segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

SORTEIO NO PERISCOPE. DIA 3 DE FEVEREIRO




Prezados Amigos do Blog. 
Acabo de entrar no aplicativo Periscope e no próximo dia 3 de fevereiro, às 16 horas, farei meu primeiro vídeo, de boas-vindas, com sorteio da minha obra Direito Civil, Volume 2, que trata da Teoria Geral das Obrigações e da Responsabilidade Civil (12ª Edição).
A partir de agora pretendo fazer vídeos semanais, às sextas-feiras, com os seguintes conteúdos:
- Dicas para provas, como o exame da OAB e concursos públicos.
- Plantões de dúvidas para alunos de graduação nas semanas de provas das Faculdades.
- Esclarecimentos sobre conteúdo dos meus livros, para alunos e professores.
- Recomendações e dicas práticas para os advogados que iniciam sua carreira no contencioso cível.
Não perca tempo, seja meu seguidor no aplicativo (@flaviotartuce).
Abraços a todos.
Professor Flávio Tartuce

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

OS QUINZE ANOS DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO E AS RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE. COLUNA DO MIGALHAS DE JANEIRO DE 2017

OS QUINZE ANOS DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO E AS RELAÇÕES FAMILIARES NA CONTEMPORANEIDADE[1]



Flávio Tartuce[2]



