivo...” (fls. 1.099). E depois porque não se vislumbra na conduta das requeridas a necessária intenção de prejudicar a imagem da autora. Se investiram e conseguiram aliciar o “garoto propaganda” eleito pela requerente para de divulgação do produto concorrente, deveriam arcar com os prejuízos decorrentes dessa atuação, mas não é possível antever que essa conduta tivesse causado prejuízo à boa imagem da empresa que o fabricava a cerveja. À requerente, então, cumpria o dever de demonstrar o fato constitutivo de seu direito e como não se desincumbiu desse ônus, não há como reconhecer que a intervenção das rés tivesse tornado imprestável todos os investimentos da autora (fls. 25), se outros elementos de convicção conduzem à conclusão oposta, ou seja, que a propaganda atingiu seu objetivo principal. Bem por isso, no meu sentir, só restaria à autora buscar indenização por prejuízos que tivesse sofrido com, por exemplo, a redução de vendas após a ruptura do contrato e veiculação do comercial que fazia referência à cerveja, mas buscar o ressarcimento de todos os gastos com a campanha que, bem ou mal, atingiu seu objetivo de alavancar a venda da Nova Schin, sem prova efetiva do dano, impossível acolher a pretensão da autora. Em suma, a improcedência do pedido inicial é medida que se impõe à correta solução do caso em questão. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido e condeno a requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo, por equidade, em R$ 5.000,00. P. R. I.
São Paulo, 10 de julho de 2007.
ALEXANDRE CARVALHO E SILVA DE ALMEIDA JUIZ DE DIREITO

domingo, 17 de fevereiro de 2008

INDICAÇÃO DE LIVRO. DIREITO DAS COISAS. LUCIANO DE CAMARGO PENTEADO


Prezados amigos:

Escrevo para comunicar um fato que é motivo de grande alegria para mim. Acabo de receber em minhas mãos os dois primeiros exemplares do livro abaixo/ao lado, publicado pela RT. Trata-se do resultado de alguns anos de estudo, principalmente a parte geral. Há um capítulo só sobre função social da propriedade, por exemplo, com umas 40 páginas. Outro que - dentre outros temas - trata dos sentidos da palavra propriedade. A parte sobre direitos de vizinhança (geral) também achei instigante.
Gostaria de compartilhar com vocês esta alegria. Aguardo especialmente críticas e sugestões para ir me aprimorando. Para os que desejarem ver mais detalhes, ele já está disponível no site da editora (http://www.rt.com.br/).
Um abraço,

Luciano de Camargo Penteado

INFORMATIVO 343 DO STJ.