O vigente Código Civil completou, no último dia 10 de janeiro, quinze anos de promulgação, ou seja, debutou-se no plano jurídico e social brasileiro. Entre avanços e retrocessos, a realidade é que tanto o livro de Direito de Família quanto o de Direito das Sucessões sempre foram os mais criticados da nossa Lei Geral Privada. Tanto isso é verdade que, em todo o seu período de vigência, numerosas foram as alterações promovidas tanto no plano legislativo quanto no jurisprudencial.
No âmbito da legislação do Direito de Família, cabe destacar, brevemente e em resumo: a) a Lei n. 11.441/2007, que tratou da separação, do divórcio e do inventário extrajudiciais, por escritura pública, desjudicializando-os; b) as Leis n. 11.698/2008 e n. 13.058/2014, que regularam e introduziram a obrigatoriedade da guarda compartilhada – ou alternada, ainda não se sabe ao certo –, além da possibilidade da ação de prestação de contas de alimentos, nos arts. 1.583 e 1.584 do CC/2002; c) a Lei n. 12.010/2009, que modificou sobremaneira o sistema de adoção – ainda que de forma insuficiente –, concentrando-o no Estatuto da Criança e do Adolescente, e excluindo-o da codificação privada; d) a Emenda do Divórcio (EC 66/2010), que retirou os prazos mínimos para o divórcio e iniciou um debate ainda não concluído quanto ao fim da separação de direito (incluindo a separação judicial e a extrajudicial); e) o Estatuto da Pessoa com Deficiência, norma regulamentadora da Convenção de Nova Iorque, que alterou substancialmente a teoria das incapacidades e a situação da pessoa com deficiência, incluindo-a plenamente para os atos existenciais familiares e substituindo o paradigma da dignidade-vulnerabilidade pela dignidade-igualdade; e f) Novo Código de Processo Civil que, entre outras normas, tratou das Ações de Família, (pouco) alterou o regime dos alimentos, reafirmou de forma inconstitucional a separação de direito e atropelou o Estatuto da Pessoa com Deficiência, em alguns dos seus aspectos.
Na jurisprudência superior, seja do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, é imperioso destacar, nos últimos quinze anos: a) o reconhecimento do afeto como valor jurídico e como princípio do Direito de Família Brasileiro, em vários julgados, inclusive em alguns a seguir mencionados; b) o amparo da união homoafetiva como entidade familiar, equiparada à união estável heteroafetiva (ADPF 132/RJ, julgada pelo STF em 2010); c) a admissão do casamento homoafetivo, como decorrência da decisão anterior, o que acabou por influenciar todos os Tribunais Estaduais e o Conselho Nacional de Justiça (por todos: STJ, REsp. 1.183.378/RS, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, de outubro de 2011); d) o amparo ao direito de indenização por abandono afetivo (STJ, REsp. 1.159.242/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, de abril de 2012); e) o amplo reconhecimento da parentalidade socioafetiva como forma de parentesco civil, o que culminou com o julgamento do STF sobre o tema, com repercussão geral, admitindo-se até o duplo vínculo parental ou multiparentalidade (publicado no Informativo n. 840 da Corte, de setembro de 2016); f) a equiparação sucessória da união estável ao casamento, o que deve trazer a mesma conclusão para os fins familiares (julgamento iniciado pelo STF em agosto de 2016, já com sete votos).
Como se pode perceber, seja pela lei, seja pela jurisprudência – sem falar na doutrina, que geralmente está anos à frente de ambas, especialmente no âmbito do Direito de Família –, o caminho foi atribulado, instável, sem muita certeza ou perpetuidade. Em verdade, esta seara do Direito Privado é assim, mutável por natureza, pelas constantes mudanças dos costumes e do modo de vida das pessoas. Talvez por isso seria interessante descodificar o tema e inseri-lo em um Estatuto próprio, como quer o IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família). Aliás, muitas das alterações aqui mencionadas tiveram a contribuição, direta ou indireta, dessa instituição. Como sempre afirma Zeno Veloso, em suas brilhantes aulas e palestras, existem dois “Direitos de Família no Brasil, um antes e outro depois do IBDFAM”.
E como será o futuro? Como serão os próximos quinze anos? Penso que de mais e mais mudanças, estruturais e funcionais. Como escrevi neste canal, 2016 foi o ano da afetividade no plano da jurisprudência superior. E já neste início de 2017, chamou muita a atenção e gerou debates o interessante texto de José Fernando Simão, em que trata juridicamente do “Sugar Daddy”, da “Sugar Baby” e do site Meu Patrocínio. Como destaca o jurista, “Sugar – açúcar em inglês – e daddy – papai — são duas palavras que, somadas, indicam que o homem, mais velho e, por isso, papai, se dispõe a ‘bancar’ mulher mais jovem. Não se trata de um site de prostituição em que homens, após manutenção de relação sexual, pagam pelos serviços prestados. É uma relação em que o homem mais velho tem prazer em se relacionar com mulher mais jovem que gosta de ser mimada, ganhar presentes, viajar, comer em bons restaurantes, sair para lugares chiques. Já o homem mais velho, normalmente em uma fase da vida pela qual poucas mulheres mais jovens sentem atração, paga para ela e proporciona alguns luxos, prazeres que a ela estariam negados em razão do custo” (ver em http://flaviotartuce.jusbrasil.com.br/artigos/417619840/sugar-daddy-e-sugar-baby-transparencia-nas-relacoes-afetivas-parte-1).
Ainda segundo Simão, tal relacionamento demonstra a transparência das relações contemporâneas, pois as partes já sabem de antemão como este se dará: “transparência significa que as partes não ocultam seus interesses. Ela não quer uma relação amorosa, nem ele. São pessoas que buscam companhia e convívio com regras bem claras: ‘Tudo é combinado, sem mal-entendidos’”. Para ele, em continuidade, dois aspectos da pós-modernidade são claros nessas relações.
O primeiro deles é que muitas pessoas buscam diversas formas de prazer, além dos modelos tradicionais: “não é necessário buscar o prazer apenas no sexo, apenas no namoro, apenas no casamento, apenas nas viagens, apenas nos restaurantes e nos presentes”. O segundo aspecto diz respeito aos novos arranjos afetivos, a busca de novos modelos de agrupamento. Nesse contexto, concordo com ele que “o modelo construído para os relacionamentos heterossexuais e copiados pelas famílias homoafetivas de casamento ou união estável é um modelo decadente e em franca mudança”.
Não se pode negar que é natural o pleito jurídico de que os modelos de afeto passem a ser reconhecidos como modelos de família. Foi assim com os filhos havidos fora do casamento, com as famílias reconstituídas, com as uniões homoafetivas e com os filhos socioafetivos. O pleito atual diz respeito às famílias poliafetivas, questão que deve ser julgada em breve no âmbito do Supremo Tribunal Federal, como tenho pontuado.
Eventualmente, os relacionamentos com açúcar podem gerar efeitos familiares, especialmente se algum filho nascer da relação. Como decidiu o Superior Tribunal de Justiça, em outra decisão de impacto, o ficar pode gerar efeitos jurídicos. Nos termos da sua ementa, “a recusa do investigado em se submeter ao teste de DNA implica a inversão do ônus da prova e consequente presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor. Verificada a recusa, o reconhecimento da paternidade decorrerá de outras provas, estas suficientes a demonstrar ou a existência de relacionamento amoroso à época da concepção ou, ao menos, a existência de relacionamento casual, hábito hodierno que parte do simples 'ficar', relação fugaz, de apenas um encontro, mas que pode garantir a concepção, dada a forte dissolução que opera entre o envolvimento amoroso e o contato sexual” (REsp. 557.365/RO, Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em abril de 2005).
Por tudo isso, e por outros afetos, o futuro nos reserva muitos debates, muitos desafios, sendo necessário, por certo, fazer novas adaptações no Código Civil


[1] Coluna do Informativo Migalhas, de janeiro de 2017. 
[2] Doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUCSP. Professor titular permanente do programa de mestrado e doutorado da FADISP. Professor e Coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensu da EPD. Professor da Rede LFG. Diretor do IBDFAM – Nacional e vice-presidente do IBDFAM/SP. Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico. 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

SUGAR DADDY E SUGAR BABY: TRANSPARÊNCIA NAS RELAÇÕES AFETIVAS. PARTE 2. ARTIGO DE GISELLE CÂMARA GROENINGA

"Sugar daddy" e "sugar baby": transparência nas relações afetivas. PARTE 2.
Giselle Groeninga. Doutora em Direito Civil pela USP. Professora do curso de pós-graduação em Direito de Família e Sucessões da Escola Paulista de Direito. Diretora Nacional do IBDFAM. Psicanalista.