MULTA. ATRASO. PAGAMENTO. SERVIÇO. TELEFONIA. ART. 52, § 1º, CDC. Aplica-se o disposto no art. 52, § 1º, do CDC (Lei n. 8.078/1990) aos contratos de prestação de serviços de telefonia, uma vez que há relação de consumo, logo incidirá o percentual de 2% em decorrência de atraso no pagamento pela prestação dos serviços telefônicos. A Portaria n. 127/1989 do Ministério das Comunicações, a qual estabeleceu multa de 10% a ser cobrada pelo inadimplemento de contas telefônicas, não pode sobrepor-se a uma lei ordinária, de interesse público e hierarquicamente superior àquela. Assim, a Turma, ao prosseguir o julgamento, negou provimento ao recurso. Precedentes citados: AgRg 460.768-SP, DJ 19/5/2003, e REsp 476.649-SP, DJ 25/2/2004. REsp 436.224-DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 18/12/2007.
VÍCIO. QUALIDADE. AUTOMÓVEL. EXEGESE. ART. 18, § 1º, I, CDC. Constatado o vício do produto, concede-se ao fornecedor a oportunidade de saná-lo no prazo máximo de trinta dias. Não sendo reparado o vício, o consumidor poderá exigir, à sua escolha, as três alternativas constantes dos incisos do § 1º do art. 18 do CDC. No caso, inexiste ofensa ao mencionado dispositivo, pois, imediatamente após a reclamação, o fornecedor prontificou-se a reparar o produto – um veículo automotor. Não aceita a oferta pelo consumidor, propôs a substituição do bem por outro da mesma espécie e em perfeitas condições de uso ou a compra pelo preço de mercado e, ainda assim, o consumidor manteve-se renitente. “A primeira solução que o código apresenta ao consumidor é a substituição das partes viciadas do produto. Não se está diante de uma opção propriamente dita, uma vez que, como regra, o consumidor não tem outra alternativa a não ser aceitar tal substituição” (Antônio Herman de Vasconcellos Benjamin, in comentários ao Código de Proteção do Consumidor, coordenador Juarez de Oliveira – São Paulo – Saraiva, 1991). Não sanado o vício de qualidade, cabe ao consumidor a escolha de uma das alternativas prevista no art. 18, § 1º, do CDC. O dispositivo em comento não confere ao consumidor o direito à troca do bem por outro novo, determina apenas que, “não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso (...)”. Precedentes citados: REsp 185.836-SP, DJ 22/3/1999, e REsp 109.294-RS, DJ 12/5/1997. REsp 991.985-PR, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18/12/2007.
CONCESSIONÁRIA. TELEFONIA. NÃO-DISCRIMINAÇÃO. IMPULSOS EXCEDENTES. CDC.
Na espécie, questiona-se a forma de tarifação que é imposta pela concessionária de telefonia, em razão da não-discriminação de todos os impulsos consumidos pelo usuário, o que violaria o direito básico de transparência e de informação do consumidor, previsto no art. 6º, III, do CDC. A Min. Relatora, baseando-se em seu voto proferido no REsp 942.546-RS, entendeu que, após o necessário processo de modernização do setor de telecomunicações capitaneado pela Anatel, a transparência exigida pelo art. 6º, III, do CDC e pelo art. 3º, IV, da Lei Geral de Telecomunicação, no que toca à política de tarifação dos serviços públicos prestados pelas concessionárias, encontra-se, na atualidade, plenamente atendida, não havendo que se falar em violação de tais dispositivos legais. Ademais, examinada a questão sob a ótica do princípio da razoabilidade, vê-se que a complexidade técnica e operacional exigida para promover a alteração na sistemática de medição dos serviços de telefonia e para implementar o detalhamento de todas as ligações locais, objeto de gradativa e progressiva política pública para a modernização do setor de telefonia, não poderia ser determinada de forma simplista, em curto espaço de tempo, mediante interferência do Poder Judiciário, como pretendido pela autora da presente demanda. REsp 975.346-MG, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 18/12/2007.
ESPÓLIO. MEAÇÃO. VIÚVA. A matéria controvertida no inventário consiste em definir se os bens oriundos do recebimento de honorários advocatícios na constância de casamento celebrado sob o regime da comunhão universal de bens devem ou não integrar a meação da viúva. Para a Min. Relatora, não destoa de outros julgados deste Superior Tribunal que o recebimento sob forma de dação em pagamento de uma fazenda e de TDAs pelos serviços profissionais prestados pelo marido como advogado e na constância do matrimônio incorporam-se ao patrimônio do casal, o que impõe comunicabilidade desses bens à viúva meeira que se dedicou à criação dos filhos e à administração do lar. Com esse entendimento, a Turma restabeleceu a decisão interlocutória na qual se determinou que os bens do litígio integrassem a meação da viúva, devendo o inventário prosseguir nos moldes do devido processo legal. Precedente citado: EREsp 421.801-RS, DJ 17/12/2004. REsp 895.344-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/12/2007.