Fonte: CONJUR. 

José Fernando Simão, em provocativa coluna, abordou a “transparência nas relações afetivas” tomando como exemplo um site de relacionamento no qual um homem mais velho se dispõe a “bancar” uma mulher mais jovem.
A transparência das relações estaria na clareza quanto à especificação dos interesses: por parte dos homens a companhia das mulheres mais jovens, e por parte delas os mimos, o apoio financeiro e/ou emocional. Esclarece que não se trata de site de prostituição por não envolver pagamento por serviços sexuais.
Como apontado pelo jurista na primeira parte, o site reflete aspectos da pós-modernidade ou, ainda segundo o filósofo francês Gilles Lipovetsky, hipermodernidade, que coloca a leveza, o efêmero, a estética, mas também o vazio como característicos destes novos tempos. 
José Fernando Simão, distinguiu três marcas destes novos tempos.
A primeira marca seria a de que as pessoas buscam diversas formas de prazer, além das formas tradicionais. Sim, vivemos tempos de maior liberdade, diversidade e criatividade. Mas estes são também tempos um tanto confusos e de angústia, em que o prazer e o imediatismo sedutoramente tomam o lugar dos relacionamentos menos líquidos, utilizando o termo do filósofo recentemente falecido Zigmunt Bauman, pautados nos investimentos afetivos duradouros que estes requerem.
E o site neste sentido é claro. A transparência no relacionamento significa que nenhum dos dois quer uma relação amorosa. Há inclusive um vídeo com os dizeres “namoro não” em que o relacionamento sugar, açúcar, mostra ambos felizes em situações leves de jantares, viagens e presentes, com a mulher vestida como princesa. Relacionamento sugar contraposto ao do namoro, em que as fisionomias demonstram insatisfação. E é de se imaginar como seria a contraposição do relacionamento sugar com as relações familiares...
O que se vende, no caso, está no sonhado virtual, de “contratos” claros, sem manifestamente haver outras expectativas. Dito de outro modo, relacionamentos mais leves e, necessariamente, afetivamente parciais.
A segunda marca da hipermodernidade estaria em novos modelos. Segundo José Fernando Simão, aquele construído nos relacionamentos heterossexuais, e copiado pelas famílias homoafetivas, seria um modelo decadente e em franca mudança. Tenho a acrescentar que nestes novos tempos, na realidade, convivem lado a lado os diversos modelos, e do meu ponto de vista somente podem ser considerados decadentes aqueles que impõem restrições à liberdade, em tempos que privilegiam as escolhas.
Os modelos mais tradicionais são pautados na comunhão de vidas, em que está presente o desejo propriamente dito (de, privação, mais sidus, estrela, o que alude à vontade do sujeito de obter algo que lhe falta mas que é impossível de satisfação[1]). Estes modelos caracterizam-se também por relações afetivas que contemplam a satisfação e a insatisfação, por valores morais, e pela busca da continuidade. É o modelo que subjaz à construção das famílias.
Já os novos modelos seriam aqueles centrados na comunhão parcial de alguns interesses, não necessariamente duradouros, e mais centrados no prazer e nas necessidades. Um modelo que contempla relações mais parciais, menos profundas e mais efêmeras e, às vezes talvez, mas não necessariamente, mais desumanizadas.
A terceira marca seria a da transparência, exemplificada nos aplicativos de relacionamentos que exigem que o utilizador seja direto: o que quer, quando quer e em que condições quer.
Segundo a ótica do jurista, o site exemplificaria a vontade de estar junto e nada mais. E, poderíamos parar por aqui pensando que assim como se dizia que “o que não está nos autos não está no mundo”, o que o que não está claramente especificado no contrato não estaria no mundo das relações que dizem respeito ao Direito.
Mas sabemos que há sempre mais do que entrelinhas nos “contratos”, que as expectativas em muito transcendem seus termos manifestos e, ainda, que a dita transparência não nos exime de questionar se há equilíbrio entre os poderes que se manifestam nos interesses presentes nas relações.
Como apontado na primeira parte, o interesse (inter, entre, mais est, ser, aludindo à ao ser, existir, na convivência com o outro[2]) sempre está presente nas relações. E é importante desmistificá-lo. Sendo palavra avalorativa, podemos retirar daqueles que são interesses econômicos um caráter nem mais nem menos louvável do que outros como, por exemplo, a companhia e leveza, receber mimos, ter apoio emocional — interesses que tocam mais à esfera afetiva, ou mesmo interesses da ordem da sexualidade propriamente dita.
A desmistificação do conceito de interesse nos coloca, assim, no caminho de enfrentar a dificuldade que temos em considerar de forma imparcial interesses de ordem distinta. Em geral, julgamos o relacionamento entre um homem mais velho com boa situação financeira com uma mulher mais jovem de forma desvalorativa apenas quanto ao interesse da mulher, inclusive “esquecendo” do outro polo do interessado na relação: o homem. É como se este fosse vítima, não responsável, por cair na sedução feminina.
Mas não só os interesses que estão presentes em todas as relações. Elas implicam necessariamente questões relativas ao poder.
No caso da proposta do site o interesse dos homens se alia ao poder do dinheiro e da idade, o interesse das mulheres se alia ao poder da sedução da juventude e da estética.
Duas formas de exercício de poder que transcendem o sexo biológico e que tocam às questões de gênero, socialmente determinadas e fruto, também, das formas de estruturação e exercício de poder na sociedade. E é inegável que estas formas ainda estão muito distantes do ideal de igualdade.
Acrescento, ainda, uma quarta marca destes novos tempos – a do paradoxo. Inevitavelmente as relações, que como vimos envolvem interesse e poder, também sempre encerram expectativas, conscientes ou não. Queiramos ou não, somos seres temporais e desejantes, para além da satisfação de meras necessidades. Assim, acaba por ser um tanto contraditória a ideia de “estar junto e nada mais”.
Finalmente, não poderia deixar de apontar que a expressão “transparência nas relações” também é paradoxal. Por leves, efêmeras, tanto quanto possível despidas de expectativas não claras, as relações têm sempre substância e significado. E, de alguma forma, as experiências mesmo que efêmeras deixam marcas na psiquê, ainda que sejam da ordem do vazio, da insatisfação. E esta, por sua vez, impulsiona com força crescente a paradoxal busca por .... sites de relacionamento.

[1] ZIMERMAN, David, E. Vocabulário Contemporâneo de Psicanálise. Porto Alegre: ARTMED Editora. 2001. p. 102
[2] ZIMERMAN, David, E. Vocabulário Contemporâneo de Psicanálise. Porto Alegre: ARTMED Editora. 2001. p. 220.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

PENHORA DO BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR DA LOCAÇÃO. ARTIGO DE MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO

AINDA SOBRE A PENHORABILIDADE DO IMÓVEL DE MORADIA DO FIADOR NA LOCAÇÃO IMOBILIÁRIA URBANA

Marco Aurélio Bezerra de Melo. Desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Mestre em Direito pela Estácio. Professor da EMERJ.

Cumprindo o comando constitucional da proteção à dignidade humana (art. 1º, III, CF) e, mais tarde, o direito à moradia como direito social básico (art. 6º, CF com a redação da EC 26/2000), a lei 8009/90, norma de ordem pública e, portanto, inderrogável pela vontade das partes, tornou impenhorável o bem imóvel que serve de moradia ao cidadão, assim como as acessões, benfeitorias e pertenças que guarnecem a residência, excepcionados os adornos suntuosos ou de luxo, pertencentes ao executado.
Em 1991, por acréscimo trazido pela lei 8245, incluiu-se o inciso VII no rol de exceções da impenhorabilidade a que alude o artigo 3º da citada lei 8009/90. Trata-se da polêmica previsão da fiança locatícia imobiliária urbana, a indicar que nessa modalidade de garantia fidejussória, o fiador que tenha um único imóvel que lhe serve de única moradia poderá vir a perdê-lo se o locatário não cumprir com a sua obrigação perante o locador.
O Supremo Tribunal Federal, na pena do emérito Ministro Carlos Velloso[1], em decisão monocrática proferida no ano de 2005, reconheceu a inconstitucionalidade da lei por duplo fundamento: ofensa ao direito de moradia e à isonomia. Significativo se mostra o seguinte trecho da referida decisão:
Posto isso, veja-se a contradição: a Lei 8.245, de 1991, excepcionando o bem de família do fiador,sujeitou o seu imóvel residencial, imóvel residencial próprio do  casal, ou da entidade familiar, à penhora. Não há dúvida que ressalva trazida pela Lei 8.245, de 1991, inciso VII do art. 3º feriu de morte o princípio isonômico, tratando desigualmente situações iguais, esquecendo-se do velho brocardo latino: ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio, ou em vernáculo: onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de Direito. Isto quer dizer que, tendo em vista o princípio isonômico, o citado dispositivo inciso VII do art. 3º, acrescentado pela Lei 8.245/91, não foi recebido pela EC 26, de 2000. Essa não recepção mais se acentua diante do fato de a EC 26, de 2000, ter estampado, expressamente, no art. 6º, C.F., o direito à moradia como direito fundamental de 2ª geração, direito social. Ora, o bem de família Lei 8.009/90, art. 1º encontra justificativa, foi dito linha atrás, no constituir o direito à moradia um direito fundamental que deve ser protegido e por isso mesmo encontra garantia na Constituição. Em síntese, o inciso VII do art. 3º da Lei 8.009, de 1990, introduzido pela Lei 8.245, de 1991, não foi recebido pela CF, art. 6º, redação da EC 26/2000.”.
Na doutrina, importantes vozes defendem a tese da inconstitucionalidade da norma[2], mas o fato é que o entendimento majoritário na jurisprudência tem sido pela constitucionalidade.
No Supremo Tribunal Federal, a tese da inconstitucionalidade não fez eco. Após a citada decisão monocrática, o Pleno, ainda que por maioria, vencidos os Ministros Carlos Britto, Eros Grau e Celso de Mello, entendeu pela constitucionalidade da norma especial[3]. No Superior Tribunal de Justiça, a questão acabou sendo afetada pelo regime de recursos repetitivos e a egrégia Segunda Seção, na esteira de antigo verbete aprovado por maioria no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro[4], entendeu que “é válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.”. (Súmula 549, Segunda Seção, julgado em 14/10/2015, DJe 19/10/2015).
É óbvio que o fundamento jurídico da tese majoritária na jurisprudência está blindado pelos melhores propósitos de incrementar a oferta de imóveis para a locação, notadamente para fins residenciais, mas trata-se, em nosso modo de sentir, de um grande equívoco dos poderes legislativo e judiciário, animado por argumentos ad terrorem do fundamental mercado imobiliário, no sentido de que os locadores preferirão deixar os imóveis vazios ou que sem essa regra não haverá garantia na locação, aumentando ainda mais o déficit habitacional como se este tivesse como causa a penhorabilidade do imóvel de moradia do fiador.
Com todo respeito às opiniões em contrário, na legalidade constitucional que prima pela isonomia, direito à moradia em posição de supremacia em relação ao direito de crédito, tendo em vista a primazia da proteção da dignidade humana, não há espaço para tal construção jurídica.
Com relação ao direito à moradia a hipótese é de não recepção dessa parte da lei 8009/90 com a redação dada pela lei do inquilinato, pois há uma demonstração explícita do afastamento do direito social à moradia, particularizada a um contratante e em atenção ao interesse privatista do locador, desprestigiando os paradigmas da justiça social.
Entretanto, mais eloquente é a inconstitucionalidade por falta de isonomia. Como se justifica que o locatário seja titular do direito à moradia e tenha o seu único imóvel para fins de moradia impenhorável e o responsável que não tem o dever primário de pagamento do aluguel não possa se socorrer de tal direito? Sobre esse ponto, perverso tem se mostrado o entendimento da jurisprudência sobre a penhorabilidade do único imóvel de moradia do locatário na ação fundada no direito de sub-rogação. Sob o justificável argumento de que não se pode conferir interpretação extensiva a normas que restringem direitos[5], os Tribunais[6], em maioria, têm rechaçado essa legítima pretensão do fiador contra o locatário.
Oxalá que a óbvia submissão do atual Código de Processo Civil à Constituição Federal (art. 1º) não seja obstaculizada pela preocupação com a estabilidade da jurisprudência e essa triste tese seja superada (overruling) com as cautelas propugnadas pelos parágrafos segundo, terceiro e quarto do artigo 927 da mesma lei.
A ignomínia da penhora do imóvel de moradia do fiador que tanto desespero tem levado a diversas famílias desde a entrada em vigor da atual lei do inquilinato há de cessar ou então que confessemos a nossa incompetência em dotar a locação imobiliária urbana de uma efetiva garantia aos locadores.
Há muitas possibilidades no ordenamento jurídico, mas pode existir um descaso mental diante de uma jurisprudência tão confortável para os interesses do locador e até mesmo do locatário que não será alvejado pela penhora de eventual imóvel de moradia de sua titularidade.