JUROS. CAPITALIZAÇÃO. CC/2002. A MP n. 1.963-17/2000, republicada sob o n. 2.170-36/2001 (de garantida vigência em razão do art. 2º da EC n. 32/2001), é direcionada às operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, daí sua especificidade, a fazê-la prevalecer sob o novo Código Civil. Dessarte, depois de 31/3/2000, data em que entrou em vigor o art. 5º da referida MP, as instituições financeiras, se expressamente pactuado, fazem jus à capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual em contratos não regulados por lei específica, direito que não foi afastado pelo art. 591 do CC/2002, dispositivo aplicável aos contratos civis em geral. No caso, cuidou-se de contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária, firmado após a vigência do novo Código Civil. Precedentes citados: REsp 602.068-RS, DJ 21/3/2005; REsp 680.237-RS, DJ 15/3/2006; AgRg no REsp 714.510-RS, DJ 22/8/2005, e REsp 821.357-RS, DJ 23/8/2007. REsp 890.460-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 18/12/2007.
EMBARGOS. TERCEIRO. FRAUDE. CREDORES. PROCESSO. DÚVIDA. Em embargos de terceiro referentes à execução, foi mantida a penhora judicial, pois se negou valor à escritura de compra e venda celebrada entre os embargantes e a executada, sob o fundamento de que estava vetado seu registro, a teor da decisão do juízo de registros públicos em processo de dúvida suscitado pelo oficial de registro de imóveis. Sucede que é inviável o reconhecimento de fraude contra credores no bojo de embargos de terceiro (Súm. n. 195-STJ), pois necessária sua investigação e decretação na via própria da ação pauliana ou revocatória. A decisão proferida no processo de dúvida não obstrui o direito dos embargantes. Além de emanada em processo de jurisdição voluntária, ela apenas impede o registro, não afasta a higidez dos efeitos da escritura não-registrada, tal como preconiza a Súm. n. 84-STJ, ao menos até a sua desconstituição pela ação pauliana. Com esses fundamentos, a Turma afastou a penhora. REsp 431.202-MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 18/12/2007.
ASSOCIAÇÃO RESIDENCIAL. COBRANÇA. CONTRIBUIÇÃO. CONSERVAÇÃO. LEGITIMIDADE. Trata-se de ação de cobrança movida por associação residencial, objetivando o recebimento de contribuições alusivas aos serviços de vigilância, administração e preservação do loteamento e outros mais, sob a alegação de que o réu-recorrido, não obstante a aquisição de dois lotes no local e a adesão às normas estatutárias, não pagou as taxas respectivas. Destacou o Min. Relator não se afigurar razoável que alguém adquira um lote em condomínio fechado já implantado, que oferece diversas vantagens aos proprietários, faça adesão contratual ao estatuto, responsabilizando-se pelo pagamento de sua quota parte, para depois excluir-se “em tese” do grupo, em favor de uma pseudo-individualidade que sequer poderá exercer, na medida em que não tem como se afastar da comunidade e irá, por conseguinte, continuar a fruir de suas vantagens, ao menos em grande parte. No caso, trata-se de loteamento fechado, situação em que a vinculação entre os titulares é até maior, pois da própria essência da comunidade criada com determinadas propostas de vida em uma sociedade com compromissos mútuos pré-definidos, integrada pelos lotes e residências sobre eles edificadas. E, aqui, é incontroverso que o autor comprou os imóveis quando já instalada a associação e firmou compromisso de dela participar. Pode, é claro, debater, como associado, as verbas, impugnar os excessos, votar e ser votado, fazer propostas com vistas ao aprimoramento dos serviços, até ao corte de custos, mas comodamente se eximir do pagamento pelo que frui não pode, em absoluto. Isso posto, a Turma conheceu do recurso e deu-lhe provimento. Precedentes citados: AgRg no REsp 490.419-SP, DJ 30/6/2003; REsp 139.952-RJ, DJ 19/4/1999; REsp 439.661-RJ, DJ 18/11/2002, e REsp 503.768-RJ, DJ 1º/9/2003. REsp 443.305-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 7/2/2008.

AÇÃO. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. Trata-se de recurso em que se discute a indenização por dano moral alegadamente causado aos autores em razão de alarme soado quando de sua saída de estabelecimento comercial onde haviam feito compras. Mas a Turma não conheceu do recurso ao argumento de que a decisão foi tomada com base nos fatos dos autos, que não têm como ser revistos pelo STJ (Súm. n. 7-STJ) e segundo os quais, tal como posto pelo TJ, não houve qualquer atitude dos empregados da loja no sentido de agravar o incidente, emprestando a ele repercussão maior do que o soar do alarme. Este fato, por sua vez, ainda que desagradável, representa um dissabor, um contratempo, mas não chega a gerar, por si só, direito indenizável, porquanto distante de causar dor ou sofrimento a ponto de reclamar ressarcimento material. Destacou o Min. Relator que há, evidentemente, situações em que, soado o alarme, os prepostos do estabelecimento agem de modo agressivo, ríspido, espalhafatoso, até de condução do cliente a local reservado para revista, o que, aí, sim, reclama posicionamento diverso, pois atinge a esfera moral da vítima. Mas não foi este o caso, absolutamente. Ao inverso, retrata o acórdão que a reação imediata do gerente foi de polidez, acompanhada de pedidos de desculpas dele e da caixa que deixara de retirar o lacre de segurança, não possibilitando fazer supor aos presentes que houvera suspeita de furto. Também, segundo a Corte estadual, não ficou comprovada a alegada revista no carrinho de compras. Cada caso apresenta circunstâncias próprias, e, aqui, restou patente a inexistência de ato ilícito indenizável, senão um aborrecimento prontamente contornado. REsp 470.694-PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 7/2/2008.
PENHORA. SAFRA FUTURA. PRISÃO CIVIL. Trata-se de habeas corpus preventivo contra acórdão do TJ que autorizou o decreto de prisão civil do paciente, resultante de não ter havido devolução do bem ou depósito do equivalente em dinheiro da safra de café, objeto de depósito judicial nos autos de execução movida por cooperativa de crédito rural. O Tribunal a quo, ao negar provimento ao agravo de instrumento dos impetrantes, entendeu que o paciente ofertou à penhora safra futura de café, estipulada em 1.670 sacas em cédula de crédito rural. Assim, concluiu que o descumprimento do encargo levou à caracterização do depositário infiel, autorizando o decreto de prisão. O impetrante assevera ser incabível o decreto de prisão por infidelidade no cumprimento do encargo de depositário judicial de safra futura. O Min. Relator ressaltou que, apesar de a safra futura de café ter sido ofertada à penhora pelo próprio paciente, esse fato, por si só, não é capaz de tornar incólume de revisão a decretação de prisão sancionada pelo Tribunal indigitado. O entendimento deste Superior Tribunal tem chancelado a penhora de bem fungível e aplicado a pena de prisão ao depositário judicial infiel. Todavia, no presente caso, há a figura de depósito de coisa futura, a safra de café não colhida à época da penhora. Aqui, o tratamento é diferenciado: a infidelidade do depósito de safra futura, mesmo que judicial, não autoriza a pena de prisão civil. Precedentes citados: RHC 13.600-MS, DJ 18/8/2003; RHC 15.907-SP, DJ 16/11/2004; RHC 17.900-DF, DJ 10/10/2005, e HC 26.639-SP, DJ 1º/3/2004. HC 88.308-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 7/2/2008.
AÇÃO. COBRANÇA. SEGURO. VIDA. A recorrente, que já não vivia maritalmente há cinco anos, pretende ser considerada beneficiária do seguro de vida em razão do falecimento de servidor público municipal, alegando convivência marital na data do óbito. Mas sua pretensão foi negada porque o Tribunal de origem, analisando as provas produzidas, entendeu inexistente a condição de ex-companheira do falecido e, em conseqüência, negou-lhe o pagamento do seguro. Por isso, a justificação é apenas um meio de prova e não, como quer a recorrente, a própria demonstração cabal de que ela manteve união estável com o de cujus. Assim como os outros elementos considerados (testemunhas e documentos), a justificação foi livremente apreciada para se chegar à conclusão de não ter a recorrente direito ao seguro. Diante disso, a Turma não conheceu do recurso. Precedente citado: AgRg no REsp 628.937-RJ, DJ 27/3/2006. REsp 793.182-RS, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 7/2/2008.
JUROS. CAPITALIZAÇÃO. CC/2002. A Turma reiterou o entendimento tomado no julgamento do REsp 890.460-RS, nota constante deste mesmo Informativo. Na espécie, no que concerne à capitalização mensal dos juros, entende o Min. Relator que a matéria está a merecer reflexão mais aprofundada, diferentemente das matérias de enfrentamento corriqueiro nos órgãos julgadores deste Superior Tribunal. No caso, o acórdão recorrido preteriu o art. 5º da MP n. 1.963-17/2000 (2.170-36/2001), com vigência a partir de 30/3/2000, ao art. 591 do novo Código Civil, que entrou em vigor em 11/1/2003, para estabelecer a periodicidade anual dessa parcela. A Lei n. 4.595/1964, que disciplina o Sistema Financeiro Nacional, com status de lei complementar, não aborda a questão da capitalização dos juros. Assim, o encargo desde há muito encontrava regulação no art. 4º da Lei de Usura, Decreto n. 22.626/1933 (Súm. n. 121-STF). No precedente decorrente do julgamento do REsp 680.237-RS, DJ 15/3/2006, alusivo aos juros remuneratórios, dois foram os fundamentos: o primeiro, de que a Lei n. 4.595/1964 possui caráter de lei complementar. O segundo, que contém disposições especiais de modo que prevalece, ainda que mais antiga, sobre a lei de caráter geral, inespecífica, do Sistema Financeiro Nacional, caso do Código Civil vigente. No que tange à MP n. 1.963-17/2000 (2.170-36/2001), evidente que o primeiro fundamento não se aplica. Porém, entendeu o Min. Relator que o segundo sim, por se direcionar às “operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional”, especificidade que a faz prevalente sobre o Código Civil atual, que não a revogou expressamente e não é com ele incompatível, porque é possível a coexistência por aplicável aos contratos civis em geral (art. 2º, § 1º, da LICC). Na verdade, a hipótese é a do parágrafo 2º do art. 1º. Tem-se, assim, que a partir de 31/3/2000 é facultado às instituições financeiras, em contratos sem regulação em lei específica, desde que expressamente contratado, cobrar a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual, direito que não foi abolido com o advento da Lei n. 10.406/2002. Precedentes citados: REsp 890.460-RS, REsp 821.357-RS, DJ 1º/2/2008, e AgRg no REsp 714.510-RS, DJ 22/8/2005. REsp 906.054-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 7/2/2008.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