[1] RE nº 352.940/SP, julg. em 25/04/2005.
[2] Eliane Maria Barreiros Aina. O Fiador e o Direito à Moradia. Direito Fundamental à Moradia frente à Situação do Fiador Proprietário do Bem de Família. 2002, p. 123/124; Gildo dos Santos. Locação e Despejo. Comentários à lei 8.245/91. 4ª ed. 2001, p. 123/146; Flávio Tartuce. Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie. 10ª ed. 2015, p. 486/493; Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho. Contratos em Espécie. 6ª ed. 2013, p. 629/632; Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald. Contratos. 5ª ed. 2015, p. 1043/1044.
[3] Fiador. Locação. Ação de despejo. Sentença de procedência. Execução. Responsabilidade solidária pelos débitos do afiançado. Penhora de seu imóvel residencial. Bem de família. Admissibilidade. Inexistência de afronta ao direito de moradia, previsto no art. 6º da CF. Constitucionalidade do art.3º, inc. VII, da Lei nº 8.009/90, com a redação da Lei nº 8.245/91. Recurso extraordinário desprovido. Votos vencidos. A penhorabilidade do bem de família do fiador do contrato de locação, objeto do art. 3º, inc. VII, da Lei nº 8.009, de 23 de março de 1990, com a redação da Lei nº 8.245, de 15 de outubro de 1991, não ofende o art. 6º da Constituição da República
(RE 407688, Relator(a):  Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/02/2006, DJ 06-10-2006 PP-00033 EMENT VOL-02250-05 PP-00880 RTJ VOL-00200-01 PP-00166 RJSP v. 55, n. 360, 2007, p. 129-147).
[4] Súmula nº 63: “Cabe a incidência de penhora sobre imóvel único do fiador de contrato de locação, Lei nº. 8009/90 (art. 3º, VII) e Lei nº. 8245/91.” Referência: Súmula da Jurisprudência Predominante nº. 2001.146.00005. Julgamento em 24/06/2002. Relator: Desembargador Paulo Ventura. Votação por maioria. Registro do Acórdão em 14/08/2003.
[5] Defendendo a possibilidade de interpretação extensiva para alcançar o imóvel de moradia do locatário: Gabriel Seijo Leal de Figueiredo. Contrato de Fiança. 2010, p. 179/181.
[6] Ação de regresso, decorrente de fiança concedida em contrato de locação, em fase de cumprimento de sentença. Não estando caracterizada nenhuma das hipóteses previstas no art. 3º, da Lei 8.009/90, que trata das exceções à regra da impenhorabilidade, e estando evidenciado que o imóvel constrito é bem de família do executado, o levantamento da penhora é medida que se impõe. Recurso provido. (Relator(a): Gomes Varjão; Comarca: Diadema; Órgão julgador: 34ª Câmara de Direito Privado; Data do julgamento: 10/10/2016; Data de registro: 10/10/2016).

LANÇAMENTO. MANUAL DE DIREITO DO CONSUMIDOR. EDIÇÃO 2017



Prezados Amigos do Blog.
Foi lançada a Edição 2017 do Manual de Direito do Consumidor, que escrevo em coautoria com o Professor Daniel Amorim Assumpção Neves.
O livro analisa tanto o Direito Material quanto o Processual e tem sido muito utilizado no campo profissional, especialmente pelos julgadores nacionais.
Indico sobremaneira o livro para aqueles que estão iniciando a carreira na prática cível, especialmente para os advogados que atuam perante os Juizados Especiais Cíveis.
Abaixo o link para a aquisição da obra.
Abraços a todos.
Professor Flávio Tartuce

Manual de Direito do Consumidor - Volume Único
Flávio Tartuce e Danie AorimAssumpção Neves
6ª edição (2017) | 1.008 páginas
A obra analisa os principais conceitos da Lei 8.078/1990, tanto sob os aspectos materiais como processuais. A sua organização segue justamente a divisão metodológica constante da referida lei. Todos os dispositivos do Código do Consumidor importantes à seara material e processual estão devidamente comentados, acompanhados de posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais recentes, bem como da análise de exemplos práticos, retirados das experiências dos autores na atuação consultiva ou na docência.
O livro está atualizado de acordo com o CPC/2015 e é direcionado a todo o público jurídico, bem como o público em geral que tenha interesse em conhecer o Direito do Consumidor pátrio, em razão da clareza de linguagem e a forma como estão expostos os temas.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

REDE LFG. CURSO INTENSIVO II. 2017.1. DIVISÃO DE TEMAS E PROFESSORES.

REDE LFG. 2017.1. DIREITO CIVIL.


CURSO INTENSIVO II. TOTAL DE 22 AULAS.


MÓDULO 1. JANEIRO DE 2017. 


RESPONSABILIDADE CIVIL.  4 AULAS.


1. CONCEITOS INICIAIS DE RESPONSABILIDADE CIVIL. ATO ILÍCITO E ABUSO DE DIREITO. ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL. CONDUTA HUMANA, CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE. FLÁVIO TARTUCE.


2. ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTINUAÇÃO DE NEXO DE CAUSALIDADE. DANO. DANOS CLÁSSICOS E NOVOS DANOS.FLÁVIO TARTUCE.


3. CLASSIFICAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL QUANTO À CULPA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E OBJETIVA. PRINCIPAIS HIPÓTESES DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA.  FLÁVIO TARTUCE.


4. EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL. PABLO STOLZE.


MÓDULO 2.  MARÇO DE 2017.  



TEORIA GERAL DOS CONTRATOS. 4 AULAS.