O MAIS RECENTE ARTIGO DO NOVO PROFESSOR DA USP.

CONTRATO ADMINISTRATIVO E BOA-FÉ OBJETIVA.
José Fernando Simão

Não são poucas as vezes que, quando lecionamos os princípios contratuais, seja em curso de graduação, pós-graduação, ou preparatório para concursos públicos, que surge uma questão por parte dos alunos: os princípios contratuais previstos no Código Civil se aplicam aos contratos administrativos? Em caso afirmativo, como fica a supremacia do interesse público?

Ressaltamos que a idéia de escrever o presente artigo decorre de julgado enviado pelo Professor Flávio Tartuce ao grupo de estudos Professora Giselda Hironaka e que será analisado a seguir.

I – Os princípios

Primeiramente, cabe explicar quais são os princípios contratuais tradicionais e aqueles ditos sociais e que constam do Código Civil de 2002.

Classicamente, a doutrina arrola como princípios dos contratos a autonomia privada, sua força obrigatória, o consensualismo e a relatividade dos seus efeitos.

Por autonomia privada entende-se o poder que as partes têm de contratar e suscitar, mediante a declaração de vontades, efeitos reconhecidos pela lei. É correto afirmar que o contrato reflete a vontade das partes e seu poder de auto-regulamentação ao qual a lei empresta sua força coercitiva.

Já a idéia de consensualismo significa que basta o simples consentimento, como regra, para que o contrato se forme. Trata-se da superação do formalismo reinante em momentos históricos anteriores, épocas em que o contrato só adquiria a sua força obrigatória se cumprida a solenidade.

Afirma-se, também, que o contrato somente vincula aqueles que dele participaram, sendo, portanto, res inter allios, não obrigando ou prejudicando terceiros estranhos à relação jurídica. Como é sabido, o contrato somente poderá beneficiar terceiros, razão pela qual o Código Civil trata da estipulação em favor de terceiros. Estamos diante da relatividade do contrato.

Sobre os princípios tradicionais recomendamos a leitura de nossa obra Série Leituras Jurídicas, Editora Atlas, v. 5 – CONTRATOS.

O Código Civil de 2002 cuida também de dois novos princípios: a boa-fé objetiva e a função social do contrato.

A função social do contrato está prevista no art. 421 do CC que assim dispõe:

Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

Flávio Tartuce conceitua função social do contrato como um regramento contratual de ordem pública, (art. 2.035, parágrafo único, do Código Civil), pelo qual o contrato deve ser, necessariamente, analisado e interpretado de acordo com o contexto da sociedade, e explica que não se pode afastar o fundamento constitucional deste preceito, pois está intimamente ligado à dignidade da pessoa humana (A função social dos contratos, 2007, p. 248).

Dois são os desdobramentos da função social: na relação entre as partes contratantes e na relação dos contratantes com terceiros. É de se salientar, que nem toda a doutrina aceita esse dúplice desdobramento do tema. Enquanto Antonio Jeová dos Santos, Fernando Noronha e Sílvio de Salvo Venosa só admitem a eficácia interna, Teresa Negreiros e Humberto Theodoro Júnior só admitem a eficácia externa. Por outro lado, admitem ambas eficácias Maria Helena Diniz, Paulo Luiz Netto Lobo, Paulo Nalin, Nelson Nery Jr, Judith Martins-Costa (TARTUCE,2007:246,247). Para aprofundamento do tema recomendamos o livro de Flávio Tartuce, A função social dos Contratos do CDC ao novo CC, Editora Método, 2ª edição, 2007.

A boa-fé objetiva vem prevista no art. 422 do CC:

Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Explica Sílvio de Salvo Venosa (Direito civil, 2003, v. 2, p. 378) que, para a análise da boa-fé objetiva, o intérprete parte de um padrão de conduta comum, do homem médio, no caso concreto. É um dever de agir de acordo com determinados padrões sociais estabelecidos e reconhecidos.

As noções de agir corretamente com o próximo, ou seja, de honrar a palavra dada, de não causar prejuízos desnecessários a outrem, de cooperação para com o outro contratante, refletem o conceito de norma ética de conduta, segundo os padrões do homem médio. Trata-se de uma norma impositiva de conduta leal, geradora de um dever de correção que domina o tráfego negocial (Judith MARTINS-COSTA, Comentários ao novo CC, v. 5, 2003, p. 46).

II – O julgado

O Superior Tribunal de Justiça julgava mandado de segurança impetrado contra ato de autoridade militar que aplicou a penalidade de suspensão temporária de participação em licitação devido ao atraso no cumprimento da prestação de fornecer os produtos contratados (REsp 914.087/RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04.10.2007, DJ 29.10.2007 p. 190).

A penalidade administrativa de suspensão temporária em participação em licitações decorreu do fato de a empresa impetrante ter um contrato firmado com a Administração Pública para o fornecimento de 48.000 fogareiros, no valor de R$ 46.080,00 com entrega prevista em 30 dias. Entretanto, o cumprimento integral do contrato não ocorreu no prazo avençado, mas sim de forma parcelada em 60 e 150 dias, com informação prévia à Administração Pública das dificuldades enfrentadas em face de problemas de mercado.

Em razão desse inadimplemento relativo, que em termos de direito civil é classificado como mora, pois os fogareiros, apesar de entregues extemporaneamente ainda era úteis à Administração, gerou a sanção de suspensão temporária em licitações.

Interessantes as razões invocadas pelo Ministro Relator, José Delgado, para conceder a segurança pleiteada e afastar a suspensão imposta.

Diz o Ministro que “ademais, como ficou patenteado nos autos, houve mero atraso no cumprimento das prestações pela impetrante, sendo certo que a própria Administração militar recebeu parte dos produtos fornecidos sem qualquer ressalva, o que pressupõe algum tipo de moratória concedida para o adimplemento total da obrigação”.

Note-se que, de início afasta a possibilidade de um comportamento contraditório (venire contra factum proprium) da Administração Pública. Se aceitou os fogareiros, ainda que fora do prazo contratual, sem qualquer ressalva (primeiro comportamento) seria comportamento contraditório aplicar alguma penalidade à empresa na seqüência (segundo comportamento).

Sobre o tema explica MENEZES CORDEIRO que venire contra factum proprium significa o exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente pelo exercente (Da boa-fé no direito civil, 2001, p. 742). Tem como requisito a existência de dois comportamentos lícitos de uma mesma pessoa, separados por determinado lapso temporal, sendo que o segundo comportamento contraria o primeiro. A vinculação entre o instituto do venire e a boa-fé objetiva foi objeto do seguinte enunciado da IV Jornada de Direito Civil:

“Enunciado 362 - Art. 422. A vedação do comportamento contraditório (venire contra factum proprium) funda-se na proteção da confiança, tal como se extrai dos arts. 187 e 422 do Código Civil”

Ainda, aplicada a boa-fé objetiva para vedar um comportamento contraditório da Administração, prossegue o Ministro José Delgado:

“Na contemporaneidade, os valores e princípios constitucionais relacionados à igualdade substancial, justiça social e solidariedade, fundamentam mudanças de paradigmas antigos em matéria de contrato, inclusive no campo do contrato administrativo que, desse modo, sem perder suas características e atributos do período anterior, passa a ser informado pela noção de boa-fé objetiva, transparência e razoabilidade no campo pré-contratual, durante o contrato e pós-contratual. Assim deve ser analisada a questão referente à possível penalidade aplicada ao contratado pela Administração Pública, e desse modo, o art. 87, da Lei nº 8.666⁄93, somente pode ser interpretado com base na razoabilidade, adotando, entre outros critérios, a própria gravidade do descumprimento do contrato, a noção de adimplemento substancial, e a proporcionalidade.” (sublinhamos).