1. CONCEITO DE CONTRATO E PRINCÍPIOS CONTRATUAIS. FLÁVIO TARTUCE.


2. PRINCÍPIOS CONTRATUAIS (CONTINUAÇÃO). FORMAÇÃO DO CONTRATO. CONTRATO PRELIMINAR. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. FLÁVIO TARTUCE.


3. REVISÃO DO CONTRATO, VÍCIOS REDIBITÓRIOS E EVICÇÃO. FLÁVIO TARTUCE.


4. EXTINÇÃO DOS CONTRATOS. FLÁVIO TARTUCE.


CONTRATOS EM ESPÉCIE. 4 AULAS.


1. COMPRA E VENDA. FLÁVIO TARTUCE. 


2. DOAÇÃO. FLÁVIO TARTUCE. 


3. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E EMPREITADA. JOÃO AGUIRRE.


4. EMPRÉSTIMO (COMODATO E MÚTUO) E FIANÇA.  FLÁVIO TARTUCE.



DIREITO DAS COISAS. 7 AULAS.


1. INTRODUÇÃO AO DIREITO DAS COISAS. INÍCIO DE POSSE. CONCEITO, OBJETO E TEORIAS JUSTIFICADORAS. DETENÇÃO. FLÁVIO TARTUCE.


2. POSSE. CLASSIFICAÇÕES E EFEITOS MATERIAIS. COMPOSSE. FLÁVIO TARTUCE.


3. PROPRIEDADE. CONCEITO, ATRIBUTOS E LIMITES. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. A DESAPROPRIAÇÃO JUDICIAL PRIVADA POR POSSE-TRABALHO E SUAS POLÊMICAS. FLÁVIO TARTUCE.


4. FORMAS DE AQUISIÇÃO E PERDA DA PROPRIEDADE. USUCAPIÃO. FLÁVIO TARTUCE.


5. CONDOMÍNIO.  FLÁVIO TARTUCE. 


6. DIREITOS REAIS DE GOZO OU FRUIÇÃO. SUPERFÍCIE, SERVIDÕES, USUFRUTO, USO, HABITAÇÃO E CONCESSÕES ESPECIAIS. ONLINE.  JOÃO AGUIRRE.


7. DIREITOS REAIS DE GARANTIA. ONLINEJOÃO AGUIRRE. 


DIREITO DAS SUCESSÕES. 3 AULAS.


1. DIREITO SUCESSÓRIO. CONCEITOS FUNDAMENTAIS, DISPOSIÇÕES GERAIS. CAPACIDADE SUCESSÓRIA. HERANÇA E SUA ADMINISTRAÇÃO. HERANÇA JACENTE E VACANTE. INDIGNIDADE E DESERDAÇÃO. PETIÇÃO DE HERANÇA.    JOÃO AGUIRRE


2. SUCESSÃO LEGÍTIMA. REGRAS FUNDAMENTAIS. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. FLÁVIO TARTUCE. 


3. CONTINUAÇÃO DE SUCESSÃO LEGÍTIMA E SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. FLÁVIO TARTUCE. 


sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

TJSP CONDENA MULHER POR ENGANO QUANTO À PROLE

Mulher indenizará ex-marido por esconder verdadeira paternidade de filha
Fonte: Migalhas
A 28ª câmara de Direito Privado do TJ/SP manteve decisão que condenou uma mulher a indenizar seu ex-marido por danos morais. Exame de DNA demonstrou que o autor do processo não é pai biológico de uma mulher que criou como se fosse sua filha. O valor da indenização foi fixado em R$ 39 mil.
Consta nos autos que a ré e o autor tiveram a filha em 1982. Em 2014 foi realizado teste de DNA, que revelou não ser ele o pai biológico, ao contrário do que dizia sua ex-esposa.
De acordo com o relator do processo, desembargador Ênio Santarelli Zuliani, a infidelidade não é a causa do dever de indenizar, e sim o engano ou o constrangimento de ser considerado o pai de filha de outrem, “motivo de deboche de quem sabe e esconde a trama de alcova e de comentários desairosos da sociedade”.
O pior é, ainda que desenvolvidas relações afetuosas entre o autor e a filha da ré, descobrir que não existe paternidade biológica, um aspecto frustrante para os caminhos da hereditariedade e da biografia familiar.”
O julgamento teve votação unânime.

domingo, 8 de janeiro de 2017

SUGAR DADDY E SUGAR BABY: TRANSPARÊNCIA NAS RELAÇÕES AFETIVAS (PARTE 1). ARTIGO DE JOSÉ FERNANDO SIMÃO

Sugar daddy e sugar baby: transparência nas relações afetivas (parte 1)

José Fernando Simão. Professor da Faculdade de Direito da USP. Livre-docente, Doutor e Mestre pela USP. Advogado e Consultor Jurídico.