Dessa forma, resta claro que o Superior Tribunal de Justiça acolhe, também para o contrato administrativo os princípios sociais do Código Civil de 2002. Antes de ser administrativo ou civil, estamos diante de um contrato. E se nos perguntarem como fica o princípio da supremacia do interesse público, a resposta é uma só: cabe ao aplicador do direito valer-se da ponderação de princípios caso aja choque entre eles.

JOSÉ FERNANDO SIMÃO É PROFESSOR DOUTOR DA USP!!!

Prezados Amigos e Amigas,

Gostaria de informar que, na tarde de ontem, o amigo José Fernando Simão tornou-se Professor Doutor do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

A aprovação se deu em concurso do qual participaram onze candidatos.
A banca do concurso foi composta pelos Professores Rodolfo de Camargo Mancuso (presidente), Alvaro Villaça Azevedo, Ivete Senise Ferreira, Silmara Juny Chinelato e Heleno Taveira Torres.

Abraços a todos,

Flávio Tartuce

STJ. JUROS. LAMENTÁVEL...

FONTE: STJ
Novo Código Civil não rege capitalização de juros nos contratos bancários
As instituições bancárias podem capitalizar juros por períodos inferiores a um ano, ainda que o contrato de financiamento tenha sido firmado após a vigência do novo Código Civil, a partir de janeiro de 2003.
As Turmas julgadoras que compõem a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar em dois recursos especiais sobre o tema, decidiram que a nova lei não revogou nem modificou a lei anterior que disciplina os contratos do Sistema Financeiro Nacional no que diz respeito à limitação de juros.
Por isso, em contratos a partir de 30 de março de 2000, vale o artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, que afasta a imposição do limite anual à capitalização de juros, não se aplicando o artigo 591 do Código Civil.
A capitalização de juros corresponde à prática mediante a qual juros são calculados sobre os próprios juros devidos em contratos de empréstimos ou financiamentos bancários, por exemplo. Com a orientação amplamente majoritária fixada pela Terceira e pela Quarta Turma, em termos práticos, esse passa a ser o entendimento pacificado que deverá prevalecer nos julgamentos futuros sobre o tema que venham a ocorrer na Segunda Seção do STJ. No julgamento mais recente (REsp 890.460), a Quarta Turma atendeu a recurso do banco ABN Amro Real S.A. para que valesse a regra pactuada em contrato, de capitalização de juros mensal, para um financiamento firmado em 30 de outubro de 2003. O voto do relator, ministro Aldir Passarinho Junior, foi seguido por unanimidade na Turma. Os ministros entenderam que, “mesmo para os contratos de agentes do Sistema Financeiro Nacional celebrados posteriormente à vigência do novo Código Civil, que é lei ordinária, os juros remuneratórios não estão sujeitos à limitação, devendo ser cobrados na forma em que ajustados entre os contratantes”.
Isso quer dizer que prevalece a regra especial da medida provisória que admite a capitalização mensal.
A posição do STJ reformou a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) sobre o tema, anteriormente aplicada ao caso em análise. Na Terceira Turma, o tema foi interpretado da mesma maneira, ao analisar outro recurso especial vindo do Rio Grande do Sul (REsp 821357).
Um voto-vista do ministro Ari Pargendler, acompanhado pela maioria, declarou a exigibilidade da capitalização mensal dos juros pactuada em contrato entre o ABN Amro Real S.A. e um cliente. O cliente havia ingressado na Justiça com ação revisional de contrato de financiamento. Entre outros pontos, ele contestava a cobrança de juros capitalizados mensalmente. Em primeiro grau, acerca desse aspecto, a sentença determinou que a capitalização fosse anual. O banco apelou ao TJ-RS, mas não conseguiu reverter a decisão. No STJ, na Terceira Turma, o relator do recurso, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF), entendeu que o artigo 591 do novo Código Civil teria revogado a MP 2.170-36. Para ele, o novo código não seria uma norma geral em relação à MP, devendo ser aplicada a limitação anual. Ocorre que os demais ministros acompanharam o voto-vista do ministro Pargendler, que divergiu neste aspecto, assegurando a capitalização mensal, conforme pretendido pelo banco e estabelecido em contrato. REsp 890460 REsp 821357