“O dinheiro é um tema que detona a
emergência e a evidência de todos os
contratos tácitos e implícitos que
invariavelmente permeiam nossas relações.”
(Clara Coria, em O Sexo Oculto do Dinheiro)

Há algum tempo, fui convidado pelos professores Oksandro Gonçalves e Marcia Carla Pereira para proferir uma palestra na PUCPR. O tema era "Análise Econômica do Direito", e tive o prazer de aprender com os professores Ricardo Lupion e Cesar Santolim e com os organizadores do evento, que gentilmente me convidaram para falar sobre os princípios sociais dos contratos.
Na palestra do professor Oksandro, tomei conhecimento de um site chamado Meu Patrocínio e imediatamente acessei a internet para ver do que se tratava. Passei, então, a conhecer a figura do sugar daddy.
Sugar — açúcar em inglês — e daddy — papai — são duas palavras que, somadas, indicam que o homem, mais velho e, por isso, papai, se dispõe a “bancar” mulher mais jovem. Não se trata de um site de prostituição em que homens, após manutenção de relação sexual, pagam pelos serviços prestados. É uma relação em que o homem mais velho tem prazer em se relacionar com mulher mais jovem que gosta de ser mimada, ganhar presentes, viajar, comer em bons restaurantes, sair para lugares chiques. Já o homem mais velho, normalmente em uma fase da vida pela qual poucas mulheres mais jovens sentem atração, paga para ela e proporciona alguns luxos, prazeres que a ela estariam negados em razão do custo.
Imagino que o leitor deva estar se perguntando: não é possível que uma mulher mais jovem se apaixone por um homem mais velho? A resposta é positiva e isso acontece. O site simplesmente proporciona que, se isso não ocorreu com você, homem com mais de 50 anos, com recursos financeiros, você possa estar na companhia de uma mulher mais jovem que dividirá com você os prazeres da vida: viagens, restaurantes, shows, espetáculos etc.
Para as candidatas a sugar babies, o site informa: “Você merece o melhor que o mundo tem a oferecer e está preparada para agarrar uma oportunidade. Quer um mentor, alguém que te apoie nos estudos ou na carreira, emocional ou financeiramente. O Meu Patrocínio te ajuda a encontrar alguém generoso e experiente para um relacionamento madurotransparente e sem joguinhos, cheio de viagens fantásticas e mimos”.
Já para os possíveis sugar daddies, o texto é o seguinte: “Você trabalhou muito para se tornar a pessoa bem-sucedida que é hoje. Quer o melhor que a vida tem a oferecer, e prefere que seja com alguém que compartilhe dessa energia e tenha conteúdo suficiente para trilhar o caminho com você, onde quer que seja. O Meu Patrocínio te ajuda a encontrar mulheres atraentes e promissoras para um relacionamento verdadeiro e transparente”.
Os adjetivos indicam que o que se oferece é algo maduro, verdadeiro e transparente. O casal não precisa “de joguinhos” para atingir seus objetivos. A relação é clara. Transparência é o que vende o site.
Transparência significa que as partes não ocultam seus interesses. Ela não quer uma relação amorosa, nem ele. São pessoas que buscam companhia e convívio com regras bem claras: "Tudo é combinado, sem mal-entendidos", segundo o texto do site.
Em minha opinião, o site reflete aspectos claros dos novos tempos ou pós-modernidade.
A primeira marca desses tempos é que as pessoas buscam diversas formas de prazer, além das tradicionais. Há muita criatividade e hedonismo. Não é necessários buscar o prazer apenas no sexo, apenas no namoro, apenas no casamento, apenas nas viagens, apenas nos restaurantes e nos presentes.
A segunda marca dos tempos em que vivemos é que são tempos de experimentar novos modelos. Poucos dizem, ninguém escreve, mas muitos sentem que o modelo construído para os relacionamentos heterossexuais e copiados pelas famílias homoafetivas de casamento ou união estável é um modelo decadente e em franca mudança.
No século XX, o Direito mudou apenas as relações entre homens e mulheres por meio da igualdade e ampliou às pessoas do mesmo sexo o acesso a modelos em crise e de pouco ou nenhuma efetividade e afetividade. O século XXI assiste a um questionamento dos modelos de relação e admite que há relações diferentes das tradicionais.
A terceira marca é a transparência. Os aplicativos de relacionamento, que são muitos, exigem que o utilizador seja direto: o que quer, quando quer e em que condições quer.
É isso que faz o site Meu Patrocínio. Demonstra que interesse é palavra avalorativa, nem positiva nem negativa, e que todas as pessoas em toda e qualquer relação o tem. Interesse não é algo pejorativo ou negativo. É simplesmente a vontade de estar com. Nada mais.
Mas há mais a compreender. Na parte 2, Giselle Groeninga fará considerações a partir da Psicanálise a respeito da ideia de transparência nas relações afetivas.